Segunda 29 de Abril de 2024

Nacional

NOVOS FATOS NA CRISE DA SAÚDE NO RIO

A agonia do Hospital Universitário da UFRJ

02 Jun 2008   |   comentários

As últimas vítimas da dengue ainda não deixaram os noticiários e já há uma nova crise que atinge a saúde do Rio de Janeiro. Desta vez a crise é menos de calamidade pública e muito mais cotidiana, mas não menos mortal aos trabalhadores e pobres, usuários da saúde pública. Um dos principais hospitais da cidade praticamente deixou de funcionar. O Hospital Universitário da UFRJ, referência nacional em operações de alta complexidade como transplantes, está fechando as portas. Em seu portão uma placa informa “emergência fechada” ; cada paciente que recebe alta significa um leito que é fechado; alas inteiras foram fechadas; cirurgias só ocorrem quando o médico atesta que há insumos básicos disponíveis, como linha de sutura e gaze. Procedimentos tão simples e básicos como hemogramas (exame de sangue) não podem ser realizados.

Esta crise atinge um hospital que também tem como função a formação de novos médicos e profissionais da saúde que ali fazem residência e têm aulas ’ muitas delas agora suspensas ou precarizadas. Esta nova crise da saúde está encontrando maior resistência do que a crise da dengue, ocorrendo manifestações na UNIRIO e UERJ e principalmente na UFRJ, onde já ocorreram dois atos com forte participação de estudantes de medicina, enfermagem, fisioterapia e outros cursos desta área, que paralisaram uma parte da Linha Vermelha.

É chave compreender alguns elementos mais de fundo da crise da saúde nacionalmente para tirar lições que permitam desenvolver todo o potencial desta luta para que ganhe o apoio da população e se volte contra os governos César Maia, Sérgio Cabral, Lula e os empresários da saúde.

A crise dos HUs e do sistema de saúde vigente

As universidades não são instituições que pairam por fora da luta de classes, por fora dos planos dos governos e da burguesia. Seus hospitais expressam ainda mais esta relação. Hoje a agonia do Sistema “Único” de Saúde, as profundas transformações no sistema de saúde expressam os planos do neoliberalismo lulista para a saúde e as massas.

O regime universitário e da saúde vigente previa uma divisão de tarefas entre os hospitais privados, públicos e universitários onde estes últimos, além de arcarem com o ensino e a pesquisa, se especializavam em tratamento de doenças e procedimentos complexos e raros (hanseníase, AIDS, câncer, transplantes, doenças neurológicas, entre outros), os hospitais públicos não universitários oferecerem atendimento básico com pouca verba e os hospitais e laboratórios privados ficavam com as consultas e os “exames” , com o filão rentável. Este sistema está em cheque por distintos projetos dos governos federal e estaduais que favorecem ainda mais a iniciativa privada e os empresários da saúde para que lucram através de “fundações públicas de direito privado” e em detrimento dos interesses da população.
O resultado desta política é que o atendimento a doenças raras e procedimentos complexos deixa de ser feito nos hospitais universitários, gerando crises como a do HU da UFRJ, e este atendimento fica relegado a poucos hospitais particulares, para quem puder pagar, e, ao mesmo tempo procedimentos simples entram em crise por falta de financiamento, multiplicando as filas e mortes, tendo a crise da dengue como maior expressão.

Alguns outros exemplos desta transformação na saúde:

 Hospital das Clínicas em São Paulo, maior hospital da América Latina, foi desvinculado da USP na década de 1980. Falência de sua “fundação pública de direito privado” INCOR e denúncias de corrupção contra a fundação Zerbini. Dois incêndios em um ano por falta de manutenção e hoje há um andar inteiro, com melhores instalações, para consultas e ambulatório aos planos de saúde privados.

 Em 17 de Dezembro do Ano passado Sérgio Cabral conseguiu aprovar a Lei 5164, que regulamenta as fundações de direito privado na saúde pública do estado do Rio de Janeiro.

