Domingo 5 de Maio de 2024

Juventude

Movimento Hip Hop

O grito da juventude tem que continuar independente

06 Jul 2003   |   comentários

O capitalismo, não satisfeito em submeter a condições de escravidão milhões de trabalhadores no mundo inteiro, super explora ainda mais o povo preto e a juventude, impondo salários ainda menores, empregos precários e um nível de desemprego ainda mais gritante.

A resposta a essa opressão e exploração da burguesia e do capitalismo se mostra nas diversas revoluções que aconteceram na história e nos processos revolucionários e mobilizações na atualidade nos quais a juventude cumpriu e ainda cumpre um papel fundamental em aliança com os trabalhadores.

Trotsky dizia que a juventude é uma fonte inesgotável de energias. Isso se expressa no Brasil hoje, quando mesmo não havendo um processo revolucionário - momento em que a juventude vai se expressar nas fábricas, nas manifestações de rua, no enfrentamento com a polícia e com o Estado - a juventude lança seu grito contra o capitalismo através do Hip Hop.

História do Hip Hop: do grito à organização e ação

No fim dos anos 60, em meio a um contexto de manifestações de massa contra a guerra no Vietnã, os bairros pobres nos Estados Unidos eram o cenário em que o Hip Hop dava seus primeiros passos na junção de três manifestações: a música Rap (que teve sua origem na Jamaica), a dança Break e a arte plástica do graffiti nos muros.

Herdando o caráter de contestação do movimento Black Power aqueles jovens pretos e latinos, todos pobres, perceberam a necessidade e possibilidade de expressar seu descontentamento com a repressão policial, a opressão aos pretos, as gritantes desigualdades entre ricos e pobres, enfim, algumas das condições que sustentam o capitalismo ao mesmo tempo que vão sendo reveladas como contradições que não podem ser mantidas.

Dessa forma, já no início de sua história, o Hip Hop se apresenta como uma voz dos explorados e oprimidos pelo capitalismo. Esses importantes aspectos aparecem também na história do Hip Hop no Brasil, que chega ao país no início dos anos 80. Dentre as inúmeras organizações de Hip Hop - chamadas "posses" - poderemos identificar significativas iniciativas que vão além da denúncia, criando alternativas de organização independente da juventude na luta contra a miséria capitalista.

A burguesia precisa sufocar essa força

A rebeldia desses jovens, em sua maioria pretos, incomoda a burguesia. Esta, via os partidos reformistas e as ONG’s tentam e muitas vezes conseguem, domesticar o movimento.

Do ponto de vista dos partidos reformistas, o movimento já vem sendo pressionado por mandatos (e também candidaturas) de diversos partidos, principalmente a partir de quando o PT se fortalece nos municípios e nos estados. Desde suas campanhas eleitorais, o PT tenta atrelar o movimento para se aproximar dos trabalhadores, do povo preto e da juventude na busca de votos.

O PT, aproveitando-se do fato de ser visto como um partido que defende os trabalhadores, utiliza-se da energia, criatividade e influência que o Hip Hop tem, que pode ser canalizada no sentido revolucionário, para alimentar a ilusão das massas de que é possível sair das condições de miséria e escravidão pela via das eleições e do Parlamento. Esses partidos reformistas, quando se tornam governo utilizam-se do aparato estatal para, concedendo algumas migalhas de estrutura, atrelar o movimento aos seus governos, impedindo a sua independência. Com isso, fazem um grande serviço para a burguesia aproveitando-se da ligação que têm com o movimento de massas e a juventude.

Mas não é só isso. O PT chama o movimento a compactuar com suas alianças com a burguesia. Quer nos fazer acreditar que os chamados "programas sociais" - que não ferem em nada os interesses dos burgueses - solucionarão os problemas dos trabalhadores.

Para exemplificar, em algumas prefeituras, o PT incluiu o Hip Hop no programa "bolsa-trabalho", ou seja, tenta fazer de uma manifestação que contesta o sistema num instrumento de "inclusão social" e geração de renda, medida paliativa, numa lógica que oculta o fato de que aqueles que vivem com salários de fome são quem produzem as riquezas concentradas nas mãos da burguesia.

Esse processo que vem se fortalecendo nos municípios e nos estados, agora virá com muito mais peso pelo governo federal.

