Sexta 3 de Maio de 2024

História

RESENHA

Escrevamos a história junto com os terceirizados em luta!

24 Apr 2011   |   comentários

A rotina da USP mudou positivamente essa semana. As vozes dos professores de história que habitualmente se debatiam aprisionadas e distantes nas quatro paredes das salas, muitas delas em coro com as idéias burguesas de fim da história (término da luta de classes), fim do proletariado, que seguem seus ensinamos escolásticos do passado estático enquanto são engolidos pelo presente, calaram-se frente a um grito infinitamente mais forte que vinha da FFLCH. Um grito de tamanha força que fez sacudir a poeira dos livros e dos historiados a muito entorpecidos.

E de repente, a classe operária que se buscou apagar das aulas e dos livros de história estava de pé, organizada, lutando... já não podemos mais ignorá-la! As vitimas da fome colocaram-se de pé na Primavera Árabe, ergueram-se em Jirau, e se levantaram agora na USP, indo buscar os alunos que insistiam em se esconder atrás de suas carteiras, para lhes contar sua realidade cotidiana, geograficamente tão perto, mas socialmente tão distante, pedindo-lhes apoio. Muitas lagrimas escorreram, não só pela emoção que trouxe o conhecer das condições de semi-escravização desses trabalhadores que foram transformados em “sub solo do proletariado”, mas também por a consciência ter despertado a responsabilidade da omissão nos estudantes. A escravidão aprendida nos livros de história, agora atualizada na sua versão capitalista de super-exploração e na precarização da vida dos terceirizados da limpeza. E ainda há espaço para a simplicidade, filha da dialética, de um dos terceirizados que surpreende os emocionados estudantes e diz: "Desculpem falar tanto. É que fiquei 14 anos sem conversar com nenhum de vocês".

Nos relatos das absurdas condições de exploração dar-se conta como as ofensivas de ataques destinados ao proletariado para recuperar a taxa de lucro da burguesia numa etapa de capitalismo decadente neoliberal, entre esses a terceirização, se expressam nas entranhas de suas condições de vida diárias. Alta taxa de exploração, baixíssimos salários, revoltantes condições de trabalho, desrespeito as próprias reduzidas leis trabalhistas, negação da possibilidade de organização. Todas as imposições e dificuldades que a burguesia impõe aos trabalhadores são expressos em sua radicalidade. Ha aqueles que buscam deslegitimar sua mobilização pela radicalidade de seus métodos, a esses de compreensão medíocre e limitada, os próprios trabalhadores respondem que seus métodos são proporcionais a sua condição de exploração e de fome, frutos de uma construção histórica das ultimas décadas.

Nada mais natural e legítimo que esses trabalhadores tenham métodos explosivos, que busquem responder a altura tamanha brutalidade de suas condições de existência, só os moralistas pomposos e hipocritamente confortáveis em suas poltronas negam-se a ver. Aliás, como são explosivos também os avanços de consciência desses trabalhadores. A burguesia, pela via ideológica e material, impossibilitou a esses trabalhadores de terem acesso a sua própria história de classe, seus aprendizados empíricos, negando inclusive sua própria compreensão de classe, porém, como contatava Trotsky, a consciência é feita de material maleável, que avança aos saltos. Quem vê em poucos dias o avanço de consciência desses trabalhadores (ainda que com suas contradições), mesmo com todas as dificuldades, confirma que é possível comprimir décadas e séculos em dias e horas. Avançam na sua compreensão de classe, superam algumas de suas demandas corporativas, se organizam, recuperam os métodos históricos de luta da classe operária.

Há também os que se indignam com a sujeira provocada, mais uma vez entre esses, encontramos hipócritas e pomposos de consciência medíocre e pequeno burguesa que estão tão ocupados com a morte do seu peixe dourado que recusam-se a quebrar sua rotina para serem no mínimo sensíveis com os trabalhadores que rompem suas amaras para lutarem contra a realidade de fome de suas famílias. Assim não querem ver o significado objetivo desse método de sujar, seja pela paralisação da limpeza dos braços cruzados dos trabalhadores que trabalharam sem receber e por isso podem sujar, seja pelo método espontâneo dos trabalhadores como forma de impedir a continuidade da rotina da universidade frente à justeza de suas demandas, ou ainda como do seu auto-descobrimento como classe e o reconhecimento estratégico da sua importância para o funcionamento da universidade.

Se sujar a USP tem por trás a simbologia de se fazer ver a podridão e a sujeira que se escondem na considerada maior universidade do país, então temos muito o que sujar. Na universidade que é o maior pólo de conhecimento nacional (representa grande parte das pesquisas produzidas nacionalmente) a semi-escravidão dos trabalhadores terceirizados é um problema estrutural resultante dos projetos de universidade burguesa que vem se aplicando de forma cada vez mais acentuada com os ataques dos últimos anos.

O projeto em discussão pela burguesia paulista de acentuar a excelência da USP cortando cursos e vagas de “menor procura”, elitizando-a ainda mais, ao mesmo tempo em que programa uma expansão precária em base ao ensino a distância para cursos menos relacionados às pesquisas de mercado, é o mesmo que destina a uma crescente quantidade de trabalhadores que sustentem as pilastras mestras desse projeto sobre um regime de trabalho semi-escravo. Exatamente por isso não podemos enxergar de forma departamentalizada e coorporativa os diferentes ataques que vem sendo implementados pelos governos e pela burocracia acadêmica, e sim como parte de diferentes expressões de um projeto de universidade que devemos nos contrapor e derrotar, ao mesmo tempo em que lutemos para por de pé um novo projeto de universidade, democrática desde o seu acesso até a sua estrutura, que rediscuta o papel do conhecimento, retirando-o dos entraves e limitações que o colocam a lógica mercadológica e o redirecione a serviço do conjunto da população.

Hoje, nem os livros, nem os letrados com seus doutorados, quem nos ensina e nos mostra o caminho são os trabalhadores terceirizados que sofrem na pele todo o peso de sustentar com sua super-exploração os sopros de vida do capitalismo decadente. Quando os ditos invisíveis se colocam em pé e se propõem a escrever, com a mesma mão que segura a vassoura, sua própria história, é necessário questionar a própria história, e sair da inércia contemplativa da história eternamente passado museu para assumir a necessária e dialética função de sermos historiadores sujeitos. Questionemos e transformemos o conhecimento e a universidade! Questionemos, libertemos e reescrevamos a história! Revolucionemos a sociedade!

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