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Nacional

Lula conquista algum crescimento econômico... precário

05 Jul 2004   |   comentários

Segundo os recentes indicadores do IBGE, o PIB brasileiro apresentou cresicmento de 2,7% no primeiro trimestre de 2004 em relação ao mesmo período do ano passado, e de 1,6% em relação ao trimestre imediatamente anterior. Especificamente em relação à produção industrial, o mês de abril de 2004 mostrou expansão de 6,7% em relação a abril de 2003; o acumulado nos primeiros quatro meses de 2004 cresceu 6,1% comparado ao mesmo período do ano passado e o acumulado nos últimos 12 meses teve crescimento de 2,0% em vista dos 12 meses imediatamente anteriores.

No entanto, quando analisamos os componentes que influenciaram o crescimento do PIB, observamos que as exportações cumpriram um papel central, sendo que o mercado interno, marcado pelo baixo crescimento, estagnação ou até mesmo retração de alguns ramos económicos, não tem podido cumprir mais que um papel secundário ou diretamente negativo nesse processo.

De 2002 para 2003, as exportações brasileiras saltaram de US$ 60 bilhões para US$ 73 bilhões, um crescimento de 21,1%. Do primeiro trimestre de 2003 para o mesmo período de 2004, as vendas externas avançaram de US$ 27 bilhões para US$ 34 bilhões, mantendo o mesmo patamar de crescimento. Esses valores contrastam com os que vínhamos observando de 1999 a 2002, quando o crescimento das exportações registrava uma média de 4,5% (dados extraídos do Banco Central).

Distintos fatores combinam-se para assentar as bases deste salto nas exportações. 1) De meados de 2002 até março de 2003, o dólar oscilou entre R$ 3,50 e R$ 3,35. Como os custos das mercadorias produzidas no Brasil são em grande medida pagos em reais (exceto quando existem matériasprimas importadas) e o preço de venda no mercado internacional é pago em dólar, a desvalorização do real frente ao dólar estimula as exportações, na medida em que permite aos capitalistas brasileiros obterem superlucros na comercialização com outros países. Como as decisões de produzir para exportar e o fechamento de contratos antecedem de seis a nove meses os embarques das mercadorias para o exterior, o desempenho exportador de 2003 foi fortemente influenciado por essa alta do dólar. 2) Nos últimos anos, com suas enormes taxas de crescimento, a China tem aumentado suas compras de produtos em outros países para satisfazer suas necessidades internas, cumprido um importante papel dinamizador da economia mundial. Especificamente para o Brasil, a China tem funcionado como um importante consumidor de commodities [1] (especialmente soja e minérios). 3) Problemas de secas, pragas, inundações etc., em 2003, prejudicaram a produção de commodities em alguns países competidores do Brasil (principalmente os EUA), diminuindo a oferta destes produtos no mercado internacional. Por outro lado, a recuperação do crescimento económico dos EUA e, com isso, o reaquecimento da economia mundial provocaram um aumento na procura de commodities. Essa combinação de diminuição da oferta e aumento da procura provocou uma alta dos preços de algumas commodities que cumprem um importante papel na pauta exportadora do Brasil, como é o caso da soja. 4) Somamse a esses fatores o retorno da Argentina como mercado consumidor de produtos brasileiros a partir do crescimento económico vivenciado por este país após o desvio das jornadas revolucionárias protagonizadas pelas massas argentinas em dezembro de 2001.

Baixo crescimento, estagnação e retração no mercado interno

O crescimento de 6,1% da produção industrial, no acumulado de janeiro a abril de 2004 contra igual período de 2003, mostra a diferença entre os ramos mais ligados à exportação e os que respondem ao mercado interno. Por um lado, a extração de minerais metálicos não ferrosos (41,0%), a produção de sucos e concentrados de frutas (41,2%), de café (20,1%) e de tratores e máquinas agrícolas (23,9%) expressa altos índices de expansão ligados ao aumento das vendas externas. Por outro lado, as indústrias farmacêutica (7,6%), de calçados e artigos de couro (6,2%), de leite e laticínios (5,5%) e de embalagens de material plástico (6,2%) expressam significativos índices de retração ligados à diminuição da demanda interna (dados extraídos do IBGE).

Quando analisamos o PIB desde o ponto de vista da demanda, observamos que o consumo interno, os gastos públicos e os investimentos na economia (componentes centrais que do mercado interno) apontam para uma tendência bem diferente, e, em certa medida, até mesmo oposta à que apontam as exportações.