 Em 2007 Lula enviou ao Congresso Nacional o PL 92/07 buscando regulamentar a implementação de fundações públicas de direito privado na saúde. Em outras palavras, instituir a privatização do sistema público de saúde.

A epidemia de dengue expõe a crise da saúde e a cumplicidade da burocracia sindical

Esta situação calamitosa da saúde ocorre, ao mesmo tempo que surgem sempre novas denúncias de corrupção que mostram o caráter estrutural da corrupção nesta democracia dos ricos. A mesma assembléia legislativa do Rio de Janeiro que aprovou a lei 5164 que regulamenta as fundações públicas de direito privado na saúde do estado, tem 30 de seus 70 membros denunciados por crimes que vão de homicídio a participação nas milícias assassinas de vários morros e estão ameaçados de cassação, isto tudo ainda por cima ligado ao ex-governador Garotinho, presidente regional do partido do atual governador (PMDB). A “democracia” em que vivemos está ocupada por corruptos de alto a baixo que escrevem leis e administram verbas em favor próprio e de outros burgueses, seja por vias “corruptas” ou por privatizações, fundações privadas, PACs...Aos trabalhadores e ao povo, restam empregos precarizados, a dengue e as filas nos hospitais.
Da mesma forma que as principais centrais sindicais (CUT, Força Sindical) e mais fortes sindicatos do país não levaram a frente, nem levam, nenhuma campanha independente contra a corrupção que mostre o caráter estrutural dela, e optam pelo silêncio em defesa dos políticos ligados a elas, também não estiveram à frente de nenhuma campanha em defesa da população do Rio quando bairros inteiros como Jacarepaguá chegavam a índices de contaminação por dengue de 10%. Nem mesmo quando a mídia procurava fazer que cada um culpasse seu vizinho, enquanto César Maia aconselhava o uso de mangas compridas para combater a dengue e Lula e Sérgio Cabral se esquivavam da responsabilidade responderam. Nem mesmo quando César Maia e Sérgio Cabral propuseram como solução o fim das férias, folgas e perseguição aos médicos e demais trabalhadores da saúde a CUT se manifestou. Que não tenha havido no mínimo manifestações operárias e populares contra César Maia, ao menos, é responsabilidade da CUT, Força Sindical e demais agentes governistas no movimento operário.

A esquerda anti-governista (PSOL e PSTU) denunciou a responsabilidades dos governos mas esteve aquém das necessidades que uma crise como esta coloca. O PSOL denunciou a responsabilidades dos governos mas contentou-se em fazer suas figuras públicas tirarem sangue e algumas falas na assembléia legislativa, o PSTU soltou notas e publicou tardiamente um programa mas esteve aquém do que seu peso sindical na Conlutas e nos sindicatos que dirige junto com o PSOL no Rio, se colocassem como uma alternativa independente e de classe na crise.

Lições precisam ser tiradas para que neste novo sintoma da crise da saúde nacionalmente, e no Rio em particular, a classe operária possa oferecer um programa independente e conquistar apoio da população a esta luta.

Por um programa operário independente para a crise do HU e fazer a saúde atender aos interesses dos trabalhadores e do povo

Para a luta do HU ser vitoriosa é necessário estendê-la, tratá-la não como uma crise do HU da UFRJ, mas como a crise de todos HUs e mais ainda como expressão concreta dos planos do governo Lula, Cabral e Maia para a saúde e para os trabalhadores. É preciso transformar esta luta num marco de resistência a estes planos e permitir trazer à tona a comoção contra a epidemia de dengue dirigindo-a contra os governos e a burguesia.

Para isto, é necessária a mais rigorosa independência política. A reitoria e o diretor do HU podem tentar se mostrar defensores da saúde para melhor barganhar seus negócios com o governo, mas o movimento deve responder mostrando sua responsabilidade pela crise, diferentemente do que ocorreu no ato do dia 30/5 quando o diretor falou na assembléia defendendo a terceirização e não pagou nada por isto.

