Sexta 26 de Abril de 2024

Nacional

SEGUNDO TURNO

O PT sai vitorioso das eleições, mas longe de ter um cheque em branco

02 Nov 2012   |   comentários

O segundo turno das eleições, realizado no último domingo, demonstrou uma continuidade da tendência do primeiro turno. Naquele momento analisávamos a situação afirmando que “o baixo nível de desemprego, a diminuição da miséria, a disponibilidade de crédito para o consumo (com o consequente endividamento das famílias trabalhadoras), reforçam nas massas as ilusões reformistas de que é possível seguir com mudanças graduais e constantes como foi com Lula e segue com Dilma. Estes fatores são determinantes para entender a vitória governista, o fortalecimento do PT e o debilitamento dos principais partidos da oposição burguesa (PSDB e DEM) nessas eleições.”1

Nos grandes municípios com mais de 200 mil eleitores onde houve segundo turno, as mesmas tendências se mostraram, mas ficaram mais claramente marcados alguns limites àquela tendência geral.

O que fica claro como água é que o PT conseguiu ganhar a jóia da coroa – São Paulo – com o desconhecido Fernando Haddad, que fora escolhido por Lula contra o partido, como já havia feito com Dilma, e que o PSDB paulista (centro de gravidade tucano) saiu gravemente ferido. Porém, o próprio PSDB e o DEM mostraram uma sobrevida em outros lugares (sobretudo no Norte e no Nordeste) que não permite afirmar que a vitória do PT foi “em toda a linha”, ainda mais quando sofreu duras derrotas para seu aliado (aliado que precisa ser “vigiado”) PSB em diversas capitais, e a derrota em Salvador (para o DEM) acende luzes amarelas quanto a sua força neste estado, luzes de atenção que, no entanto, não ofuscam as contundentes vitórias na capital paulista e todo seu entorno.

Nas maiores cidades o predomínio do governismo

Os analistas políticos brasileiros e os marqueteiros dos partidos falam em um G-85 no Brasil que definiria rumos importantes de todas as eleições. Esta sigla representa um grupo de 26 capitais + 59 cidades que têm mais de 200 mil eleitores e que arrastam as outras (5.565 em todo o país) por seu peso econômico, político e cultural. Olhando este resultado se vê a fortaleza do PT, ainda maior como expressão do clima geral reformista, com expressivas votações em diversos partidos governistas que ofuscam a sobrevivência do PSDB (15 cidades do G-85) e DEM (5). O PSDB e o DEM sobrevivem, mas debilitados estrategicamente por dependerem de possíveis, e não prováveis, alianças com o PSB, e terem o bastião paulista em risco, uma vez que uma marca fundamental desta eleição foi a amarga derrota do PSDB paulista que perdeu bastiões (São Paulo para o PT, Jundiaí para o PCdoB e São José dos Campos para o PT, além do “cinturão vermelho” de grandes cidades da região metropolitana dominado pelo petismo).

Uma hipótese a se levantar da derrota do PSDB paulista ter sido mais categórica do que a de outros tucanos, reafirma como aquela fração mais oposicionista do mais oposicionista dos partidos saiu enfraquecida das eleições, e os famosos opositores eleitos em Salvador e Manaus não revertem esta tendência, pois adotaram um discurso muito localista nestas eleições e pouco “antilulista” ou “antigovernista”, como diversos analistas têm remarcado. Ou seja, este resultado aponta para um enfraquecimento da oposição, por mais que ela tenha ganhado várias cidades. Serra, a maior figura oposicionista junto com Aécio Neves (MG), saiu derrotado e isto é uma mostra da debilidade do tucanato e da oposição.

Esta tendência pode ser vista não só pela negativa (as derrotas tucanas paulistas), mas também pela positiva, pelas vitórias governistas. O PT ganhou a mais importante de todas as cidades do G-85 (São Paulo) e saiu vitorioso em um total de 16 das 85 (encolhendo de 22). O encolhimento do PT se deu não para a oposição, mas para um partido da base governista, o PSB. No confronto PSB/PT, o primeiro levou a melhor em BH, Recife, Fortaleza e Campinas. O PSB soma 11 destes municípios (saindo de 5), o PMDB 10, o PDT 6 e o PCdoB 4. Outros partidos governistas também conquistaram cidades neste grupo seleto, e assim marcam a trajetória geral das eleições de 2012, que mostraram como a classe trabalhadora, os pobres urbanos e as classes médias seguem confiantes em mudanças graduais em meio ao impacto desigual da crise capitalista no país, expressando um voto de confiança na continuidade do reformismo e da estabilidade social.

