Sexta 3 de Maio de 2024

Nacional

15 ANOS DE CARTA CAPITAL

Guido Mantega aterrissa de surpresa em debate com Nouriel Roubini para defender “Brasil forte”

16 Jun 2009   |   comentários

No dia 22 de maio aconteceu na sede do hotel Sheraton Mofarrej o debate “O Brasil e a Crise Económica Mundial” , como comemoração dos 15 anos da revista Carta Capital. Estavam anunciados para participar o economista norte-americano, Nouriel Roubini ’ que ficou conhecido como “Sr. Apocalipse” por ter anunciado com antecedência a crise económica decorrente do estouro da bolha imobiliária nos EUA ’ além do senador petista Aloísio Mercadante, Antonio Delfim Neto ex-ministro da Fazenda da ditadura, cuja participação no debate limitou-se a meia dúzia de piadas, e Luiz Gonzaga Belluzzo, economista e ex-ministro de José Saney. A participação no debate custavam “módicos” 500 a mil reais, o que garantiu que a composição da platéia fosse majoritariamente de empresários aliados do governo, membros do PT, alta cúpula da burocracia estudantil, como a presidente da UNE, Lucia Stumpf, jornalistas dos grandes meios, e pouquíssimos estudantes e jornalistas “comuns” como a autora deste artigo, que por acaso conseguiram uma entrada gratuita.

Logo no início da atividade ficou patente que haveria uma contradição inescapável entre a fala de Nouriel Roubini , conhecido como um dos mais pessimistas economistas burgueses sobre a possibilidade de uma recuperação da economia, com a linha oficial que o governo Lula de se apoiar em alguns índices económicos conjunturais que apresentaram melhora nas últimas semanas para testar o terreno para a retomada do discurso dos “fundamentos sólidos” da economia brasileira. Entretanto, ninguém poderia imaginar o que sucedeu.

Roubini iniciou sua exposição perguntado se o pior já havia passado ou ainda estaria por vir. Neste sentido, ofereceu um informe detalhado sobre a situação da economia norte-americana e dos países imperialistas, colocando que 2/3 do mundo encontra-se em recessão, e que a recuperação de alguns índices económicos chineses não resolveriam a situação já que a demanda chinesa, ainda que em melhores condições conjunturais, não pode alavancar a economia mundial. Isso pelo simples fato de que nos EUA o consumo corresponde a 65% do PIB, enquanto na China não passaria de 35%. Neste sentido, apresentou ’ do ponto de vista das análises burguesas ’ uma visão mais realista da situação, colocando que a euforia que está tomando conta das bolsas e da mídia não tem fundamentos reais se analisa-se a situação para além do imediato.” Vai levar entre cinco e dez anos para a poupança cair, e o consumo subir. A China não vai retomar aquele ritmo de crescimento de 10% ao ano porque o consumo americano será menor nos próximos anos” , afirmou Roubini.
Porém, qual não foi a surpresa do público quando em meio a sua fala, a luz caiu e os microfones deixaram de funcionar, por conta de uma “pane” . A “pane” era a chegada não anunciada do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que voara de Brasília para atividade da Carta Capital. Após algumas dezenas de minutos de perplexidade da platéia, e de negociata entre a cúpula governista presente, tornou-se óbvio que a “surpresa” da chegada do ministro de Lula tinha o objetivo de “neutralizar” a análise traçada por Nouriel Roubini, fazendo propaganda da política do governo e reforçando o mito dos “fundamentos sólidos” da economia brasileira, e “centralizar” a direção da revista Carta Capital, base de apoio aberta do governo Lula, por ter trazido justamente um dos economistas mais céticos em relação a uma melhora da economia, e o próprio Aloisio Mercadante por participar do debate.
Afirmando que “a crise não acabou, mas talvez o pior tenha passado” , Guido Mantega realizou uma apresentação de cerca de uma hora defendendo que a crise brasileira seria em V, ou seja, de queda abrupta, porém seguida de rápida recuperação, que deixou entrever que em sua opinião já estaria começando. Os motivos? Simples, a política de Lula: O PAC, um suposto mercado interno “sólido” , melhor “desempenho fiscal” (ou seja, redução de investimento em saúde, educação, etc), pré-sal entre outros. Fora precedido por Aloísio Mercadante, que ia na mesmíssima linha tendo ressaltado ademais como a queda do dólar melhora a competitividade das exportações brasileiras no mercado internacional. No ápice do cinismo, Mercadante disse que dos “600 mil empregos a menos desde o estouro da crise já teria sido recuperados 270 mil” . Em primeiro lugar, a marca dos postos de trabalho cortados já esbarra nos 2 milhões. Em segundo uma parcela considerável dos postos criados é de empregos precarizados. Logicamente, o ministro Guido Mantega não tocou no aumento do desemprego, e nas conseqüências da retração do comércio mundial, ou da queda nas previsões de crescimento nacional, que segundo diversos organismos como o FMI e analistas burgueses seria de 0%. Muito menos tocou na queda da produção industrial que alcança patamares históricos de uma média de 13,9%.

Porém, a despeito de haver uma melhora conjuntural de alguns índices económicos que afetam o Brasil (ainda que muita desta melhora se deva ao aumento da especulação), o problema mais importante, como ressaltou Roubini e o próprio Luiz Belluzzo foi obrigado a admitir, é que “as bases da última onda de crescimento fundamentadas no alto consumo norte-americano que absorvia a produção chinesa, que por sua vez aumentava a demanda mundial por matérias-primas, foram destruídas. E não existem outras que as substituam” . Neste sentido, por mais que o governo Lula tenha mandado ninguém menos que Guido Mantega para vender a idéia do Brasil forte, a pergunta de Roubini continua ecoando: “estamos em meio ao fim da crise, ou o pior ainda está por vir?” Nem toda demagogia cínica que o alto escalão do governo Lula é capaz consegue dissolver minimante esta questão. Sobretudo quando se pensa nas misérias e sofrimentos que a classe trabalhadora já está sofrendo, como os demitidos da Embraer.

Artigos relacionados: Nacional









  • Não há comentários para este artigo