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Quinta 28 de Março de 2024

Movimento Operário

LANÇAMENTO DO LIVRO "A PRECARIZAÇÃO TEM ROSTO DE MULHER" NA UNICAMP

"Este é um livro militante"

20 May 2011   |   comentários

"É um livro militante, e essa é a grande qualidade desse livro, é a força que ele tem para intervir num processo de precarização do trabalho tão contundente e tão evidente quanto é esse da USP" (Paula Marcelino)

No dia 11/5, realizou-se na sala de auditório do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp o lançamento da nova publicação das Edições Iskra, “A precarização tem rosto de mulher”, organizada pela LER-QI e Pão e Rosas, com uma mesa de debate acerca da impressionante greve das trabalhadoras terceirizadas da empresa UNIÃO na USP e a questão da terceirização do trabalho. A mesa esteve composta por Rita Frau, professora da rede pública de ensino, militante da agrupação de professores “Pela Base” e do grupo de mulheres Pão e Rosas; como mediadora, e com a participação de Diana Assunção, diretora do SINTUSP e dirigente da LER-QI/Pão e Rosas; Glória Oliveira, trabalhadora terceirizada da limpeza; e Paula Marcelino, doutora em Sociologia pela Unicamp, docente da USP e autora do livro "A logística da precarização: terceirização do trabalho na Honda do Brasil”.

Com um auditório de 60 pessoas, essa importante publicação, relatando a experiência de luta dos trabalhadores e das trabalhadoras terceirizadas da empresa Dima em 2005 a partir de entrevistas com uma das principais protagonistas do conflito, Silvana, trabalhadora terceirizada, negra, mãe de família – abriu espaço para reconstruirmos a história desta greve na recente mobilização dos terceirizados da UNIÃO, em que os terceirizados se sublevaram contra as péssimas condições de trabalho, contra os assédios morais que sofriam das encarregadas, que chegavam a chamá-los de “escravos”, as humilhações da patronal e contra os atrasos do baixíssimo salário.

Rita Frau, antes de passar a palavra as participantes, introduziu o debate com os elementos da conjuntura política nacional, no momento em que uma mulher presidente, a primeira na história do país, consegue se eleger rasgando todos os direitos democráticos mais elementares para as mulheres – afligindo principalmente as mulheres negras e pobres – como o direito elementar ao aborto legal, seguro e garantido pelo Estado, não renunciando às suas alianças com os setores mais reacionários da sociedade, como os militares e civis cúmplices e protagonistas do genocídio ditatorial brasileiro, assim como da Igreja Católica que apoiou “religiosamente” enquanto instituição o golpe militar e continua sendo cúmplice da morte de milhares de mulheres todos os anos por conta do aborto clandestino, e que agora se prepara para atacar com força medieval a aprovação no STF da união igualitária entre casais homossexuais. Contradições essas que se expressam nas reuniões de cúpula entre o governo petista, a burocracia sindical e a patronal (Camargo Corrêa) em Jirau, em que se efetuou a demissão sumária de 6 mil trabalhadores precarizados, mostrando que o que antes das eleições era “ampliação de empregos”, na primeira mobilização explosiva da classe operária nas obras de responsabilidade federal do PAC, para Dilma se transforma em “contratação exagerada e excessiva” de trabalhadores.

Diana Assunção, diretora do Sindicato dos Trabalhadores da USP e que esteve lado a lado com as terceirizadas da UNIÃO em sua luta, descreveu os distintos tempos do conflito em que, através da espontaneidade e radicalidade destes trabalhadores, em confluência com um combativo sindicato como o Sintusp e com a política dos revolucionários, passando a luta do terreno econômico ao político, por meio dos métodos criativos de utilização dos meios de trabalho enquanto meios conscientes de mobilização e da auto-organização democrática operária, foi possível impor uma derrota à Reitoria garantindo o pagamento dos salários e dos direitos. Lembrou das emocionantes expressões de mulheres e homens até então invisíveis numa universidade “exemplo” de super-exploração: como a de um terceirizado durante uma reunião com estudantes da Ciências Sociais, quando após falar mais de 30 minutos sem parar, disse: "Desculpe falar tanto. É que há 14 anos não consigo conversar com estudantes aqui...". Mas a chave de todo este processo é não considerar estas conquistas como vitórias “em si mesmas”, senão como preparação na batalha pela efetivação sem concurso público de todos os cerca de quatro mil terceirizados e terceirizadas da USP, uma estratégia luta pela unidade das fileiras operárias.