Outro eixo da política de cooptação do regime são as grandes corporações. É evidente a política da burguesia de esvaziamento de conteúdo da arte de contestação - como aconteceu com outras manifestações em décadas passadas - e exploração da estética que se extrai dessas manifestações, tornando-as meros produtos. Isso se dá através de comerciais publicitários, da indústria fono-gráfica e dos veículos da grande mídia, pertencentes e a serviço da burguesia. A música Rap sofre essa pressão com maior intensidade, entretanto, verificamos hoje essa ofensiva aumentando sobre todo o Hip Hop.

Vemos também os grandes bancos tentando controlar e institucionalizar o Hip Hop. O (anti-spam-(anti-spam-Bank)) Boston, que está entre os maiores credores da dívida externa do país, teve a fachada de uma de suas agências grafi-tada. Tal fato ocorreu para divulgar a parceria do banco com o projeto de uma ONG de São Paulo, que tem como proposta que o graffiti seja um meio de "inclusão social".

Ora, o que significa "inclusão social" numa sociedade baseada no lucro de poucos e na miséria de muitos? Isto significa que as grandes corporações, ao mesmo tempo em que promovem a exploração de milhões de trabalhadores, financiam projetos que tentam se apresentar como solucio-nadores dos problemas sociais a fim de conter as mobilizações e a organização da luta revolucionária dos trabalhadores.

Vale dizer ainda que as empresas deixam de pagar parte dos impostos por financiarem tais projetos, mais um benefício que o Estado capitalista oferece à burguesia.

As grandes corporações, a burguesia e seus governos, entretanto, estão muito distantes das bases do movimento Hip Hop para cooptá-lo de conjunto. Para isso, eles financiam e se articulam com as ONGs e com o chamado "terceiro setor". Querem atrelar os jovens com a consciência mais avançada aos "projetos sociais" voltados a questões pontuais, para que estes jovens proletários, devido à sua influência sejam interlo-cutores da política da burguesia.

Partindo da afirmação de que o socialismo fracassou e que o Estado não é capaz de responder às demandas da população, o discurso de sustentação das ONGs traz a idéia de que a "sociedade civil" deve se organizar para solucionar problemas sociais. A idéia de "sociedade civil" nega o antagonismo entre a burguesia e o proletariado, dizendo que todos devem se unir, ou seja, nega a existência da luta de classes.

As ONGs são um braço de sustentação do capitalismo, portanto, nunca serão um instrumento de luta revolucionária contra esse sistema, ao contrário do que muitas pessoas acreditam.

Pela auto-organização do Hip Hop

Em resposta a todas essas tentativas de cooptação, há uma parcela do Hip Hop mais avançada que aponta a necessidade de independência e de que não seja destruído o caráter combativo do movimento. Para isso, é necessário antes romper com essas instituições do capitalismo. Alguns grupos já dão mostras de desacordo com esse processo. Em São Paulo, por exemplo, o Núcleo Rotação, grupo que atua no movimento em torno das questões de raça, classe e gênero, retirou-se da organização da Semana de Cultura Hip Hop, promovida pela ONG "Ação Educativa". A tentativa de esvaziamento político do evento e a intenção de buscar patrocínios de grandes bancos e empresas foram os pontos de desacordo expostos pelo núcleo no momento de sua ruptura.

Para sustentação financeira do movimento, abre-se o debate sobre a necessidade de não mais depender das instituições do capitalismo. Só será possível garantir a autonomia ideológica e política quebrando as correntes da dependência financeira do movimento. Assim, construir uma alternativa de auto-sustentação do movimento é um desafio que se coloca.

Ao mesmo tempo, a partir da compreensão de que o grande inimigo é a burguesia, fica evidente que a relação do Hip Hop com outros movimentos e organizações dos trabalhadores, como os sindicatos, poderão provocar avanços no sentido de que a união poderá existir entre os trabalhadores e o povo pobre e nunca com a burguesia.

Cada posse, na região em que já atua, pode cumprir o papel de promover o debate sobre os rumos do Hip Hop.

Nessa perspectiva, as articulações que reúnem essas posses são espaços em que esse debate pode ser ampliado, sendo que cada posse levará as reflexões e propostas vindas do seu bairro ou cidade - no caso das cidades menores.

Assim o Hip Hop estará dando passos fundamentais para garantir a independência do movimento, na construção da auto-organização do movimento, fortalecendo o potencial revolucionário dessa juventude que já não mais suporta a escravidão do capitalismo.

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