Sexta 3 de Maio de 2024

Nacional

DEBATE COM A ESQUERDA DIANTE DAS ELEIÇÕES

Uma oportunidade perdida para preparar a vanguarda

17 Oct 2008 | Nas eleições municipais recém concluídas, as organizações políticas de esquerda deveriam ter colocado sua intervenção política a serviço de preparar os setores de vanguarda da classe trabalhadora e da juventude, para enfrentar os impactos da crise econômica internacional sobre o Brasil; com agitação de um programa operário independente, que responda aos ataques que estão por vir ou que já começaram a chegar na medida em que a burguesia vai descarregar seus prejuízos sobre as costas dos trabalhadores. Lamentavelmente, não foi isso que observamos.   |   comentários

PSOL: um partido que diz defender os interesses dos trabalhadores, mas vota leis antioperárias, faz coligações eleitorais com partidos burgueses e recebe financiamento de grandes monopólios capitalistas

O PSOL, que já vinha de votar uma lei que atacava diretamente os trabalhadores [1], nestas eleições aliou-se com partidos burgueses e aceitou o financiamento de campanha de um dos maiores monopólios capitalistas brasileiros, o grupo Gerdau, cujo dono foi um reconhecido apoiador do golpe militar de 1964. Estes foram apenas os fatos mais marcantes de uma campanha que em seu conjunto pouco se diferenciou das promessas “nos marcos da ordem” , que caracterizaram as campanhas dos partidos dominantes, a ponto de destacar como parte de seus programas municipais a consigna: “Mais polícia nas ruas!” . Seja pela própria força do lulismo e do conservadorismo (expresso em alto um nível de reeleição) ou pelo excesso de sua adaptação às “regras do jogo” , o PSOL não conseguiu eleger nenhum prefeito e apenas 25 vereadores, num universo de 52 mil vagas nas Câmaras Municipais; e obteve 800 mil votos para prefeitos, bem distante dos 6,5 milhões de votos que Heloísa Helena recebeu nas eleições presidenciais de 2006.

Nestas eleições, o PSOL se consolida em um patamar superior, como um partido que diz defender os interesses dos trabalhadores, mas que tem uma estratégia de conciliação com setores opositores da burguesia para tentar levar adiante um projeto de gestão dos negócios capitalistas com maior intervenção estatal e participação popular. Ainda que até agora essa estratégia não tenha ganhado maior respaldo entre setores burgueses, não podemos excluir a possibilidade de que se fortaleça na medida em que a crise económica internacional se instale no Brasil. Porque, se no último período o que predominou é uma importante unidade burguesa em torno ao esquema político económico lulista, a crise vai necessariamente atacar setores capitalistas que podem buscar novas alianças e projetos políticos alternativos nos marcos do capitalismo.

Hoje, quando o capitalismo em crise trás à tona todo tipo de discursos e propostas que buscam “regulá-lo” para minimizar seu DNA completamente anárquico e irracional, setores como o PSOL, que representam este tipo de projetos no Brasil e que podem vir a ser fortalecer nessa “onda” internacional, precisam ser especialmente combatidos. Todo discurso a favor de um capitalismo mais “regulado” é inevitavelmente cúmplice dos enormes ataques que a burguesia terá que descarregar sobre o proletariado para sair desta crise. São discursos que devem se enfrentar nos locais de trabalho e estudo com a simples conclusão de que o capitalismo não dá mais, e que é hora dos trabalhadores se prepararem novamente para tomar o poder.

A conseqüências da adaptação do PSTU ao PSOL

O PSTU, apesar de reivindicar a revolução operária e socialista, ao participar das eleições como uma sombra na Frente de Esquerda encabeçada pelo PSOL, confunde os setores de vanguarda e dificulta a luta pela independência de classe.

