Sexta 3 de Maio de 2024

Teoria

SOBRE A ATUALIDADE DO LEGADO DE LEON TROTSKY E DA IV INTERNACIONAL

Nos limites da restauração burguesa

02 Nov 2011   |   comentários



A segunda fase da crise mundial com epicentro na Europa, com “guerra de moedas” e resgates multi-milionários cada vez mais impotentes para freá-la, mostram os limites do capitalismo para garantir sua reprodução como sistema. Por sua vez, sem que tenha ainda surgido uma potência para substituí-lo, o imperialismo norte-americano viu seu retrocesso histórico aprofundar-se, e é neste marco que se vê obrigado a lidar com as crescentes tensões geopolíticas geradas pela crise [1].

No terreno da luta de classes, já estamos vendo as primeiras consequências da crise mundial. Depos da Grécia, a poderosa classe operária francesa entra no cenário da crise tensionando seus músculos e fazendo um primeiro reconhecimento de forças, que apesar da aprovação parlamentar da reforma previdenciária deixa colocado o início de uma nova etapa com características pré-revolucionárias na França, enquanto as tentativas de descarregar a crise sobre os trabalhadores abrem perspectivas de novos enfrentamentos em vários países da Europa. Hoje vemos como no Magreb proliferam as mobilizações populares, com a Tunísia como epicentro.

Primeiras batalhas que se dão após anos em que vimos presenciando a recomposição social e também reivindicativa da classe trabalhadora. Contudo, esta recomposição parte de uma situação de atraso político do movimento operário com poucos precedentes. Há uma aguda crise de subjetividade do proletariado, fruto da ofensiva neoliberal, da restauração capitalista nos ex-estados operários burocratizados e a desmoralização, produto da identificação do stalinismo como “socialismo real”.

Esta contradição entre a reatualização das premissas objetivas para a revolução proletária e a crise de subjetividade que atravessa o movimento operário é o único ponto de partida para uma compreensão profunda das tarefas dos revolucionários hoje. Se a atualidade do marxismo está dada pela persistência das condições que lhe deram origem, e dentro dela a do marxismo clássico do século XX, pela continuidade das condições da época imperialista de declínio do capitalismo, o legado de Trotski, fundador da Oposição de Esquerda e da IV Internacional, tem um significado essencial, como o único ponto de partida para compreender a contradição que vivemos (entre as condições objetivas e subjetivas) para desentranhar as causas e conseqüências da mesma, e pensar as tarefas dos revolucionários em uma situação histórica onde ao calor da crise começam a dar-se novas condições para avançar na reconstrução do marxismo revolucionário, que como não poderia ser de outra forma, estará indissoluvelmente ligado ao desenvolvimento dos grandes acontecimentos da luta de classes.

Parte I – A etapa da “restauração burguesa”

O século XX deu nascimento à época imperialista com uma primeira etapa atravessada por duas guerras mundiais, o triunfo da revolução russa, a crise dos anos 30 e o ascenso do fascismo; com o pós-guerra teve lugar o surgimento de uma segunda etapa, marcada pela Ordem de Yalta, à qual nos referiremos mais adiante; o ano de 1989, como data emblemática, coroou o início de uma terceira etapa da época de crises, guerras e revoluções, cujo traço distintivo podemos sintetizar em duas palavras “restauração burguesa”. Hoje, a crise mundial e as profundas consequências históricas que se desprendem dela nos põe na aurora de uma quarta etapa marcada pela reatualização de condições clássicas da época. Porém a história não se repete, a compreensão das contradições acumuladas sob a “restauração burguesa” constituem o novo ponto de partida para delinear as características do teatro de operações das batalhas de classe dos próximos anos.

