Quarta 1 de Maio de 2024

Internacional

A política de Chávez e a visão embelezadora do PSOL

20 Jan 2005   |   comentários

O presidente venezuelano Hugo Chávez é comumente citado por diversas correntes da esquerda como a “grande esperança” da América Latina, e o maior opositor ao imperialismo norte-americano na região.

Apesar de existirem tensões entre Chávez e o imperialismo norte-americano, para ter um programa revolucionário para os trabalhadores e as massas venezuelanas, se faz necessário que os marxistas revolucionários se detenham sobre os limites do chavismo, visão contrária as das esquerdas que caem em simplificações e embelezamento do chavismo.

Em primeiro lugar há que se definir qual é o caráter do governo de Chávez. Este governo se caracteriza concretamente pelo seu caráter bonapartista sui generis, de forte apelo nacional populista. Como dizia Trotsky sobre a questão: “na realidade pode governar (os bonapartistas sui generis) ou se convertendo em instrumento do capitalismo estrangeiro e submetendo o proletariado com as cadeias de uma ditadura policial, ou manobrando com o proletariado, chegando inclusive a fazer concessões, ganhando deste modo a possibilidade de dispor de certa liberdade em relação aos capitalistas estrangeiros” [1]
Dessa forma, torna-se claro que apesar de ser obrigado a dar concessões às massas, Chávez atua como um “administrador” das crises do capitalismo no país não podendo, portanto, ser passível de embelezamentos por parte de setores da esquerda que o tratam como um exemplar aliado.

Chávez intitula a si e a seu governo de “revolucionário” , e justifica esta disparatada afirmação a partir da reivindicação que faz da revolução bolivariana, revolução de caráter burguês ocorrida na Venezuela no século XIX que culminou na independência deste país. Para o presidente venezuelano se trataria agora de dar continuidade à revolução bolivariana, ou seja, “aprofundar” as conquistas democráticas nos marcos do capitalismo. Tenta revestir como “revolucionárias” algumas concessões que é obrigado pelas massas a dar como a recente revisão de títulos da terra, que servem apenas para terras improdutivas não atacando os latifundiários. Ademais, segue negociando e concedendo ainda mais privilégios para os empresários e burgueses que há pouco eram os maiores apoiadores do golpe para tirá-lo do poder, enquanto as massas continuam a viver sob penúria.

Revolução operária e socialista ou aprofundar a revolução bolivariana?

Que Chávez discuta que o seu governo tem como missão “aprofundar” a revolução bolivariana é mais do que natural, trata-se mesmo de uma necessidade para se manter no poder. Contudo, esta discussão posta por organizações que se colocam no campo da revolução como a UIT [2] integrada pelo MST argentino e pela CST ’ corrente do PSOL que tem no deputado Babá sua maior figura pública ’ é absolutamente imperdoável.

A UIT, em sua publicação Correspondencia Internacional, dá mostras da lógica típica dos centristas quando se pergunta “(...) a revolução bolivariana será aprofundada, como disse Chávez após o referendo?” [3]. Questão que é respondida da seguinte forma: “Teríamos que responder o que significaria aprofundar a revolução bolivariana. Para nós, significaria deixar de pagar a dívida externa, (...) para dar emprego e salário a mais de dois milhões de desocupados, (...) seria liquidar o poderio económico e social dos esquálidos” [4].

Esta é uma visão etapista na qual haveria que aprofundar as conquistas da revolução bolivariana e, portanto, burguesa, e não agitar desde já a necessidade de uma revolução operária e socialista, que parta das demandas democráticas mais sentidas em direção a um programa de ação transicional, única forma de acabar efetivamente com o poder dos esquálidos. Esta é a questão essencial que faz com que os centristas da UIT, e no Brasil da CST, contribuam não para armar as massas venezuelanas e latino-americanas para a revolução operária, mas para que estas se restrinjam a “exigir” e “pressionar” Chávez. Ademais, a UIT não hesita em caracterizar o governo de Chávez como revolucionário, como se pode ver em “Cronología de una revolución” que trata de toda a trajetória do governo chavista.

Fazer exigências a governos burgueses é um método legítimo entre os revolucionários, para desmascarar a impotência destes em responder aos anseios mínimos das massas. Mas isso deve se combinar com um programa de ação orientado pela independência de classe e centralidade da classe operária, aliado a nenhum embelezamento dos governos populistas e bonapartistas. Capitular e se adaptar, como faz a UIT, às possíveis ilusões das massas neste ou naquele agente do capitalismo centro-esquerdista, em nome de “dialogar” com o nível de consciência existente é um dos maiores desserviços que se pode prestar à revolução.

Chávez e PSOL no Fórum Social Mundial: utopias de “Outro mundo é possível”

No chamado às atividades que im-pulsionará no Fórum Social Mundial, o PSOL dá especial destaque à vinda de Hugo Chávez como parte “de um ordenador de qual deve ser uma política para enfrentar o imperialismo em nosso continente” . Chávez, que será recebido pelo MST e pela CUT, terá honras prestadas pelo PSOL nesta e em outras atividades, graças ao seu “governo antiimperialista” .

Ao invés de jogar seu peso em atividades que tenham como centro os trabalhadores que no Brasil iniciam o processo de ruptura com o governo Lula, ou dos trabalhadores da América Latina que têm protagonizado greves e ações antiburocráticas, o PSOL prefere propagandear Chávez e as direções conciliacionistas bolivarianas, como “exemplo” a ser seguido no Brasil.

Isso não é à toa. Afinal, algumas das mais importantes correntes do PSOL, como o MTL mantém em comum com os bolivarianos a concepção de que não seriam os trabalhadores o sujeito da revolução, mas que o novo sujeito das transformações da sociedade seriam os movimentos sociais, como o MST e o MTST.

Outras correntes do PSOL, como a de Heloísa Helena, vêem em Chávez um exemplo de “mudanças” por dentro dos mecanismos democráticos. Por sua vez, o MES e a CST consideram que os trabalhadores em sua revolução devem começar seguindo as direções burguesas, e só depois tomariam a frente do processo [5]

Ao contrário de todas estas correntes, que nós caracterizamos como centristas, defendemos que a classe operária se organize de forma independente e avance para oferecer ao conjunto das massas venezuelanas uma verdadeira alternativa de poder revolucionário.

[2UIT ’ corrente que se reivindica como parte do trotskismo, que tem suas bases teóricas em Nahuel Moreno.

[3Correspondencia Internacional, dezembro a março de 2005, pág. 13.

[4Como se chama a burguesia golpista e pró-imperialista na Venezuela.

[5O PSTU, apesar de se colocar mais à esquerda, defende uma concepção da mecânica interna da revolução semelhante a esta. Não por acaso, as três correntes são continuadoras da linha revisionista iniciada por Nahuel Moreno. Para conhecer nossa polêmica com Moreno, consultar o texto “Polêmica com a LIT e o legado teórico de Nahuel Moreno” , em www.ft.org.ar..

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