Domingo 28 de Abril de 2024

Movimento Operário

Universidades estaduais paulistas

Reajuste salarial, mais verbas para educação e democracia na universidade

05 Jun 2006   |   comentários

Depois das fortes greves por reajuste salarial em 2000 e 2004; e depois da greve por mais verba para a educação em 2005; mais uma vez os trabalhadores da USP, Unesp e Unicamp, em aliança com os estudantes, se mobilizam para fazerem valer suas reivindicações, movimento este que teve inicio no dia 8 de junho.

A pauta de reivindicações da greve combina a luta pelas demandas económicas mais imediatas dos trabalhadores (7% de recuperação das perdas salariais provocadas pela inflação, entre outras) com a luta política por mais verbas para a educação pública. A defesa do aumento das verbas destinadas à universidade está intimamente ligada à luta para barrar o processo de terceirização que se espalha aqui dentro e defender iguais salários e iguais direitos entre trabalhadores efetivos e terceirizados; está intimamente ligada à luta por assistência estudantil e por contratação de professores e funcionários; e está ligada à luta contra a privatização da universidade através da introdução em nosso espaço de empresas privadas (as “fundações” ) que colocam a educação pública a serviço de proporcionar lucro aos capitalistas.

Os reitores, mais uma vez e como sempre, para não atenderem as reivindicações económicas do movimento, alegam que o orçamento da universidade é insuficiente. Ofereceram um reajuste miserável de 0,75% (mais 1,79% em setembro a depender da arrecadação do ICMS). Ao mesmo tempo, disseram que estão defendendo junto ao governo do estado o aumento das verbas para a universidade dos atuais 9,56% de arrecadação do ICMS para 11,19%. Entretanto, por incrível que pareça, também disseram que estão encontrando “as portas fechadas” no Palácio dos Bandeirantes e na Assembléia Legislativa para qualquer negociação sobre o aumento de verbas.

“Portas fechadas” para os reitores no governo do estado? Que estranho...

Por quê os reitores ’ que aqui dentro são os principais agentes que implementam os planos neoliberais de privatização e sucateamento da universidade pública ’ reivindicam o aumento das verbas para 11,19%? Por quê esses mesmos reitores, que são escolhidos “ a dedo” pelo governador através da chamada “lista tríplice” (sem nenhuma participação direta da comunidade universitária) encontram as “portas fechadas” no Palácio dos Bandeirantes?

Não é de hoje que os reitores fazem demagogia em torno do aumento de verbas para a universidade. Todo ano, nas vésperas da votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) na Assembléia Legislativa de São Paulo (ALESP), o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (CRUESP) sempre envia algum pedido de aumento de verbas miserável para os deputados. Mas o que desmascara este falso discurso demagógico dos reitores é o fato de que, se eles de fato quisessem, bastava utilizarem sua autoridade para convocar massivamente uma marcha de 100 mil pessoas ao Palácio dos Bandeirantes utilizando abusivamente a mídia, decretando ponto facultativo nas universidades e colocando ónibus na porta das faculdades, cursinhos e escolas para levar os estudantes à manifestação. Com 100 mil pessoas na porta (ou até bem menos), as portas do Palácio rapidamente se abririam, seja pela “boa vontade” do governador ou na marra. Mas, obviamente, não é isso que acontece. Pelo contrário, a cada greve que fazemos, os reitores utilizam sua autoridade e a imprensa sim para desqualificar nosso movimento e nos atacar, enviando a polícia para reprimir nossos piquetes. Ou seja, essa demagogia do CURESP de defender o aumento de verbas está a serviço apenas de enganar os trabalhadores e estudantes, vendendo a ilusão de que os reitores defendem a universidade pública.

