Sábado 27 de Abril de 2024

Internacional

USP

Debate resgata as lições de 68 para pensar o presente e lança filmes dos grupos Medvedkine

09 Aug 2008   |   comentários

Num debate na USP, no dia 14/8, com o tema “Aliança entre estudantes e trabalhadores na França de 68 e de Sarkozy” , mais de 70 pessoas assistiram o debate com Stéphane Andrieu, professor de filosofia e militante do Grupo Communiste Révolutionnaire internationaliste (nova seção simpatizante da Fração Trotskista-Quarta Internacional na França), Flávia Vale (da LER-QI e do Movimento A Plenos Pulmões) e Luiz Renato Martins (professor da ECA-USP).

Foi exibido o filme "Les ouvriers aussi" (“Os operários também” ), marcando o lançamento dos filmes dos grupos Medvedkine inéditos no Brasil[1], que retratam o cotidiano e as lutas dos operários franceses de 68. Luiz Renato comentou os filmes explicando a relação da arte e do artista com cada momento histórico, criticando aqueles que tratam a arte como uma “esfera autónoma” , ressaltando a diferença da arte em momentos de ascenso e de retrocesso e a riqueza desses filmes justamente por se tratarem de um cinema feito em meio a um ascenso.

Stéphane resgatou as lições do maio francês como chave para pensar as lutas do presente, particularmente a questão da auto-organização, da aliança operário-estudantil, do papel da greve geral e do partido revolucionário. A partir das perguntas também desenvolveu quais são as tarefas que nós, da FT-QI e como CRI na França nos propomos como revolucionários na atual situação objetiva e subjetiva, dando centralidade para recompor o marxismo e de construir organizações políticas ancoradas na classe trabalhadora que possam cumprir um papel superior ao que puderam cumprir os revolucionários no ascenso de 68 por estarem despreparados estratégica e organizativamente.

Flávia Vale analisou a situação da subjetividade da classe trabalhadora hoje e do marxismo, para colocar o desafio de que os estudantes hoje tomem para si a tarefa de aportar para recompor o marxismo como uma teoria viva capaz de responder aos problemas da atualidade se recuperado desde um ponto de vista não dogmático, e chamou a todos os estudantes a impulsionarem conosco o boletim de debate marxista, cultura e política, Desatai o Futuro, que será lançado proximamente pela APP.

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Stéphane Andrieu

I) Algumas lições de maio de 68

A quarenta anos de maio de 68, para os estudantes e trabalhadores que aspiram a pór fim à barbárie capitalista, a questão não é simplesmente relembrar com nostalgia os grandiosos acontecimentos daqueles anos. É preciso fazer o esforço de extrair as principais lições para o futuro, isto é com o objetivo de se preparar para intervir de forma revolucionária quando situações que coloquem problemas similares se apresentem novamente.

Deste ponto de vista, o paradoxo do maio de 68 consiste do contraste gritante entre a potência da greve geral e o caráter reduzido das conquistas obtidas pelo proletariado. Em seu ponto mais alto, no dia 22 de maio, a greve geral mobilizava 8 milhões de trabalhadores e 2 milhões de estudantes. Mais de um trabalhador a cada dois estava em greve, um número trez vezes maior que o de junho de 1936. Durante três semanas, o país esteve paralisado : as fábricas paradas, as escolas fechadas, e rápidamente o transporte interrompido por falta de combustível. No entanto, as concessões feitas pelo governo e pela patronal e consideradas suficientes pelas direções das confederações sindicais ’ a começar pela principal entre elas, a CGT, dirigida pelo PCF ’ eram irrisórias se comparadas a força do movimento : um aumento salarial de 7%, o que correspondia na prática ao ritmo da inflação ; um aumento do salário mínimo em 35%, reivindicado por setores da alta burguesia havia vários meses com o objetivo de eliminar as empresas menos rentáveis e que foi rápidamente absorvido pelo aumento dos preços ; o reconhecimento e novos direitos para os delegados sindicais ; algumas reduções localizadas do tempo de trabalho.