Restauração absolutista e “restauração burguesa”

As comparações entre a revolução burguesa e a revolução proletária sempre serviram como ponto de referência para os marxistas clássicos. Ali por volta de 1926, para explicar o fenômeno novo da burocratização do primeiro estado operário da história, não casualmente entre as fileiras bolcheviques foram buscadas referências no processo da revolução burguesa na França de 1789. A mesma havia percorrido um ciclo completo que mostrava diferentes etapas capazes de jogar luz sobre o processo na URSS. Se a discussão sobre o “jacobinismo” do pensamento de Lênin havia enchido páginas de polêmicas no princípio do século XX, no momento do ascenso do Stalinismo o debate sobre “Termidor” havia entrado no centro da polêmica. A analogia fazia referência ao golpe de estado de 1794 e a sanção da Constituição de 1795. Nas polêmicas de 1926 o “Termidor” era identificado com a própria contra-revolução, razão pela qual Trotski vai polemizar com o grupo “centralismo democrático” contra essa comparação. No entanto, nove anos depois retorna ao debate para precisar que o “Termidor” na revolução francesa não tinha representado a contra-revolução, e sim, mais precisamente, “a reação sobre as bases da revolução”, tomando para si a analogia histórica entendida nestes termos.

Seria possível continuar esta analogia, enquanto processo, com a Restauração bourbônica em 1814, que dá lugar à implantação de um neo-absolutismo e à conformação da Santa Aliança, denominando “restauração burguesa” a contra-ofensiva que o imperialismo lançou ao conjunto do mundo, após fechar, mediante uma combinação de derrotas físicas e desvios, o ascenso revolucionário ocorrido entre 1968 e 1981.

Esta ofensiva reacionária, que foi batizado de “neoliberalismo”, se expressou num primeiro momento nos países imperialistas, a partir da chegada ao governo de Reagan nos EUA e Thatcher na Grã Bretanha, mediante a implementação de uma série de “contra-reformas” econômicas, sociais e políticas, com o objetivo de reverter as conquistas obtidas pelo movimento operário durante os anos de “boom” do pós-guerra (em previdência, serviços públicos, condições de vida e de trabalho) sob as bandeiras do livre mercado para garantir os lucros capitalistas. Depois se estendeu aos países semicoloniais mediante o chamado “Consenso de Washington”, e teve sua expressão nos ex-estados operários burocratizados pela via da restauração do capitalismo, ainda que, como veremos, com diferentes conseqüências na URSS com relação à China.

O processo de conjunto constituiu uma verdadeira contra-revolução/restauração que modificou a relação de forças em favor do imperialismo, que pôde seguir adiante com métodos essencialmente pacíficos sobre a base da extensão da democracia liberal a amplas zonas do globo. A extensão destas democracias coincidiu com sua mutação em relação àquelas que conheceram os países imperialistas em outros momentos do século XX sobre a base da espoliação de colônias e semicolônias. Mais amplas geograficamente, se constituíram como democracias degradadas, tendo como base fundamental as classes médias urbanas e até setores privilegiados da classe operária (especialmente nos países centrais) que tiveram a porta aberta à extensão do consumo. A desideologização do discurso político sob a combinação da exaltação do indivíduo e sua realização no consumo (“consumismo”) foram as bases deste “novo pacto” muito mais elitista do que aquele do pós-guerra e que conviveu com o aumento da exploração e da degradação social da maioria da classe trabalhadora, junto com os altos índices de desemprego e a proliferação exponencial da pobreza, assim como das favelas que se multiplicaram por todo o mundo, sendo o “clientelismo” e a criminalização as políticas fundamentais do neoliberalismo para esses setores.

Esta “nova ordem” foi imposta sobre a base da derrota do ascenso anterior, e em muitos casos diretamente a partir de ditaduras, o que chamamos de “democracias pós-contra-revolucionárias” [2], mas, acima de tudo, teve como base a fratura interna da classe trabalhadora como nunca antes. Junto à tradicional divisão imposta pelo capital entre a classe operária dos países imperialistas e a das semicolônias e colônias, se somaram outras que deram lugar, junto à proliferação de desempregados permanentes, ao surgimento de trabalhadores “de segunda” (contratos temporários, subcontratos por empresas “terceirizadas”, trabalhadores sem contrato legal, sem contrato coletivo, “sem documentos”, ou diferentes combinações disso) que conformam quase metade da classe trabalhadora mundial [3], contrastando com o setor da classe operária “efetiva”, sindicalizada, com salários e condições de trabalho marcadamente superiores à média.

