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Movimento Operário

Curso sobre a revolução russa reúne trabalhadores em São Paulo e Campinas

24 Feb 2015   |   comentários

Mais de cem trabalhadores se reuniram nos dias 7 e 8 de fevereiro para refletir sobre essa grande revolução

Mais de cem trabalhadores se reuniram no último final de semana para refletir sobre essa grande revolução na qual os trabalhadores pela primeira vez derrotaram a burguesia. O debate que se seguiu as exposições iniciais foi muito rico, e abordou vários dos aspectos de uma estratégia da revolução socialista adaptada aos dias de hoje, atualizando as principais lições da revolução russa.

A novidade da revolução Russa

Durante a maior parte do tempo os trabalhadores e os povos oprimidos vivem sob o comando das classes dominantes e a aparência é que esse é um domínio impossível de quebrar. Em momentos especiais, quando as grandes massas populares entram na cena política para defender seus próprios interesses, se negam a seguir vivendo como antes e questionam o poder dos poderosos de sempre, temos uma revolução.

Até a Revolução Russa, em cada revolução o povo tinha combatido contra uma classe opressora do passado, mas para levar adiante uma nova classe opressora ao poder. O maior exemplo é a revolução francesa, uma grande revolução popular, na qual os camponeses pobres e os pobres das cidades asseguraram a vitória da burguesia sobre a nobreza feudal e abriram as portas para o desenvolvimento capitalista. Na Rússia os trabalhadores mostraram pela primeira vez que são capazes de vencer. Pela primeira vez uma revolução levou ao poder as classes exploradas que são a maioria do povo e não uma nova classe de exploradores.

Alguns anos depois da revolução, o peso do isolamento e o desgaste provocado por duas guerras (a guerra imperialista e a guerra civil) já se fez sentir em muitos retrocessos, mas a marca do primeiro grande êxito revolucionário da classe trabalhadora permaneceu. Por volta de 1989-1991, a revolução terminou de ser derrotada, e o capitalismo retornou à Rússia. Essa derrota final foi resultado do isolamento da revolução, que não conseguiu se expandir para os países mais desenvolvidos, e da formação de uma burocracia privilegiada que sufocou a economia soviética e fez de tudo para evitar a internacionalização da revolução, até que dirigiu a restauração capitalista e se transformou na nova burguesia Russa.

Depois de tudo, e apesar de todas as mentiras disseminadas contra os bolcheviques, igualando-os ao estalinismo, o que se conserva e temos que aproveitar são as inestimáveis lições de como pela primeira vez os trabalhadores derrubaram a burguesia e se mantiveram no poder construindo uma nova sociedade.

O que eram os Sovietes?

Os Sovietes representaram nos primeiros anos da revolução o poder que surge da classe trabalhadora, da sua organização a partir das fábricas e dos bairros, em unidade com os soldados e camponeses. Foi um sistema de democracia direta muito mais profundo que o de qualquer republica parlamentar burguesa. A representação nos sovietes se dava a partir do local de trabalho e os representantes escolhidos podiam ser revogados a qualquer momento. Era permitida a mais ampla liberdade de organização para todos os partidos operários e populares.

Na Rússia, em fevereiro, o antigo estado monárquico foi demolido. A disciplina das tropas foi quebrada. Os soldados, assim como os operários, se organizaram em sovietes. Surgidos pela primeira vez na revolução russa de 1905, depois de fevereiro de 1917 se espalham rapidamente. A burguesia formou, apavorada, seu próprio governo, que não contava com nenhuma autoridade entre as massas revolucionárias. Sua única força vinha do apoio que recebiam dos dirigentes dos partidos conciliadores (Mencheviques e Socialistas Revolucionários, que ficaram conhecidos assim por que conciliavam com a burguesia), majoritários nos sovietes no inicio da revolução. Contra a vontade destes partidos, os sovietes representavam o poder que surge da classe trabalhadora, da sua organização a partir das fábricas e dos bairros e que desafiava o poder burgues. Se estabeleceu uma situação de duplo poder.

A dualidade de poderes não é simplesmente uma divisão ou disputa pelo governo. O estado é sempre dominado por uma classe, a classe que domina determinada sociedade. No capitalismo, um sistema onde a burguesia é dominante, o estado é dominado pela burguesia. A dualidade de poderes surge quando os trabalhadores já começaram a organizar seu próprio poder, contrário ao dos burgueses, como começavam a fazer com os sovietes. E quando o estado burgues está enfraquecido e desorganizado. Essa situação não pode durar muito tempo e em algum momento um poder tem que prevalecer sobre o outro.

