Segunda 29 de Abril de 2024

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"Euforia do crescimento" prepara ataques aos trabalhadores

15 Feb 2004 | O governo Lula, o PT e a maioria da burguesia e seus economistas têm feito todo um alarde em torno de um suposto “crescimento econômico” de 3,5% a 4% para o Brasil em 2004. No entanto, esse “crescimento econômico” que eles projetam para 2004 não significará de forma alguma à diminuição do desemprego, à recuperação da renda ou à diminuição das condições de miséria em que vive a população. Nesse artigo procuramos esclarecer esses “obscuros segredos” da economia através dos quais a burguesia busca enganar os trabalhadores e a juventude explorada.   |   comentários

O caráter estrutural da crise económica

O Brasil atualmente passa por uma crise económica estrutural que se caracteriza, em termos gerais, pela contradição entre as reduzidas condições de consumo da população e a enorme capacidade produtiva das empresas, fazendo com que estas permaneçam com grande parte de suas instalações ociosas, o que reduz a taxa de lucro, o que determina uma baixa nos investimentos e no nível de emprego. Essa tendência tem se expressado de forma mais contundente no constante declínio da taxa de crescimento económico expressa no PIB (3,6% em 2000; 2,4% em 2001; 1,5 em 2002; e 0,4% em 2003); que por sua vez é uma contrapartida das tendências de declínio da taxa de investimento e no declínio da taxa de consumo da população.

Para responder a essa crise, a burguesia é obrigada a lançar mão da intervenção estatal sobre a economia, tanto no sentido de protegê-la da competição internacional como com vistas a buscar estímulos a sua reativação. No entanto, como decorrência da ofensiva capitalista descarregada na década de 90 (o chamado “modelo neoliberal” ), e das conseqüentes transformações tanto no âmbito da produção como das finanças, a burguesia restringiu enormemente a capacidade do Estado de cumprir este papel.

Nesse sentido, ao caráter mais geral da crise que nos referimos logo acima se agrega, atualmente, as seguintes características particulares: os altos índices de endividamento, tanto do governo como das empresas, tanto com relação às instituições financeiras nacionais como internacionais; e os altos índices de especulação financeira. Esse é o significado do que a burguesia chama de “vulnerabilidade externa” , ou seja, a enorme dependência com relação ao capital imperialista para viabilizar o próprio funcionamento normal da economia.

Qual a resposta do governo Lula para sua “crise estrutural” ?

Para conseguir lidar com a chamada “vulnerabilidade externa” , o governo e a burguesia hoje lançam mão de dois mecanismos centrais: o “enxugamento” das contas públicas, o chamado “ajuste fiscal” ; e a manutenção de altas taxas de juros, ou seja, o “ajuste monetário” . O primeiro desses mecanismos significa aumentar a arrecadação do Estado; e reduzir os “gastos públicos” , principalmente os investimentos do Estado em infra-estrutura e os chamados “gastos sociais” .

O segundo significa a manutenção de altas taxas de juros pagas pelo Estado, não só com o objetivo de atrair o capital especulativo internacional, mas também com o objetivo de evitar o aumento da inflação.

Uma “resposta” que tende a acumular e agravar a crise

O ajuste fiscal, além de aumentar os custos da produção e do consumo, dificultando os investimentos na economia, e além de reduzir enormemente a capacidade do Estado de gerar empregos e arcar com as necessidades mais básicas da população, impõe sérias restrições ao crescimento económico na medida em que não garante a infra-estrutura necessária para a viabilização da produção.

Já o ajuste monetário, na medida em que atrai centralmente o capital especulativo para o país com a finalidade de manter a normalidade do pagamento de suas contas em dólares, mantém a “vulnerabilidade externa” , pois este tipo de capital sai tão rápido quanto entra, bastando para isso encontrar um destino mais rentável ou verificar o risco de calote. Além disso, este contribui para agravar as tendências recessivas da economia.

Então, qual o motivo da euforia em torno do crescimento económico para 2004?