A restauração dentro da restauração

A restauração capitalista, propriamente dita, nos ex-Estados operários burocratizados esteve no centro da configuração deste cenário de “restauração burguesa”. Junto com a ofensiva neoliberal contra as conquistas obtidas pela classe operária durante o “boom” do pós-guerra, o governo de Reagan irá redobrar o enfrentamento contra a URSS, como novo norte após a derrota no Vietnã. Essa política agressiva, que teve como um de seus principais meios a corrida armamentista, vai acelerar a decadência econômica e o processo de desorganização da economia que marcou a Perestroika de Gorbachov, com consequências terríveis para as condições de vida das massas. Neste marco, as mobilizações de 89-91 levaram à queda dos regimes stalinistas porém com um nível baixíssimo de subjetividade, produto das derrotas anteriores dos processos de revolução política [4]. Desta forma puderam ser hegemonizados pelas direções pró-capitalistas tendo como resultado a restauração do capitalismo na URSS, nos Estados do Leste europeu, e a reunificação em chave capitalista da Alemanha [5].

Os resultados obtidos pelo imperialismo superaram amplamente os seus objetivos iniciais. Desta forma, a reação imperialista iniciada nos primeiros anos 80, transformou-se em contra-revolução. Este elemento daria a marca definitiva da etapa de “restauração burguesa” em seu conjunto.

Retomando a comparação com a Restauração absolutista, esta marca distintiva da “restauração burguesa” está determinada pelo fato de que a relação entre feudalismo e capitalismo é fundamentalmente distinta da que existe entre o capitalismo e o socialismo. O socialismo não tem nenhuma forma determinada de existência histórica, como modo de produção, por fora da conquista do poder político por parte da classe operária, enquanto que as relações capitalistas se reproduzem, por assim dizer, “automaticamente” (até a explosão das crises que são inerentes a ela).

Trotski remarcava este elemento em sua comparação com o “termidor” burguês quando dizia: “A derrocada de Napoleão com toda certeza não aconteceu sem deixar marcas nas relações entre as classes; mas no fundo a pirâmide social da França conservou seu caráter burguês. O fim inevitável do bonapartismo stalinista coloca agora mesmo um ponto de interrogação na conservação do caráter do estado operário da URSS. A economia socialista não pode se edificar sem poder socialista. A sorte da URSS, como estado socialista, depende do regime político que venha a substituir o bonapartismo stalinista” [6].

Neste mesmo sentido, em relação à restauração bourbônica, ainda que esta tenha reconfigurado rapidamente o mapa da Europa e reinstalado novas versões do absolutismo, no econômico e no social foi incapaz de voltar a restaurar o feudalismo, as relações capitalistas continuaram a se desenvolver sob os novos regimes, a ilusão da “volta ao passado” não foi mais do que isso, uma ilusão. Diferentemente desta, a “restauração capitalista” não só implicou, não somente a queda da burocracia enquanto “ditadura sobre o proletariado”, e sim e especialmente (como mostrou mais claramente a evolução mais “ordenada” da burocracia do PC Chinês a se converterem em capitalistas), a destruição das conquistas que se mantinham da revolução nos estados operários burocratizados, a aplicação na maioria dos casos dos planos de ajuste do FMI, a reversão dos direitos sociais, e regressão social expressada, por exemplo no caso da ex-URSS na abrupta queda da expectativa de vida da população.

As conseqüências da restauração: mais Trotski e menos Smith

Um elemento fundamental para entender a restauração é a diferente evolução da restauração no Ocidente e na Rússia, com respeito ao Oriente, em especial à China. Se a restauração para a Rússia, que chegou a ser a segunda potência mundial, significou o desmantelamento de sua importante indústria e sua transformação em um país altamente dependente da exportação de gás e petróleo, na China, que ao momento de se iniciarem as reformas de Deng Xiaoping em 79 contava com uma população camponesa que superava 80%, significou um desenvolvimento industrial sem precedentes que a converte hoje, em termos de PIB, na segunda economia do mundo.

