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Nacional

OPINIÃO SOBRE O JULGAMENTO DO MENSALAO

Anotações políticas à margem do julgamento do mensalão: nem com o relator nem com o revisor, muito pelo contrário

01 Sep 2012   |   comentários

No dia 01/09 já transcorreram 17 dias do julgamento do mensalão e até o momento só foram sufragados votos no primeiro de oito blocos do julgamento. Cabendo no final o estabelecimento das penas, bem como intermináveis recursos. Este processo e a efetivação da condenação e cumprimento de penas de algum réu julgado culpado deve demorar meses senão anos. O destino é certo: esquecimento e (...)

No dia 01/09 já transcorreram 17 dias do julgamento do mensalão e até o momento só foram sufragados votos no primeiro de oito blocos do julgamento. Cabendo no final o estabelecimento das penas, bem como intermináveis recursos. Este processo e a efetivação da condenação e cumprimento de penas de algum réu julgado culpado deve demorar meses senão anos. O destino é certo: esquecimento e impunidade. Impunidade pelo passar do tempo, pela na não aplicabilidade da pena devido ao passar dos anos, por intermináveis recursos, e de conjunto na mais tradicional prática do Estado brasileiro: impunidade dos poderosos. O histórico do STF comprova como dificilmente algum condenado irá à cadeia, devido a recursos, proscrição de pena, alteração de pena e outros motivos (quem alerta para isto é um jornal que tem feito intensa campanha pela condenação, O Globo, no artigo “Parlamentares condenados pelo STF nunca cumpriram pena na prisão”, 28/08).

Os argumentos que ocupam as páginas dos grandes jornais e dos comentaristas dos canais de notícia (e não dos telejornais dos grandes canais pois estes tem dado menos atenção) é de uma contraposição entre o relator (Joaquim Barbosa) e o revisor (Lewandoski). Esta visão aparentemente polar encobre parte dos fatos e o que está efetivamente em jogo não só do ponto de vista da eventual (e muito desejada) punição de alguns dos réus como de toda uma nova jurisprudência que está sendo debatida que, se de fato sair vitoriosa e consolidar-se pode ser extremamente prejudicial à classe trabalhadora.

7 anos após a denúncia só pode dar pizza

O mensalão está sendo julgado 7 anos após a denúncia de sua existência. Este fato em si fala como este Estado não quer investigar e punir a si mesmo. Passado tanto tempo, a atenção e expectativas diminuíram notavelmente. Enquanto em 2005 e 2006 setores minoritários mas importantes do proletariado e da juventude tinham opiniões não só de quem era culpado mas como julgar, como punir, se havia ou não que expropriar os bens dos corruptos e corruptores, entre outros debates, agora este assunto é hiper-restrito, tanto nas expectativas como também em quem debate o mesmo.

Setores duros da articulação e do grupo ligado ao antigo trinômio Lula-Dirceu-Genoíno buscaram ver e mobilizar setores do proletariado (com o SMABC à frente) com a tese de “golpe da direita”. O DEM (naquela época PFL e antes do racha de Kassab e vários outros, ainda era um relevante partido burguês nacional) exigia impeachment de Lula, setores do PSDB também. O país parecia caminhar a uma polarização e uma profunda crise política até que FHC centralizou a oposição burguesa entorno da tese do ‘sangramento de Lula’ e de guardar o devido respeito ao proletariado brasileiro que sem Lula podia tornar-se indomável. Tudo acalmou-se e no fins das contas caminhou-se a este longo caminho garantidor de impunidade, de não retorno dos bens coletivos subtraídos, etc.

Porém mesmo tendo triunfado um caminho “longo, gradual e seguro”, politicamente o país mudou muito desde então. Nem o próprio PT passou incólume destes eventos e por mais forte que fosse uma tese defendida pelo hiper-poderoso Lula, de alas importantes da cúpula partidária surgiram chapas em suas eleições internas que defendiam algum tipo de punição aos envolvidos (como a que foi encabeçada pelo hoje, menos crítico e ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo).

Passado tanto tempo prevalece em amplos setores das massas um ignorar do caso, ou um acompanhamento passivo polarizado entre duas saídas muito mais contidas dentro regime do que as que setores do proletariado e da juventude defendiam nos idos de 2005 (e expressavam-se distorcidamente até nas eleições internas do PT como citado acima). Fora os setores que simplesmente ignoram o que está passando, em setores do proletariado e da juventude mais minoritários estão as duas teses: a- de confiança a que justiça puna os corruptos e, por outro lado, b- a tese que diminui todos os eventos a “golpe da direita”. Dentro do PT e da CUT todas nuances parecem ter sumido detrás da tese Lula-Dirceu-Genoíno que é a tese “B” citada acima.