A principal explicação desta contradição reside no peso das direções reformistas no seio da classe operária e em sua orientação claramente contra-revolucionária durante todo o processo : pode-se falar de uma situação revolucionária traída. Na França da época, o papel decisivo nesta traição foi cumprido pelo PCF e por sua central sindical, a CGT, hegemónica nos principais setores da classe operária. A força desse partido pode ser explicada, em parte pelo prestígio obtido em razão de seu papel central na resistência contra a ocupação nazista durante a segunda guerra mundial, e em parte pela prosperidade económica do pós-Guerra, que permitia certas concessões materiais aos trabalhadores, prosperidade essa possibilitada precisamente pela traição por parte do PCF da situação revolucionária aberta na saída da guerra. Em um sentido, quase é possível deduzir quais eram as principais tarefas dos revolucionários partindo das tendências e orientações que o PCF e a CGT combateram encarniçadamente.

1) A greve geral coloca sobre a mesa o problema do poder

O PCF e a CGT, que num primeiro momento se esforçaram para impedir a greve, fizeram tudo, uma vez que a greve havia se generalizado, para limitar a mobilisação a um marco de reivindicações puramente económicas. Dedicavam boa parte de seus discursos em denunciar como « gauchistes » [ultra-esquerdistas], « aventureiros », provocadores, todos aqueles que pretendiam imprimir à luta um outro objetivo. (Nas eleições do mês de junho, o PCF insistia exaustivamente no fato de que ele não era candidato ao poder, nem mesmo à direção do governo. Se limitava à defesa de um « programa de progresso social e de paz e de política de união de todas as forças democráticas », isto é, um programa que pretendia conciliar os interesses de duas classes opostas e irreconciliáveis).

Se é formalmente verdade que as greves eram movidas por reivindicações económicas, isso não contradiz o fato de que o movimento dos estudantes etrabalhadores era portador de aspirações que superavam o próprio programa de reivindicações que pouco a pouco foi unificando o conjunto das greves. Antes mesmo do começo da greve geral propriamente dita, desde a manifestaão do dia 13 de maio, que reuniu um milhão de trabalhadores, as palavras de ordem eram « CRS SS » [numa comparação entre a tropa de choque que reprimia os estudantes e os agentes nazistas], « dez anos, já é o suficiente » [De Gaulle estava no governo havia dez anos], « Abaixo De Gaulle », « Abaixo o Estado policial ». A bandeira vermelha colore a manifestação e A Internacional é seu canto. Ao longo das três emanas de greve, as palavras de ordem políticas florecem por todos os lados : « Basta de governo De Gaulle-Pompidou, basta de governo capitalista », levantava por exemplo um comitê de cordenação der Paris e região
Se toda greve com ocupação coloca sobre a mesa o problema de saber quem manda na fábrica, os operários ou o patrão, a extensão das greves e sua transformação em greve geral coloca com uma agudeza particular o problema político de quem dirige o país. A paralisia económica, produto da greve geral, mostra de forma concreta que a sociedade burguesa, na qual o poder político pertence aos capitalistas, está edificada sobre o trabalho da classe operária. Neste sentido, ela coloca objetivamente o problema do poder. Exige portanto das organizações revolucionárias uma orientação que permita às massas tomar para si o objetivo de derrubar o poder instituído e substituí-lo por seu próprio poder. Isto passa, em primeiro lugar, pela formulação de palavras de ordem que emprimam esse objetivos e possíveis de serem apropriadas pelas massas em cada etapa.

Nas condições presentes em maio de 68, onde a esmagadora maioria dos operários tinha profunda confiança no PCF e em outras organizações reformistas, tal orientação supunha, num primeiro momento, colocar-se como objetivo a derrubada do governo De Gaulle pela mobilização de massas e a instauração de um governo das organizações operárias. Era a condição primeira para que a contradição entre as aspirações das massas e a orientação de suas direções pudesse se desenvolver. POr sua vez, espontaneamente os operários de Renault-Bollancourt respondem aos dirigentes da CGT que vieram no dian 28 de maio tentar vender os acordos de Grenelle para acabar com a greve com a palavra de ordem de « governo popular ». Na realidade, o PCF não se cansava de repetir, nos dias de festa, que as aspirações dos trabalhadortes só poderiam ser satisfeitas por um « governo popular ». Ao virar essa palavra de ordem contra a política do PCF, os operários mostravam sua consciência de que o que estava em jogo era o poder.

