Sexta 26 de Abril de 2024

Internacional

OS 11 MILHÕES DE VOTOS DE CFK E OS “TRÊS B” DO GOVERNO PERONISTA

15 Nov 2011   |   comentários

Um governo que acaba de obter uma esmagadora vitória padece, no entanto, de incerteza estratégica e a fuga de capitais é um sintoma disso. A primeira medida da presidente reeleita foi decretar que as privilegiadas mineradoras e petrolíferas liquidassem a totalidade das divisas de suas exportações (igual aos produtores de soja e azeite), revogando assim uma exceção aberta por Menem e Cavallo e sustentada até hoje pelos Kirchner. Uma medida de intervenção estatal para aumentar em 4 bilhões de dólares anuais e diminuir a hemorragia que vem tendo o Banco Central, porem que não garante o fim da fuga de capitais. A preocupação oficial inclui a operação de Garré com os recursos da guarda nacional e a Prefeitura para detectar uma dezena de “raivosos” compradores de dólares de renda não contabilizada, mas de nenhuma maneira aponta para um controle efetivo dos grandes bancos e empresas que alem do mais, utilizam a transferência a sua matriz no estrangeiro como mecanismo privilegiado de fuga. Ao mesmo tempo, o governo e a equipe econômica de Boudou tentam aproveitar a reunião de Cristina Kirchner (CFK) com Barack Obama durante o G-20, para destravar créditos que os EUA vinham vetando e encaminhar um acordo com o Clube de Paris para regredir o endividamento como exigem as empresas patronais da AEA.

A contradição do voto popular que recebeu a presidente é que ele esta carregado da expectativa de conservar a situação dos últimos anos, quando têm se modificado as condições internacionais que a fizeram possível. Os 11 milhões e meio de votos a CFK atravessam todas as classes sociais. É evidente que mantém os votos da ampla maioria da classe trabalhadora, e que também recuperou as classes médias, inclusive grande parte delas das regiões agrárias que a enfrentaram em 2008. O poder de consumo tem sido historicamente um denominador comum da ampla base de apoio de todo o tipo de governo capitalista, inclusive os pouco similares como o de Cristina e o do também reeleito Menem em 95, porque transmite uma aparência de igualdade confluindo apoios sociais que vão desde as favelas de Florêncio Varela até os clubes de campo de Pilar. Porem, ao contrario de Menem, que foi reeleito em um momento que estourava o hiperdesemprego com milhões por fora do “modelo de conversão” em decadencia, o kirchnerismo se construiu sobre as bases de um ciclo econômico que, depois da depressão de 2001, se beneficiou da entrada de milhões ao emprego precário e, nos últimos anos, com a intervenção do Estado que cresceu exponencialmente em suas arrecadações, criando uma capa de contenção desde as camadas mais baixas da classe trabalhadora e do povo pobre. O contundente resultado da reeleição de Cristina Kirchner se deve também ao voto de franjas das massas que em 2009 propiciaram a vitória de De Narváez no Legislativo da Província de Buenos Aires. Há dois anos Nestor Kirchner perdia no bastião do peronismo com 2,3 milhões de votos, agora, FPV ganhou com quase 4,5 milhões. Depois do golpe que sofreu em um dos seus centros de gravidade com aquela derrota, o governo liberou o “Abono por Filho” uma bandeira histórica da CTA em épocas de Menem e De la Rua, que significou para os que não tinham nada, uma mudança no nível de vida. As medidas “de esquerda” do kirchnerismo sempre foram dadas de contra-golpe. Somente após a derrota pra a patronal produtora de soja por uma porção da renda agrária em 2008 e frente o colapso das ações da Agencia Federal de Pensões e Aposentadorias (AFPJ) atingidas pela crise financeira internacional, a estatização dos fundos de pensão, ao mesmo tempo que reforçou o “bonapartismo fiscal” aumentando o poder dos fundos estatais desde Anses, estendeu a diminuição do tempo de aposentadoria a quem sequer recebia. Estas medidas “contra a pobreza” permitiram ao Kirchnerismo, alem do mais, se somar aos setores da centro-esquerda que nos anos 90 comungavam a oposição anti-menemista como Fepaso, reforçando o acompanhamento de medidas tomadas da “agenda progressista” e dos movimentos sociais, como a Lei do Casamento Igualitário.

Partido dominante?