Com pouco acompanhamento e contido dentro de jogos jurídicos para que este Estado, com seus juízes punam ou absolvam os seus próprios políticos e operadores. A própria mídia burguesa resolveu adequar sua pauta levando em consideração este arrefecer do debate. Enquanto os grandes jornais burgueses pautam diária e extensivamente o mensalão, o mesmo não fazem em suas rádios e TVs abertas. O mensalão virou assunto de um setor do proletariado que acompanha os blogueiros ditos progressistas (“tese B”) ou de setores da juventude e da classe média que tem ilusões na justiça (ficha limpa, redes em apoio a Joaquim Barbosa entre outras expressões) e lêem os grandes jornais e revistas burguesas (“tese A”).

Porém como indica o histórico do STF, como a situação atual aponta com a iminente aposentadoria de um dos juízes e possibilidade de empates há mais do que margem para pizza. A condenação provisória de João Paulo Cunha, Marcos Valério entre outros, foram feitas usando argumentos jurídicos muito distintos por cada juiz, haverá ampla margem para recorrem. As pretensões eleitorais de Cunha acabaram, teve que desistir de disputar a eleição de Osasco (SP) mas disto a ir a cadeia há um longo caminho...

Os votos também parecem indicar este caminho. Quão mais distantes do núcleo político mais unânimes as condenações até o momento. A grande unanimidade em punição tem sido o desconhecido Pizzolato do BB e Marcos Valério, sobre Cunha do PT pairam mais dúvidas nos caso de corrupção e lavagem de dinheiro (mais graves) que no caso de peculato. Esta mesma tendência devemos ver repetir-se, possivelmente Dirceu será condenado também mas sobre pairarão mais dúvidas do que já pairaram na condenação de cunha, está[a postar a tendência a terminar em pizza.

Haverá bodes expiatórios e Pizzolato e Marcos Valério seguramente estão entre eles mas a tendência geral é de terminar em nada ou muito pouco, frustrando as expectativas daqueles setores da juventude e classe média que querem que a corrupção seja punida. E, ao mesmo tempo este resultado não terminará plenamente na ampla e irrestrita derrota do suposto “golpe da direita”.

As teses beligerantes sairão ambas perdendo e o sistema político, o Estado brasileiro igual. E neste marco geral que se inscrevem as divergências do relator Barbosa e do revisor Lewandoski – que de substancial diferiram até o momento no julgamento de Cunha e apontam para divergirem no julgamento do núcleo político Dirceu e Genoíno. Em torno desta polarização ocorre outra polarização argumentativa que o proletariado e a juventude deve acompanhar vivamente pois de ambos lados há importantes armadilhas para os direitos da juventude e da classe trabalhadora.

Se tudo tende a terminar em pizza, importa o que está sendo julgado?

Em um sentido não mas em vários sim. No sentido das expectativas de punição e que este julgamento seja um marco de “moralização” do Estado e da política brasileira evidentemente não, com um outro bode expiatório tudo tende à pizza. Mas mesmo se o improvável acontecesse, das condenações resultasse em efetiva prisão de diversos réus e ressarcimento das divisas subtraídas, teria mudado algo da política brasileira? Para nós não, esta política existe deste modo como forma para uma ditadura de classe, ela é o como que a burguesia brasileira opera para explorar e ao mesmo tempo fingir às massas brasileiras que elas seriam parte do processo político. Pode ser que em determinado momento setores burgueses queiram alterar algumas regras do jogo, queiram efetivas punições, porém tudo isto estará submetido a seu interesse geral, estratégico, de manter a exploração sobre a classe trabalhadora e sua hegemonia sobre o conjunto da sociedade.

Se nada mudará efetivamente porque importa este julgamento? Pois, trata-se do mais importante julgamento do STF desde o impeachment de Collor, e mais que isto, dada sua extensão e complexidade a partir deste julgamento promete ser estabelecida toda uma jurisprudência. Este Estado, que nós marxistas entendemos como existindo para garantir os interesses de uma minoria parasitária (os capitalistas) sobre as massas através de suas instituições coercitivas como a justiça e as polícias não pode moralizar-se, ser alterado neste aspecto fundamental que é seu motivo de existência, mesmo quando um setor burguês puna outro por corrupção, este Estado seguira sendo uma maquina de uma classe sobre outra, a particularidade atual é que isto é feito com total impunidade das classes dominantes, dos políticos, etc. Este Estado precisa ser destruído e erguido um novo a partir da mais ampla democracia dos trabalhadores organizados em conselhos (soviets).

Porém antes deste meio estratégico que é a destruição deste Estado e estabelecimento de um novo, não dá na mesma para a classe trabalhadora quais são as leis, quais são os direitos que formalmente este Estado garantiria? E aí reside todo o problema deste julgamento.

Contradição entre aparência e essência: como punir os poderosos?