A principal base de sustentação para o otimismo do governo e da burguesia que o sustenta é o fato de que a economia mundial, após apresentar míseros índices de crescimento em 2001 e 2002 (1,1 e 1,7%, respectivamente), em 2003 consegue uma significativa recuperação de 3,2%.

A chave dessa recuperação tem sido o impulso da economia norte-americana; e o aumento em cerca de 40% das importações chinesas, que atuou como alavanca da economia japonesa e do resto das economias asiáticas. Estes dois fatores explicam também o particular sucesso do setor exportador do Brasil ligado à produção de matéria-prima (commodities).

Um outro elemento essencial dessa recuperação, que influiu enormemente na capacidade de Pallocci de afastar em curto prazo o risco de default (calote) da economia brasileira, é a existência de baixas taxas de juros nos países centrais ’ em particular os EUA ’, que tem gerado uma crescente liquidez internacional expressa num novo aumento do fluxo de capitais para os mercados emergentes.

Somado a esses elementos, o governo conseguiu, ao longo de 2003, reduzir gradualmente ’ mas constantemente ’ a taxa de juros, criando uma perspectiva de retorno de condições favoráveis ao crédito barato para a produção e para o consumo.

Os limites da “euforia”

O primeiro limite desta euforia está dado pelas próprias incertezas que circunscrevem as perspectivas de continuidade ou não do crescimento económico mundial de 2004 em diante. [1]

Em segundo lugar, as últimas declarações do banco central norte-americano (FED) têm mostrado que ainda no primeiro semestre deste ano irá aumentar a taxa de juros em seu país, o que por sua vez significará um aumento equivalente das taxas de juros nos demais países centrais, influenciando significativamente no fluxo internacional de capitais especulativos, diminuindo o caráter atrativo do investimento em países como o Brasil.

Em terceiro lugar, a partir de janeiro têm ressurgido pressões inflacionárias internas como subproduto: a) do alto valor da cotação dos produtos exportados pelo Brasil no mercado internacional, que acabam influenciando na alta dos preços desses produtos aqui no Brasil; e b) do aumento dos impostos, principalmente na mudança do critério de cobrança da CONFINS, que se por um lado diminuirá os custos das indústrias, por outro obrigará os setores de serviços a aumentarem seus preços.

Essas são as bases das “conturbações” vividas tanto no âmbito económico como no âmbito político do país nas últimas semanas, expressas na recusa do Banco Central em dar continuidade à redução da taxa de juros no mês de janeiro; e expressas nos conflitos entre José Dirceu e António Palloci.

A crise mais uma vez é descarregada sobre as costas dos trabalhadores

Ao invés dos 10 milhões de empregos prometidos por Lula, o que se evidencia ’ só em 2003 ’ são 600 mil desempregados a mais, uma queda na renda de cerca 12%, e um enorme aumento do emprego informal.

O que o governo não diz é que, mesmo com um crescimento económico de 4% em 2004, este não mudará em nada a situação de desemprego do país, e nem tampouco o nível dos salários. Isso é assim porque, em função da alta ociosidade que hoje abarca a maioria das empresas, e em função das incertezas com relação à sustentabilidade do crescimento económico, os capitalistas preferirão recorrer aos diversos mecanismos de flexibilização das condições de trabalho a arriscar em novas contratações. Isso significa que serão utilizados os “bancos de horas” acumulados ao longo de 2003; que será aumentada a carga de trabalho sobre os trabalhadores; que serão exigidas mais horas extras; que aumentará a contratação “temporária” e “informal” ; tudo isso antes que o “crescimento económico” possa se reverter realmente e uma diminuição do desemprego.

Como “corolário” dos ataques a os “custos da produção” de forma a estimular a ativação da economia. Isso significará cortar o que a burguesia chama de “salário indireto” dos trabalhadores; ou seja, cortar os direitos históricos da classe, como, por exemplo, o 13º, a multa de 40% do FGTS em caso de demissão, o descanso semanal remunerado do domingo, a licença maternidade, entre outros.

[1Ler artigo “Em direção a uma recuperação sustentável da economia mundial?” , na revista Estratégia Internacional no 20 no site www.ft.org.ar.

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