Entretanto, infelizmente (para os reitores), desta vez sua demagogia esbarrou em um obstáculo: mal começada a greve, na sexta-feira dia 9/6, o governador Cláudio Lembo declarou que não cogita aumentar as verbas para a universidade porque, segundo suas próprias palavras: “se a universidade tem dinheiro para construir um Hotel 5 estrelas, então não precisa de mais verbas” . Ou seja, o governador responsabilizou a reitoria por má administração das verbas da universidade, e com isso expós uma “brecha” entre os “de cima” , uma “crise nas alturas” , uma divisão entre os que mandam. O movimento precisa compreender a fundo essa “crise nas alturas” e saber aproveitá-la para elevar o nível político da greve e expandi-la, adquirindo um caráter mais massivo e ganhando o apoio de amplos setores da população.

“Hotel 5 estrelas” ou “mais verbas para a universidade” ?

Esta divisão entre o governador e os reitores coloca para o movimento uma questão que até agora vinha sendo tratada de forma secundária, mas que deve ser colocada com um dos nossos problemas centrais: como é gasto o orçamento universitário? Quem toma essas decisões?

Não adianta conquistarmos mais verbas para a universidade se estas verbas continuarem sendo utilizadas para beneficiar uma casta minoritária de “professores-doutroes” que já recebem salários milionários e para beneficiar empresas privadas que parasitam a universidade. O FMI, o Banco Mundial e os governos neoliberais de plantão não têm um escritório dentro da universidade de onde emitem todas as ordens de demissões, precarização do ensino, terceirizações, privatizações, super-exploração do trabalho etc. Quem implementa estes planos dentro da universidade é a burocracia acadêmica que gira em torno da reitoria e preenche a maioria esmagadora das cadeiras dos Conselhos Universitários.

O vergonhoso projeto com o qual a reitora Suely Vilela pretende construir um Hotel 5 estrelas dentro da USP ocorre ao mesmo tempo em que os terceirizados que fazem a limpeza da universidade trabalham num regime de semi-escravidão; as salas super-lotadas muitas vezes obrigam os estudantes a assistir suas aulas nos corredores; muitos estudantes não conseguem se formar por falta de professores para darem as disciplinas; os funcionarias acumulam 623% de perdas salariais desde 1989. A não ser os “professores-doutores” que fazem parte da burocracia acadêmica, qualquer estudante, trabalhador ou professor que toma conhecimento desse Hotel não tem como não se indignar. Por que o dinheiro deste Hotel não pode ser destinado à assistência estudantil, à contratação de professores e funcionários ou ao reajuste salarial?

É para responder a esta pergunta que a luta por mais verbas deve estar inseparavelmente ligada à luta para que a reitoria mostre de forma transparente o que é feito com cada centavo dentro da universidade e como são feitas todas as licitações e contratos com as empresas privadas que prestam serviços para a universidade. Os reitores consideram suficientes os dados gerais que apresentam sobre a utilização do orçamento universitário. Mas estes dados apresentados pela reitoria não dizem quanto de verba vai ser gasta com o Hotel 5 estrelas (alguns comentários dizem 30 milhões de reais); tampouco dizem o que é feito com os milhões repassados às fundações que administram as unidades ligadas à área de saúde; tampouco explicam por que a dona do restaurante da Química é esposa de um professor da ECA.

Funcionários, estudantes e professores da USP construíram no ano passado um importante movimento pela democratização da universidade, que tinha como eixos centrais a luta por uma “Estatuinte livre e soberana” e a luta por “eleições diretas para reitor” . Essas são reivindicações que precisam ser assimiladas pelo conjunto do movimento nas três universidades e precisa ser incorporada como uma das principais bandeiras de luta da greve, dirigida contra o absurdo que é a construção deste Hotel.

Assim como demos um passo importante no sentido de ligar a luta por reajuste salarial à luta por mais verbas, devemos ligar essas duas inseparavelmente à luta pela democratização da universidade, que só pode se concretizar se existir total transparência na prestação de contas de cada centavo que é gasto do orçamento e se a partir disso a comunidade universitária começar a assumir a responsabilidade pela gestão democrática do mesmo.

Mazé é trabalhadora da USP e membro do Conselho de Diretores de Base da Coseas e Marília é estudante de geografia da USP e militante do Movimento A Plenos Pulmões

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