Glória lembrou profunda e politicamente do regime de trabalho terceirizado que humilha e invizibiliza os verdadeiros responsáveis pelo funcionamento integral da universidade, as durezas das jornadas de trabalho (as remuneradas e as não-remuneradas, como o trabalho doméstico), a dificuldade de se organizar, o desrespeito das supervisoras, a violência do sindicato patronal do SIEMACO (representante dos terceirizados na USP), e a desumanidade a que estão submetidas esses trabalhadores com exaustivas condições de serviço. Com bastante ênfase na atuação conjunta com o Sintusp, deixou marcada na sua intervenção a importância da aliança operário-estudantil, da unidade dos trabalhadores para lutar por seus direitos trabalhistas elementares, continuamente repisados pelos diretores do peso “semi-escravista” dessas condições capitalistas de trabalho. Deu espacial ênfase à importância da luta pela efetivação dos terceirizados sem a necessidade de concurso público: “Aprendi que a gente não tem que deixar pra lá, temos que ter coragem, ir à luta sem medo porque às vezes as pessoas acham que a gente deve temer, que devemos parar. Mas temos que batalhar pelos nossos objetivos. Acho também fundamental continuar lutando pela efetivação, nós merecemos. Entramos nestas terceirizadas e sofremos muito, somos muito humilhados. A efetivação pode mudar o quadro de nossas vidas. Eu penso em continuar lutando pela efetivação, seja na profissão que eu estiver, quero ser efetivada e que todos sejam efetivados.”

Paula Marcelino saudou a iniciativa da LER-QI e também a escolha, que julgou acertada, do tema da terceirização do trabalho como matéria de teorização e prática, expresso num livro que, em suas palavras, “é um livro militante (...)”. Referiu-se às diversas expressões da terceirização do trabalho tanto no âmbito público como no privado, os diferentes resultados que da terceirização nesses âmbitos (no caso do setor privado, originada no interesse burguês pela economia de gastos com a força de trabalho e ampliação da margem de lucro com essa porção compósita dos rendimentos; enquanto no setor público, tem origem na inadimplência do Estado em suas funções de financiamento público), ambos os casos, entretanto, fundados no marco comum da super-exploração da força viva de trabalho. Também sugeriu aspectos para o avanço na compreensão e esclarecimento do tema, tais como: aprofundar o debate sobre a estrutura sindical brasileira e seus impactos na forma de organização e de luta da classe trabalhadora; a relação entre legitimidade política (Sintusp) e jurídica (Siemaco) dos sindicatos que se pretendem representar os trabalhadores; o combate à meritocracia estudantil e a relação entre estes e os trabalhadores. Por fim, declarou-se aliada na luta pela efetivação dos terceirizados sem a necessidade de concurso público.

Em meio aos ataques da reitoria e da burocracia acadêmica da Unicamp a estudantes (com ameaça de expulsão de 5 estudantes que ocuparam a Administração da Moradia Estudantil reivindicando permanência) e os ataques criminosos e escandalosos sobre os trabalhadores (nove trabalhadores intimados a depor na delegacia por ter ocupado a reitoria em 2010 contra a quebra da isonomia salarial), esse livro e o debate profundo que suscitou a greve das terceirizadas da UNIÃO na USP revelam a importância de condensar as lições necessárias extraídas dessas grandes batalhas de classe como elementos vitais na batalha estratégica pela unidade das fileiras operárias contra a ofensiva da patronal em choque com as primeiras explosões operárias no “Brasil potência” da Camargo Corrêa, da burocracia sindical, de Dilma e do PT. Expressou-se que, se mais estudantes, e não somente os da FFLCH na USP, se colocam ao lado dos trabalhadores, é possível impor uma derrota à Reitoria e ao governo, revertendo o processo de terceirização, se colocando consciente e ativamente em defesa da luta decidida pela efetivação dos terceirizados, como parte de questionar todo o projeto privatista e elitista da universidade.

A vitória estratégica que foi alcançada nestes dias de luta foi ter aberto de forma profunda a crise da terceirização na universidade, e feito com que a palavra de ordem pela “efetivação dos terceirizados” se colocasse na boca de centenas de estudantes, se fizesse valer com a assinatura de centenas de juristas, advogados e professores, saísse nos jornais e na mídia burguesa, virasse tema de debate e possibilidade de programa real, de reivindicação justa, elementar. Os conflitos do PAC, a sede patronal por sangue operário e a luta heróica do “subsolo” da classe trabalhadora impõem que se abra caminho para a construção da mais ampla e democrática campanha pela efetivação de todos os terceirizados sem a necessidade de concurso público, tendo como exemplo esses trabalhadores que saem como ponta de lança, para que outros setores do funcionalismo público, de outras categorias e universidades façam coro neste enorme grito contra a super-exploração.

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