Discutimos como esse tipo de organização não foi exclusivo da Revolução Russa e tendências à dualidade de poderes se deram com formas e nomes distintos em várias revoluções do século XX. Não só nas revoluções, mas em cada grande luta dos trabalhadores, existe a necessidade da mais ampla democracia operária a partir das assembleias de base, e essa democracia das assembleias é a base da organização soviética. Neste sentido, a estrutura organizativa dos sovietes se assemelharia à de um grande comando de greve nacional, onde cada local de trabalho envia delegados para expressar as decisões e propostas de suas assembleias. Muitas vezes os trabalhadores constroem esse tipo de organização mesmo quando seus partidos e direções sindicais não tomam a iniciativa. Porém, sem um partido revolucionário próprio, que organize a vanguarda dos trabalhadores consciente das suas tarefas históricas e que atue nos organismos da democracia operária para convencer a maioria dos trabalhadores, até mesmo esses organismos de democracia operária perdem seu conteúdo revolucionário.

Neste sentido, hoje, quando lutamos por democracia nos sindicatos, quando defendemos que tudo deve ser discutido em assembleias, quando defendemos coordenações de luta com delegados eleitos na base, quando defendemos comissões de fabrica e representantes por local de trabalho, o fazemos por dois motivos que andam juntos. Por um lado, a mais ampla democracia de base é a melhor forma de forjar a unidade necessária para que as lutas de hoje triunfem. Ao mesmo tempo, é dessa forma que os trabalhadores vão adquirindo experiência política e no exercício da sua própria democracia, tomando todas as decisões que dizem respeito as suas lutas, vão plantando as sementes do futuro estado operário. Quando serão os trabalhadores que tomaram todas as grandes decisões que dizem respeito ao conjunto da sociedade.

Um partido revolucionário como ferramenta dos trabalhadores

A revolução de fevereiro derrubou uma monarquia estabelecida há séculos, mas não realizou as demandas fundamentais dos trabalhadores e do povo: o fim da guerra e a terra para os camponeses. Em fevereiro o que aconteceu foi uma explosão de revolta popular, que se transformou em insurreição contra a monarquia. Não realizou suas demandas porque o poder passou para as mãos da burguesia. Se a revolução deu o poder à burguesia, foi porque os partidos que predominavam nos sovietes não quiseram tomar o poder.

Sem ter um partido consciente das necessidades históricas, da necessidade de derrubar a burguesia para que as demandas dos operários, camponeses e soldados fossem atendidas, a revolução corria o risco de se perder. Neste momento os bolcheviques representavam uma pequena minoria nos sovietes. Nos meses que separam fevereiro de outubro, a atuação nos sovietes permitiu que este partido minoritário se transformasse no grande partido das massas populares, dos operários nas fábricas e das tropas. A segunda revolução, a de outubro, foi preparada pelos bolcheviques em dois sentidos.
Num plano mais imediato, a ação do partido bolchevique - depois da chegada de Lenin - é de preparar a segunda revolução, de explicar pacientemente para os trabalhadores e os soldados a necessidade desta segunda revolução, que de o poder para os sovietes, que acabe com a guerra, que divida a terra entre os camponeses. Por outro lado, este partido, que prepararia as condições da vitória da revolução, não caiu do céu. Ele também teve que ser preparado, ao longo dos anos em um sem fim de lutas diversas.

Meios e fins da revolução socialista

Ao longo de todo o processo ressaltamos a relação entre os sovietes, organismos de democracia diretas dos trabalhadores e do povo e a política dos partidos que atuam no interior destes organismos. Com uma direção política que atuava no sentido de recompor o poder burgues abalado, os sovietes perdiam seu caráter revolucionário e se transformavam em auxiliares do poder burgues. Somente com uma direção revolucionaria foi capaz de expressar todo o seu potencial e realizar as demandas principais do povo russo.

No entanto o partido, os sovietes e a revolução não são nossos objetivos, são meios para alcançarmos algo maior. A revolução não acaba quando a burguesia é derrubada, este é apenas o seu inicio. Vista de um ponto de vista histórico mais global, até mesmo essa enorme vitória era apenas uma “batalha parcial”, no quadro geral da “guerra” de classes que o sistema capitalista significa em todo o mundo. A construção de uma nova sociedade, superior ao capitalismo, onde possamos acabar de vez com todos os vestígios da exploração e da opressão, só pode ser feita no mundo inteiro, e partindo de condições econômicas que garantam a “abundância”, quer dizer, a satisfação plena das necessidades humanas e sociais.

Nesse sentido, e como esperavam Lenin e Trotsky, a revolução russa de fato desencadeou uma série de revoluções em toda a Europa. Porém faltou nos demais países uma direção marxista revolucionária à altura da tarefa de vencer contra o poder capitalista; faltaram partidos como o partido bolchevique. Neste sentido, este curso não foi apenas para lembrar o passado ou para retirar algumas lições que ficarão guardadas nas nossas memórias.

Ao compartilhar com dezenas de trabalhadores, que despertam agora para a vida política ou que já acumulam anos de experiência na militância política e sindical, as lições da revolução russa, ao mesmo tempo fazemos um chamado. Para construirmos o partido da revolução, no Brasil e no mundo, retomando a atualizando o caminho apontado pelos trabalhadores russos no inicio do século passado.

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