Sexta 3 de Maio de 2024

Internacional

CONFERÊNCIA EUROPÉIA DOS PARTIDOS ANTICAPITALISTAS

Abandono da estratégia

20 Jun 2008   |   comentários

Entre os dias 30 de Maio e 1 de Junho, a Liga Comunista Revolucionária (LCR) francesa organizou um encontro internacional das organizações européias ligadas ao SU (Secretariado Unificado da IV Internacional), que contou com cerca de 2 mil pessoas de cerca de 16 países europeus. Para além de algumas menções aos 40 anos do Maio de 68, o centro político desse encontro foi a discussão aberta principalmente por essa organização, em torno da discussão estratégica e a formação dos “partidos anticapitalistas” (PACs) na Europa.

A proposta do Encontro foi a de coordenar os esforços do SU no continente europeu e assim apontou Besancenot, porta-voz no novo projeto da LCR: “É necessário compreender que a Liga [LCR] está em um processo irreversível. Lançou um chamado, sente que isso tem apelo e iremos até o final. Deixaremos espaço para que os novos cheguem e que não são velhos veteranos da política. E reforçaremos os laços com as demais forças européias para construir uma força anticapitalista européia” [1].

O chamado da LCR, na verdade, abrange reformistas e revolucionários e tem como objetivo se “renovar” frente a um novo período, ou o fim “era da revolução de outubro” e com isso, dizem se tratar agora de forjar uma grande confluência (sem delimitação de classes) anticapitalista, com o argumento de se ligar as “pessoas de carne e osso” , setores tradicionais do reformismo em crise com o giro “social-liberal” e movimentos sociais. Ou seja, apresentam o partido anticapitalista como uma experiência nova, apontando um questionamento fundamental do ponto de vista da teoria e estratégia marxista, de que a “época de Outubro” teria se fechado e com ela o legado da Revolução de Outubro não tenha mais validade.

Esses projetos partidários, na verdade, já duram alguns anos: a corrente mandelista já fez profundas experiências de “partidos amplos” . No Brasil, o PT que fora usurpado da classe trabalhadora pela direção conciliadora lulista, foi um partido estratégico para os mandelistas até chegarem ao governo. Uma vez aí se gerou uma crise em sua organização, sendo que um setor considerável assumiu postos no governo capitalista, com o “velho” ministerialismo de Miguel Rosseto, ex-ministro do Desenvolvimento Agrário. Na época, um setor da DS se expressou em termos muito amigáveis com a sua corrente internacional, dizendo que era mais importante a experiência ministerialista do que a bandeira da IV Internacional.

Estes partidos tinham, para os mandelistas, o objetivo de levar a frente a perspectiva de “criação de amplas convergências anti-capitalistas” , defendidas ainda hoje “como mediações organizativas necessárias para cobrir o vazio político criado pela esquerda social-liberal ou subalterna ao social-liberalismo e para construir una alternativa política ao social-liberalismo” [2] e terminaram capitaneando governos neoliberais, além de liquidar política e organizativamente as organizações mandelistas.

Na Itália, a experiência do governo Prodi e do Rifondazione Comunista, gerou nova onda de crise [3], já que essa organização que agregava diversas outras, consentiu o crédito de guerra italiano para a guerra do Afeganistão. Flávia D´Angeli da Sinistra Crítica da Itália [4] fez uma fala no encontro, justificando a necessidade de uma nova esquerda anti-capitalista no país, frente ao “desastre que foi para a esquerda o segundo mandato de Prodi e o fim da esquerda no parlamento” . Não menciona que para fazer frente ao movimento “anti-berlusconi” , todas as organizações trotskistas, inclusive a sua, se dissolveram por mais de dez anos no Rifondazione Comunista. Desse processo não se poderia fazer nenhum balanço, nem do papel que cumpriu a esquerda italiana e o seu desbarranque objetivo com resultado das últimas eleições e a volta de Berlusconi. Tudo se resume à “conversão ao social-liberalismo” dos partidos tradicionais e as alusões ao “problema estratégico” , por fora das tarefas concretas da luta de classes.

Outra organização que esteve presente nesse encontro e que teve uma experiência concreta foi o Bloco de Esquerda, que dura quase uma década e que crescentemente se converte em uma “oposição ao PS” no parlamento burguês, ao mesmo tempo em que abandona crescentemente as “lutas sociais” . Nesse caso, vale uma nota de que a organização portuguesa da LIT, a Ruptura/FER, através de sua participação no BE busca combinar o eleitoralismo com “as lutas” , demonstrando que nem mesmo os morenistas se colocam em posição de combate contra o liquidacionismo, se adaptando ao projeto absolutamente reformista do BE em Portugal.

Aqui no Brasil a experiência “anticapitalista” do PSOL fica cada vez mais difícil de ser justificada como tal, considerando que o partido em todos os momentos possíveis demonstrou, atuando completamente por dentro do regime burguês, que está longe de ser essa “alternativa para o século XXI” [5], incluídas votações anti-operárias e as campanhas reacionárias contra o aborto defendidas por Heloísa Helena. Algo similar ao que se expressa na Alemanha com o Die Linke que “defende os trabalhadores nos sindicatos” e ao mesmo tempo vota leis anti-operárias em uma coalizão com o Partido Socialista em Berlim.

Esse encontro, ainda que não seja um “grande fato” como colocam os principais dirigentes do SU, mostrou que o projeto mandelista caminha a passos concretos para consolidar essas experiências (reformistas ou semi-reformistas) na Europa, apostando na crise das direções tradicionais, mas sem aportar para o desenvolvimento de verdadeira alternativas da classe operária, pois abandonam os seus vínculos com as lições elementares do marxismo . Para nós, isso reafirma a importância do debate de estratégias entre a esquerda, e o resgate de uma atuação baseada na independência de classe contra estas novas mediações.

[1Entrevista de Olivier Besancenot a Marlène Benquet, antiga militante da Fração da Lutte Ouvrière, 13/05/08

[2Tesis políticas ’ V Encuentro Confederal de Espacio Alternativo, www.vientosur.info.

[3A organização Socialist Democracy da Irlanda, que pertence ao SU, chamava a crise de “o Brasil chega à Itália” .

[4Sinistra Critica é uma organização do SU que se formou após a ruptura do o RC e a morte de Livio Maitan em 2004, dirigente histórico do mandelismo e que em seus últimos momentos era conselheiro de Bertinotti

[5Incluímos aqui também definições da própria corrente Enlace, ligada ao SU, que afirmam que o PSOL pode ser um passo para um PAC, mas o seu curso atual é o oposto.

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