Entretanto, essas palavras de ordem embora necessárias eram insuficientes, pois, em primeiro lugar, não se pode esperar que as direções reformistas tomem o poder por sua própria conta, sem a pressão das massas ; em segundo lugar, que as massas possam exercer sua pressão sem estarem auto-organizadas ; e enfim, não se deve confundir um governo das organizaçãos operárias com um governo operário

2) A necessidade de auto-organização dos trabalhadores

Os trabalhadores não podem se tornar uma força real, capaz de superar os estreitos limites impostos pelos aparatos burocráticos e derrotar a burguesia se não se dotam de seus próprios organismos de luta. É precisamente por isso que a direção do PCF e da CGT, istruídas pelas experiências da greve geral de 1936, da insurreição operária na Hungria em 1956 e do início da primavera de Praga no mesmo ano de 1968, combatia encarniçadamente as ocupações de fábrica reais e os comitês de greve autênticos. A CGT se opõe aos comitês de greve. Georges Séguy, secretário geral da confederação, declara por exemplo, em em resposta a um ouvinte de um programa de rádio, no dia 17 de maio : « Você defende a organização nacional de todos os comitês. Bom, eu acho que as confederações podem elas mesamas se fazer cargo das tarefas que lhesd cabem ».

No entanto, para impedir a constituição de autênticos comitês de greve, a CGT prefere muitas vezes criar com outros reformistas comitês de greve esvaziados de todo conteúdo real, já que reduzidos a uma simples reunião de delegados sindicais. Assim, a burocracia operária mantém o controle total da greve. O PCF combate também toda e qualquer tentativa de coordenação dos comitês de greve existentes. Foram necessários, por exemplo, dias de negociação para que uma simples delegação sindical de Renault-Flins pudesse entrar em Renault-Billancourt.

Numa situação de greve geral, a palavra de ordem de comitê de greve nas empresas e estabelecimentos e por sua unificação em todos os níveis, com o objetivo de um comitê central de greve , é vital. É a única forma de que os trabalhadores possam tomar em suas próprias mãos a luta. E, mais importante, a única maneira de preparar o enfrentamento com o poder do Estado e começar a criar uma dualidade de poder. Neste sentido, uma política consequente de auto-organização implica uma política de armamento do proletariado, que começa pela organização da auto-defesa operária frente à repressão policial das manifestações, greves e piquetes de greve.

3) O problema da aliança entre trabalhadores e estudantes

Ainda que os estudantes sejam frequentemente originarios da grande, pequena e média burguesia, eles se mostram muitas vezes os mais sensíveis às contradições que atravessam toda a sociedade capitalista, como foi o caso por exemplo na revolução de 1905 na Rússia, no início da revolução espanhola nos anos 30 ou ainda na luta contra a ditadura militar no Brasil.

Este foi particularmente o casdo da França durante o ano de 1968. Se por uma lado eram majoritariamente filhos da burguesia, se sentiam particularmente tocados pelas guerras de libertação nacional dos povos oprimidos, como as da Argélia e do Vietnã, foram brutalmente atacados pelo plano do governo de reduzir o número de estudantes e de submeter mais abertamente as universidades às necessidades imediatas do capital, são especialmente sensíveis à ordem moral e à brutalidade da repressão do Estado. O mais avançados entre eles, desenvolviam uma crítica da universidade como universidade de classe. Neste sentido, se os estudantes foram os primeiros a se enfrentar contra o poder gaullista, armando barricadas para retomar a Sorbonne ocupada poelas forças repressivas e fazendo frente aos ataques da polícia, seus dirigentes eram em geral conscientes da impotência dos estudantes isolados e da necessidade da aliança com a única classe capaz de derrubar a velha sociedade. Esta questão se expressa claramente no chamado da Unef à população após a noite das barricadas : « De fato, a luta deles é fundamentalmente a mesma : os operários rejeitam a sociedade que os explora, os estudantes rejeitam uma universidade que tende a fazer deles os cérebros dóceis de um sistema fundado sobre a exploração, e as vezes inclusive cúmplices diretos dessa exploração ».