A transformação desta “luta específica” do HU em luta política passa em primeiro lugar por exigir da esquerda antigovernista como PSTU e PSOL e dos sindicatos que influenciam, como a Adufrj, Sepe, Sindisprev-RJ e do ANDES-SN, que passem das palavras aos atos. Chega de denúncia em abstrato das fundações públicas de direito privado, aqui elas estão! Chega de denúncia esporádica contra os governos e sua responsabilidade pela epidemia da dengue, aqui está o resultado cotidiano da política destes governos para a saúde e para os trabalhadores e o povo! Por uma campanha, inclusive na mídia burguesa, impulsionada pelos sindicatos e pela Conlutas! Nesta campanha a Conlutas deveria fazer exigências e mostrar o papel traidor que tem cumprido os sindicatos da CUT, começando pelos da área da saúde.

”¢ Por mais verbas para a saúde e educação mediante o não pagamento das dívidas interna e externa e confisco dos bens dos corruptos!
”¢ Punição dos culpados pela epidemia de dengue começando por César Maia!
”¢ Pela incorporação e iguais salários e iguais direitos a todos terceirizados!
”¢ Salário Mínimo do DIEESE (R$ 1900,00) para todos trabalhadores!
”¢ Estatização sem indenização de todos hospitais, clínicas e laboratórios privados, para usar toda a capacidade de exames, consultas, leitos para atender aos interesses da população.
”¢ Por comitês de médicos, trabalhadores da saúde, estudantes de medicina e usuários para gerir os hospitais e o sistema de saúde.
”¢ Por uma campanha popular entre todos os usuários para cercar de apoio o conflito em defesa da saúde pública e um plano de lutas para impor estas demandas.
”¢ Por um encontro de representantes de todos os sindicatos da saúde da Conlutas, de professores e funcionários das universidades para coordenar e estender o conflito.

O papel que os estudantes podem ter nesta luta

A universidade no Brasil é profundamente elitista e racista. Na UFBA recentemente um coordenador da medicina quis reintroduzir os preconceitos racialistas. Aqui no Rio várias universidades públicas não oferecem cursos noturnos, impedindo os estudantes que trabalham de estudar, isto sem contar o filtro de classe que é o vestibular. Na UERJ há um laboratório de “antropologia física” , “disciplina” que é praticada pela polícia nos morros!

A presente luta em defesa dos HU”™s e do HUCFF (UFRJ) em particular permite que os estudantes rompam com este isolamento social e de classe, que são as universidades e atacar de frente os projetos do governo como o REUNI e PROUNI, que mediante abertura de cursos noturnos e compra de vagas em particulares procuram resolver duas crises da universidade, a de “democratização da universidade” e a de excesso de vagas nas universidades particulares. Como? Expandindo as universidades federais, sem infra-estrutura, e em base a precarização do ensino e pesquisa, submetendo de forma mais direta à formação de mão-de-obra barata (através dos ciclos básicos e novos vestibulares para a “especialização” ) e produção de conhecimento atrelada aos interesses da burguesia nacional e internacional através dos projetos de financiamento, patentes, entre outros.

Para responder a esta situação é necessário que os estudantes e suas entidades como CA”™s e DCE”™s estejam a serviço de produzir um conhecimento radicalmente distinto, que sirva aos interesses da população e para organizar os estudantes a defenderem não “sua universidade” , mas uma universidade aberta aos trabalhadores e seus filhos através do fim do vestibular e estatização das universidades particulares. Nesta luta é necessário avançar de mostrar a crise do HUCFF apenas como crise da falta de aulas, mas como continuidade de um descaso que mata (dengue!). Os estudantes precisam se organizar para que esta luta deixe de ser só sua e passe a ser uma luta dos trabalhadores e do povo!

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