Sábado 4 de Maio de 2024

Nacional

Repetindo em forma de farsa a tragédia petista

10 Oct 2006   |   comentários

O PSOL sai das eleições mais conhecido nacionalmente, como o "partido da Heloísa Helena", sua principal figura pública que, ainda que não tenha chegado a conquistar a porcentagem que as pesquisas indicavam, obteve uma votação expressiva para presidente, de cerca de 6,5 milhões de votos. Em diversos artigos anteriores do Palavra Operária, já criticamos as concepções estratégicas, programáticas e organizativas desse partido. Entretanto vemos a necessidade de retomar algumas dessas críticas à luz do resultado das eleições que marca o fim de uma etapa em sua construção e do aprofundamento de elementos que já assinalávamos.

Um programa cada vez mais adaptado ao desenvolvimentismo burguês

Dois anos atrás, denunciávamos o PSOL por apresentar um programa adaptado à democracia dos ricos, que propunha como eixo uma série de "reformas populares" (como a centralização do câmbio e o controle da saída de capitais) que na prática constituem "meras restrições financeiras ao conjunto da política neoliberal" . Um programa que em nenhum momento expõe claramente a necessidade de destruir o capitalismo pela via revolucionária, se limitando a consignas abstratas de "democratização" da democracia burguesa, uma "nova constituição", democratização da polícia (!). Que para completar chamava a construção de uma Federação de Repúblicas da América Latina, assim, sem nenhum adjetivo, o que só pode ser entendido como a defesa de um bloco dos países capitalistas do subcontinente, bem no espírito defendido pelo próprio Lula em seus momentos de demagogia terceiro-mundista. O sujeito que levaria a cabo este programa seria um bloco policlassista onde a classe trabalhadora se encontraria completamente diluída.

Entretanto hoje o programa expresso pelo PSOL e pela candidata Heloísa Helena é abertamente reformista do que o de 2004. No documento elaborado por seu candidato a vice César Benjamim está dito com todas as letras que este pretende apresentar "um modelo económico alternativo e viável, considerando-se as limitações do exercício do governo no contexto das instituições atuais" . Assim, elegendo como inimigos o capital financeiro (e não o capital em geral) e os juros altos, o PSOL encabeçou nestas eleições uma frente eleitoral pequeno-burguesa, porém com um programa diretamente burguês desenvolvimentista, propondo-se a uma mera mudança de "modelo viável" e "no contexto das instituições atuais", ou seja, as da degradada democracia burguesa.

Partido de tendências e democracia interna

Já denunciávamos, desde antes da fundação do PSOL, como por trás da defesa do que chamavam "partido de tendências", existia o projeto de um partido que fosse, nas palavras de Heloísa Helena "um guarda-chuva para a esquerda". Nas palavras de Luciana Genro "devemos construir uma trincheira de resistência no campo partidário e no campo sindical, aglutinando a esquerda socialista que não se rendeu, sejam reformistas ou revolucionários". Já dissemos na época que se tratava de uma capitulação das correntes que se reivindicam revolucionárias dentro do PSOL, já que para os revolucionários, os reformistas são "agentes políticos do capital, ou seja, inimigos declarados da revolução social" . É claro que desde o início a política que prima nesse partido é a das alas direitas, reformistas. Porém, também neste aspecto houve desenvolvimentos importantes. Durante a crise do mensalão, um novo setor da "esquerda petista" foi para o PSOL. A Ação Popular Socialista (APS), corrente abertamente reformista, passou a ser a maior corrente do PSOL, conformando com outros setores uma sólida maioria de direita no partido.

Além disso, a suposta democracia interna possibilitada pelo anti-centralismo frenético do PSOL é a maior das falácias. O controle das alas direitas sobre o partido se dá pela via de métodos escandalosamente burocráticos. Nas listas de e-mail do partido mais de um militante se queixou de que as "circulares internas" do PSOL eram os jornais da burguesia, já que era através deles que muitas vezes se inteiravam das decisões dos organismos dirigentes. Agora uma resolução da Executiva Nacional sobre o segundo turno das eleições proíbe os militantes e correntes internas de manifestarem sua posição: "A posição do P-SOL é para os filiados do P-SOL [...] nossa resolução tem caráter proibitivo".

Essa é a democracia interna do PSOL, na qual para ocultar as crises entre a ala direita que quer apoiar Lula no segundo turno e a ala que chama o voto nulo, a direção impõe uma posição ambígua de não apoiar nenhum dos dois candidatos, tampouco chamar o voto nulo e dizer que "cada um faz o que quer, porém não conta pra ninguém".

"Perdas e danos" do PSOL nas eleições

Se por um lado o PSOL sai destas eleições mais conhecido nacionalmente, por outro terá menos da metade dos parlamentares que tem hoje, não ultrapassou a cláusula de barreira e Heloísa Helena não terá mais o "palanque" do Senado para esgoelar-se em nome de Deus e contra os "demoníacos" especuladores. As alas direitas se perguntam se vale a pena continuar num partido com tão diminuta expressão parlamentar e ainda por cima cheio de "trotskistas". As crises internas se acirram e há descontentamento com a hegemonia do reformismo, a atividade meramente eleitoreira e com os métodos burocráticos assumidos, ao fim e ao cabo, para tão pouco ganho. É nesse marco que queremos abrir uma discussão com os companheiros que se reivindicam revolucionários dentro do PSOL.

Não repetir em forma de farsa a tragédia da esquerda do PT

A maioria das correntes do PSOL que reivindicam a revolução socialista formava parte da chamada "esquerda petista" e durante esse longo período cumpriram o papel de legitimar a política do PT que aprofundava cada vez mais sua traição à classe trabalhadora. Ao "cobrir pela esquerda" a política do PT, reforçavam as ilusões nesse partido, que hoje é o principal obstáculo para o avanço da consciência dos trabalhadores no sentido da revolução. Uma parte terminou expulsa quando o PT passou de ser a "pata esquerda" do regime burguês para ser o aplicador das políticas da burguesia. Hoje, no PSOL, reeditam de maneira farsesca os equívocos do passado.

O PSOL já deu suficientes demonstrações de que nele a estratégia que prima é de reformar o capitalismo e a democracia dos ricos, a mesma que tinha o PT há alguns anos, com a diferença de não contar com a ampla base operária com que o PT contava (e em grande medida ainda conta).

Chamamos os companheiros do PSOL que se reivindicam revolucionários à reflexão. Cumprirão uma vez mais o papel de legitimar uma mediação que persuada os trabalhadores mais avançados de que é possível reformar o capitalismo, mudando o "modelo"? De que serve tanta adaptação se os votos de Heloísa Helena não se revertem em aprofundamento da ligação do PSOL com setores de trabalhadores?

O PSOL que surge do processo de rupturas com o PT vem se transformando rapidamente em um dique de contenção para que esse processo se acelere e se dê em chave classista e revolucionária. É tempo de tirar as lições das experiências passadas e abrir uma discussão sobre os caminhos para a construção de um partido revolucionário no Brasil, que lute pela independência política da classe trabalhadora e pela derrubada revolucionária do capitalismo.

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