Este ascenso vertiginoso levou, por exemplo, Arrighi a sustentar que a atual evolução na China faria “mais provável que nunca nos quase dois séculos e meio que passaram desde a publicação de A Riqueza das Nações a materialização da previsão de Adam Smith de uma sociedade de mercado à escala mundial baseada em uma maior igualdade entre as civilizações do mundo” [7].

Não obstante, se comparamos a China com países vizinhos como Japão, Coréia do Sul e Taiwan, a realidade parece ser diferente. Como assinala Perry Anderson [8], apesar de que a extensão do ciclo de alto crescimento na China já supera em dez anos o que desfrutaram seus vizinhos em diferentes momentos depois da Segunda Guerra: a dependência da exportação por parte da China desde os anos 90 foi esmagadoramente superior; o consumo dentro do PIB foi muito mais baixo; a dependência do capital estrangeiro muito maior; a brecha existente entre os rendimentos (e o investimento) entre a cidade e o campo foi na China muito superior; e o peso do setor estatal da economia segue sendo extraordinariamente maior. Outro elemento, e que Anderson passa por alto, é que a China, apesar de contar com a petroleira Sinopec, o Industrial & Commercial Bank of China, ou a empresa estatal de energia State Grid entre as maiores empresas do mundo, ela não conta com nenhuma multinacional, como a Toyota, Honda ou Hitachi, das quais o Japão possui às dezenas, nem como a Samsung ou a Hyundai da Coréia do Sul, nem como a Hon Hai Precision Industry de Taiwan.

O certo é que a realidade da China está longe de levar água ao moinho da tese de Arrighi. Seu Produto Nacional Bruto per capita situa-se pouco à frente daquele do Congo e de Angola, com 135 milhões de habitantes que vivem com menos de um dólar diário e 400 milhões que o fazem com menos de dois. Enquanto isso avança vertiginosamente a destruição do meio ambiente e o esbanjamento de energia com respeito aos padrões internacionais, mantém-se a “commoditificação” da produção manufatureira, conseqüência das pressões do modelo exportador, assim como do atraso tecnológico relativo com respeito às potências imperialistas, e o persistente domínio das empresas imperialistas sobre o mercado chinês em produtos de tecnologia. [9]

Não é a hipótese de Adam Smith sobre a maior igualdade entre as nações a que pode nos permitir explicar tudo isso, mas sim as categorias utilizadas por Trotski, com quem podemos afirmar que se configurou um espetacular processo de desenvolvimento desigual e combinado, em que se aprofundaram as contradições entre o campo e a cidade em um país que com 23% da população mundial só dispões de 6% da terra cultivável do planeta. Onde cidades pujantes de milhões de habitantes e torres de concreto, com grandes concentrações operárias onde se trabalha sem uma clara delimitação da jornada de trabalho, de 16 até 18 horas, e em alguns casos mais, convivem com um campo de muito baixa produtividade, onde grande parte da população sobrevive graças às remessas enviadas por seus filhos das cidade [10].

Neste contexto, em março e em maio de 2002, produziu-se a maior mobilização operária na China desde Tiananmen, em três cidades de Dongbei (Liaoyang, Daqing e Fushun) saíram à luta dezenas de milhares de operários não-pagos, aposentados e desempregados, da metalurgia, da mineração e dos altos fornos que protagonizaram protestos e mobilizações durante várias semanas. [11] Não obstante, o inédito é que durante os últimos anos, em um contexto em que continuam estando proibidos os sindicatos independentes e o direito de greve, a nova classe operária chinesa começou a mobilizar-se crescentemente em lutas salariais e reivindicativas, contra o não pagamento de salários, e por direitos democráticos, sendo que em muitos casos aqueles que emigram desde o campo são catalogados como ilegais nas cidades [12]. Uma nova classe operária de entre 100 e 200 milhões de trabalhadores que migraram do campo para a cidade nas últimas duas décadas.