A coordenação parisiense dos comitês de ação estudantis proclama « a Sorbonne para os trabalhadores » e precisa : « Agora é preciso se dirtigir à classe operária. Não para organizá-los nós mesmos, mas para aproveitar a audiência que nos deu nossa coragem e explcar a necessidade de derrubar o regime.».

O PCF se opunha frontalmente à aliança entre operários e estudantes, denunciando estes últimos como elementos estranhos à classe operária. De fato, os trotskistas e os maoistas estavam particularmente inseridos no meio estudantil e muito pouco no operário. Neste sentido, impedir a união entre estudantes e operários era tentar impedir a união entre os intelectuais marxistas ou marxistizanes e a classe operária, isto é entre os portadores de um programa político e aqueles que estavam, em condições de aplicá-lo. Se os esforços empregados pelo aparato stalinista deu frutos, eles não foram capazes de impedir múltiplas formas de união : os operários se reuniam nas universidades ; operários e estudantes colaboravam nos comitês de bairro ; os estudantes ajudavam os operários a enfrentar a repressão utilizando sua experiência adquirida nos enfrentamentos com a polícia, por exemplo em Renault-Flins, onde os estudantes se colocaram na primeira fileira dos combates que duraram vários dias.

4) A necessidade de um partido revolucionário

As organizações que se reivindicavam trotskistas, originárias da IV Internacional, se esforçaram para aplicar uma orientação de acordo com o programa trotskista. No entanto, elas só foram capazes de fazê-lo parcialmente e em graus diversos, por causa de seu despreparo teórico e programático, mas também de sua débiç inserção na classe operária. Lutte Ouvrière, a organização que tinha maior inserção no movimento operário, ainda que denunciasse o aparato stalinista, não colocava nenhuma perspectiva política e se limitavaa incitar os trabalhadores a lutar para conquistar mais do que os acordos de Grenelle ofereciam. A OCI lambertista combateu duramente a direção stalinista, ressaltou corretamente a necessidade de os estudantes de buscar a unidade com a classe operária, exigiu das direções sindicais o chamado à greve geral, lutou pela constituição de comitês de greve e de um comitê central de greve ; mas se equivocou ao abandonar os estudantes que queriam retomar a Sorbonne, deixando-os se enfrentar sozinhos copntra as forças repressivas e não levantou nenhuma consigna de governo.

Quanto á JCR e ao PCI, se por um lado eles desenvolveram uma orientação globalmente correta, se adaptaram algumas vezes às tendências ultra-esquerdistas dos estudantes, por exemplo alentando o enfrentamento com a policia quando os estudantes isolados não eram capazes de vencer, ou outras vezes à pressão do PCF e dos mapoistas, como quando a JCR levantou a palavra de ordem de « governo popular », sem caráter de classe definido, sob pretexto de dialogar com a base do PCF e da CGT. O despreparo destas organizações tinha sua origem fundamental na crise que havia feito explodir a débil IV Internacional no início dos anos 50, sob a pressão combinada do stalinismo e da social democracia, reforçada pelas derrota dos movimentos revolucionários do pós-Guerra e pelo boom económico. Se eles tivessem sabido resistir à pressão do isolamento, defender o programa marxista e se inserir na vanguarda da classe operária, teriam podido cumprir outro papel, menos marginal, que o que cumpriram. Pois o que sobretudo faltou à classe operária de 1968, foi um partido autenticamente revolucionário.

Flávia Valle

Boa noite. Queria aproveitar este espaço e a atenção de todos os estudantes e trabalhadores que estão aqui presentes e que de alguma forma tem interesse nas grandes lutas dos estudantes e dos trabalhadores internacionalmente para debater quais os desafios da juventude para os novos cenários que começam a se armar de intensificação das contradição capitalistas.

A luta dos operários e dos estudantes franceses foram um prenúncio do começo do esgotamento do boom do pós-guerra em que todo o mundo se preparava para novos embates da luta de classes. Foi este o cenário em que houveram processos revolucionários como no Chile no começo dos 70 com os cordões industriais; na Bolívia em 1971 com a Assembléia Popular; na Argentina com o Cordobazo e finalmente com a Revolução Portuguesa de 1974, para citar alguns. Assim, desde o final da década de 70 não vemos mais grandes embates da luta de classes após derrotas profundas destes processos nos países da periferia e desvios nos países centrais, como exemplo o maio francês.

