Sábado 18 de Maio de 2024

Movimento Operário

KRAFT-TERRABUSI

Entrevista com Javier Hermosilla, um dos delegados dos trabalhadores da Kraft

18 Oct 2009 | Hermosilla é o único membro da comissão interna que foi proibido de entrar na fábrica. Sua situação poderá definir-se amanha, na Justiça do Trabalho. “Procuram nos discriminar dizendo que estamos ideologizados”, diz.   |   comentários

Chamam-no “Poke” porque há 10 anos, quando começou a trabalhar na ex-Terrabusi, o chamavam de “Pokemón” . Javier Hermosilla ’32 anos, três filhos’ começou a trabalhar aos 14 anos como sapateiro e conheceu sua mulher numa fábrica de sapatos. Desde outubro de 2005 integra a comissão interna liderada por Ramón Bogado e se transformou em outra das referências do conflito na Kraft Foods. Essa semana estará no centro da cena porque se definirá sua situação na Justiça do Trabalho. Na conversa com o Página 12, o dirigente próximo ao PTS disse que, a seu ver, “a fábrica não está derrotada, mas sim fortalecida” .

O posto de Hermosilla na fábrica está em um dos 16 fornos de bolachas, que medem 100 metros. “o único odor que fode é o das essências concentradas, como a de queijo do Club Social. Fora isso, tudo bem, é como uma padaria gigante” , diz, arrumando a franja com as duas mãos.

’ Podem dizer na fábrica se estão em algum partido político?

’ Para os companheiros sim, o problema é com os encarregados. Quando há demissões massivas sabem que os militantes são os primeiros, quando entrei, nem mesmo disse que havia feito Sociologia na UBA (ri).

’ Por que saiu dizendo que não são loucos de ultra-esquerda?

’ Tenho uma ideologia e, nessa situação, fazer cumprir as poucas leis que beneficiam aos trabalhadores incomoda. O ministro (Carlos) Tomada nos disse que somos intransigentes porque rechaçamos que 52 companheiros fiquem de fora. Não tem lógica. Também buscam nos discriminar dizendo que estamos ideologizados ou politizados. Quando um trabalhador peronista ou radical vai à greve não lhe dizem o mesmo, e essa discriminação busca isolar como passo anterior à repressão.

’ Você está judicialmente impedido de entrar na Kraft?

’ Não, isso é mentira. A empresa encontrou um juiz que assim como eles, pensa que sou um obstáculo para o lucro capitalista. Dizem-me que não posso entrar e eu, com a sentença na mão, digo “mas aqui não diz isso” . Na terça-feira (amanha) tenho audiência e os companheiros vão mobilizar-se até o tribunal. Todos os anos lutamos por aumentos que nunca vem, é um problema político sobre o papel do Estado, que está a serviço de uma minoria. É a proposta impulsionada desde o Sindicato dos Ceramistas (de Neuquén), de criar um modelo sindical que seja expressão política dos problemas de todo o país. O sindicato da Daer, por exemplo, este feito para utilizar a caixa das obras sociais em seu benefício. O Ministério do Trabalho te diz que é mediador, que não está para te defender, mas para colocar em igualdade de condições entre os dois, mas o trabalhador e o empresário não estão em igualdade. A idéia é colocar estas instituições a serviço da maioria, os pobres e desempregados.

’ Qual o salário na Kraft?

’ o salário médio é um dos mais baixos do país, entre 9 e 10 pesos a hora, entre 2 mil e 2500 pesos. As mulheres por lei não podem trabalhar a noite em turno fixo, e para que pudessem fazê-lo, o sindicato fechou a tempos esse período a 50%.

’ Até onde vai o conflito?

’ Vai terminar a nosso favor. A empresa fez muitas manobrar que deram errado, quis acabar com a greve e não conseguiu, quis dividir-nos e não pode. Esse conflito nós ganhamos se entram todos os companheiros. Para isso é essencial que os delegados entrem, assim haverá pressão desde dentro, somada com a de fora.