Em meados de 2010 pudemos ver a onda de lutas que teve como emblema os operários da Honda na província de Guangdong, que após manter a planta paralisada durante duas semanas, estendeu-se a outras regiões como mostraram os enfrentamentos dos trabalhadores da KOK Machinery na periferia de Xangai com a polícia.

Como aponta Richard Walker em sua crítica a Arrighi, os reparos que este introduz para dar conta do vertiginoso desenvolvimento da classe operária enquanto tal (termo que não utiliza até o capítulo XII de seu livro) e da emergência de uma classe propriamente capitalista (demasiado concentrada nos mecanismos de “acumulação por despossessão” [13]) são graves obstáculos para uma análise que pretenda dar conta da China atual. [14]

Em síntese, partindo da teoria do desenvolvimento desigual e combinado de Trotski podemos afirmar que o processo de restauração significou, sobre a base da unidade nacional conquistada pela revolução de 49, um desenvolvimento industrial sem precedentes impulsionado essencialmente pela penetração do capital financeiro internacional, diretamente ou através do Estado, que ao mesmo tempo em que desenvolveu exponencialmente as fileiras da classe operária (hoje 400 milhões de trabalhadores urbanos), o fez sem dar lugar ao surgimento análogo de uma burguesia desta magnitude. Ou seja, um desenrolar em que o capital financeiro e o Estado tiveram um papel preponderante dando por resultado um proletariado muito forte (o mais numeroso do planeta para um só país) e uma burguesia comparativamente muitíssimo mais débil.

Parafraseando Arrighi, mais que confirmar a predição de Smith em A riqueza das Nações, teríamos que dizer que a evolução atual da China torna muitíssimo mais provável hoje a previsão que colocara Trotski em seu livro A Revolução Permanente, há já mais de setenta anos, com respeito ao proletariado chinês e seu potencial revolucionário como caudilho do povo oprimido.

Restauração burguesa como etapa da época imperialista

Um dos intérpretes desta etapa em termos de restauração foi o geógrafo marxista David Harvey, cuja visão criticamos em particular em outro lugar [15]. Em seu livro Breve história do neoliberalismo retoma as elaborações de Gérard Duménil e Dominique Lévy, que definem o neoliberalismo como projeto de “restauração do poder de classe”. Harvey analisa a história do neoliberalismo como um “ardil político que aponta a restabelecer as condições para a acumulação de capital e a restauração do poder de classe” [16]. Ou seja, se por um lado fala de restauração, por outro lado defende que a mesma se limita a uma política, um “ardil político”. Aqui não se trata de um detalhe menor, mas é justamente o que lhe permite levantar em O novo imperialismo a possível reversibilidade do processo. Tomando Chamberlain como exemplo, aquele que reivindicou que o imperialismo britânico de finais do século XIX não fosse tão brutal em suas práticas, nos diz: “os Estados Unidos poderão mitigar, se não abandonar, sua trajetória imperialista, empreendendo uma redistribuição massiva da riqueza dentro de suas fronteiras e uma reorientação do fluxo de capitais em direção da produção e renovação de infra-estruturas...” [17].

No entanto, longe da possibilidade de restabelecer um novo ciclo a partir de uma viragem na política do imperialismo, eclode a crise capitalista atual, apesar de todas as transformações que ocorreram desde os anos 80 até hoje a favor do capital. Transformações como, a restauração do capitalismo nos ex- estados operários burocratizados, na Rússia, no Leste da Europa e no Oriente, que implicou a reconquista de novos espaços para a valorização do capital; a liberalização extrema do sistema financeiro (depois de que foram derrubadas as barreiras entre os bancos de investimento, bancos comerciais e as seguradoras); o fato de ter alcançado uma nova divisão mundial do trabalho, incorporando países da periferia à produção manufatureira internacional valendo-se da exploração intensiva de força de trabalho; o avanço na integração de um mercado de trabalho mundial que aumentou a competição entre os trabalhadores e foi a base para aumentar a mais-valia absoluta obtida pelo capital; o desenvolvimento de nichos de acumulação (como os NICs e novos NICs [18], a chamada “nova economia” [19], e depois a bolha imobiliária que estourou em 2008), incluindo a China, para sustentar a taxa de lucro com uma débil acumulação de capital de conjunto durante as últimas décadas.

