Domingo 28 de Abril de 2024

Internacional

CAMILA VALLEJO (PC CHILENO) SE REUNE COM DILMA PARA PEDIR MEDIAÇÃO NAS NEGOCIAÇÕES

A UNE, o governo e os parlamentares do Brasil não são exemplo para os estudantes chilenos

11 Aug 2011   |   comentários

  • Vallejo com a UNE e com Dilma e de costas aos que lutam no Brasil

Na última semana estive no Chile representando a Liga Estratégia Revolucionária e levando nossa solidariedade internacionalista do Brasil. Participei de barricadas, manifestações e atos de estudantes e trabalhadores. Junto aos companheiros do PTR e das agrupações Armas da Crítica e Pão e Rosas, e desde sua organização na Faculdade de Filosofia da Universidade do Chile, pude viver a experiência histórica desta paralisação nacional dos dias 24 e 25, fato que não ocorria a mais de 10 anos. O processo de mobilização é profundo e segue chegando a setores cada vez mais amplos da população, ultrapassando seu caráter majoritariamente estudantil, e atingindo a importantes setores da juventude trabalhadora e precarizada, trabalhadores das áreas de serviços estatais e amplo apoio popular e da própria classe média. Já começa a expressar desgaste no governo de Piñera, questionamentos ao regime, e depois do assassinato de Manuel Gutierrez Reinoso, pelas mãos da polícia, um amplo repúdio à repressão. Numa situação de crise internacional que já demonstrou o "estrago" que pode fazer em países como Grécia e Portugal, ainda que a América Latina não tenha sentido "na pele" suas conseqüências, o próximo período anuncia que mudanças bruscas poderão acontecer, e a preparação objetiva da classe operária e de setores oprimidos e explorados da população será fundamental para como encarar estes processos da luta de classes.

No Chile, a demanda impulsionadora de toda esta luta que já dura mais de 3 meses, e que teve seu primeiro ensaio com a Revolta dos Pingüins em 2006, quando milhares de secundaristas organizaram ocupações, é a luta pela educação gratuita, uma vez que a estrutura educacional do país permanece praticamente intacta desde a ditadura de Pinochet, mantendo altos custos de mensalidades nas universidades que são consideradas "públicas". O governo de Piñera usa um discurso que já ouvimos várias vezes em nosso país, dizendo que "a educação gratuita não somente é impossível, como seria injusta", querendo dizer que se a educação é gratuita para todos, os que podem pagar acabariam saindo beneficiados.

Aqui no Brasil a estratégia do governo foi isolar cada vez mais as universidades públicas através do vestibular (e do uso do ENEM como vestibular unificado nacionalmente) transformando-nas em universidades de elite que deixem de fora a maior parte da juventude trabalhadora, pobre e negra. Esta grande maioria que quer entrar nas universidade tem que recorrer às universidades privadas que aparecem como mais “democráticas” porque não tem os mesmos filtros de vestibular, ou quando tem não são tão rígidos. Esta foi a forma encontrada para transformar este ataque do ensino privado em uma concessão, uma política ligada também a injeção de capital do Estado nos monopólios do mercado educacional como um dos pilares da política do governo do PT (Prouni). O discurso que o governo faz de que só a elite entra nas universidades públicas é necessário para que as privadas existam em uma quantidade crescente para dar conta de toda a juventude que não consegue entrar nas públicas. É uma injeção massiva de capitais para este ataque, e conta com o apoio de todas as organizações ligadas ao governo do PT, como é o caso também da UNE.

Com toda esta semelhança com a situação chilena, onde os estudantes lutam por educação pública, não podemos fazer nada menos que repudiar o que Camila Vallejo, dirigente da “Jota” (juventude do PC chileno) veio fazer e declarar no Brasil. Ela participou das marchas da UNE e sentou-se com Dilma. O que ela queria ao sentar-se com os políticos que fazem o jogo dos empresários da educação no Brasil, justamente quando irá reunir-se com Piñera nos próximos dias? Veio pedir que os parlamentares do Brasil formem uma comissão para ajudar na “mediação” do conflito.Camilla declarou que o Brasil é um exemplo e tem um governo "progressista" muito bem visto no Chile, e segundo a Folha de São Paulo (01/09/11) "O presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), acatou pedido da líder estudantil chilena Camila Vallejo e autorizou, ontem, a formação de comitiva de deputados para visitar o Chile. Vallejo pediu a visita para que os parlamentares "conheçam" e tentem mediar o conflito entre os estudantes chilenos, que exigem reforma do sistema educacional, e o governo do centro-direitista Sebastián Piñera". Para nós este objetivo dela bem como suas declarações elogiosas de algumas conquistas parciais no Brasil expressam claramente sua estratégia de frear o movimento, de negociar de costas às bases e sobre o sangue de Manuel Gutiérrez Reinoso. É uma estratégia reformista, que se coloca por cima das massas para melhor localizar-se nas corridas eleitorais e parlamentares.