’ Não teme ficar de fora, junto aos delegados de setor?

’ pode acontecer, mas a empresa começou a desprestigiar-me frente aos companheiros e o efeito foi contrário, os trabalhadores tem raiva porque não posso entrar.

’ Não existe risco de que o conflito se dilua e fiquem isolados? Continuarão os bloqueios por vocês?

’ Penso que sim, assim disse a comissão interna. Os companheiros que entram tem que voltar a organizar-se, e dentro há uma força bárbara. A melhor mostra é a negativa da empresa e da Daer de prorrogar os mandatos da comissão interna, sabem que a fábrica está forte e que de fora tem força para continuar lutando. E isso combinado com uma paralisação dentro não lhes é conveniente. A fábrica não está derrotada, muito pelo contrário, está fortalecida. López Matheu, o ideólogo que se encarregou do Clarín, da AGR, desapareceu.

’ Houve grupos que ameaçaram os trabalhadores para obrigá-los a parar?

’ Não é possível que em uma fábrica com dezenas de líderes, com a polícia, que um grupo de 10 pessoas possa impor terror sobre 2600. Há 18 anos que a Daer não consegue ganhar a comissão interna; na última eleição nem sequer apresentou lista. Assim e no total tem uns 300 votos na fábrica. A comissão interna tem entre 1300 e 1400. Há um grupo que às vezes vai para um lado e outras vai para o outro, que nesse caso se transformou em militante da empresa. Em duas assembléias apareceram com os chefes e os líderes. Votou-se não deixá-los participar. Propuseram levantar a greve, perderam e gritaram com todo mundo, mas não voou nem uma bolachinha. Houve mais de 30 dias com 2600 trabalhadores paralisados, isso é o que querem esconder.

’ Vocês pretendiam fechar a fábrica em julho por conta da gripe A?

’ Pedimos uma semana de licença e a empresa negou. O sindicato propós mobilizar o edifício onde estão os chefes e a comissão interna decidiu apoiar, assim nasceu a acusação por privação ilegítima da liberdade. Uma armadilha gigante. Deram licença de um fim de semana e na segunda-feira estava tudo igual, não haviam desinfetado. Houve muita raiva e voltamos a parar, dessa vez com a comissão interna à frente. Negavam-se a fechar o jardim de infância para que as mulheres continuassem produzindo, mas havia pânico de que a gripe chegasse aos pequenos. Fecharam finalmente o maternal sem dar licença ás mães, que não tinham onde deixar os filhos. A outra grande mentira é o seqüestro dos diretores, motivo que fez demitirem gente: foi uma montagem para varrer a comissão interna e o corpo de delegados, fazer demissões seletivas e acabar com a organização de base. Tão pouco é certo que houve uma tomada, foi uma permanência na fábrica: começaram a dizer tomada para ocultar 36 dias de paralisação e tapar o apoio que têm os demitidos.

’ A vice-ministra Noemí Rial disse que aos delegados só interessa que eles entrem, que o conflito é intersindical.

’Totalmente mentira. Se queremos entrar, é para fortalecer a luta pela re-incorporação de todos.

’ O que vai acontecer com os mandatos de vocês que estão vencidos?

’ Denunciamos uma manobra da empresa e do sindicato, que colocam que nossos mandatos terminaram, que não se prorroga o fato como sempre ocorreu. O ministério disse que não podia fazer nada. Talvez tudo feche para deixar a fábrica sem direção sindical. Sabemos que o sindicato prepara uma convocatória fantasma, sem que entremos, porque se nos apresentamos, passamos a perna na Daer.

’ mas transcendeu que Bogado e você perderiam a eleição.

’ isso é mentira, quem diz isso é quem não conhece Terrabusi. São 16 anos da comissão interna, nas últimas eleições como lista única.

Artigo retirado do jornal Página 12, um dos mais importantes da Argentina.

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