A questão é que a recuperação que começou no início dos anos 80, apesar de compreender a depressão dos salários em nível internacional e múltiplas derrotas ao movimento de massas, e de que as sucessivas crises operaram como “limpezas” parciais de capital sobrante, não teve como ponto de apoio uma destruição de forças produtivas comparável àquela da segunda guerra mundial sobre a qual se baseou o “boom” do pós-guerra. Assim, nenhuma destas transformações pôde impedir a crise mundial que vivemos atualmente, pelo contrário, multiplicaram as contradições de um capitalismo cada vez mais incapaz de garantir as condições para sua própria reprodução [20].

Da mesma forma que os restauradores do absolutismo, os restauradores do capitalismo superestimaram seu triunfo. Seus propagandistas falaram da desaparição da classe operária para torná-la invisível, enquanto esta, tomada de conjunto, se estendia durante a etapa como nunca antes na história. Também, da mesma forma que os apologistas da Santa Aliança, quiseram mostrar o domínio incontestado dos EUA como o fim do imperialismo e dos enfrentamentos inter-estatais. Porém o que é certo é que a etapa da “restauração burguesa” é parte da época imperialista de declínio do capitalismo.

Como mostra a crise atual, o principal limite não está na ausência de um Chamberlain, mas no fato de que o capitalismo do século XIX não é o do XXI. A própria intervenção estatal de magnitudes inéditas para salvar os capitalistas, mostra o caráter declinante do capitalismo em sua fase atual, onde o dinamismo (e automatismo) de que podiam gozar as relações de produção capitalistas, apesar da forma dos estados sob a restauração bourbônica, eram infinitamente superiores às do capitalismo atual.

Neste sentido, se nos finais da década de 1820 se podia dizer que ainda que o absolutismo tinha conquistado uma “sobrevida” depois da derrota de Napoleão isso não significou a regeneração das condições que lhe deram origem, hoje podemos dizer algo muito parecido do capitalismo, que ainda que a derrota do ascenso de 68-81 (que incluiu revoluções no centro, na periferia e nos estados operários burocratizados) abriu o caminho à restauração outorgando uma sobrevida ao capitalismo, este foi incapaz de reverter suas condições históricas de declínio como sistema social.

A época da revolução burguesa e a época da revolução proletária

Outra interpretação da etapa e termos de restauração pode ser encontrada em Daniel Bensaïd, que em seu livro A discordância dos tempos, partindo da comparação com a Restauração bourbônica realizada pelo filósofo Alain Badiou [21], definia o processo como “ ‘o contrário de uma revolução’. Resulta da assimetria entre as forças de conservação e as forças de transformação. Aqui está o segredo dessas derrocadas e desmoronamentos sem gesto inaugural, sem novidade nem promessa, onde o sentido se reduz a uma restauração. Não a uma restauração puramente econômica das ‘leis de mercado’. Mas sim a uma Restauração maiúscula, em toda a linha”. [22]

A analogia de Bensaïd de “Restauração em toda a linha”, não apenas não respeitava a realidade das limitações que teve em seu momento a Restauração bourbônica, como tampouco reparava nos limites da própria comparação histórica, adaptando-se desta forma ao clima ideológico imperante nos anos 1990. O certo é que, com o que ficou dito anteriormente, acaba-se a pertinência da analogia histórica, já que a derrota de Napoleão, e este é o ponto de partida fundamental, não somente significou para a burguesia a restauração absolutista e o retorno ao antigo regime, senão que demarcou o final da última revolução burguesa [23], e com ela da época das revoluções burguesas, um ciclo que havia compreendido quatro revoluções em, nada mais nada menos, três séculos (a dos Países Baixos no século XVI, a Guerra Civil Inglesa no século XVII, a Guerra de Independência norte-americana e a Revolução Francesa do século XVIII).