Este cenário, combinado com a ofensiva neoliberal da burguesia durante toda a década de 90 com privatizações, precarização do trabalho, ataques aos direitos trabalhistas e da juventude foram não apenas derrotas objetivas mas também subjetivas. Hoje mais do que nunca há um grande distanciamento do marxismo da classe operária e da juventude num cenário ríspido para as idéias que colocam a atualidade da transformação social e da revolução. Em contraposição, ainda prevalece a saída e perspectiva individual, por fora do coletivo e de uma perspectiva independente dos trabalhadores como classe. Porém toda a ofensiva ideológica que se dedicou a burguesia durante esses anos dizendo que a classe operária não existiria mais, de que haveria se dado o fim da luta de classes pois o capitalismo teria superado todas suas contradições começam a mostrar, na realidade, suas frágeis bases... mais fortes foram as jornadas revolucionárias na Bolívia, os levantes na Argentina e no Equador no início do século XXI e agora a crise económica no coração dos Estados Unidos.

Temos que nos preparar desde já para atuarmos em grandes crises sociais, políticas e económicas e ter uma reflexão e inserção marxista dos estudantes nos debates teóricos e nas mais recentes expressões, iniciais mas importantes, de lutas operárias.

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Frente a este cenário é fundamental que os estudantes, e em especial nós da USP, que protagonizamos uma das lutas mais importantes do ano passado e que estamos no principal local de produção do conhecimento do país, sejamos ativos, agora, em protagonizar da forma mais viva uma reflexão marxista capaz de responder às grandes contradições sociais e de se ligar à classe operária.

Para esta perspectiva mais uma vez coloco a necessidade de fazer um balanço profundo das últimas lutas estudantis que após anos inexistente aparece como breve ensaio das potencialidades e debilidades, objetivas e subjetivas dos estudantes. Não é meu objetivo aqui entrar em todo o balanço que fizemos das lutas de 2007 e do primeiro semestre de 2008 (que todos podem conhecer e ler no site da Ler-qi e do Movimento a Plenos Pulmões) mas acho importante ressaltar como a espontaneidade do início da luta logo se transformou em isolamento dos grandes setores de estudantes e principalmente da classe trabalhadora e do povo a partir do momento que o movimento não se armou com um programa que questionasse o caráter elitista e racista desta universidade. Na USP e nas federais, por exemplo, uma luta inicial contra projetos do governo (principalmente no caso do REUNI) não teve um programa capaz de mobilizar as forças sociais necessárias para derrotar os ataques e passar à ofensiva. Neste sentido a luta pela defesa da universidade contra os projetos de maior atrelamento destas à burguesia tem que ser intrinsecamente ligada à luta por uma nova universidade a serviço dos trabalhadores e do povo questionando o poder e a ideologia da reacionária burguesia e de seus ideólogos que hoje ocupam cargos na USP, Unicamp, no governo, ONGs etc.

Quero focar no debate com os estudantes que estiveram ou que se solidarizaram com nossa luta sobre o papel que pode cumprir a juventude quando se coloca esse tipo de grandes desafios. E eram desse porte os desafios que se colocaram os estudantes franceses quando lutaram contra o próprio imperialismo pela independência da Argélia, quando se ligaram aos trabalhadores dizendo “tomem de nossas frágeis mãos suas bandeiras de luta” ou quando fizeram grandes debates sobre quais as bases e necessidades da revolução. Porém, não podemos transpor mecanicamente o que foram estes anos para a conjuntura atual. Isso seria antimarxista pois vivemos numa conjuntura completamente distinta.

Resgatar o maio francês tem que nos permitir atuar a partir do melhor que já mostrou o movimento estudantil ao longo da história para possuir um caráter anti-capitalista e pró-operário atuando conscientemente nos grandes momentos da luta de classes e dos grandes problemas teóricos e sociais. Apenas mostrando quão retrógrada é a ideologia burguesa e que o ceticismo não nos compete, pois nossa geração começa a ver a recomposição da classe operária, lutas estudantis vitoriosas como o CPE na França e uma crise do domínio internacional que cumpria o imperialismo norte-americano, é que podemos criar as bases marxistas de uma nova juventude que se coloca grandes desafios.

