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Nacional

Plínio de Arruda Sampaio e o neodesenvolvimentismo burguês

08 Oct 2006   |   comentários

Em comparação com o que foi a campanha de Heloísa Helena à presidência, a campanha de Plínio de Arruda ao governo de São Paulo se destaca pela seriedade e pelo compromisso e coerência com a sua trajetória e com a sua estratégia política. Se destaca também por ter dado uma atenção mínima, ainda que completamente insuficiente, ao que se exige de um candidato a governador (ou presidente ou) por uma Frente de Esquerda, às três mil e seiscentas demissões no bastião operário do ABC.

Seu último artigo na Folha, às vésperas da eleição, colocou a discussão da Volks num patamar estratégico, como deve ser. Por isso é um ponto de apóio para aprofundar uma das principais polemicas que devem ser travadas na esquerda para que não se repitam os erros do passado e para demonstrar a principal deficiência e anacronismo da estratégia do PSOL. Este momento deve ser de reflexão para os militantes sinceros e combativos das organizações de esquerda, depois da derrota nas eleições, frente a um regime enfraquecido e a perspectiva de uma maior polarização social e política. A tarefa fundamental neste momento é clarificar o debate de estratégias na esquerda e avançar para a construção das bases de um partido revolucionário de trabalhadores com influencia de massas.

Para entrar na discussão sobre as demissões e a greve na Volks, Plínio de Arruda parte de reivindicar Celso Furtado:

"Falta-nos a experiência de provas cruciais, como as que conheceram outros povos cuja sobrevivência chegou a estar ameaçada. Mas não ignoramos que nosso tempo histórico se acelera, e que a contagem desse tempo se faz contra nós. Trata-se de saber se temos um futuro como nação que conta na construção do devenir humano. Ou se prevalecerão as forças que se empenham em interromper o nosso processo histórico de formação de um Estado-nação."

Ao colocar o problema das demissões em massa, a partir disso, como um problema nacional de primeira importância, faz o que nem Heloísa Helena nem a Frente de Esquerda fizeram ao longo de toda sua campanha. Porém, faz isso se baseando numa estratégia política que vai levar os trabalhadores e o povo brasileiro a novas derrotas e a perder ainda mais o mínimo de soberania que conserva em relação aos “centros de poder” . Plínio conserva assim sua tradição, pois foi armada com essa mesma estratégia que a esquerda apoiou Jango na década de 60 e foi incapaz de combater o golpe militar e foi com essa estratégia que o PT foi construído e chegou ao ponto que chegou de aderir ao neoliberalismo.

É preciso dividir a “nação” para conquistar a “soberania nacional”

A estratégia nacionalista burguesa, da qual Celso Furtado é um dos principais ideólogos, que influenciou profundamente o pensamento da esquerda brasileira levou, e levará de novo se deixarmos, os trabalhadores e o povo pobre a verdadeiras catástrofes.

A base desta estratégia, com a qual Plínio de Arruda concorda plenamente, é a luta para que o Brasil se desenvolva economicamente e conquiste sua soberania nacional. O que só poderia ser obtido se apoiando no poder estatal para fortalecer o mercado interno elevando a renda dos trabalhadores, investir em infra-estrutura, indústria de base e tecnologia nacional, o que supõe certo grau de enfrentamento com as “oligarquias” e com os interesses dos “centros capitalistas” . Dessa forma o Brasil poderia escapar da “catástrofe” deixando de ser um país periférico e passando a ocupar um lugar de destaque no sistema internacional. Porém. Essa visão estratégica não leva em conta que será a própria burguesia brasileira que vai se opor de armas nas mãos a qualquer tentativa de uma política nacionalista verdadeiramente conseqüente. As condições da luta de classes nacional de um forte proletariado com interesses opostos aos da burguesia, e da economia mundial, repartida entre um punhado de países imperialistas, já não permite um desenvolvimento capitalista “soberano” que tire o país do atraso.

O Brasil se industrializou e se tornou um país capitalista por uma via distinta e muito depois que os países “desenvolvidos” , isto é, imperialistas. Os burgueses brasileiros não combateram de armas nas mãos seus inimigos internos e externos como fez a burguesia nos EUA e Inglaterra. A burguesia brasileira nasceu no campo, e se desenvolveu como uma sombra das poderosas burguesias dos Estados Unidos e da Inglaterra. Por medo de perder o seu poder ela aprendeu a temer mais os trabalhadores e o povo do seu próprio país do que a subordinação a uma burguesia imperialista, seja ela americana ou inglesa, alemã ou japonesa.