Os companheiros do PSTU precisam tirar como balanço destas eleições que ao se colocar lado a lado do PSOL, como se fossem parte de um mesmo bloco “socialista” , acabam cobrindo pela esquerda e fortalecendo o projeto reformista de Heloísa Helena, e não fortalecendo a luta para desmascarar este projeto, como acreditam os militantes do PSTU. Esta é uma conclusão que salta do próprio resultado eleitoral.

Apesar da direção do PSTU apresentar os resultados mesclando os votos no PSOL e no PSTU para dar a entender que o PSTU aumentou sua influência, a análise dos votos que recebeu cada legenda separadamente é cruel. A soma total dos votos para prefeito no conjunto dos partidos da esquerda antigovernista (PSOL, PSTU, PCB e PCO) em 2008 foi de 946 mil. Isso representou um significativo aumento em relação às últimas eleições municipais em 2004, quando a esquerda antigovernista somada, neste momento composta apenas pelo PSTU, o PCB e o PCO, recebeu 245 mil votos. Entretanto, este crescimento dos votos na esquerda antigovernista foi propiciado centralmente pelo PSOL, que representa 84% do total, e em detrimento dos partidos que reivindicam a independência de classe como o PSTU e do PCO, que diminuíram substancialmente o número de votos que receberam. O PSTU, que em 2004 havia recebido 183 mil votos para prefeito e 130 mil para vereador, em 2008 recebeu 77 mil e 74 mil, respectivamente. Esta é uma demonstração cabal de que ao ficar a reboque do PSOL, o PSTU fortalece seu adversário e não a si mesmo. Conclusão esta que se vê ainda mais reforçada quando verificamos que o PCB, que optou por guardar uma maior autonomia em relação a Frente de Esquerda, com candidatos próprios na maior parte das cidades, aumentou a quantidade de votos para prefeito: de 19 mil em 2004 para 64 mil em 2008 [2].

Essas são as conseqüências sofridas pelo PSTU por sua política de privilegiar suas alianças eleitorais e sindicais com o PSOL, em detrimento da luta pela independência política dos trabalhadores, impossível de ser conseqüentemente levada à cabo misturando bandeiras com o PSOL.

Uma oportunidade perdida

O fato de que a esquerda antigovernista tenha recebido uma votação extremamente marginal, não significa que inexistisse qualquer espaço à esquerda do governo Lula e dos partidos burgueses de oposição. Ao contrário, historicamente altos índices de votos nulos e brancos nas capitais do país foram uma expressão distorcida do descontentamento que existe em setores minoritários ’ mas importantes. Fenómeno este que se expressou também nos muitos setores que, desiludidos com o “mais do mesmo” , votaram de “nariz tapado” nos candidatos “menos piores” .

Desde a LER-QI, defendemos que a Conlutas impulsionasse uma Frente Classista nessas eleições. Junto com o Sindicato de Trabalhadores da Universidade de São Paulo (Sintusp), levamos esta proposta ao 1º Congresso da Conlutas (julho de 2008), nas vésperas das eleições. Ao reunir cerca de 3 mil delegados trabalhadores e estudantes de todo o país, poderia ter sido impulsionada uma Frente Classista que, baseada em um programa operário independente, preparasse os setores de vanguarda para enfrentar as perspectivas que se abrem com os impactos da crise económica sobre o Brasil. Entretanto, o PSTU, direção majoritária da Conlutas, foi um obstáculo para que nossa proposta fosse levada a diante e deixou a Conlutas desarmada ao preferir conformar uma coalizão eleitoral com PSOL na “Frente de Esquerda” .

[1Em 2007, o PSOL votou no Congresso a favor da Lei conhecida como Super-Simples, que flexibiliza os direitos dos trabalhadores das pequenas e médias empresas.

[2O PCO, Partido da Causa Operária, organização internacionalmente ligada ao Partido Obrero na Argentina, viu sua votação para prefeito cair de 43 mil em 2004 para 10 mil em 2008. Este fato deveria servir para que o PCO refletisse sobre seu equivoco em caracterizar a Conlutas e o PSTU como reacionários e a LER-QI como “seguidores dos reacionários” .

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