Quarta 1 de Maio de 2024

Internacional

APÓS 17 DIAS DE LUTA, A HISTÓRICA GREVE DOCENTE FEZ RETROCEDER O GOVERNO SCIOLI

Primeiras lições de uma greve histórica

06 Apr 2014   |   comentários

Os professores de Buenos Aires protagonizaram uma luta histórica com 17 dias de greve ativa, o que nos impõe um balanço sério e profundo, destacando as conquistas e assinalando as debilidades. Rompemos o teto salarial do governo nacional e provincial, que queriam nos impor 22%. Conseguimos 38% de aumento para o professor que acabou de começar, o que, embora ainda esteja longe da cesta básica familiar, supera o que o governo e a oposição patronal (...)

Que considerações você tem acerca da greve que acaba de terminar na província de Buenos Aires?

Nathalia González Seligra (Sec. Direitos Humanos Suteba Matanza): Quero começar repudiando a repressão que sofreram nossos companheiros docentes que se manifestavam na frente da Legislatura provincial, que se soma à repressão sofrida em outras províncias anteriormente. Após a repressão do governador Urtubey, anunciaram greve por tempo indeterminado. Em La Rioja, docentes e pais tomaram escolas por aumento salarial e obras de infraestrutura. Em Neuquén seguem as greves, frente a ausência de uma proposta salarial por parte do governador Sapag. Insistimos que a CTERA convoque uma greve nacional já, em repúdio à repressão e para unificar a força de todos os docentes do país, enquanto ainda existem províncias que fecharam as datas-base do setor.

Os professores de Buenos Aires protagonizaram uma luta histórica com 17 dias de greve ativa, o que nos impõe um balanço sério e profundo, destacando as conquistas e assinalando as debilidades. Rompemos o teto salarial do governo nacional e provincial, que queriam nos impor 22%. Conseguimos 38% de aumento para o professor que acabou de começar, o que, embora ainda esteja longe da cesta básica familiar, supera o que o governo e a oposição patronal queriam dar. Obtivemos um valor médio de aumento geral para os docentes de 30,9% e impusemos que se tirasse o “presentismo” da discussão salarial, e que não se descontassem os dias de greve. Rechaçamos que a educação seja considerada um “serviço essencial” e não obedecemos os juízes amigos de Scioli que nos ordenavam que voltássemos a trabalhar, violando o direito de greve. Milhares rechaçaram a oferta do governo; o que obtivemos foi produto de nossa luta e do papel combativo dos SUTEBAs [seccionais sindicais dos trabalhadores da educação de Buenos Aires, NdT] recuperados pela esquerda. Lamentavelmente não pudemos evitar que Baradel, o dirigente oficial da SUTEBA provincial, acabasse prematuramente com nossa luta nos impedindo de ir por mais.

O que foi votado acerca da oferta do governo?

Gabriela Macauda (Sec. Geral adjunta SUTEBA Tigre): Nas assembleias da SUTEBA Tigre, Matanza, Quilmes, Ensenada, La Plata, Berazategui, Escobar, Bahía Blanca, Marcos Paz, em San Martin, General Sarmiento, entre outras, votamos por amplíssima maioria por rechaçar a proposta de Scioli. Por um lado, porque não era suficiente frente a escalada inflacionária e os aumentos de impostos. Defendemos nosso salário, mas também a educação pública. A renda mínima familiar atualmente custa em torno de $10.000 pesos, o que significa que inclusive com o aumento vamos ter que continuar trabalhando em pelo menos dois cargos para chegar ao fim do mês. Isto vai deteriorando nossas condições de vida e trabalho, atacando a qualidade do ensino. Por outro lado, e muito importante, havia força para mais. Nosso movimento estava em ascenso, como se viu na mobilização de mais de 20.000 professores no Ministério da Educação em 26/03 e nas marchas distritais como a de mais de 10.000 professores do SUTEBA La Matanza, junto com trabalhadores da educação, da saúde, ferroviários, trabalhadores e desempregados, ou a do SUTEBA Ensenada e La Plata com estatais e trabalhadores do estaleiro Rio Santiago. Ademais, existem 8 províncias que seguem na luta e não podemos deixá-las sozinhas lutando isoladas, como quer impor a CTERA desde o começo do ano.

Que outras conquistas teve essa luta?

Marisa Damiani (SUTEBA Quilmes): Ademais, voltando as conquistas de nossa luta, temos que destacar que contra a “demonização” dos docentes que começou com CFK nas sessões legislativas nos tratando como vagabundos e faltosos, e apesar do poder que tem a mídia como formadora de opinião, não puderam nos dividir e nem nos derrotar. Como nunca antes tivemos o apoio dos pais, estudantes, trabalhadores e moradores da comunidade, seja nas marchas, vindo nas assembleias ou nos dando ânimo desde a varanda ou do armazém do bairro. Isto foi muito emocionante e cumpriu um papel fundamental que nos deu moral para seguir lutando. Nem 678, nem TN [duas cadeias televisivas, NdT], nem CFK, nem Massa pedindo para os professores voltarem às escolas, puderam quebrar este apoio operário e popular a nossa greve. Agora mesmo em La Rioja existem escolas tomadas por pais que pedem aumento para os professores, e os docentes de Salta seguem reivindicando e foram reprimidos.

