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Nacional

Reforma Universitária de Lula e do PT: Pequenas concessões, grandes ataques

20 Jan 2005   |   comentários

A partir da aprovação do ProUni (Projeto “Universidade Para Todos” ), parte fundamental da reforma universitária, o governo tem apresentado este como o seu principal programa social de inclusão e de distribuição de renda.

Na década de 60, a Ditadura Militar apresentou o seu projeto sob o nome de “Reforma Universitária” assimilando a principal bandeira de luta dos estudantes, para aplicar uma série de medidas que tinham como objetivo realizar concessões para a classe média e ampliar a base de apoio dos militares. Lula aprendeu com esta tática da ditadura e assimila uma das bandeiras do movimento estudantil nos últimos tempos, a luta por uma “Universidade Para Todos” , num projeto que apresenta concessões para um setor dentre os mais pobres da população para, ao mesmo tempo, salvar da crise as universidades particulares.

Todos os setores que hoje com-preendem o papel do governo Lula e do PT de agentes da burguesia e do imperialismo não devem se esquecer jamais de que este ainda conta com um alto índice de aprovação popular e de que até agora apresentou suas reformas ’ a da previdência e da universidade ’ como ataques aos “privilegiados” . Temos que tirar todas as conclusões práticas e programáticas desta situação para que os setores ainda minoritários que lutam contra os ataques do governo federal não se vejam isolados da maioria da população. O objetivo central deste artigo é o de apresentar uma análise um pouco mais detida do projeto do governo, alertando para as armadilhas que ai se escondem e levantar um programa que consideramos necessário para estender uma ponte que possibilite a unidade dos estudantes universitários com a ampla maioria excluída do ensino superior.

O conteúdo da reforma universitária do governo Lula

Se queremos organizar uma luta séria contra as medidas que o governo Lula está aplicando, não podemos nos limitar a uma análise facilista desta reforma. Afirmar simplesmente que o conteúdo da reforma é privatista, não ajuda a unificar o movimento estudantil com todos os setores que estão fora da universidade, porque facilita o trabalho do governo de dividir a juventude. Não podemos fechar os olhos para o fato de que 500 mil jovens se inscreveram para as vagas remanescentes do ProUni. Por outro lado, afirmar que temos que defender os pontos positivos da reforma e lutar contra os negativos é pior ainda. Na medida em que cada ponto da reforma universitária significa um ataque profundo à educação pública, é necessário saber demonstrar por que a reforma de conjunto deve ser rechaçada.

É certo que no seu conteúdo a reforma universitária busca avançar na aplicação do projeto do Banco Mundial para a educação. Podemos resumir este projeto em uma frase, que é “transformar a educação numa área aberta ao mercado capitalista” . Porém, o governo não pretende fazer isso de um golpe só, privatizando diretamente as universidades públicas, pois sabe o descontentamento popular que isto iria gerar. Assim, nos seus últimos documentos afirma “O sistema misto integrado, regulado pelo Estado, próprio de uma sociedade democrática, plural e multicultural, deve atender a Princípios e Diretrizes bem estabelecidos a partir do interesse público.” [1]

A questão fundamental é que o governo Lula e o PT entendem sob a denominação “público” os interesses da burguesia brasileira.

Ao mesmo tempo que o governo parte de reconhecer a crise das universidades brasileiras ’ tanto do sistema público, pela falta de verbas, quando do privado pelo alto índice de inadimplência ’ busca dar uma saída reacionária a ela. Admite a necessidade de autonomia para as universidades, porém tem um entendimento bem particular de autonomia: “Se, por um lado, a gravidade da crise emergencial das universidades está na falta de recursos financeiros do setor público, não se pode negar que, por outro lado, a crise decorre também das amarras legais que impedem cada universidade de captar e administrar recursos, definir prioridades e estruturas de gastos e planejamento. Por isso, a imediata garantia de autonomia às universidades é um passo necessário para enfrentar a emergência.” [2]

Com essa concepção de auto-nomia o PT pretende abrir as portas das universidades públicas para os investidores particulares, por isso a lei das PPP (parcerias público-privada) é um complemento da refoma, assim como a lei de inovação tecnológica e mais ainda a lei das fundações. Todas estas buscam facilitar o processo de apropriação privada do conhecimento produzido pela universidade pública, assim como facilitar o uso dos seus recursos materiais e humanos pelas grandes empresas.

