Sábado 20 de Abril de 2024

Internacional

ARGENTINA

As batalhas de nossa esquerda

14 Oct 2014   |   comentários

Neste fim de ciclo a esquerda é um fator atuante. Nas eleições de 2013, atraiu a vontade de quase um milhão e meio de votos que, sem dúvida, foram a expressão de uma camada de trabalhadores e estudantes à esquerda do kirchnerismo, onde supostamente havia uma parede.

Neste fim de ciclo a esquerda é um fator atuante. Nas eleições de 2013, atraiu a vontade de quase um milhão e meio de votos que, sem dúvida, foram a expressão de uma camada de trabalhadores e estudantes à esquerda do kirchnerismo, onde supostamente havia uma parede.

A histórica conquista de deputados para a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores significou a aparição de uma renovada identidade política de um setor de massas, minoritário, mas intenso, na realidade nacional argentina.

Mas não é só este registro tão volátil da política, como os votos, o determinante para medir a esquerda. O decisivo é sua inserção como fator real nas lutas cotidianas, em especial naquelas que se convertem em batalhas de classe que transcendem a “pequena política” do mero conflito entre patrões e operários. Este é o ponto crucial para considerar a esquerda como fator real.

Com as três paralisações gerais convocadas pela CGT de Moyano, que enfrentaram Cristina Kirchner, se foi criando uma oposição operária de um setor de massas ao governo. O primeiro deles, em novembro de 2012, pôde ser majoritariamente capitalizado por Sergio Massa.

Mas depois da paralisação de 10 de abril deste ano se consolidou um destacamento avançado, uma vanguarda da classe trabalhadora. Desde o mês de maio, com a resistência operária às demissões na Gestamp, mas fundamentalmente em Donnelley e Lear, adquiriu identidade nacional uma nova geração que se enfrenta com as patronais e com as direções como as do SMATA, em um sindicato chave do principal motor da indústria. Uma olhada objetiva sobre as distintas forças da esquerda demonstra um resultado inconstestável: a esquerda que está assentada neste processo se desenvolveu com ele; e a que se manteve à margem do fenômeno parece condenada a buscar atalhos eleitorais nos espaços que deixa o regime político ou ensaiar encenações alheias à vida real da classe trabalhadora.

Em particular, isto se expressou nos quatro meses de luta na norte-americana Lear Corporation. A resistência de seus homens e mulheres pela reincorporação dos demitidos e o reconhecimento de seus delegados se transformou em um emblema nacional, uma primeira barreira às demissões que tentam as patronais na indústria e o desafio, inédito para a esquerda, de derrotar nada menos que a burocracia sindical mais forte com a que conta o oficialismo.

Em nome de Lear fala Capitanich, Berni e seus urubus; os bate-paus de Pignannelli organizam “assembléias-sequestros” e irrompem na Câmara de deputados para hostilizar a esquerda. Por Lear, se veta a palavra ao deputado Del Caño e todos os meios se veem obrigados a transmitir suas ações ao vivo e a cores. Escrevem os intelectuais oficialistas de Carta Aberta sobre o novo cenário da política nacional: hoje a Panamericana começa a ocupar “o lugar do conflito” de classes.
Por Lear, também, milhares de trabalhadoras e trabalhadores, estudantes e personalidades se solidarizaram, marcharam, deram dinheiro e alimentos em todo o país, em uma enorme mostra de solidariedade popular.

Antecipando o futuro, depois de 13 anos da ocupação da histórica Zanon em Neuquén, os gráficos de Donnelley (ex- Atântida) voltam a dar o exemplo ante os fechamentos de empresas que, seguramente, vão aparecer mais nitidamente com o avanço da crise capitalista. A unidade de Zanon e Donnelley em uma mesma corrente operária representa a unificação da vanguarda de 2001 com uma nova geração que volta a marcar a única resposta possível ante a crise catastrófica que ameaça: ocupar e produzir para lutar pela estatização sob gestão operária e, em primeiro lugar, colocar em pé fábricas militantes que se convertam em um ponto de referência, como ontem foi Zanon e hoje é Donnelley, na maior concentração trabalhadora do país que rodeia a Panamericana.

Surgiu uma nova geração operária que se estende além de Lear e Donnelley. Esteve presente nas lutas dos metalúrgicos de Liliana da UOM de Rosário, na Shell de Avellaneda, nos exemplos de Kraft, PepsiCo e as comissões internas que disputam o poderoso sindicato da alimentação, e ainda nas derrotas por falta de preparação e improvisação, como a dos valentes ativistas de Gestamp. Todos são parte da geração da Panamericana.

Encontros e desencontros

O Encontro Sindical Combativo realizado no estádio de Atlanta entre a esquerda com inserção operária, como o PTS, junto a Carlos “Perro” Santillán, que conduz o SEOM de Jujuy, Rubén “Pollo” Sobrero e outras forças, significou um passo adiante na unificação dos setores combativos e os marxistas. Teve resultados práticos: amplificou a campanha pela absolvição dos petroleiros de Las Heras e constituiu os piquetes, que deram um caráter ativo à paralisação nacional de 10 de abril. Dessa unidade principista surgiu o ato unitário do 1° de Maio, incorporando o Partido Obrero à iniciativa do PTS e dos participantes do Encontro de Atlanta. Ocorreram, depois, importantes reagrupamentos para a ação em frente única operária com Encontros regionais combativos na Zona Norte da GBA, entre outros.