No acumulado dos últimos quatro trimestres, enquanto o consumo das famílias e os investimentos apresentaram uma diminuição de 2,3% e 5,7%, respectivamente, as exportações de bens e serviços apresentaram crescimento de 14,6%. Ao compararmos o consumo das famílias no primeiro trimestre de 2004 com o primeiro trimestre de 2003 (um dos trimestres de maior retração), observamos um crescimento de 1,2%. No entanto, se tomamos como base de comparação o primeiro trimestre de 2002, quando a economia ainda não havia sido afetada pela recessão de 2003 e, portanto, uma base de comparação mais adequada para medir o crescimento económico, houve uma diminuição de quase 2% no gasto dos brasileiros. Em relação aos investimentos, se comparamos o primeiro trimestre de 2004 com o primeiro de 2003, houve aumento de 2,2%. Se, por outro lado, usando a mesma lógica anterior, tomamos como base de comparação o ano de 2002, observamos que o crescimento foi de apenas 0,5%. [2] Com relação aos gastos do governo, apesar de terem aumentado, este aumento tem sido destinado ao pagamento das dívidas do governo e não ao aumento de verbas em educação, saúde, infraestrutura etc., que na verdade têm sido cortadas.

Diferentes fatores combinam-se para criar essa dinâmica no mercado interno. A subordinação do governo aos banqueiros e ao imperialismo faz que ele mantenha altas taxas de juros. Os altos juros garantem uma alta rentabilidade para os capitalistas que especulam no mercado financeiro e encarecem o crédito tanto para o investimento na economia como para o consumo, provocando a retração do mercado interno e com isso o aumento do desemprego, o aumento da informalidade e a queda da renda. A mesma subordinação ao imperialismo faz com que o governo corte seus investimentos na economia para destinar dinheiro aos banqueiros internacionais. Esses cortes criam problemas infraestruturais como as péssimas condições nas estradas e o alto custo (ou até mesmo falta) de água e energia. Além disso, significam cortes diretos de empregos que eram proporcionados pelas obras públicas e também provocam a retração do mercado interno, gerando as mesmas conseqüências que as taxas de juros. O mesmo ocorre com o aumento dos impostos, que tira da renda dos trabalhadores para pagar as dívidas aos banqueiros. Só em 2004 a carga tributária deve pular para 38,11% do PIB, sendo que em 2003 essa porcentagem era de 36,11% e em 1995 de 28,44% (dados extraídos do IBPT).

As novas dificuldades para a manutenção da atual dinâmica exportadora

Apesar da experiência recente mostrar que o volume de exportações brasileiras está intimamente ligado ao valor do dólar, ainda não estão claros os efeitos que a recente alta desta moeda trará para as vendas externas em 2004. No entanto, alguns fatores já começam a influenciar negativamente na dinâmica das exportações e outros delineiam obstáculos a médio prazo.

As novas dificuldades que atingem a produção agropecuária brasileira, e ainda mais as novas dificuldades que atingem a produção de soja, ganham enorme importância para as perspectivas de crescimento do PIB e das exportações em função do enorme peso que estes setores económicos têm tido na recuperação do crescimento em curso. A soja tem sido o principal produto da pauta de exportações brasileiras, responsável isoladamente por 22,4% do aumento das vendas externas, e a agropecuária tem sido um dos principais motores de crescimento do PIB.

O aumento da oferta de soja no mercado internacional em função da recuperação da produção dos EUA (que avaliam a possibilidade de uma safra recorde este ano), pressiona para baixo o preço desta commoditie no mercado internacional. A atual política do governo chinês de reduzir seu crescimento económico (pois a China tem enfrentado obstáculos para seu crescimento em função do esgotamento de sua capacidade infraestrutural) tem como resultado a redução de suas importações. Além da diminuição do crédito fornecido pelo governo, a queda na importação de soja pela China também foi influenciada pela redução da demanda de farelo de soja provocada pela “gripe do frango” , que matou um enorme quantidade de aves consumidoras deste produto naquele país. Esse é o pano de fundo que está por trás da recente crise do Brasil com a China, na qual esta tenta quebrar contratos antigos para adaptálos às novas condições de preços baixos e baixa demanda. A recente crise energética na Argentina, que traz à tona as restrições infraestruturais que sua economia enfrenta para continuar crescendo no ritmo atual, combinado com a manutenção dos baixos salários e do alto nível de desemprego e informalidade, mostram os limites para que este país possa alavancar as exportações brasileira de forma sustentada. Como se isso não bastasse, este ano surgem novos problemas de secas, pragas e inundações na produção agropecuária brasileira, como por exemplo os embargos por parte da Rússia e da Argentina à exportação da carne brasileira em função do foco de febre aftosa no Pará.

[1Commodities é o nome internacional dado a produtos que passam por poucos processos de industrialização e normalmente servem como matériaprima para a produção de outras mercadorias. Exemplos de commodities são: aço, minerais, petróleo, produtos agropecuários etc.

[2Dados extraídos das Contas Nacionais do IBGE publicadas em 27/05/2004 e da revista Primeira Leitura de junho de 2004.

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