Quarta 8 de Maio de 2024

Movimento Operário

Uma reflexão sobre a greve do metrô e desafios atuais dos trabalhadores

Greves tradicionais ou “batalhas de classes”?

26 Jun 2014   |   comentários

Nos distintos embates teóricos em que a vanguarda da classe operária está inserida, na disputa de concepções para dar rumo à luta pela emancipação dos trabalhadores, existe sem dúvida, para retomar as palavras de Marx, um critério que define a realidade das teorias: é a prática, como expressão de concepções que se materializam em ações políticas.

Nos distintos embates teóricos em que a vanguarda da classe operária está inserida, na disputa de concepções para dar rumo à luta pela emancipação dos trabalhadores, existe sem dúvida, para retomar as palavras de Marx, um critério que define a realidade das teorias: é a prática, como expressão de concepções que se materializam em ações políticas.
Nesse sentido, observar os fenômenos mais agudos da luta de classes em nosso país é decisivo para os que pretendem avançar numa estratégia que possa realmente trazer vitórias aos trabalhadores e nos conduzir para além das misérias e opressões do sistema capitalista. A greve impulsionada pelos trabalhadores metroviários de São Paulo durante cinco dias no mês de junho é um desses conflitos emblemáticos que nos ajudam a pensar a que devemos nos preparar.

Porque não era apenas “outra greve”?

A greve do metrô se inseriu no marco de uma onda de greves operárias, que vem se desenvolvendo desde os últimos meses do ano passado, ganhando a cena nacional e que teve um ponto de inflexão (no peso subjetivo da luta) na greve dos garis do começo do ano, que se seguiu a outros conflitos importantes, tendo destaque os rodoviários em nível nacional.

No entanto, a greve dos metroviários guardava dois elementos fundamentais que a faziam uma greve particular: do ponto de vista objetivo, trata-se de uma categoria estatal que, também como outros setores centrados nos grandes centros urbanos, vem assumindo uma posição estratégica muito relevante, em que sua paralisação afeta de conjunto várias regiões da cidade (no caso, da capital de São Paulo). Do ponto de vista subjetivo, após a vitória dos garis contra a direção do sindicato (que atuava contra a greve) e, de conjunto, após as distintas greves que tem ocorrido passando por cima das direções dos sindicatos, restava saber se aonde a esquerda no país dirigia efetivamente se demonstraria a importância dessas organizações para a vitória dos conflitos.

A greve de Minneapolis e a greve do metrô

Podemos entender melhor as contradições da greve do metrô se resgatarmos uma das greves que se tornaram um marco na atuação política dos trotskistas: o conflito de caminhoneiros em Minneapolis nos Estados Unidos no ano de 1934. Existe um paralelo “histórico” interessante com Minneapolis que ajuda a pensar: apesar de todas as importantes diferenças entre a década de 30 e os dias atuais, os Estados Unidos vinham de um ascenso de lutas operárias a partir de 1933 e, com a vitória na “greve do carvão”, aprofundou-se a onda de lutas; no Brasil também ocorreu uma onda de greves que, com a vitória dos garis, deu mais confiança ao movimento operário. O que pensou a direção política dos trotskistas em 1934? Eleger as greves onde poderiam se concentrar e fazer a diferença, sabendo que o governo da época tentaria esmagar com tudo essas lutas. Do mesmo modo, o que poderia se esperar que um governo como Alckmin em São Paulo? Viria com toda força tentar acabar com a greve do metrô como forma de “frear” as lutas de conjunto: era necessário também aqui uma direção política guiada pela teoria da luta de classes, e seguindo o principio que utilizavam em 1934, “não especular, não fazer as coisas pela metade”.

Relatando esse episódio James Cannon dizia que toda a preparação era organizada apenas do ponto de vista de uma “guerra de classes”. Ou seja, para organizarem uma grande vitória numa greve que durou cinco semanas foram necessários pensar todos os detalhes, aliados, avaliar cada um dos piquetes, organizar autodefesa contra a repressão, pensar um jornal diário contra as calunias da imprensa tradicional, enfim, toda uma preparação que faz os operários sentirem confiança em suas próprias forças.

Indo daí aos nossos dias, ao contrário disso, a greve do metrô contou com uma direção burocrática personificada no presidente do sindicato (Altino do PSTU), pisoteando organismos de representação de base anteriormente formados, restringindo todo o diálogo com a população ao utópico pedido para que Alckmin liberasse as catracas por um dia (com um interesse pragmático e corporativo nas negociações), e embelezando as direções sindicais mais reacionárias e traidoras do país, dizendo que se os metroviários fossem demitidos essas fariam uma “greve geral na cidade em sua ajuda”, além de implorar pela ajuda de Dilma e da FIFA. Ou seja, tudo no sentido de não confiar na força dos trabalhadores e sim nas manobras e maquinações burocráticas e de gabinete.

Retomando a experiência de Minneapolis, dizia Cannon ““Nosso pessoal não acreditava em nada nem ninguém, apenas na política da luta de classes e na habilidade dos trabalhadores para preservar sua força de massa, e na solidariedade. (...) Sabiam que esse poder, não a diplomacia, resolveria esse assunto (...) Em coisas como o conflito de interesses de classe deve-se estar preparado para brigar”. “Brigar” é, em primeiro lugar, conduzir a greve com o máximo de democracia; comandos de greve com delegados eleitos por estação para os trabalhadores serem a condução real da greve e sentirem sua força. Depois, seria ter uma política de hegemonia proletária para forjar uma profunda aliança com a população, fazendo um chamado a uma luta nacional pela estatização dos transportes sob controle dos trabalhadores e usuários. E, por fim, seria escolher os aliados de classe (no movimento operário, confluindo com os rodoviários e ferroviários em luta, com os sindicatos da esquerda mobilizados completamente em torno da greve) ou da juventude e intelectuais em grandes campanhas.
Desgraçadamente, incapaz de preparar uma batalha efetiva de classes, a esquerda levou os metroviários a engolirem 42 demissões sem levar sua luta até o final (dada a enorme força ainda vigente). Fica claro que não era apenas uma questão de capitular no momento decisivo, mas de não ter, desde a preparação do conflito, uma estratégia revolucionária para conduzir a greve à vitória.

É preciso se organizar pra vencer

O grande dilema que os trabalhadores tem de enfrentar é que tem havido distintas lutas passando por cima dos sindicatos, sendo a mais emblemática a dos garis do RJ que ganharam 37% de aumento, e onde a esquerda está no sindicato só tem havido derrotas, sendo a dos metroviários a mais expressiva.
O grande literato brasileiro Guimarães Rosa dizia sobre um de seus personagens (o famoso Sete-de-Ouros) que se podia explicar toda a sua vida no destino de um só de seus grandes dias: achamos que a derrota sofrida na greve dos metroviários também expressa, no curso de cinco dias, uma concepção política global que devemos superar, da esquerda tradicional. Agora é necessário que a conclusão dos trabalhadores seja de retomar os sindicatos a serviço de uma estratégia realmente revolucionária, que possa fazer suas lutas chegarem a vitória e que aponte à construção de um partido que possa ser expressão política dos trabalhadores em todas essas lutas, com a perspectiva da emancipação e de uma sociedade sem exploração e opressões.

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