O “desencontro” desta experiência se produz quando justamente se fazia mais necessário seu aprofundamento. As batalhas, algumas perdidas, mas combatidas, como a de Gestamp, e em especial as de Donnelley e Lear, faziam imprescindível ampliar essa unidade para a ação na luta de classes. Mas não prosperou, apesar de que continuam debates abertos.

Os companheiros Santillán e Sobrero têm a posição política de crer que podem organizar uma corrente sindical nacional à margem das batalhas centrais sobre posições estratégicas da classe operária industrial. Isto significaria uma corrente sindical limitada a acordos de dirigentes sem a participação de todos os implicados nas lutas cotidianas; isto é, sem disputar de verdade o poder das burocracias de Moyano e Micheli, nem das burocracias oficialistas nos sindicatos de metal e mecânicos. Em última instância, é uma espera passiva a que Moyano continue com o prometido “plano de luta”. Outro componente da Frente de Esquerda, o PO, optou pela solidão, por uma orientação sectária e propagandista separada da luta real.

Estas posições dentro da esquerda apostam em tratar de organizar, sob sua tutela, correntes sindicais setoriais, como fizeram no último “fim de ciclo”, com os movimentos de desempregados pensados como colaterais partidárias ao invés de brigar por um movimento único. Mas desta vez com muito menos peso nos sindicatos do que tiveram em alguns bairros naquela época. Neste aspecto, o PTS propõe redobrar a aposta e coordenar um encontro unitário do movimento operário combativo e à esquerda, com plena democracia interna e acordado entre todos, em especial junto aos delegados e comissões internas que tomam forma na política nacional. Existe um rico debate sobre estas alternativas, que está em curso.

Por cima e por baixo

A esquerda emergente na Argentina é a que pensa estrategicamente as batalhas políticas parciais a partir do ponto de vista da finalidade última dos comunistas.

Isto não significa falar do papel das forças armadas e de segurança em abstrato (muito menos adaptar-se à agenda de “segurança” propondo reformas policiais). A denúncia de repercussão internacional que realizaram os operários de Kraft e seus advogados do PTS, conhecida popularmente como “Projeto X”, é o que corresponde a isso: transformar em denúncia política contra o sistema a perseguição de que são alvo os operários em suas lutas cotidianas para que seja compreendido pelas grandes massas da população e possamos ganhá-las como aliadas na lucha contra o capital.
Da mesma maneira, a “primazia” do La Izquierda Diario, dos vídeos do “Gendarme Carancho” (“Policial Urubu”) que se discutiu em qualquer bar, em qualquer conversa de mesa, e pôs a esquerda no centro do debate nacional.

Isto explica que o deputado Del Caño, porta-voz do PTS, surja como nova figura ascendente na FIT, ligado a estes processos diretamente, além de sua juventude e frescor que concretiza a ideia de uma renovação na direção da esquerda, que também deve se renovar a si mesma.

As batalhas políticas “por cima” (nas demandas legais na Justiça, nos meios de massas, nas intervenções no Congresso) devem pensar-se em função de deslegitimar o poder burguês para legitimar a ação de classe e a construção de uma esquerda dos trabalhadores.

Todavia, há velhos esquerdistas que se debatem entre dois cursos de ação que, como as paralelas, nunca se tocam. No terreno das ideias privilegiam a agitação em nível da participação eleitoral; na ação de todos os dias se limitam ao sindicalismo. La Izquierda Diario estará aberta a este debate crucial.

O aporte destas páginas estará cheio de exemplos concretos. A denúncia da reforma oficial do Código Civil e Comercial pactuado com o Vaticano que fizeram os deputados da FIT no Congresso, assim como a participação nas marchas por justiça contra os casos de femicídio, são chaves para a formação do movimento de mulheres. Um movimento que se prepara para participar do Encontro Nacional em Salta nos dias 11, 12 y 13 de outubro, onde estará colocado lançar una verdadeira campanha nacional pela lei de direito ao aborto que entusiasme e some à militância ativa centenas e milhares de mulheres trabalhadoras e estudantes.

As apresentações das chapas das frentes de esquerda nos centros acadêmicos são parte de uma “disputa pela juventude” para que não seja levada nem ao “camporismo de Estado” de um governo em decadência, nem a falsas “esquerdas independentes” que crêem que para conseguir “o possível” é necessário estar alinhado a um ou outro bando capitalista.

A esquerda diariamente

Faz duas semanas lançamos este apaixonante projeto para que a esquerda tenha seu próprio diário. Os primeiros resultados são positivos. Segundo as medições da web, tivemos cerca de 300 mil visitas, o que prognostica que superaremos o meio milhão no primeiro mês. Segundo as estatísticas de Alexa, La Izquierda Diario, recém-nascido, está ascendendo à posição das primeiras centenas de sites web do país e superando, de longe, o alcance que tínhamos os anteriores portais da esquerda (PTS e PO).

A aposta está em mostrar um conjunto de políticas, ações e ideias a centenas de milhares para forjar uma esquerda militante das trabalhadoras, dos trabalhadores e da juventude.

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