Mas esses traços de aparente “hegemonia” de modelo não só estão assentados em um passado “próspero” de crescimento econômico que já não será igual. Tampouco se sustenta em um partido dominante e estável, como foi a social-democracia da Suécia, senão em uma coalizão de governo instável, com uma vasta heterogeneidade de interesses e povoada por arrivistas e membros da camarilha do peronismo. O Cristinismo é uma fração dentro da fração dos Kirchneristas no geral, embora hoje a fortaleza da figura presidencial lhe permita arbitrar sobre o conjunto e a situação econômica mantenha certa ilusão de “unidade nacional”. Isto não significa subestimar o fortalecimento do Cristinismo que recuperou a maioria na Câmara dos Deputados, e tem agora suas próprias tropas no poder legislativo. É parte também, de certa renovação da burocracia política e estatal desde onde ascendem tanto La Câmpora como os ex-jovens de Alsogaray que vem com Boudou, e deixa diluída a representação da cúpula sindical de onde só assumiram os deputados Gdansky da UOM de La Matanza e Facundo Moyano, para piorar as coisas, duas tendências hoje distintas dentro da CGT. No entanto, o dilema para todo o governo centrado em uma figura forte, inclusive já sem a flexibilidade que lhe dava o “bonapartismo de duplo comando” junto a Nestor Kirchner, um de seus problemas estará na luta pela sucessão dentro da própria aliança de governo que agora lhe possibilitou a – ou lhe acompanhou na – vitória de 23 de outubro. É de se esperar tensões, lutas de camarilhas e crises políticas em torno dos posicionamentos entre 2013 e 2015 que terá o peronismo como principal protagonista. As ameaças de reforma constitucional que vem lançando o governo, dificilmente buscarão impor a dupla reeleição de CFK, mas sim injetar perspectivas de futuro no seu ultimo mandato, evitar que se desate a luta de todos contra todos pela sucessão, e colocar-se como uma das principais articuladoras do candidato que virá, ao estilo dos presidentes do PRI mexicano.

A governabilidade do regime

A ponto de completar-se 10 anos da crise de 2001, não se pode dizer que se tenha consolidado um regime de partido dominante, como tentam apresentar os peronistas, senão que governa uma coalizão instável. Mas embora esta articulação tenha o Estado como articulador, a oposição patronal retrocedeu em todas as posições conquistadas após o lock out agrário e passou de ‘Grupo A’ a dividir-se em todo o abecedário. Hermes Binner, o segundo colocado das eleições de 23 de outubro, buscará uma aliança com o radicalismo, já sem a direção de Alfonsin, que perdeu todas. Essa divisão da oposição é uma desvantagem em favor da classe trabalhadora e da esquerda: como vários analistas têm previsto “a oposição será social” para dizer que não poderá ser capitalizada mecanicamente por ninguém a diáspora dos partidos tradicionais.

Enquanto a crise não pega em cheio, o governo tratará de utilizar sua fortaleza política para manter o equilíbrio entre a super ganância dos banqueiros, os subsídios estatais para sustentar a rentabilidade dos empresários e, por sua vez, a contenção social sobre as camadas mais baixas. O mecanismo tentará ser o “pacto social”, de “unidade nacional” ou o nome que coloquem sobre a intenção de subordinar as organizações sindicais às corporações empresarias. Em função disto, o governo enfrentou uma batalha de desgaste para disciplinar Moyano, e ainda mais, a CGT. O discurso do “nunca menos” já esta sendo utilizado de maneira reacionária, não só pelo governo como por setores da burocracia sindical, como a UOM, que exigem da classe trabalhadora que segure as demandas salariais em função “dos que tem menos”, como se os aumentos salariais fossem colocar em risco o Abono por Filho, embora se mantenham os subsídios para garantir a rentabilidade “dos que tem ganhado como nunca” na UIA e AEA.

Quando a crise golpear, os poderes reais da “governabilidade” serão os verdadeiros sustentáculos do peronismo, o que temos denominado dos Três B: os Barões do PJ nas províncias e municípios, a polícia Bonaerense e demais polícias provinciais que lhe cobrem as costas e a Burocracia Sindical para controlar o movimento operário. É aí que reside a verdadeira fortaleza do peronismo governante nos momentos de crise e luta de classes, como são esperados no governo que se inicia: nos poderes de fato que aparecerão como asseguradores do Estado por trás do volátil “voto universal”, assim como a classe dominante recorre ao refugio do valor do ouro quando se desvaloriza o papel moeda circulante.

“Nós, a esquerda

Nesta situação de conformismo social e conservadorismo, mas também de prevenção para encarar a crise internacional, a frente de Esquerda consolidou mais de meio milhão de votos entre os trabalhadores e a juventude, ao redor das demandas para enfrentar aos capitalistas. As exigências de um salário equivalente às necessidade familiares, o fim do trabalho precário, o programa de planos de habitação em base a expropriação das grandes concentrações de terras desocupadas e para a especulação imobiliária, o não pagamento da divida externa e a gestão dos aposentados e trabalhadores sobre os fundos da Anseas para garantir 82%, ou a estatização dos recursos estratégicos como os hidrocarbonetos e a mineração sob controle operário, que agitamos na campanha estarão cada vez mais na ordem do dia da agenda dos trabalhadores e do povo. Mas se necessita avançar na construção de uma força militante que possa levar esse programa aos enfrentamentos de classe, fazê-lo vivo conquistando uma corrente por um partido da classe trabalhadora que ganhe força decisiva nos sindicatos eliminando a burocracia da CGT e CTA, e avance com a juventude para retirar do rotineirismo as organizações do movimento estudantil frente os desafios da crise que chega. Na perspectiva da construção de um partido revolucionário e internacionalista que tem o PTS, nós temos entre os integrantes da FIT um debate franco, fraternal e aberto de programas e estratégias para esclarecer as posições acerca do futuro, como exige uma ampla militância agrupada na Frente de Esquerda.

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