Autonomia universitária não pode ser entendida como autonomia para captar recursos junto à iniciativa privada. A luta pela autonomia é a luta contra a burocracia acadêmica, en-castelada nos postos de mando da universidade. É a luta por uma gestão democrática, com maioria estudantil, onde seja a própria comunidade universitária que decida tudo o que diz respeito a universidade e para que isso seja possível é fundamental o financiamento público desta.

No primeiro documento oficial do governo, já citado, podemos ver a essência do seu projeto. Ali o grupo interministerial, afirma a necessidade de aumento no valor das bolsas dos pós-graduandos, que na prática já se efetuou em 2004. O que é isso senão uma concessão para tentar ampliar sua base de apoio entre os universitários? Ao mesmo tempo que constata a crise das universidades federais, defende a necessidade de verbas de emergência, defende a necessidade de contratação de professores e funcionários e mais, defende a necessidade de se dobrar as vagas nas federais até 2007. Porém, ampliar vagas destruindo a qualidade do ensino. “Como um segundo passo, rumo ao necessário redesenho emergencial, é imperativo reconhecer que a universidade pública brasileira, nos limites impostos pela educação presencial, mesmo com aumento substancial de recursos, não teria condições de aumentar as vagas de forma maciça no curto e media prazos. Em um país de dimensões continentais a educação a distância surge como um caminho viável e necessário.” [3]

Para ajudar a resolver a falta de professores o governo propõe que os professores aposentados continuem em atividade: “A perda sofrida pelas universidades nos últimos anos, em função dessas aposentadorias precoces, tem sido devastadora. Para evitar a perda de tamanho potencial, a solução seria a criação de um programa de bolsas de excelência docente, que permitisse manter esses professores em atividade acadêmica nas universidades federais.” [4]

Tudo o que foi desenvolvido acima, demonstra que a reforma universitária combina mínimas concessões ’ aumento do valor das bolsas de pós-graduação ’ com enormes ataques como a ampliação do financiamento privado nas instituições públicas e a implementação do ensino à distância. Ao mesmo tempo em que se propõe a ampliar vagas, uma concessão a quem está fora da universidade, o governo pretende ampliar as vagas destruindo a qualidade do ensino e sem verbas suplementares. Ao longo deste ano vimos um exemplo deste processo na UNESP e suas conseqüências nefastas, porém também vimos que se o movimento estudantil e universitário se limitar a luta contra a expansão de vagas, não conseguirá o apoio da população e será derrotado.

ProUni: banquete para empresários e migalhas para a juventude

Na data da aprovação do ProUni vimos o presidente Lula, junto com o ministro da educação Tarso Genro, tecendo enormes elogios ao seu programa, colocando-o como um passo fundamental na construção de um país “mais justo” . Apresentaram o programa como “o maior do governo” . Ao sancionar o projeto Lula afirmou “No Brasil sempre foi assim, na hora em que o pobre conquista um milímetro de espaço, ele incomoda, mesmo que não tenha tirado um milímetro de espaço dos ricos” , e foi complementado pelo ministro Tarso Genro “esses pequenos setores da nossa elite ainda foram secundados por outros que se autodenominam revolucionários. É bom que se grave a posição destas pessoas” . [5]

Ao mesmo tempo em que o governo apresenta o seu projeto como uma grande conquista “dos menos favorecidos” , setores de universidades particulares como o reitor na UniNove, Eduardo Storópoli, se colocam contra o projeto do governo, afirmando que este está imbuído de um “ranço ideológico” contra a universidade particular.