Esta reflexão nos permite, por exemplo, ver a importância de combater toda a ideologia burguesa que coloca a exploração e opressão como inevitáveis ou uma vertente que vemos diariamente nas aulas de grande parte do departamento de Ciência Política da USP que naturalizam a democracia burguesa querendo tirar de cena qualquer elemento de crises, de violência social e de revoluções até no surgimento e implementação do Estado burguês com as grandes revoluções de 1776 nos EUA e 1789 na França. Também vemos teóricos burgueses que quiseram converter em senso comum a idéia de que toda revolução terminará, invariavelmente, na instauração de alguma forma de totalitarismo.

Mais atualmente vimos voltar o debate em setores da esquerda sobre qual a dinâmica entre o social e o político. Alguns teóricos começaram a colocar que o político tem que ser secundarizado frente à hegemonia do social. Da mesma forma que a burguesia cantou por todos os cantos o fim da classe operária e da luta de classes, setores da esquerda adotaram uma estratégia autonomista apostando em alternativas utópicas de “mudar o mundo sem tomar o poder” ou colocando a luta necessária pela derrubada violenta do estado burguês com a criação de um estado operário como um outro tipo de alienação. Todo este discurso se baseia em negar o papel das correntes políticas e de uma direção consciente, armada com a síntese dos principais processos de luta de classes nacionais e internacionais e das experiências das grandes revoluções operárias como a Russa de 1917.

O marxismo é uma ferramenta teórica que nos permite combater não apenas a ideologia burguesa mas toda e qualquer variante de ceticismo e de adaptação ao regime democrático burguês após anos sem revoluções. A alternativa autonomista foi uma das que mais teve peso durante os últimos processos de lutas estudantis e pudemos ver que não serviu para armar os estudantes para que se ligasse aos trabalhadores e para combater a fundo a ideologia burguesa. Desta forma que desde a Plenos Pulmões nos colocamos junto a Marx quando diz que “a crítica não é paixão da cabeça, mas a cabeça da paixão. Não é uma lanceta anatómica, mas uma arma. O seu alvo é um inimigo que ela procura, não para refutar, mas para destruir” .

O grande desafio que chamamos os estudantes e que nos colocamos desde a Lerqi e do do Movimento A Plenos Pulmões é o de armar essas críticas como uma arma de atuação e militância e que seja capaz de resgatar o marxismo após uma série de derrotas da classe operária e de avanços ideológicos da burguesia. A juventude é um dos principais setores que têm que se dar esta tarefa não de forma estéril e vanguardista mas com a mais sincera necessidade revolucionária de armar as bases para uma futura fusão do marxismo com a classe operária que quando se deu permitiu a criação do primeiro estado operário da história com a III Internacional em seus momentos revolucionários.

Queremos nos armar com o que há de mais novo nos debates acadêmicos e da esquerda para fazer da teoria uma arma e dar as bases sólidas da teoria revolucionária para a prática revolucionária.

Com essas mesmas bases que queremos, desde a Plenos Pulmões, ligar os estudantes aos trabalhadores não apenas da USP mas das fábricas da região oeste e de Osasco. Queremos expressar toda essa potencialidade numa corrente estudantil que levante alto as bandeiras contra todo tipo de opressão e exploração e que faça nossa a luta de todos os negros haitianos contra as tropas brasileiras, chilenas e argentinas do Haiti e contra toda a repressão e extermínio policial da polícia brasileira que é uma das que mais mata no mundo. Queremos voltar a expressar a inquietude de todos os jovens que não se contentam mais com o mesmo e que se colocam as grandes tarefas da humanidade: a emancipação social pelas mãos dos próprios trabalhadores. E mais uma vez estamos junto a Marx quando diz que “a elevação da classe operária em si em classe para si só pode se dar com sua organização em partido” . Chamo todos os estudantes que estão aqui a Desatar o Futuro com a paciência e audácia de todos os que dedicaram a vida a levar nas costas grandes pedaços da humanidade quando se colocaram a perspectiva e militância revolucionária.

Impulsionado pela Liga Estratégia Revolucionária - Quarta Internacional e pelo Movimento A Plenos Pulmões

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