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Cultura

Stagium: a construção de um ballet com voz popular

06 Feb 2015   |   comentários

Em plena ditadura civil militar surgia uma das mais importantes e contestadoras companhias de ballet do Brasil, a Stagium. Companhia fundada em 1971 por Decio Otero e Marika Gidali sob os olhos dos burros censores como diria o próprio fundador da escola.

Em plena ditadura civil militar surgia uma das mais importantes e contestadoras companhias de ballet do Brasil, a Stagium. Companhia fundada em 1971 por Decio Otero e Marika Gidali sob os olhos dos burros censores como diria o próprio fundador da escola: "A censura era muito burra. [Eles pensavam que] O ballet não tem palavra entao não tem perigo. Mas tem perigo porque a stagium era a única cia na década de 70 que subia no palco pra dizer coisas..." Por ter conseguido burlar a censura que não conseguia entender nada através da dança conseguiu não ser amordaçada e contestou a alienação.

É preciso dizer que a Stagium nunca tratou a dança apenas como algo belo a se exibir nos palcos de grandes teatros. A dança para Decio e Marika é um meio de diálogo, e a tecnica a se dançar não é um fim, mas um meio de se conseguir esse dialogo. Essa concepção tem relação direta com o Brasil. Em um país grande, de diversidade cultural incomparável, e não elitista o ballet não poderia permanecer enclausurado em teatros municipais repetindo o que se era feito na Europa. Nas palavras de Decio: "Nossas realidades e necessidades são outras. A riqueza de nossa musica, nosso teatro, cinema e literatura abriram-me as amarras possibilitando-me criar um repertório com forte identidade latino-americano."

A companhia passou então a trazer para suas coreografias aspectos da cultura brasileira sem perder de vista o ballet e deixando de pertencer apenas a um estilo não podendo mais ser classificada. Não era contemporâneo, pós-moderno, era ballet brasileiro que nascia. Se na Europa a peça Romeu e Julieta, de William Sheakspeare ganhava ballet, a Stagium transformava o "Grande Sertão Veredas" no ballet Diadorin. Foi a primeira a colocar em seus espetáculos musica brasileira, misturada a musica clássica, sons da natureza... Enfim, a liberdade de criação.

Conseguiu conquistar o publico e apresentar o ballet para além das elites levando seus espetáculos para fora do palco. Se apresentaram em favelas, igrejas, praias, hospitais, metrôs, hangares, tribos indígenas, pequenas cidades, prisões. É mais correto dizer que tornou tudo, todo lugar, possível de ser um palco. Buscou se construir para além do eixo Rio - São Paulo e foi isso que a forjou. Decio e Marika sempre indicam a experiência de se apresentar em uma barca ao longo do rio São Francisco por 15 dias como o divisor de águas da escola e do ballet no Brasil. Foi durante essa experiência que notaram que era preciso se comunicar com o publico, dialogar, haver troca para que a arte se realizasse.

Suprimiram os grandes cenários e figurinos de seus ballets. Nada disso era necessário, nas palavras de Decio: "o corpo falava por si só." Eles desconstruíram o bailarino bobo que entra no palco apenas para exibir o resultado de infinitas repetições para construir o bailarino que sobe ao palco para dizer alguma coisa através do seu corpo e que sabe tudo a respeito do que quer dizer.

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