Domingo 5 de Maio de 2024

Debates

Fundamentos para a construção de uma corrente

05 Jun 2006 | A seguir queremos aprofundar um debate já em curso com os trabalhadores que têm atuado junto aos militantes da LER-QI em distintas categorias, assim como com novos setores da classe trabalhadora. Para tal, partimos de uma reflexão sobre a experiência com o governo de Lula e o PT, do processo de reorganização da esquerda que decorre desta experiência e de um balanço do Congresso Nacional dos Trabalhadores (CONAT).   |   comentários

O processo de experiência com o governo Lula e o PT

Infelizmente, a experiência com o primeiro governo de Lula, apesar dos ataques neoliberais e do escândalo do mensalão, não foi suficiente para que uma massa mais ampla de trabalhadores (que no Brasil significa necessariamente centenas de milhares, ou milhões) rompesse com as ilusões de que votando no PT poderiam ter atendidas minimamente suas aspirações por mudanças. É isso o que demonstram as expectativas de que Lula seja reeleito ainda no primeiro turno das eleições no final do ano.

A manutenção da força política de Lula tem se dado centralmente em função de três fatores. Em primeiro lugar do ciclo de crescimento da economia mundial nos últimos 3 ou 4 anos. Em segundo lugar, em função do papel cumprido pelas direções petistas e governistas, que controlam os principais sindicatos e movimentos populares do país. E em terceiro lugar pela falta de uma direção política capaz de organizar uma massa mais ampla de trabalhadores com uma política operária independente.

Por outro lado, temos a nosso favor o fato de que os partidos políticos dominantes estão imersos em uma crise, o que faz com que sejam incapazes de apresentar saída sustentada para as aspirações por mudanças mais fundamentais (emprego, salário, educação, saúde etc.) do povo explorado e oprimido, a não ser propondo mais do mesmo ou um “neoliberalismo ligth” . Isso fica evidente quando muitos trabalhadores que pretendem votar em Lula o farão com “o nariz tapado” ; ou seja, com um espírito de que Lula é um “mal menor” frente à volta do PSDB.

É nesse marco que ganha uma enorme importância o processo de reorganização dos setores de esquerda que tem ocorrido em todo o país. Apesar deste ser um processo ainda pequeno e descolado de lutas radicalizadas, ele dá origem a um “espaço político” capaz de contribuir para que os setores mais conscientes da classe trabalhadores influenciem a massa menos politizada, principalmente na medida em que se desenvolvam novos processos de lutas radicalizadas, envolvendo setores mais amplos da classe trabalhadora. A principal expressão deste processo no plano sindical é a Conlutas, que reúne vários sindicatos e oposições sindicais que se colocam contra o governo e seus servos pelegos no movimento sindical; e que reuniu cerca de 3 mil delegados de todo o país num Congresso realizado nos dias 5, 6 e 7 de maio em Sumaré-SP. No plano político, a principal expressão deste processo de reorganização é a frente eleitoral formada pelo PSOL, PSTU e PCB, que tem nos 6% de intenções de voto na candidatura presidencial de Heloísa Helena a expressão de setores descontentes com o neoliberalismo do PT e do PSDB.

É provável que um segundo mandato de Lula, ou mesmo um próximo governo do PSDB, seja significativamente mais débil que o governo do PT nos últimos 4 anos. Isso porque as recentes turbulências na economia mundial indicam que pode estar se avizinhando uma nova fase de recessão; porque muito provavelmente a burguesia terá que impor novos ataques mais diretos à classe trabalhadora (como por exemplo a reforma trabalhista ou uma nova fase da reforma na previdência); e porque as crises que têm desgastado os partidos políticos dominantes e as instituições de domínio (como o Congresso) não parecem estar perto de se resolverem.

É por isso que devemos nos preparar para embates superiores da luta de classes nos próximos anos, mais radicalizados e atingindo um setor mais amplo da classe trabalhadora. Entretanto, não podemos esperar automaticamente que tudo vá caminhar para a esquerda. De forma alguma está excluída a possibilidade de que surja, seja por lutas derrotadas ou por uma série de batalhas não dadas, da experiência mais profunda com Lula e o PT uma saída pela direita. É para isso que se preparam, por exemplo, alguns setores do PFL e do PSDB. Dependerá em grande medida da intervenção dos setores mais conscientes da classe trabalhadora a luta para que a experiência com Lula e o PT dê origem a uma nova fase mais aberta e radicalizada da luta de classes no país; que com seus altos e baixos, com seus fluxos e refluxos, nos permita contribuir para a consolidação de uma saída operária independente para as demandas mais sentidas do povo explorado e oprimido.

Lições do Congresso Nacional dos Trabalhadores

O Conat demonstrou a importante potencialidade que tem a Conlutas, ao reunir cerca de 3 mil delegados que se colocam contra o governo Lula, o PT e os pelegos da CUT em vários sindicatos e oposições sindicais espalhados em distintas regiões do país; e nos permitiu perceber os enormes desafios que ainda temos pela frente.

