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Teoria

Os marxistas revolucionários e a frente única operária

20 Mar 2005   |   comentários

A tática de frente única foi utilizada pelos bolcheviques russos antes da Revolução de Outubro. O segundo Congresso da Internacional Comunista de 1920 deu a esta tática expressão programática. O objetivo desta é permitir que os operários se unifiquem na luta contra o inimigo de classes comum, mesmo quando a classe trabalhadora se encontre dividida em organizações reformistas e revolucionárias. Como continuidade desta tradição bolchevique, Trotsky afirmava que buscar a maior unificação das massas em suas lutas se impunha “a necessidade da tática de frente única, que nos obriga a concertar alianças circunstanciais com dirigentes reformistas” . [1]

Numa época como a nossa em que os sindicatos e os dirigentes sindicais e políticos são burocratas e reformistas de todo tipo, ou seja, agentes da burguesia que garantem seu apoio para dirigir as organizações operárias através do engano, da mentira, da corrupção e dos ataques diretos contra as alas revolucionárias, a unidade dos trabalhadores e das massas organizadas ou influenciadas pelos sindicatos e organizações operárias somente pode ser conquistada com a luta contra a burocracia sindical que deve estar combinada com táticas como a frente única, exigências e denúncias, entre outras.

Esta unidade na luta dos trabalhadores, além de tudo, permite aos revolucionários entrar em contato com as bases das organizações operárias (sindicatos etc.), abrindo condições para ganhar a confiança dos trabalhadores que ainda confiam nos reformistas com táticas que desmascarem os burocratas e façam com que as bases compreendam seu papel traidor e possam se ligar à vanguarda combativa e classista para expulsar esses burocratas e retomar o controle das organizações operárias para as mãos dos trabalhadores pela via da auto-organização e democracia operária como parte de uma política independente e revolucionária.

De acordo com a tradição dos bolcheviques, “é condição indispensável para implementar a tática de frente única que o partido revolucionário mantenha em todo momento sua independência e seu direito de criticar os demais integrantes da frente única” .

Trotsky deixava claro que “os reformistas não são traidores porque sempre, e com cada um de seus atos, cumprem as ordens da burguesia. Se assim fosse, não teriam influência no movimento operário e, por conseguinte, a burguesia não necessitaria deles” , mostrando que os burocratas sindicais (reformistas) em alguns momentos são obrigados, para defender diretamente seus interesses ou para manter o controle sobre sua base social, a “descumprir” as ordens ou até se enfrentar com a burguesia. Sem mudar seu caráter reformista e burocrático, “a fim de contar com a autoridade necessária para trair os operários no momento decisivo, os oportunistas se vêem obrigados, no período preparatório, a dirigir as lutas operárias...”

Compreendendo a tática de frente única como uma tática circunstancial, episódica, não permanente, destinada a alcançar a unidade dos trabalhadores e das massas que têm suas organizações dirigidas por reformistas e burocratas, Trotsky ensinava que “a aliança com os reformistas, no momento em que as circunstâncias os obriga a dar um passou ou meio passo adiante, pode ser inevitável. [...] Porém, é necessário saber de antemão que os comunistas romperão implacavelmente com os reformistas tão logo estes dêem um salto para trás.” Palavras simples que mostram a flexibilidade tática com que os revolucionários devem atuar para, diante da dinâmica das direções e organizações operárias concretas e reais, encontrar as mais apropriadas táticas para a unidade dos trabalhadores e desmascaramento dos dirigentes burocráticos, sem capitular ou depositar qualquer ilusão ou confiança nos reformistas.

No período do “terceiro período” [2] os stalinistas falsificaram essa tática com o que eles chamavam de “frente única por baixo” , afirmando que os acordos de unidade de ação deveriam ser negociados unicamente com as bases e não com os dirigentes das organizações reformistas. Como a social-democracia, na época, era a corrente reformista real que dirigia os principais sindicatos (grandes organizações operárias), a “frente única por baixo” dos stalinistas significava, na prática, impedir qualquer tipo de frente única, pois não se podia fazer acordos com “esses dirigentes” reformistas. Com esta política oportunista, que se escondia sob um discurso “radical” contra os reformistas” , o stalinismo pavimentou o caminho do nazismo na Alemanha ao negar qualquer unidade circunstancial com a social-democracia, a quem consideravam como “irmãos gêmeos” dos nazistas, confundindo os milhões de trabalhadores que consideravam os social-democratas como seus dirigentes nas organizações operárias e dividindo a classe operária em “social-democratas” e “comunistas” .

Atualmente, na situação concreta brasileira, ainda que não tenhamos greves, mas apenas as primeiras manifestações de um setor de sindicalistas reformistas da CUT e outras centrais contra a reforma sindical do governo, não podemos cair na tentação stalinista do “terceiro período” , como faz o PSTU que coloca como política central a necessidade de que os sindicatos saiam da CUT para constuir uma nova central. Se é verdade que os dirigentes sindicais que hoje estão contra “essa reforma” são burocratas sindicais e governistas, isso não pode ser “pretexto” para uma política oportunista de não lutar seriamente pela unidade da classe trabalhadora e impor a tática de frente única operária a esses dirigentes burocráticos como forma de conseguir unificar a luta contra a reforma e chegar às bases dos grandes sindicatos que esses reformistas dirigem.

Retomando as tradições revolucionárias bolcheviques continuadas por Trotsky, devemos nos orientar com firmeza ideológica e flexibilidade tática, compreendendo a necessidade de lutar pela máxima unidade dos trabalhadores e das massas que estão nos sindicatos dirigidos por reformistas e burocratas da CUT e demais centrais, sem capitular ou embelezar esses dirigentes sindicais que “dão meio passo à frente” , se colocando contra “essa reforma” sindical. Para os marxistas revolucionários é um dever “separar as massas dos reformistas” que, longe de entrar em decadência tem-se fortalecido nos últimos anos. Porém, este fortalecimento faz com que eles dependam mais que antes de sua base proletária. A tática de frente única está dirigida precisamente para essa dependência” .

[1Todas as citações foram extraídas do artigo “O ”˜terceiro período”™ dos erros da Internacional Comunista” . Leon Trotsky. 22 de fevereiro de 1930. CD “Escritos de Leon Trotsky 1929-1940” . Livro 1. CEIP Leon Trotsky. Argentina, 2000.

[2De acordo com a teoria stalinista, em 1928 ocorria o período final do capitalismo, marcado como “terceiro período” em que não se necessitava táticas como a frente única e, ao contrário, a linha oportunista era romper com os sindicatos reformistas e construir “sindicatos vermelhos” , deixando a social-democracia livre para seguir enganando e dirigindo as massas nas grandes organizações operárias. A partir de 1934, oficialmente o stalinismo desertou da prática do “terceiro período” e deu o giro para a política de frente popular (aliança para governar com setores da burguesia) que durou até 1939. Na “teoria” stalinista o “primeiro período” estava compreendido entre 1917 e 1924, caracterizado pela crise do capitalismo e ascenso revolucionário. O “segundo período” , de 1925 a 1928, se caracterizava pela estabilização do capitalismo.

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