Qual foi o papel da burocracia de Baradel e da CTERA?

María Díaz Reck (SUTEBA La Plata): Baradel se viu obrigado a sustentar a greve por 17 dias graças a raiva na base e ao peso da oposição de esquerda, que no ano passado lhe arrancou 9 seccionais e outras que a Celeste oficial [direção burocrática dos professores, NdT] manteve com fraude, como San Martín ou Esteban Echeverria. A raiva dos professores diante de tamanha subordinação da burocracia ao governo nacional, que vinha nos atacando e desmantelando a educação pública, era enorme. Durante todo o conflito se articulou com Yasky e Maldonado que deixaram isolada nossa luta, e se negaram a chamar uma greve nacional e um plano de luta de CTERA e da CTA, para que a luta dos docentes bonaerenses e de todo pais triunfasse.
Baradel aproveitou o retrocesso que impusemos ao governo de Scioli – que teve que melhorar a oferta salarial e retroceder em seu ataque – e no Plenário de Secretários Gerais acabou com a greve de maneira antidemocrática, com assembleias convocadas improvisadamente e amparados em seus estatutos antidemocráticos, nos quais valem o mesmo o voto de uma assembléia de 15 professores em Exaltación de La Cruz que o voto de uma assembleia com mais de 1400 professores em La Matanza. Eram necessárias assembleias convocadas com tempo e preparação e um congresso provincial de delegados com mandatos convocado pelo SUTEBA central para decidir democraticamente o destino da greve, pois havia força para ir por mais.

Três lições.

Seguir recuperando os SUTEBA e a CTERA.

NGS: Esta greve histórica voltou a colocar a necessidade de recuperar o SUTEBA e a CTERA [Confederação dos Trabalhadores da Educação, NdT] para os trabalhadores da educação. O avanço dado pelos professores e professoras ao recuperar 9 seccionais, ainda sendo um importante ponto de apoio como mostrou a greve, foram insuficientes nesta primeira batalha para superar a burocracia sindical de Baradel, Maldonado e Yasky. Temos que arrancar o SUTEBA e a CTERA da burocracia kirchnerista que mantém nosso sindicato e a confederação divididos ou esvaziados, como impôs o menemismo desde os‘90. Mas esta luta para recuperar nossas organizações anda de mãos dadas com a sua transformação desde a raiz para colocá-los a serviço dos interesses do conjunto dos trabalhadores. Devemos transformar os estatutos burocráticos do SUTEBA, começando pelas seccionais que já recuperamos, como começaram a discutir na última assembléia de SUTEBA Quilmes.

Nos unirmos aos trabalhadores.

GM: A luta nos uniu aos pais de nossos estudantes que também são trabalhadores e nos apoiaram. Frente à paralisação nacional das CGT de Moyano e Barrionuevo em 10/04 com apoio da CTA Micheli, temos que seguir unidos contra o plano de ajustes e aumento de impostos do governo, e pela absolvição dos petroleiros de Las Heras. Teremos que tomar em nossas mãos esta paralisação fazendo assembléias em todos os distritos e exigindo a Baradel e Maldonado que convoquem um congresso de delegados para votar a greve junto com o resto dos trabalhadores.

Pela independência política dos trabalhadores.

MD: Os docentes foram protagonistas de lutas históricas nos últimos fins de ciclo: 1988, 1997 e 2001, inclusive confluindo com setores da esquerda. Em todos esses processos se produziu uma ruptura com os governos de turno, mas isto era capitalizado por outras variantes patronais que se apresentavam como opositoras ou progressistas.

Recordemos que a Alfonsín se seguiu Menem, a Menem seguiu-se De La Rua e após a crise de 2001, foi a hora do kirchnerismo, com o qual os professores estão ajustando contas agora. Todas essas mudanças foram apoiadas pela direção dos SUTEBAs e da CTERA. Neste fim de ciclo não podemos repetir a experiência de que nossas organizações se coloquem a serviço de políticas patronais, sejam oficialistas ou opositoras. Nesta greve todos os políticos patronais, desde Scioli, Massa ou Macri que estiveram com Cristina, e toda a burocracia, tanto a oficialista de Baradel e Maldonado como a opositora da CTA michelista (aliada a FAP de Binner), responde a distintos interesses empresariais. A partir de La Marrón [agrupação classista e antiburocrática dos professores impulsionada pelo PTS e independentes, NdT] nos propusemos construir uma forte corrente que lute no interior dos sindicatos pela independência política de todas as variantes patronais, para que nossas organizações estejam a serviço de nossos interesses de classe.

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