Segunda 29 de Abril de 2024

Nacional

Contra as medidas do governo Lula - Alencar

Os trabalhadores começam a lutar

06 Jul 2003   |   comentários

O descontentamento de setores das classes oprimidas do país começa a se manifestar frente à nova situação gerada pela orientação à direita do governo, e o não cumprimento das mudanças esperadas pelo povo. Isto é o que expressa a importante luta que começam a travar trabalhadores do setor público federal contra a reforma da Previdência, enfrentando-se diretamente com Lula; os conflitos que surgem aqui e acolá entre governo e funcionários públicos, somados aos conflitos entre a patronal e os trabalhadores do setor privado, como é o exemplo das greves metalúrgicas que vêm ocorrendo desde o mês de abril; assim também devem ser encaradas as ocupações de terras e bloqueios de estradas realizadas pelos camponeses sem-terras, que tem aumentado no último período. Tudo isso é o que está por trás dos conflitos atualmente colocados entre o governo Lula e os deputados das correntes de esquerda do PT, assim como entre o governo e os intelectuais historicamente ligados ao partido. É que a política económica recessiva do governo tem gerado um aumento do desemprego, agravado pelo aumento da carestia de vida. A miséria no campo e na cidade continua a atingir milhões de trabalhadores urbanos e agrícolas e camponeses sem-terra. Em meio a esse cenário, Lula aplica um brutal corte nas verbas do governo que seriam dedica-das às políticas sociais, ao mesmo tempo em que promove uma reforma da Previdência que ataca a aposentadoria do conjunto dos servidores públicos. Tudo para cumprir os acordos com o FMI.

A importante manifestação de 11 de junho, onde mais de 25 mil trabalhadores, em sua imensa maioria servidores públicos, mas também com o apoio de trabalhadores dos setores privados e de estudantes, contra a reforma da Previdência, é um importante indicador de que os trabalhadores não estão dispostos a suportar que a crise seja descar-regada sobre suas costas, e já marcaram uma greve por tempo indeterminado da categoria para o dia 8 de julho. A manifestação de Brasília foi a primeira ação que mostra a disposição de setores da classe trabalhadora de se enfrentar com o governo para defender seus interesses. Porém, este fato político vai além: esta foi a primeira manifestação de amplitude nacional organizada pelos setores não majoritários da CUT e realizada, em última instância, à revelia da direção, que apesar de ter se colocado à frente da negociação e ter dado seu apoio formal, na verdade trabalhou para boicotá-la, como ficou expresso no repúdio dos manifestantes à figura de Marinho, recém eleito presidente da central por indicação de Lula, e nas vaias aos líderes da bancada do PT e do PCdoB na Câmara dos Deputados durante o ato, enquanto os chamados deputados "radicais" PT eram extremamente aplaudidos.

As greves de servidores públicos, realizadas no âmbito estadual e municipal, indicam a mesma disposição, como no caso de setores da categoria em Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro. Inclusive contra governos do PT, como no caso de Blumenau e Campinas (nesta última até mesmo enfrentando-se com a polícia e contrariando as orientações da direção do sindicato, controlado pelo PcdoB). Somam-se a essas as lutas prota-gonizadas por setores ligados ao transporte público, como no caso dos transportes rodoviários em Belém e dos rodoviários e metroviários em São Paulo.

Desde abril, setores dos operários metalúrgicos, tanto base da CUT como base da Força Sindical, protagonizaram greves pela reposição dos salários desvalorizados pela inflação. Ainda que a enorme maioria das lutas nos setores privados tenham sido desviadas através de bónus concedidos aos trabalhadores e da promessa de reposição salarial no segundo semestre, esses elementos mostram que a categoria dos metalúrgicos pode vir a realizar importantes enfren-tamentos com a patronal no próximo período, principalmente se levamos em consideração que este é um dos setores mais atingidos pela crise.

A situação no campo não aponta para um cenário diferente. A onda de ocupações de terras e os bloqueios de estrada indicam uma disposição de setores dos sem-terras de lutar por seus interesses, mesmo que para isso tenham que contrariar a suas direções nacionais que indicaram cargos no governo. A direção majoritária do MST sofre rachas semelhantes aos que sofre a CUT, entre setores do sul e sudeste mais pró-governo e da região norte e nordeste. Este recrudescimento de lutas no campo tem gerado enfrentamentos cada vez maiores com os latifundiários, que organizam verdadeiros bandos armados que já assassinaram mais sem-terras neste ano do que em todo o ano passado. A governo ameaça responder ofensivamente contra os sem-terras falando que a lei vai se cumprir se não se pararem com a onda das ocupações, o que não significa outra coisa senão repressão.

O elemento diferencial dessas lutas com relação às lutas protagonizadas durante o governo FHC é que estas são qualitativamente distintas na medida em que, em muitos casos, estão ocorrendo à revelia de suas direções, que hoje estão completamente atreladas com o governo. Tudo isto é o que se expressa superestruturalmente na crise entre a chamada esquerda do PT que resiste em acompanhar o brutal giro à direita do governo, crise esta que atinge hoje patamares nacionais.

Tudo isto significa que começa a se gestar uma nova camada - pequena, mas que pode começar a dar passos importantes - de trabalhadores e de setores populares no país que cumprem um papel na primeira linha contra as medidas do governo e da patronal. Esta camada é hoje constituída principalmente por trabalhadores dos setores de servidores públicos e de outras categorias dos setores privados, por trabalhadores que gravitam em torno das correntes da esquerda do PT, e setores ligados ao PSTU e a outros agrupamentos menores, que podem anunciar rupturas com o governo Lula. São novos setores de trabalhadores, que têm como enorme barreira suas próprias direções políticas, além das enormes ilusões que a população ainda deposita em Lula.

Na medida em que o governo aprofunda seu alinhamento com o FMI e o imperialismo, expandindo e acentuando as críticas de setores da burguesia nacional, cria-se um caldo de cultura favorável para que essa vanguarda se consolide, protagonize importantes lutas no próximo período e ganhe a simpatia de setores do movimento de massas. Daí a importância de como esta vanguarda se liga ao movimento de massas, porque, atuando isoladamente, pode vir a sofrer ataques mais diretos do governo. Por isso, é importante estar consciente de que, na medida em que o governo consiga abafar os questionamentos dos setores burgueses que hoje começam a protestar e, na medida em que consiga dar concessões, por menores que sejam, ao movimento de massas, isso poderia resultar em um isolamento maior destes setores que hoje saem à luta. Por isso, é central termos uma política que ao mesmo tempo aprofunde a independência desta vanguarda com relação ao governo e assente as bases para que esta amplie seus laços com setores mais amplos do movimento de massas, enfrentando a política do governo, no caminho da luta pela independência política dos trabalhadores.

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