Na verdade o ProUni tem um duplo sentido. Busca ampliar a base de apoio popular ao governo, com a concessão de 112 mil bolsas, na sua maioria integrais e ao mesmo tempo salvar da crise as universidades particulares que aderem ao programa com a isenção de impostos como o próprio imposto de renda e outros. As universidades que aderirem ao programa terão de oferecer esse ano 10% de suas vagas para bolsistas e a partir do ano que vem 8,5%, para poderem não pagar os impostos. Apesar desta enorme concessão muitos tubarões do ensino privado não se sentem satisfeitos, pois na verdade o que queriam eram os empréstimos públicos sem ter que dar nada em troca.

Segundo as informações do MSU (Movimento dos Sem Educação), que apóia o ProUni, se formaram no ano dois milhões de jovens. Além da clara limitação numérica do projeto, ele conta com dois outros elementos que o tornam um projeto claramente favorável às universidades privadas e contrário aos interesses da juventude. Dá lugar a uma transferência direta de verbas públicas para o setor privado e oferece aos jovens da periferia vaga em universidades onde a qualidade de ensino é horrível.

Um programa para soldar a aliança dos estudantes com o conjunto da juventude

Por tudo o que foi exposto sobre o conteúdo da reforma e sobre a tática do governo de colocar a juventude da periferia contra o movimento estudantil universitário, fica claro que aqueles que se colocam contra toda a reforma universitária do governo, não podem se limitar a esta luta. Se não queremos cair nem no jogo do governo e nem no jogo da “Esquerda” Petista que quer reformar a reforma, é urgente avançar num programa pela positiva que resolva a crise da universidade de acordo com os interesses da maioria da população.

Não podemos somente ficar denunciando o ProUni. É necessário partir da denúncia deste programa, que salva os tubarões do ensino da crise, para lutar de maneira intransigente pela estatização de todas as universidades particulares. Não devemos criticar os estudantes que aceitam as bolsas do governo, mas sim atrai-los para a luta unificada pela redução de mensalidades (apesar deles não pagarem) e para a luta pela estatização. Ao mesmo tempo devemos exigir bolsas integrais de estudo, que financiem livros, cópias, transporte e alimentação para que os bolsistas possam se manter na universidade. Assim denunciaremos o jogo demagógico de Lula e do PT.

Nas públicas, principalmente nas federais, os estudantes não podem se colocar contrários à expansão de vagas, se não quiserem se enfrentar a toda juventude que está fora da universidade. A primeira reivindicação é de que os filhos dos funcionários da universidade tenham garantido o ingresso direto nesta, que as primeiras novas vagas criadas sejam para eles sem terem de passar por vestibular. O eixo da reivindicação nas públicas deve ser de mais verbas, pela contratação de professores e funcionários, como condições fundamentais para a expansão de vagas. Queremos todas as vagas que o governo oferecer, porém lutaremos até o fim pela qualidade destas e contra a destruição do ensino publico, com coisas do tipo “ensino à distancia” .

A luta das públicas e das particulares devem encontrar um denominador comum na luta contra toda a reforma universitária de Lula e do PT, na luta pelo fim do vestibular, isto é, pelo ingresso direto na universidade pata TODOS os jovens que terminem o colégio. Levantando essa bandeira, de que todos os jovens devem estar na universidade, que está ligada à ne-cessidade da estatização das universidades privadas e à exigência de mais verbas, e levantando a bandeira de bolsas de estudos integrais, poderemos desmistificar o discurso do governo e abrir caminho para a aliança do movimento estudantil com toda a juventude, a única aliança que nos permitirá travar uma luta séria por uma universidade a serviço dos trabalhadores e do povo.

[1Reafirmando princípios e consolidando diretrizes da reforma da educação superior, MEC. Agosto de 2004.

[2Documento do grupo de trabalho interministerial, outubro de 2003.

[3Idem.

[4Idem.

[5O Estado de São Paulo. 14/01/2005.

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