A contradição entre aparência e essência é uma das regras fundamentais da dialética. Qualquer aspecto parcial do que anseiam os trabalhadores, a juventude, neste Estado que existe para garantir os interesses de uma minoria, expressará mais aberta ou veladamente esta contradição. A mão que faz a obra altera seu resultado. E é exatamente o que está acontecendo. O anseio de punição se entendido como essência está divorciado da aparência: quem investiga, como pune, com qual argumento e a efetiva punição. Este anseio democrático de julgar e punir os poderosos está sendo conduzido pelo STF e particularmente por uma ala do mesmo com Joaquim Barbosa, Luiz Fux e outros a frente.

Os argumentos dos mais enfáticos condenadores como Fux são altamente perigosos para a classe trabalhadora. Este juiz fez uma demagógica defesa da punição dos corruptos (defendendo que isto desfalca a educação, mas, como sabemos, não é o caso, a prioridade dos gastos dos distintos governos é a dívida) visando oferecer uma cara progressista para seus reacionários argumentos. Sua defesa reeditou argumentos que eram lei no Estado Novo varguista, que a defesa ao suscitar álibis deve comprovar sua inocência, que inferências dos juízes a partir de similaridades lógicas são suficientes para efetivar punições, em suma que ha quase tanto ônus à defesa quanto à acusação.. E a partir daí abriu-se um debate no STF se seria possível punir alguém sem haver provas contra estas pessoas mas induções lógicas dos juízes, provas testemunhais, etc. Com este mesmo argumento qualquer trabalhador grevista poderá ser punido de tudo que é crime conforme o bel-prazer dos juízes (p.ex, presume-se que seja um terrorista, logo deve ser punidos como tal...).

Com os argumentos de Rosa Weber, Fux, Barbosa, Pelloso, entre outros basta alguma similaridade com outros eventos e que aparente ser algo para ser punido como aquele algo. Pelluso argumentou explicitamente assim, para isto usou uma analogia simples: quando um carro bate na traseira de outro cabe ao que bateu comprovar que tratava-se de uma situação excepcional para não ser punido. Esta premissa valida logicamente coloca o ônus da prova no réu e não na acusação, o triunfo de tal premissa jurídica significará o retorno de uma jurisprudência ditatorial, do Estado Novo como argumentou a outra ala do STF.

A outra ala do STF neste debate sobre o ônus da prova recair e como na defesa (e não necessariamente nos votos) teve a frente Lewandoski, Dias Toffoli e Celso Mello. Estes votos são votos a favor da impunidade e não há de estranhar que sejam dados de forma mais enfática pelo super-suspeito ministro Toffoli. Ele foi advogado das campanhas presidências de Lula em 1998, 2002 e 2006 e trabalhou como advogado da Casa Civil sob mando do réu José Dirceu de 2003 a 2005.

Em resumo a classe trabalhadora está diante da seguinte situação neste julgamento, diversos ministros seguem parte da opinião dos trabalhadores, da juventude, que quer punição a todos os corruptos (não só os do PT e governismo mas os tucanos também), porém o fazem abrindo brechas para criar uma jurisprudência ditatorial. Por outro lado, estão aqueles que querem se fazer defensores desta conquista da humanidade que é ser (teoricamente) punido somente pelo que seja compravado sua culpa estão argumentando em defesa da impunidade dos poderosos deste país.

Este julgamento ilustra amplamente a contradição entre as aparências e essências. A contradição entre o anseio democrático de ver punidos os corruptos e poderosos e isto ser realizado por este Estado, com suas leis, seus juízes, seus argumentos. No mesmo julgamento temos defensores dos direitos dos réus contra o Estado para safar justamente os poderosos deste mesmo Estado, que não age nem hoje nem em qualquer outro dia com 1/100 do benefício da dúvida frente à classe trabalhadora, juventude. Muito pelo contrário aos pobres e negros nos subúrbios, bairros e favelas não há sequer julgamento frente à polícia.

Em suma, esta contradição que se mostra neste julgamento mostra como a efetiva investigação, julgamento severo porém mais amplo e democrático, e efetiva punição só pode ser realizada efetivamente pela própria classe trabalhadora ao ter erguido o seu Estado, e desde hoje a partir de sua mobilização independente para que ocorram efetivas investigações, punições. A única forma de superar a aparência de investigação, punição que é incentivada a que classe trabalhadora sinta com este julgamento, é só uma aparência pois os verdadeiros mecanismos de exploração, dominação, por mais que punam ou não, não estarão as mostras, em julgamento. Deste modo a superação desta contradição entre aparência e essência não será feita somente com punição ou não, mas através da mobilização independente da classe trabalhadora, para que através desta luta elementar que corruptos devolvam o que roubam e sejam punidos sejam dados passos não para moralizar um Estado que vive para explorar e garantir o roubo da classe trabalhadora, mas para que esta luta parcial seja um passo para os objetivos estratégicos de destruir este Estado e erguer um Novo. Aí, superada a contradição entre as relações de produção e formas de propriedade, entre a classe que tudo produz e o Estado, que se darão passos efetivos para superar a contradição entre aparência e essência.

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