Quarta 1 de Maio de 2024

Internacional

Eleições no Iraque se transformam em teste ácido para o imperialismo

20 Jan 2005   |   comentários

A menos de duas semanas das eleições, a crise aberta no Iraque se intensifica. Os planos do imperialismo norte-americano, e do governo fantoche de Allawi, de realizar as eleições para conseguir alguma legitimidade frente às massas iraquianas têm sido cada vez mais questionados pelo recrudescimento dos ataques a membros do alto escalão do governo provisório. Nas primeiras semanas de janeiro, foram assassinados o governador de Bagdá, assessores importantes do aiatolá pró-imperialista Ali Al Sistani, além de ataques diários à polícia iraquiana e ao exército de ocupação.

Este cenário prova que ainda que o imperialismo consiga de fato realizar as eleições marcadas para o dia 30 de janeiro, que elegeria 275 deputados para redigir um arremedo de constituição, esta terá como efeito mais provável o acirramento das tensões internas. Contrariando o demagógico discurso dos EUA de “levar a democracia ao Iraque” , as eleições se realizarão em clima de guerra, com fechamento das fronteiras, toque de recolher e restrição da movimentação dentro do país.

A situação se agrava ainda mais com o chamado ao boicote às eleições promovido pelos sunitas, concretizado em um manifesto desaprovando o processo eleitoral e exortando os iraquianos a não votarem, assinado por 17 partidos e movimentos, personalidades políticas, laicas e religiosas. Há apenas um único partido sunita que participa do atual governo provisório, o Partido Islâmico Iraquiano, o que anuncia um cenário extremamente conturbado, já que apesar de constituírem minoria numérica, totalizando 20% da população, os sunitas são atualmente os principais protagonistas da resistência. A negação dos sunitas em tomar parte do processo eleitoral tem gerado temores acerca da possibilidade de uma guerra civil no Iraque, por parte de membros do governo provisório. “Se a Assembléia Nacional não representar todos os iraquianos, vamos entrar em uma guerra civil e dividiremos o país” , afirma Al Nagib, atual ministro do interior do Iraque. Soma-se a isso a reivindicação dos curdos, que compõem 20% da população, de autonomia política e territorial. Dessa forma, as eleições longe de minimizarem as contradições internas, podem se transformar na ponta de lança do processo de conflitos internos que têm assustado os membros do governo provisório pró-imperialistas. “Se os árabes se separarem (xiitas e sunitas) e se distanciarem de sua identidade árabe, o Iraque vai acabar como país” profetiza Al Nagib.

A importância da realização das eleições iraquianas para os EUA

Os EUA têm apostado todas as suas fichas na realização das eleições na data prevista, mesmo contando com a oposição do próprio Allawi que teme os efeitos da resistência sunita e da divisão do país, pois necessita mostrar que pode cumprir a sua agenda, em uma clara tentativa de minimizar a desmoralização que vinham tendo frente ao mundo inteiro pela resistência iraquiana, reafirmando assim a sua posição como principal potência mundial e da doutrina neoconservadora no início do segundo mandato de Bush.

Por outro lado, necessita mostrar avanços em estabelecer um regime e um governo com maior legitimidade para poder seguir ameaçando os demais governos hostis aos EUA, como a Coréia do Norte e o Irã, de um possível ataque militar. As alusões a um ataque ao Irã foram corriqueiras nas primeiras semanas do ano, embora dificilmente se concretizariam antes dos EUA conseguirem minimizar as tensões no Iraque.

A tática dos EUA: cooptação das direções xiitas

O exército de ocupação após uma brutal ofensiva que resultou na morte de centenas de iraquianos no final do ano passado, conseguiu uma vitória tática ao retomar o controle das cidades sunitas de Faluja e Samarra. Porém, esta vitória tática não foi suficiente para minar as contradições dos EUA no Iraque. A descrença com relação às eleições cresce a cada dia junto aos sunitas, como provam as últimas ofensivas sobre os membros do governo e o chamado ao boicote eleitoral.

Para tentar deslegitimar o descontentamento destes setores, o imperialismo tem se apoiado em uma tática pouco sustentável, que pode se transformar em um importante elemento debilitador de seus planos ao se apoiar na cooptação das direções xiitas, e no fato de serem estes a maioria numérica no Iraque, argumentando que “aqueles que se opõem às eleições são apenas os seguidores de Osama Bin Laden” . Com esta política o imperialismo acaba aprofundando as bases da inicial divisão entre sunitas e xiitas, cenário que se avança poderá colocar em xeque o regime imposto pelos EUA.

É certo que os EUA foram eficazes em cooptar as direções burguesas e conciliadoras dos xiitas, conseguindo desarticular e desarmar o Exército Mehdi, que no período anterior protagonizou heróicas ações contra a ocupação imperialista, simultaneamente aos ataques desferidos pelos sunitas, o que trazia ao conflito ele-mentos que apontavam para uma dinâmica de guerra de libertação nacional.

Ainda que no presente momento, as direções burguesas criminosas dos xiitas tenham sido as principais responsáveis internas por anular estes elementos progressivos das massas, alimentando as ilusões no processo eleitoral e na política imperialista, a resistência xiita pode ser reavivada fruto do descontentamento popular com as condições de vida e de prováveis desgastes das direções conciliadoras pela impotência destas em estabelecer um regime independente dos EUA.

Zarqawi e Al Qaeda: é necessário que as massas iraquianas superem estas direções burguesas e se unifiquem, em luta pela sua autodeterminação

A comparativa imobilidade das massas xiitas no atual momento resultou também em que, as últimas principais ações contra a ocupação e os membros do governo fantoche de Allawi tenham tido como protagonistas Zarqawi, terrorista jordaniano da Al Qaeda.

Ainda que estes cumpram um papel no sentido de enfraquecer o governo provisório e, portanto o próprio imperialismo, não são capazes de estar à frente do povo iraquiano em sua luta pela autodeter-minação. Isso porque suas ações, como os ataques às mesquitas xiitas e a civis xiitas, tendem a aprofundar as cisões entre os xiitas e sunitas e fortalecer o sectarismo de ambas as partes, em um momento crítico no qual só a unificação de ambos os setores pode acabar efetivamente com a ocupação imperialista. É necessário que os trabalhadores iraquianos, sunitas e xiitas, tomem a dianteira da resistência contra a ocupação e a farsa eleitoral que quer impor o imperialismo.

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