A classe trabalhadora não deu um cheque em branco ao PT

Apesar de vitorioso, o PT não saiu com um cheque em branco destas eleições. A perda de votos para o PSB, pela direita, uma vez que este partido se mostra menos “reformista” que o PT, e pela esquerda, com as minoritárias, mas importantes votações da esquerda antigovernista (PSOL e PSTU), no primeiro turno. Perdas principalmente observadas naquelas cidades onde o PT havia rompido o pacto de aumentos salariais, aparecendo abertamente antigreve, enfrentando-se com sua base social (funcionalismo público e classes médias “progressistas”) e onde há maiores sinais, ainda que iniciais e dentro dos marcos do reformismo social, de politização da juventude. Tudo isso mostra como a vitória do PT não foi tão ilimitada.

Outro elemento importante a reter destas eleições foi a elevada abstenção, votos em branco e nulo em diversas cidades, sobretudo nas maiores. Em São Paulo este índice superou os 30%, marcando que para uma parte grande da população trabalhadora e para a juventude há uma crescente crise de representatividade nos partidos do regime, incluindo os governistas e opositores, que a esquerda não consegue alcançar nem dialogar por suas debilidades orgânicas e políticas.

No segundo turno um PSOL difícil de diferenciar do governismo ou da oposição burguesa

O PSOL disputou duas eleições no segundo turno no Norte do país: Macapá e Belém. Venceu em Macapá, capital do Amapá. Naquela cidade foi eleito com um vice de um partido burguês, inimigo da reforma agrária e dos trabalhadores, o PPS, contando com o apoio do governador Capiberibe, do PSB, e ainda com diversos apoios dos mais tradicionais partidos da direita do país, como o DEM e o PSDB. Uma vitória com um sabor tucano e que terá seus reflexos quando o partido começar a administrar a cidade, pois o que ocorreu em Macapá não foi somente um chamado do DEM e do PSDB a votar no PSOL mas uma aliança para governarem juntos a cidade, como diversos vídeos do Senador Randolphe (PSOL) na internet mostram. Ou seja, o “opositor antineoliberal” PSOL (junto ao PCB) terminou numa aliança governamental com a “oposição neoliberal”.

Na capital do Pará (Belém) o oportunismo do PSOL foi para o outro lado do espectro político nacional. Lá o PSOL abandonou qualquer slogan antigovernista, foi indiferenciável do PT e do PCdoB. Tinha como vice de Edmilson o PCdoB, recebeu dinheiro de grandes empresas, inclusive empreiteiras, e no segundo turno, contou com o apoio de Dilma, Lula e diversos ministros do governo que gravaram vídeos em apoio e foram usados na campanha de televisão do candidato do PSOL. O governismo apoiou o PSOL reivindicando-o como “continuidade” do “modo petista de governar”.

O mais chamativo da diluição do PSOL na oposição burguesa em uma cidade e no governismo em outra da mesma região é que este passo foi comandado pela mesma corrente nas duas cidades. A corrente APS do presidente nacional do partido Ivan Valente. Seus passos oportunistas para ganhar uma eleição a qualquer custo demonstram que não existe qualquer perspectiva deste partido em se oferecer como alternativa anti-capitalista, ou mesmo mostra contradições para se postular como esquerda anti-governista. Frente a isto, numerosas correntes do PSOL, mesmo aquelas que também tem em seu DNA a habilidade em fazer transações com a burguesia em nome da tática, escreveram notas de repúdio.

O MTL atingido pelo escândalo de seu maior dirigente, Martiniano Cavalcanti foi afastado do partido por receber dinheiro do bicheiro Carlinhos Cachoeira, pronunciou-se contra as táticas do Amapá. O MES de Luciana Genro que já havia recebido dinheiro da multinacional brasileira Gerdau e da fábrica de armamentos Taurus na eleição de 2010, também se pronunciou contrariamente.

Anuncia-se uma marcada disputa neste partido. Porém, entre as alas que querem diluí-lo rapidamente em qualquer partido do regime que eleja mais cargos, e as distintas tendências que criticam os excesso de Belém e Macapá, mas aceitam as mesmas “táticas” desde que menos descaradas, não há uma ala que defenda posições de independência de classe. Todas as alas, inclusive a mais crítica CST (de Babá), reivindicam a campanha de Freixo no Rio de Janeiro como exemplo contrário a Belém e Macapá. Porém Freixo também havia sido apoiado por políticos burgueses (como Andrea Gouvêa, vereadora do PSDB), havia pronunciado que também poderia reprimir greves do funcionalismo como fez Dilma, e ergueu um programa que não falava sequer uma vez a palavra “classe trabalhadora”. Ou seja, mesmo onde para as correntes do PSOL haveria um exemplo de uma candidatura de “esquerda” já havia claros sinais de um caminhar no sentido da APS. O que todas essas correntes de esquerda não contestam é o fato simples de estarem “construindo” um partido centro-esquerdista, que se nega conscientemente a ser proletário e revolucionário. Ou seja, um partido que só pode ser reformista, já que não pode ser diretamente burguês. Ao seguir nessa estratégia reformista este partido não poderá fugir dos cantos de sereia da burguesia, do regime burguês e suas instituições – incluindo o mecanismo de corrupção como “disciplinador” do regime de domínio.