A cada tentativa, por mimima que seja, de re-dividir a renda nacional, de reduzir os lucros dos monopólios imperialistas e de suas filiais brasileiras para aumentar a poupança nacional e ampliar os investimentos em tecnologia, teríamos que enfrentar a resistência da burguesia e da classe dominante. Por medidas tíbias nesse sentido Jango foi derrubado. Que dirá então da luta por demandas democráticas nacionais, como a reforma agrária ou a autodeterminação do povo negro? Se apoiar nos trabalhadores e no povo para negociar e transigir com a classe dominante em nome de “evitar a guerra civil” ou para “não provocar o exercito” , ou por qualquer outro argumento menos catastrófico, significa desarmar os trabalhadores frente a verdadeira guerra civil que provoca a burguesia com seus bandos, seu exercito e sua policia, desencadeia quando seus interesses são ameaçados. Já vimos este filme com o PCB em 37 e 64. Ou então significa, como aconteceu com o PT, que de tanto transigir e negociar se termina passando completamente para o outro lado.

É impossível lutar consequentemente por estas demandas nacionais e democráticas sem preparar os trabalhadores para uma luta implacável contra seus amos nacionais. Sem a classe operária se transformar em sujeito histórico independente, que lute pelos seus próprios objetivos e que seja capaz de derrotar a burguesia nacional e estrangeira, vai ser impossível conquistar as demandas mais elementares da maioria do povo brasileiro. Somente uma república operária e camponesa, baseada nos organismos de democracia direta das bases, vai ser capaz de levar a cabo a luta contra o imperialismo, pela soberania nacional. Assim, realização dessas tarefas históricas se dará ao mesmo tempo em que vai estar se iniciando a construção do socialismo e não dentro do sistema capitalista.

Das demandas imediatas à luta pelo poder

Isso significa que hoje, em cada combate parcial e local, nas greves e mobilizações que forem protagonizando os trabalhadores, devemos lutar para que estes se transformem em sujeito político independente da burguesia. O que devem fazer os trabalhadores quando seu sindicato os abandona, quando seus partidos o abandonam? Clamar à nação? Ainda mais que os trabalhadores não estavam isolados. Se mantivesses a mobilização conseguiriam mais e mais apoio, como já estava começando acontecer em algumas montadoras e em alguns setores do movimento estudantil.

Na década de 70 os metalúrgicos do ABC mostraram sua força ao se colocar à cabeça da nação na luta contra a ditadura. Seu chamado foi em forma de greve e mobilização massiva. Somente consegue ajuda quem se ajuda. Infelizmente, a direção do movimento escapou de suas mãos, pois nos sindicatos e no partido que nascia seus dirigentes buscavam uma solução de compromisso com a burguesia. Quatro anos depois a direção do movimento já estava nas mãos do PMDB.

Na luta contra as demissões e nas grandes lutas que estão por vir ainda, necessitaremos mais do que nunca de um partido próprio dos trabalhadores. Um partido revolucionário, que não deposite sua confiança em soluções de compromisso com a burguesia, mas que atue nas lutas de hoje para conquistar vitórias, sabendo retroceder quando necessário, e vá preparando assim os trabalhadores para a luta decisiva contra o estado burguês.

Não vivemos ainda uma situação como a da década de 70 ou 60. Isso significa que temos um valioso tempo pela frente que não pode ser desperdiçado. Que falta não nos faz um partido revolucionário que estivesse chamando os trabalhadores não a aceitar calados ao PDV por que fomos abandonados, mas sim à luta contra as demissões, que deve ser transformar agora num boicote massivo ao PDV depois da traição do sindicato petista. Um partido que se utilizaria da campanha na televisão para organizar os trabalhadores e apontar uma perspectiva estratégica para a luta: greve por tempo indeterminado até que a patronal recue. Um partido capaz de organizar, junto a Conlutas, a Intersindical e outras organizações um fundo de greve nacional para garantir que essa luta não fosse derrotada pela fome. Um partido que se utilizasse das eleições para ajudar a popularizar entre os trabalhadores a idéia de que quando uma fábrica fecha e ameaça sair do país, temos que ocupa-la e coloca-la para produzir sob controle operário e financiamento estatal.

Esse é o caminho a seguir. Demonstrar a cada passo, a cada luta, que o destino do país está nas mãos dos trabalhadores. Que somente nós podemos salvar a catástrofe no país se conseguirmos nos aliar com todos os setores oprimidos sob as botas das oligarquias e dos patrões “modernos” .

A tribuna eleitoral deveria ter sido utilizada pelos militantes que se reivindicam revolucionários para ajudar nesta tarefa e não para semear entre os trabalhadores falsas ilusões na intelectualidade “critica” , por isso não votamos em Plínio de Arruda. Um partido operário, por pequeno e pouco influente que seja, que se adapta à pequena burguesia nacionalista num momento relativamente pacifico como o atual, que é incapaz de dividir a esquerda nos momentos em que isso é fundamental, dificilmente vai conseguir mudar seu curso quando se aproximem os acontecimentos decisivos na luta de classes e não vai conseguir levar os trabalhadores e o povo pobre a vitória quando a nação estiver profundamente dividida e polarizada.

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