Terça 30 de Abril de 2024

Teoria

Semana “História , Arte e Revolução” na PUC-SP

Debate de estratégias em homenagem à Revolução Russa

23 Oct 2007   |   comentários

Entre os dias 16 e 19 de outubro aconteceu na PUC-SP a Semana “História, Arte e Revolução” , promovida pelo Centro Acadêmico de Ciências Sociais ’ Gestão Primavera de Praga, composta por militantes da LER-QI e independentes, em parceria com a Boitempo Editorial. A organização da Semana constituiu parte do esforço para resgatar o marxismo como ciência capaz de oferecer uma análise e apontar o caminho para responder aos principais desafios postos na atualidade, em combate contra a ideologia burguesa, mas também tentando superar a atmosfera de debates “amorfos” e “diplomáticos” , hoje predominantes nas universidades. Com mesas de debate, mini-cursos, exposição de filmes, de poemas e arte gráfica, o evento buscou dar uma marca de atualidade à homenagem, e usar dos mais diversos meios para instilar um clima ideológico distinto à árida paisagem intelectual dessa prestigiosa universidade.

Nas mesas de debate a polêmica foi marca distintiva das discussões. Além das intervenções de estudantes em diversos momentos, a FT-QI esteve representada na figura de três debatedores nas principais mesas: Christian Castillo, dirigente do PTS ’ organização irmã da LER-QI na Argentina ’ professor da Universidad de Buenos Aires e diretor do Instituto do Pensamento Socialista ’ IPS “Karl Marx” ; Andréa D”™Atri, também dirigente do PTS e autora do livro “Pão e Rosas” , que trata do marxismo e a questão da mulher; e Edison Salles, jovem dirigente da LER-QI e estudante de mestrado da PUC-SP.

De parte da intelectualidade, estiveram presentes nomes como Michael Löwy, membro da LCR francesa e professor da Universidade de Paris; Ricardo Antunes, professor da Unicamp afim ao PSOL; e João Quartim de Moraes, professor da Unicamp ligado ao PCdoB, entre diversos outros nomes sem filiação partidária, como Lívia Cotrim, Francisco Alambert, Marcelo Badaró e Lúcio Flávio de Almeida.

Revolução Russa: Memória e Atualidade

Foi para debater este tema que mais de 250 pessoas estiveram presentes no Tuca Arena em 17 de outubro, cujos debatedores foram Christian Castillo, Michel Löwy e Ricardo Antunes.

A intervenção de Christian Castillo resgatou os três aspectos fundamentais que sintetizam a um só tempo as lições e a atualidade da revolução russa, a saber: a hegemonia da classe operária na aliança de classes revolucionária, a democracia soviética como forma da ditadura do proletariado e o papel do partido bolchevique.

Combatendo as diversas teorias que ao longo das duas últimas décadas deram “adeus ao proletariado” , que acompanharam no plano ideológico a ofensiva neoliberal, ressaltou que do ponto de vista objetivo a classe trabalhadora constitui uma proporção superior a que jamais teve na população mundial, citando como exemplo vários países, dentre os quais o Brasil que mantém 71% de assalariados do total de 67.120.000 de ocupados urbanos. Assim, a crise da classe operária não se encontra no plano sociológico, mas no plano político. Daí a necessidade de lutar pela independência de classe contra as novas mediações reformistas, como o chavismo, e contra a ação das burocracias sindicais.

Sobre a importância dos soviets como expressão máxima da democracia operária ressaltou que “O regime dos soviets constituiu em seu momento uma tentativa de superar a separação entre economia e política própria da forma de dominação instaurada pela burguesia. É uma base ainda não superada historicamente (...) para que os trabalhadores interviessem na planificação democrática da economia” . Elemento que se comprova nos processos mais avançados protagonizados pelos trabalhadores mais recentemente, como na Bolívia em 1952 com a COB, os conselhos da revolução política húngara em 1956, nos cordões industriais chilenos em 1972-73, e também de forma embrionária em diversos outros processos.