O primeiro desafio é o de lutar para que a Conlutas ganhe uma influência sobre ampla na massa de operários industriais e de serviços estratégicos, (transportes, telecomunicações, água, luz etc.) que se encontra majoritariamente na base dos sindicatos da CUT, e em bem menor medida da Força Sindical. Por ainda ser composta em sua grande maioria por funcionários públicos, a Conlutas não possui a força necessária para paralisar a economia capitalista, e impor pela força da mobilização um programa operário independente da burguesia para responder às reivindicações mais sentidas pela classe trabalhadora e o povo pobre.

O segundo desafio que temos é lutar por uma política para a Conlutas que seja completamente independente da burguesia. Para tal, a Conlutas precisa lutar por um programa que responda às necessidades mais sentidas pela classe trabalhadora, impulsionando campanhas pelo salário mínimo do Dieese, pela redução da jornada de trabalho sem redução dos salários de formas a repartir as horas de trabalho disponíveis entre empregados e desempregados, pelo não pagamento da dívida externa e interna etc.

O terceiro desafio que temos pela frente é o de abrir uma discussão mais diretamente política na Conlutas e em seus sindicatos. Em outubro deste ano ocorrerão eleições presidenciais. Tanto Lula, que é apoiado pela CUT, quanto Alckmin, que é apoiado pela Força Sindical, são candidatos que darão continuidade aos ataques neoliberais e à situação de desemprego, arrocho salarial e miséria em que está inserida a maioria esmagadora da população. A frente eleitoral formada pelo PSOL, PSTU e PCB poderia cumprir um papel de expressar as reivindicações e as lutas da classe trabalhadora, denunciar a podridão dessa democracia dos ricos e a farsa eleitoral. A desilusão de amplos setores com o PT coloca a necessidade de um balanço do que significou essa experiência, e de como os trabalhadores devem se organizar politicamente. A Conlutas precisa abrir um debate em suas bases sobre como os trabalhadores devem atuar frente às eleições, e sobre que tipo de organização política os trabalhadores necessitam.

A luta política pela construção da Conlutas

Conscientes de que a maioria esmagadora da Conlutas defende a ruptura com a CUT, temos criticado sua direção por não se dirigir às bases dos principais sindicatos da base da CUT e da Força Sindical levantando uma política de exigências e denúncias à burocracia sindical, que permita à bases destes sindicatos perceberem o caráter traidor de suas direções, e se aproximarem da Conlutas. Este foi um dos eixos centrais de nossa intervenção no Conat. Consideramos como um importante avanço da Conlutas a recente proposta de unidade na ação com a CUT para barrar as ameaças de demissões na GM e na Volks. E também consideramos um importante avanço a cobrança à CUT e à Força Sindical publicada no último jornal da Conlutas, exigindo que estas centrais se engajem na luta contra o Super-Simples (lei que retira os direitos dos trabalhadores das pequenas empresas). Precisamos lutar para fortalecer essa estratégia de desmascaramento dos pelegos, e utilizá-la para aumentar nossa influência sobre suas bases.

Lutamos para que a Conlutas abandonasse os aspectos de seu programa que não eram independentes da burguesia, e que rebaixavam as reais reivindicações da classe trabalhadora. Dentre estes aspectos, destacávamos a campanha pela valorização do salário mínimo para R$ 550,00 (com um plano para alcançar o do Dieese em 4 anos) e a campanha pela “Auditoria Cidadã da Dívida” .

A campanha pela “Auditoria Cidadã da Dívida” impulsionada pelo chamado “Jubileu Sul” reúne petistas e governistas de todo tipo em defesa de uma “negociação soberana” da dívida do estado com os banqueiros e investidores. A Conlutas deve lutar pelo não-pagamento da dívida, pois não podemos mais continuar enriquecendo estes banqueiros milionários parasitas às custas de cortes nos gastos com educação, saúde etc. Ao impulsionar a “Auditoria Cidadã” a Conlutas termina se adaptando aos setores da burguesia que defendem uma “negociação soberana” da dívida.

Por outro lado, consideramos um importante avanço que o Conat tenha votado uma campanha pelo salário mínimo do Dieese (R$ 1551,00). Entretanto, é um erro que no primeiro jornal da Conlutas após o Conat essa campanha não tenha sido nem mesmo citada. Precisamos lutar para que a campanha pelo salário mínimo do Dieese seja um instrumento para golpear os pelegos da CUT, que defendem um salário mínimo miserável.

É necessário construir uma corrente classista e combativa na Conlutas

Infelizmente, os principais desafios que temos pela frente para a construção da Conlutas não foram os temas centrais que ocuparam os grupos de discussão e as plenárias finais do Conat. Em alguns casos não foram minimamente discutidos de forma democrática pelos delegados, e nem tampouco foram submetidos à votação no plenário. Pelo contrário, para que elas não fossem discutidas e votadas democraticamente, o desfecho do Congresso foi conduzido com métodos burocráticos.

Este balanço expõe os limites da direção política do PSTU (corrente de influência majoritária na Conlutas) e dos sindicalistas que o seguem. Por isso é necessário construirmos uma corrente dentro da Conlutas que seja capaz de explorar até o final todas as suas potencialidades, contribuindo para a superação dos limites dessas direções.

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