A diferença fundamental é que o fim do ciclo das revoluções burguesas não se deveu ao desafio das forças feudais senão às consequências do desenvolvimento do próprio capitalismo, e em primeiro lugar ao surgimento do proletariado como novo ator independente a partir de 1848. [24]

Deste ponto de vista, dar por terminada a época da revolução proletária logo após um par de décadas de restauração capitalista é tão estúpido como dar por terminada a época das revoluções burguesas em 1680 porque se haviam cumprido 20 anos de restauração dos Stuart. Bensaïd em sua analogia tendeu a esquecer deste elemento fundamental, deixando subsistir a ambigüidade da qual se nutriu a ideologia da restauração. Não casualmente, nos debates posteriores na ex-LCR deu-se por fechada “a era da revolução de outubro” na busca por novos sujeitos.

No entanto, hoje as relações de exploração capitalista se estenderam como nunca antes na história, subsumindo as mais variadas atividades humanas; a população assalariada chegou a compreender ao redor de 3 bilhões de pessoas em nível mundial, das quais aproximadamente 550 milhões são trabalhadores industriais. Pela primeira vez na história, os trabalhadores assalariados, junto com os semi-proletários, constituem a maioria da população mundial, com uma demografia que pela primeira vez faz com que a população urbana tenha superado a população rural. Longe de configurar um processo homogêneo, o capitalismo foi incapaz de proletarizar o conjunto das grandes massas que afluíram às cidades, gerando simultaneamente enormes exércitos de desempregados, amplos processos de decomposição social, e unido a isto aquilo que Mike Davis chamou de “o planeta de slums”, em referência às favelas que abrigam no mundo mais de 1 bilhão de pessoas, um sexto da população mundial. Ou seja, processos de semiproletarização, ruína de velhos setores médios e camponeses emigrados, incluindo um amplo lumpemproletariado.

Durante os anos 90, com a restauração capitalista, China, Rússia e os Estados do Leste Europeu (junto com a Índia) aportaram 1,470 bilhão de novos operários ao mercado mundial, que de conjunto duplicaram a força de trabalho de que dispunha o capital que, excluindo esses países, contava com 1.460 bilhão [25]]. Entre estes novos operários incorporados ao mercado mundial, não somente se contaram os trabalhadores previamente existentes que passaram à órbita do capitalismo, senão uma nova classe operária proveniente do campo, que na China compreendeu um exército de entre 100 a 200 milhões de novos trabalhadores urbanos que emergiu em pouco mais de duas décadas, e outro tanto pode-se assinalar à Índia. Enquanto que na Índia grande parte dessa nova classe operária centrou-se no setor de serviços (com 14% dos trabalhadores na indústria e 34% nos serviços, em 2003), na China destacou-se o desenvolvimento da classe operária industrial (27% em 2009 contra 33% nos serviços). Ou seja, durante as décadas de restauração, enquanto florescia a propaganda imperialista sobre “o fim da classe operária”, não somente se desenvolvia no “ocidente” um extenso processo de “assalariamento” de novos setores reconfigurando a classe trabalhadora com um maior peso do setor de serviços, senão que em países como a China e a Índia tinha lugar o surgimento de uma imensa nova classe operária de centenas de milhões de pessoas, não somente ocupada no setor de serviços mas também, como no caso da China, com um grande peso na indústria.

Por um lado, o efeito da incorporação daqueles 1.470 bilhão de trabalhadores ao mercado capitalista foi uma pressão enorme sobre os salários e as condições de trabalho para o aumento exponencial da mais-valia absoluta, fruto da perda do poder de negociação no marco da competição em um mercado de trabalho mundial muito mais integrado. Por outro lado, uma parte importante deste 1.470 bilhão consiste em centenas de milhões de novos trabalhadores que vieram engrossar as fileiras da classe operária internacional.

