Sexta 3 de Maio de 2024

Movimento Operário

OS CONTORNOS DA VITÓRIA NA GM

Fazer o balanço dessa importante luta e organizar o boicote às horas extras

01 Jul 2008 | Há poucos dias os trabalhadores da General Motors em São José dos Campos aprovaram o acordo feito entre o sindicato dos metalúrgicos e a GM. Depois de meses de disputa, a empresa teve que abrir mão do seu plano ideal, que era a implementação do banco de horas, dando uma vitória parcial aos trabalhadores da GM. Infelizmente, não pode ser uma grande vitória já que o acordo também garantiu as horas extras e a contratação de 600 trabalhadores em regime temporário e com salários menores que os atuais.   |   comentários

No dia seguinte à aprovação do acordo, o jornal do sindicato dizia que “essa vitória demonstrou que é possível derrotar a lógica de que flexibilizar direitos gera empregos” [1]. Com essa afirmação não podemos concordar, pois como mostraremos, houve flexibilização. Pela importância da GM e por envolver um dos mais importantes sindicatos da Conlutas, dirigido pelo PSTU, que travou uma luta por direitos, acreditamos ser importante debater aqui os acertos e erros que vimos no processo.

Hora extra também é flexibilização!
Contrato temporário é precarização!

O que queria a GM? Sabendo que está com a sua capacidade de produção perto do limite, buscava aumentar a exploração, utilizando a força de trabalho dos operários da GM por quantas horas precisasse, acumulando horas no “banco” sem pagar nenhum extra. Além disso, a contratação dos temporários com salários abaixo do piso da GM criaria um setor precarizado com maior taxa de lucro para a empresa, além de aprofundar a divisão das fileiras operárias.

Os companheiros do PSTU disseram corretamente desde o começo que não se poderia aceitar qualquer redução de direito nem qualquer flexibilização. E de fato, a maior flexibilização (o banco de horas) foi derrotada. Mas é preciso dizer a verdade aos trabalhadores: criaram-se 600 empregos, mas empregos de segunda categoria dentro da fábrica, em um regime de precarização, com salários menores e com contratos temporários, ou seja, data marcada para sua demissão.

Sobre as horas extras, a discussão é mais complicada. O acordo compromete os operários, com horas extras, a trabalhar até 49 horas por semana [2]. Justo num momento em que o próprio sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos lidera uma campanha pela redução da jornada para 36 horas, para que se criem empregos. Não se pode ocultar que essa extensão da jornada em horas extras impede a criação de centenas de empregos e intensifica a exploração dos trabalhadores.

Trata-se, portanto, de uma flexibilização da jornada. Ainda que os companheiros argumentem que as horas extras já aconteciam e foram apenas regularizadas, é o contrário do programa que deve defender a Conlutas: reduzir a jornada, acabar com as horas extras, garantindo mais empregos sem redução de salários. É importante que tudo isso seja dito publicamente pelo sindicato, para desmascarar o discurso da empresa de que pretende criar mais empregos e para que os trabalhadores possam medir exatamente o tamanho dos ganhos e das perdas de sua luta.

Era possível ir além?

O programa levantado pelo sindicato estava correto, em suas linhas gerais. Falou contra a flexibilização, não cedeu ao banco de horas, chamou a repartição das horas de trabalho com a redução da jornada. Faltou, no entanto, que esse programa fosse acompanhado de um plano de luta concreto para os sindicatos da Conlutas, para superar o isolamento que as centrais sindicais impuseram à luta.

A vitória parcial dos trabalhadores da GM e a greve radicalizada dos trabalhadores da Revap mostravam que muito mais poderia ter sido feito, aumentando as chances de uma vitória acachapante dos trabalhadores. Por exemplo, nenhum fundo de greve que preparasse a possibilidade de uma paralisação de longo prazo na GM foi construído, chamando a solidariedade dos trabalhadores de outras categorias, que apoiassem a luta com doações. Também a campanha por mais empregos não foi transformada de fato numa campanha popular, chamando os desempregados dos bairros operários de São José a participar da luta por emprego com salário e direitos plenos.

Foram realizados atos públicos com os diversos dirigentes sindicais e diversas moções foram enviadas, mas quase nenhuma ação passou das caixas de e-mail e do fax. Aos trabalhadores da base dos sindicatos, nenhuma proposta concreta. Mesmo aos operários da Revap que estavam numa fortíssima greve na mesma cidade, a única unidade foi uma marcha contra a redução de direitos. A mesma coisa para os trabalhadores da Johnson & Johnson, que também estão sendo atacados em seus direitos: nenhuma proposta de unificação efetiva na luta, nas paralisações e nas negociações.

Era preciso retomar uma prática e um programa combativo e classista nos sindicatos

A vitória económica parcial na GM e a disposição dos trabalhadores da Revap de paralisar por seus direitos, mesmo depois de aprovado o acordo com a patronal, mostram que havia a possibilidade efetiva de unificação, e a Conlutas perdeu a chance de praticar um outro tipo de política sindical, muito além das moções no papel, que chamasse os trabalhadores da base a atuar em solidariedade ativa de classe. A demonstração de que uma fração da classe estaria disposta a sustentar qualquer ação que tomassem os trabalhadores da GM, e com o apoio popular conquistado poderia colocar a patronal na defensiva e dar um novo marco para os trabalhadores do país, retomando as tradições de solidariedade e classismo.

No campo programático, diante da proposta da GM de fechar a fábrica, a resposta deveria ser a estatização e o controle operário da fábrica, inclusive para garantir que o que antes era revertido em lucro para a patronal pudesse se transformar em mais empregos. Para isso seria preciso ter encarado a luta na GM não como mais um episódio da luta sindical. Há 70 anos, o revolucionário Leon Trotsky alertava que o programa dos revolucionários para os sindicatos era o programa de transição. Se a Conlutas pretende ir além das vitórias económicas e, como será dito em seu I Congresso, “lutar para que os trabalhadores assumam o poder político na sociedade” , deve relembrar esse ensinamento.

Retomar uma prática e um programa classista para os sindicatos, alentar iniciativas reais de solidariedade de classe, fazer os balanços precisos das vitórias e derrotas da classe nas lutas de São José dos Campos, ainda que o resultado económico fosse o mesmo poderia ser, aí sim, uma vitória estratégica que faria avançar a vanguarda no sentido da revolução.

Por mais empregos: boicotar as horas extras

O acordo foi assinado, e agora os trabalhadores devem manter a sua luta. Perante a pressão da patronal para que se cumpra o acordo é preciso organizar um boicote geral às horas extras, com uma ampla campanha de que essas horas devem ser revertidas em novos empregos na GM. Esse acordo não pode se transformar numa prisão para a luta dos trabalhadores e numa trava para a luta pela redução da jornada. É preciso ganhar os trabalhadores desempregados e suas famílias para lutar por emprego, com salários e direitos iguais. Nenhuma hora extra! Pela jornada de 36 horas sem redução de salários! Unir e coordenar os 600 novos empregados com os demais para lutar pela igualdade dos salários e dos direitos!

[2As 40 horas diárias, mais uma hora por dia útil e dois sábados de 8 horas por mês.

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