O PSTU avança em seu oportunismo eleitoreiro expondo sua crise de falta de estratégia revolucionária

O PSTU esteve em posição privilegiada para travar uma batalha pela independência de classes nestas eleições do segundo turno, sobretudo onde o PSOL pode ocupar o espaço deixado pelo PT. Porém não o fez.

Em Belém o PSTU dirige o importante sindicato dos trabalhadores da construção civil e tinha como candidato na mesma frente do PSOL e PCdoB o dirigente deste sindicato, Cleber Rebelo. Cleber foi eleito vereador com uma importante votação, mas teve que contar com os votos do coeficiente eleitoral do PSOL para se eleger.

No segundo turno, há poucos dias das eleições, o PSTU rompeu com a coordenação desta campanha mas chamou voto crítico no candidato do PSOL. A posição seguidista do PSTU em relação ao PSOL se constitui como um entrave para a independência de classe que eles também afirmam reivindicar – em palavras, mas na prática o que determina é o oportunismo eleitoreiro como aconteceu em cada passo desta eleição.

No primeiro turno o PSTU havia criticado o apoio de Marina Silva a Edmilson, havia criticado o recebimento de dinheiro da burguesia, mas fazia uma agitação na cidade, como mostrava em vídeos em seu site, de que eleger Cleber e Edmilson seria “Belém na mãos dos trabalhadores”. Depois de apagar as numerosas críticas que havia feito a Edmilson quando este era do PT e havia reprimido greves, o PSTU passou a fazer agitação que ele representava os interesses dos trabalhadores (mesmo em meio às críticas para a vanguarda do dinheiro de empreiteiras e de seu programa). Depois, de repente com o vídeo de Lula e Dilma em apoio a Edmilson no segundo turno, o PSTU descobriu uma ruptura “definitiva” com os acordos da frente “Belém nas mãos do povo”.

Os zigzags do PSTU para justificar sua política oportunista de eleição de um vereador são apenas funcionais para o oportunismo eleitoreiro. Enquanto havia anúncios de apoio do PT e PDT parecia não haver problemas (mesmo com dinheiro das empreiteiras, vice do PCdoB, e o programa petista para as cidades), e o PSTU alegremente colocava seu vereador operário eleito nas ruas e no site defendendo “votar em Edmilson”. O oportunismo do PSTU determinava suas táticas desde o primeiro turno, pois seguiram na frente eleitoral com o PSOL tendo recebido dinheiro dos capitalistas. No segundo turno, antes de romper com a coordenação da campanha, estava chamando voto (crítico?) em Edmilson, que havia recebido o apoio do PDT (partido governista, patronal) e do PPL (nacionalista, ala de direita do PMDB, pró-Saddam, pró-Kadhafi, pró-Assad, da Síria). Ainda que “caminhando separados” o PSTU “golpeava junto” com este partidos para o objetivo comum de “eleger Edmilson” (como um representante dos trabalhadores?!).

,Apenas com a entrada de Lula e de Dilma na campanha do segundo turno, defendendo Edmilson e o PSOL, o PSTU “descobriu” um problema “de princípio” que justificasse a ruptura com a frente que construiu de maneira oportunista. Este passo para o PSTU só ocorreu com o vídeo de Lula e Dilma, e somente depois de ter seu vereador eleito, todas as outras rupturas anteriores do PSOL com o princípio e estratégia de independência de classe não haviam sido suficientes.

Seu balanço posterior, já “rompido” com a Frente, continua embelezando Edmilson. Nele afirmam que rompiam porque Edmilson deixou “de defender um programa que representasse os interesses dos trabalhadores, montando uma coalizão com partidos burgueses e de um latifundiário conhecido de Belém.” É uma mentira que ele defendia os interesses dos trabalhadores “antes”.

O falso discurso classista que o PSTU adotara no primeiro turno, de “cidade dos trabalhadores”, “Belém nas mãos dos trabalhadores”, não era mais que uma máscara “de esquerda” para esconder a estratégia do PSOL, que é a continuidade petista dos “governos democráticos e populares”, os “governos para todos” que consolidaram o PT como partido da ordem, partido administrador dos negócios capitalistas em diversas cidades desde os anos 1980.