Ou seja, Vallejo reivindica não somente o movimento mas todo o projeto que falamos anteriormente que são uma expressão também de como privatizar a educação pública nos países da América Latina. Inclusive a maior diferença formal entre Brasil e Chile não é tão absoluta. A cobrança de mensalidades em universidades públicas não é algo tão longínquo no Brasil, já existindo na Universidade de São Paulo projetos de cobrança de mensalidades, inclusive cursos de pós-graduação pagos como na FIA (Fundação da Faculdade de Economia e Administração), o que seria um grande passo à sua privatização total. Este avanço da privatização nesta universidade “tucana de elite” é há anos acompanhada pela “petista de elite”, a UFRJ, que faz muito tempo que tem cursos de pós-graduação pagos.

Uma dirigente conseqüente com a reivindicação de educação pública em seu país não viria ao país sentar-se com Dilma, com os deputados do PT e com a UNE que funciona como um braço do ministério da educação em seu projeto privatizante. Sua “política externa” é mostra de sua política interna de conciliar justamente com os interesses dos empresários e do governo Piñera. Aqui ela não procurou os professores em greve em Minas Gerais, os estudantes que ocupam diversas reitorias país afora, os técnicos administrativos em greve em quase todas universidades federais, o movimento estudantil combativo reunido na ANEL, o ANDES, o SINTUSP que esteve representado nos dois dias da paralisação nacional, mas os apoiadores de um projeto cheio de continuidades com o neoliberal FHC mas vendido como “progressista”.

Ao contrário de Vallejo que vê na UNE e no governo brasileiro exemplos, para nós é a luta dos estudantes chilenos que é um exemplo para toda a América Latina. Mas neste momento da luta que pudemos viver lá a discussão de “qual estratégia” é mais do que fundamental como tem colocado os companheiros do PTR. Aqui no Brasil buscamos não só nos solidarizar de todas as formas com a luta no Chile, com atos nos consulados chilenos, ou vincular as lutas que levamos aqui nas universidades com a luta chilena, mas tentando também demonstrar que para levar até o final a reivindicação de educação gratuita já, vai ser necessário passar por cima das direções burocráticas e reformistas que querem transformar o ódio de classe e a combatividade em reformas “cosméticas” para se auto-promoverem nas bancadas do governo. É necessário, portanto, conquistar uma profunda aliança entre os trabalhadores e os estudantes; implementar a auto-organização desde as bases, votando delegados e comissões mandatadas e revogáveis para evitar que existam figuras como Camila Vallejo que se coloca burocraticamente por cima do movimento e levar adiante a mais ampla campanha democrática contra a repressão, pela liberdade de todos os presos e pela prisão dos assassinos de Manuel Gutiérrez Reinoso.

Tudo isso, deve ter como pilar central que qualquer negociação deve ter como piso mínimo a educação gratuita agora, para que nenhuma "reforma" neste sistema educacional possa ser vendida como "concessão". E todo o sentimento de descontentamento social, do regime e do governo deve ser levado a se expressar numa Assembléia Constituinte Libre e Soberana, onde os amplos setores de massas possam se expressar e levar até o final suas exigências, organizando-se independentemente dos patrões e da burguesia. Para nós, isso aponta a que as mudanças profundas no Chile se darão como parte de uma luta intransigente contra a herança da ditadura de Pinochet, e portanto avançando para que os setores em luta vejam a necessidade de derrubar este governo e que governem os trabalhadores. Trata-se, portanto, de estratégias diferentes para este processo. Desde o Brasil, continuamos nos solidarizando com os estudantes e trabalhadores chilenos, e particularmente contribuindo para que a estratégia dos revolucionários possa fazer eco sobre mais setores em luta, organizando uma vanguarda com estratégia para vencer. Ao contrário da proposta de Camila Vallejo de unidade com a burguesia "progressista" do Brasil representada pelo governo Dilma, chamamos a unidade entre os trabalhadores e a juventude do Chile e do Brasil, contra seus governos e suas burguesias que mantém de distintas formas a superexploração do trabalho, a precarização e privatização do ensino e a repressão contra os setores que lutam.

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