Segunda 6 de Maio de 2024

Debates

DISCUTINDO AS MOBILIZAÇÕES

Debate na Faculdade de Educação da USP: sobre o “pensamento mágico” de Marilena Chauí

21 Jun 2013   |   comentários

É aquela velha história, se algum desavisado ousasse entrar na USP e ir até a Faculdade de Educação, na última terça-feira, encontraria na fala da profa. Marilena Chauí um terreno fértil para a confusão.

Numa mesa que esteve composta também por Bianca (militante do Juntos -MES/PSOL), Carlos Carlos (jornalista da TVT, canal de mídia da CUT), André Ciola, do MPL, além de Diana Assunção, diretora do Sintusp e dirigente da LER-QI, a profa. Marilena, a mais expressiva intelectual petista hoje, resolveu, em meio a todo esse processo, intervir no debate como aquela que está com a visão “para além das esquerdas”, que pensam “pequeno”, não veem as grandes barreiras e grandes lutas que terão de ser enfrentadas nesses tempos.

Marilena Chauí falou de três dos grandes problemas sociais que incendeiam as manifestações atuais: o “inferno urbano”, imerso nas contradições de megalópoles como São Paulo construídas pelo irracionalismo capitalista; a especulação imobiliária e o caos nas questões de moradia no Brasil; o “indecente” e ineficiente transporte coletivo.

Pois bem, segundo a intelectual petista, a grande luta é contra o capital: a chave seria entender que se trata de enfrentar montadoras, empreiteiras e o grande cartel do transporte. Será uma luta dura, que envolve “sangue e mortes” (nas palavras de “quem já viveu isso”).

Uma fala de esquerda? Não, nada há de extraordinário no discurso de Chauí: quando um petista enfatiza a direita, a burguesia, o capital financeiro (e até aqui em geral está tudo muito correto), esconde e quer “preservar” sempre sua posição política institucional. Aqui se desfaz o primeiro “mistério” de seu discurso, porque era tudo para a mobilização não se concentrar contra o governo municipal do PT, de Fernando Haddad, ou seja, entender que a luta é contra o grande capital como se nós, os petistas e o governo estivéssemos num bloco só! Abram o olho, Haddad está dentro dessa máquina burguesa e ainda ontem estava com Geraldo Alckmin no pérfido plano de não reduzir R$0,20 centavos “porque não dava no orçamento” (e nos lucros do cartel).

Mas o discurso de Chauí escondia um “mistério” superior. Começando por supostamente criticar a fluidez do facebook no chamado às manifestações, esses eventos (“passageiros”), “indiferenciados”, “sem controle” (nas palavras dela) acabavam por gerar uma ideia mágica de que após derrubar os R$0,20 centavos, poderia “ousar” ir por mais. Assim, o “pensamento mágico” não entende que a grande luta dura contra o capital é mais difícil do que imagina.

Marilena Chauí, dentro do pensamento que “fala da dura luta contra o capital” mas ainda ontem se calava frente a Haddad dizer que é impossível abaixar R$0,20 centavos no preço da passagem, nos fez lembrar aquela linda frase de maio de 1968: “sejamos realistas, exijamos o impossível” (ela não cabe no pensamento de Chauí, que às vezes parece propor justamente o oposto: “sejamos utópicos, aceitemos o que está dado”).

Voltando ao “mistério chave”, e aqui reside o principal, ela fez questão de dizer que não bastam essas manifestações em Osasco, Guaianazes, zona leste, “aqui e ali”, é preciso se organizar. Está ótimo, Marilena, mas deixe todos nós vibrarmos com a população da Zona Leste, tão arrasada no governo do PSDB e de seu partido, sair às ruas e desbravar as palavras de ordem engasgadas em toda a década de 2000. Evidentemente é preciso se organizar, é preciso construir um partido revolucionário que ultrapasse os limites impostos pela degeneração do PT, mas esse partido deve se construir em conexão com a auto-organização dos trabalhadores e da juventude.

Por fim, Marilena Chauí falou bastante sobre a manipulação da mídia. Nós também não semeamos nenhuma ilusão no jornalismo burguês e estamos contra qualquer tentativa de transformar o movimento num “grande nacionalismo” que se volte contra os partidos de esquerda. Achamos que faz parte sim da ideologia neoliberal. Mas o mais chocante foi Chauí querer misturar tudo isso no termo “massas”. Ontem nós (a esquerda organizada e classista) combatíamos todo tipo de autonomismo que quisesse dizer que as classes acabaram, que a classe trabalhadora não é mais sujeito, que não se precisa mais de partidos e sindicatos (e mantemos esse combate). Mas, Chauí, seu horror ao termo “massa” nesse momento não se refere à ideologia neoliberal, mas sim ao fato de milhões de jovens estarem nas ruas aniquilando um dos pilares do lulismo: a estabilidade social burguesa, o controle da classe trabalhadora e da juventude!

Como terminou dizendo Diana Assunção no mesmo debate, é hora de dar nome aos bois e denunciar que essa fúria das “massas” (num primeiro momento da classe média, mas da juventude trabalhadora que já começa a ganhar cena nos combates) contra a burguesia e o capital mas também contra os governos que, nos termos de Marx, fazem parte do “comitê de negócios comuns da burguesia”, como os do PT, aliado dos mais corruptos e reacionários do parlamento brasileiro. Como afirmou a companheira Diana, toda a tese de Chauí sobre o reacionarismo da classe média, termina servindo para ocultar o verdadeiro antagonismo de classe, que é entre os trabalhadores e a grande burguesia (que está com o governo). A professora, com sua tese, sequer se coloca de fato a favor das manifestações, e suas propostas para dialogar com a juventude, como a de apoiar a “reforma política” por meio da “Constituinte específica” proposta por Dilma, nada mais são do que a velha agenda do PT, agora requentada; não passam de tentativas de mudanças cosméticas, a serviço de restaurar a ordem, e nada têm a ver com os anseios profundos da juventude, das mulheres, do povo negro, da classe trabalhadora, anseios que não podem se cumprir sem escancarar aqueles antagonismos e encarar o combate frontal contra esse sistema de exploração e opressão.

É preciso terminar dizendo, a todos os intelectuais da ordem, inclusive e em primeiro lugar aos petistas: vão ter que continuar se horrorizando com os atos “aqui e ali”, na Zona leste de São Paulo e em todo o Brasil, com as “massas” nas ruas. É, professora Marilena, parece que vai ficar cada vez mais claro que o verdadeiro “pensamento mágico”, é achar que será possível mudar de fato a vida da juventude e todos os oprimidos, por dentro desse sistema de miséria. E então a força das ideias revolucionárias e materialistas de Karl Marx, que dizia que “tudo que é estável e sólido desmancha no ar”, podem ganhar corpo no novo país que irá emergir das atuais manifestações, deixando a burguesia e seus partidos, intelectuais petistas incluídos… à espera de uma “solução mágica”.


Última parte da intervenção de Diana Assunção.

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