Entendemos que para o PSTU não havia “crise” em defender com o PSOL esse “programa”, pois na verdade era o mesmo programa defendido por décadas quando estavam todos juntos no PT, e mesmo fora deste partido, o PSTU continuou organizando todas suas táticas em função de seus “chamados” à “esquerda petista” (que dirige o PSOL atual) para alianças eleitorais e estratégicas (e não para lutas concretas da classe trabalhadora), fortalecendo os reformistas em detrimento da estratégia revolucionária que exige desmascarar os reformistas, a conciliação de classes.

Mesmo com tudo isso, o PSTU anunciou sua “saída” da frente eleitoral, mas continuou “pagando” a conta: seguiu chamando “voto crítico” no PSOL e em Edmilson. Rompeu a frente eleitoral para entrar na frente política do “voto crítico” ao PSOL e Edmilson contra o PSDB. Esta frente política era encabeçada por Lula, Dilma, PDT, PPL e latifundiários... e o PSTU! Quanto malabarismo necessita para “disfarçar” tamanho oportunismo? O PSTU em sua nota defendendo o voto crítico argumentou que é preciso derrotar o PSDB por isto votava em Edmilson, “mas sem ilusões”.

Seu dirigente Valerio Arcary em palestra a militantes preparando a campanha pelo voto crítico2 orienta a votar com “nariz tampado”, pois Edmilson teria traído seus mais fiéis companheiros do PSTU e que não merecia o voto de nenhum trabalhador e nenhuma das palavras de Cleber, porém que faziam isso em respeito às ilusões da classe operária em Edmilson e sua frente e, que estariam junto aos trabalhadores porém deixando claro que não compartilhavam com o projeto do PSOL, mas tampouco seriam “um obstáculo”.

Com essas duas opções que a direção do PSTU tentou justificar sua política oportunista em Belém, seja o voto no “mal menor” seja o voto crítico numa frente de conciliação de classes, não é parte de uma política de independência de classe, sequer classista. Um partido que se reivindica revolucionário colocar-se a reboque de um projeto de conciliação de classes do PSOL supostamente em nome de respeitar as ilusões da classe operária não pode cumprir nenhum papel de preparação de seus militantes para experiências futuras de independência operária. A tradição trotskista dialoga com todas as ilusões dos trabalhadores quando esta se apoia em aspectos progressistas contra a burguesia e suas alternativas de conciliação de classes, porém sempre atuando com uma política independente de todos os setores burgueses com o guia de uma estratégia revolucionária. Quando as ilusões são baseadas no atraso subjetivo da classe operária cabe aos revolucionários dizer a verdade, o que o PSTU se esquivou de dizer ao longo desta grande manobra eleitoralista. Valério Arcary tenta converter em manobra a experiência de setores da classe operária com projetos de conciliação de classes, algo que apenas a ação independente da classe operária poderia transformar em força real de luta contra a burguesia e seus projetos. O resultado desta política só pode ser a confusão e um falatório de esquerda para esconder uma política oportunista e deseducativa à classe operária.

Está mais do que claro que, a despeito das palavras do PSTU, os dois vereadores eleitos (mesmo que sem estes graves contornos em Natal) não poderão ser uma “trincheira” dos classistas e revolucionários. Os passos que o partido deu nacionalmente e suas expressões concretas nestas cidades onde elegeram vereadores não apontam a uma trincheira revolucionária no parlamento, pois sua conquista não foi fortificada estrategicamente: independência de classe, combate intransigente à conciliação com a patronal, seus partidos e governos, programa classista e revolucionário e uma prática revolucionária para desmascarar os reformistas, sem a qual não se pode contribuir para que os trabalhadores e a vanguarda limpem sua mente das falsas ideias burguesas inoculadas pelos reformistas como o PSOL.

A vanguarda da classe trabalhadora precisa tirar lições destas eleições, ver a fortaleza do reformismo, do governismo, os passos que dá o PSOL para diluir-se ora no governismo ora na oposição burguesa para conseguir maiores votações e cargos, o sacrifício da independência de classe por parte do PSTU, em Belém (nitidamente), para, a partir desse balanço, erguer sua independência de classe contra todas as variantes burguesas e contra todas variantes de conciliação – como os fazem os reformistas – com a burguesia e seus partidos. Erguer a independência de classe como estratégia e combater intransigentemente a influência do reformismo é uma necessidade para atuarmos decididamente nas batalhas iniciais que se oferecem hoje como preparação a embates maiores da luta de classes que maiores impactos da crise capitalista seguramente colocarão no país.

1“Mesmo com o avanço eleitoral da esquerda, os capitalistas e reformistas se fortaleceram” , ver em: http://ler-qi.org/spip.php?article3642

2 Link do video: http://www.youtube.com/watch?v=NoPfmBAifEI

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