Por fim, delimitando-se das visões autonomistas que consideram o leninismo como a causa de todos os males igualando-o ao stalinismo, ressaltou que as lições deixadas pelo partido bolchevique, que levou à frente as lutas pela instauração da ditadura do proletariado, seguem sendo de valor inestimável para todos os que se colocam na perspectiva revolucionária

Os governos latino-americanos e a polêmica sobre Chávez

Dos diversos pontos de polêmica, o que ocupou o centro político foi a questão dos governos Chávez e Evo Morales. Michael Löwy se referiu a eles dizendo que as “novas revoluções” na Venezuela, Bolívia e Equador não seguiriam o “modelo de outubro” . Sobre este aspecto há que destacar que se por um lado é certo que seria um grande engano esperar que as revoluções futuras sejam transposições mecânicas da revolução russa, por outro seria um erro ainda maior invalidar as lições estratégicas vigentes sobre o sujeito, a necessidade da tomada do poder e de construção de um partido revolucionário. É nisso que se situa em nossa opinião, o grande erro da estratégia revisionista proposta pela LCR de Löwy de se dissolver em partidos amplos anticapitalistas e sem corte de classe, que leva não à revolução, mas à liquidação de sua própria tradição.

Já Antunes apesar de dizer que não tem expectativa em Chávez, e sim na “auto-organização popular” colocou que “Chávez e seu movimento são singulares (...) sua persona política tem tido uma evolução política ideológica evidente(...) e que “não dá para não perceber que a constituição bolivariana tem elementos da Comuna de Paris” . Agregou ainda que as movimentações das massas na Bolívia e Venezuela não se dão de maneira “marxista” .

Frente a discussão sobre o caráter de Chávez ressaltamos que se trata de um caudilho que leva à frente um projeto nacionalista burguês e que, portanto, é incapaz de dar uma saída de fundo às aspirações das massas. Sobre o discurso de esquerda de Chávez, Castillo ressaltou que este “busca conter os revolucionários com discursos ”˜de esquerda”™ que visam neutralizar qualquer força independente(...) Se baseia na alta renda petroleira para dar algumas concessões e garantir seu domínio, mas impede que as amplas massas tenham mudanças significativas em suas condições de vida” . É atendendo justamente a esta necessidade que Chávez hoje impulsiona o PSUV, e tenta acabar com a independência dos sindicatos. Assim, a emancipação da classe trabalhadora e das massas venezuelanas se dá contra Chávez, e não aproveitando este “atalho” . Por outro lado, o fato das massas andinas terem dado heróicas lutas, e derrubado vários presidentes, mas não terem tomado o poder confirma a urgência em se forjar partidos revolucionários que possam encabeçar de maneira consciente a grande disposição que a classe trabalhadora e as massas já vêm mostrando.

A revolução russa e o Brasil

No debate sobre “A revolução russa e o Brasil” compuseram a mesa Lúcio Flávio de Almeida, professor da PUC-SP e diretor da revista Lutas Sociais, João Quartim de Moraes, e Edison Salles. Este interveio colocando a questão de quais as lições a ser tiradas da revolução russa, e como estas iluminam a prática reproduzida historicamente pelas direções hegemónicas do proletariado brasileiro. Sintetizou estas lições na fusão revolucionária de Lênin e Trotsky ocorrida em 1917, cada qual assimilando de maneira própria a contribuição desenvolvida anteriormente pelo outro, Lênin a interpenetração das etapas da revolução na Rússia (a base da “teoria da revolução permanente” de Trotsky), este o papel do partido revolucionário de vanguarda (a “concepção leninista de organização” ). Colocou como a burocratização do Partido russo e da União Soviética desfigurou essas lições, mediante a teoria do “socialismo num só país” e o papel de colaboração com a burguesia dos distintos países que a direção stalinista impunha aos PCs ao redor do mundo. Como exemplo disso, falou da trajetória do PCB como um todo, e em particular da experiência da Aliança Nacional Libertadora (a ANL, proposta de frente com o “setor nacionalista da burguesia” e a “ala patriótica das Forças Armadas” ). Por último, a intervenção tentou abrir uma polêmica sobre o papel do consagrado historiador Caio Prado Jr. como pensador marxista, partindo de identificar aqueles pontos em que realizou contribuições efetivas em sua crítica ao PCB, mas ressaltando que suas conclusões vão no sentido oposto de abrir caminho para uma política proletária independente, e daí a inviabilidade de erigi-lo em “fundador” do marxismo brasileiro ’ pelo menos não de um marxismo efetivamente revolucionário.

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