Qualquer analogia deve partir de que, longe de dar por terminada a época das revoluções proletárias como sucedeu com a época das revoluções burguesas com o surgimento do proletariado como nova classe revolucionária, a restauração burguesa fez com que o mesmo proletariado esteja hoje, em termos objetivos, mais estendido do que nunca antes na história

Por sua vez, desde o começo da etapa da “restauração burguesa” muita água já passou por baixo da ponte. Desde aquele momento até os dias de hoje, podemos distinguir, em linhas gerais, três sub-períodos. O primeiro, cujas características assinalávamos em seções anteriores, esteve marcado pelo triunfalismo capitalista, que assim como deu a história por finalizada, declarou o fim do trabalho, dos Estados nacionais, dos grandes relatos, e do marxismo, entre muitos outros.

O segundo, caracterizado por uma série de crises que não chegaram a deslocar o mercado mundial (crise asiática, default russo em 1998, com o posterior ascenso e queda da chamada “nova economia” entre 1998-2001), por guerras regionais e agressões imperialistas que não chegaram a quebrar abertamente a ordem mundial (no Oriente Médio, no Golfo Pérsico, nos Bálcãs, e em países da África), e na luta de classes, como veremos mais adiante, pelo despertar político de milhões de jovens (desde Seattle ao movimento contra a guerra no Iraque), assim como a passagem à ação direta de setores de massas na América Latina, mas que não chegaram a constituir-se em revoluções.

A partir de 2002 terá lugar um terceiro sub-período, no qual se desenvolveu um ciclo de crescimento da economia mundial (baseado, entre outros elementos, na “bolha imobiliária”, na expansão sem precedentes dos ativos financeiros, e num renovado “boom” exportador da China que dará lugar a um salto no processo de sobreinvestimento), marcando uma desigualdade com respeito às relações inter-estatais atravessadas por tensões geopolíticas sob o signo da guerra do Iraque. Por outro lado, o movimento “no-global”, depois anti-guerra, era canalizado pelas variantes reformistas, e os processos de ação direta deixavam o centro da cena na América Latina a favor de uma série de governos “pós-neoliberais” e nacionalistas [26]. Enquanto isso, a classe operária avançava no processo de recomposição objetiva que mencionávamos antes.

Hoje, a crise mundial abre uma nova situação em que as contradições acumuladas que se relacionam com o caráter histórico da crise assentam as condições para uma mudança na relação de forças, de signo ainda indefinido mas que recoloca a vigência da época imperialista, de crises, guerras, revoluções.

A burguesia e o proletariado após a restauração

Apesar de que, como mostram os elementos assinalados, não se tenham extinguido, mas sim aprofundado as condições objetivas que marcam a época das revoluções proletárias, a propaganda imperialista conseguiu impor como sentido da época não só o fim das revoluções proletárias senão da revolução social em geral. A forma que o processo teve contribuiu para este objetivo. Diferentemente da derrota histórica que o proletariado sofreu com a Comuna de Paris, em que os heróicos communards batalharam à morte contra o exército francês apoiado pelo exército prussiano, e que serviu de exemplo e inspiração para os revolucionários do século XX apesar de ter como consequência imediata a ausência de revolução por mais de 30 anos, durante a ofensiva neoliberal os trabalhadores viram como suas próprias organizações se voltaram contra eles.

Bensaïd dizia que: “Frente ao desmoronamento de ditaduras burocráticas, estamos ameaçados do mesmo estupor que afetou Hegel quando Napoleão foi derrotado pela Europa unida. Sabia bem, segundo sua própria filosofia, que o tirano devia desaparecer uma vez consumada sua obra. [...] Porém ‘quando isso ocorreu’, ele ‘ficou cego diante da realização de suas próprias palavras’. [...] Porque havia concebido a destruição da ordem imperial a partir de dentro, pelo Espírito, e aqui ela se produzia ‘sob o peso da mediocridade e de sua massa plúmbea” [27].

No entanto, neste ponto a analogia se torna mais uma vez inadequada. A Restauração burguesa não esteve acompanhada de uma derrota militar das características de Waterloo, mas foi efetivamente “a partir de dentro”, porém num sentido contra-revolucionário, e este é seu traço distintivo.

Por isso neste ponto melhor seria compará-la com a bancarrota da social-democracia alemã após 1914. Sobre este fato, Trotski apontava: “A história se desenvolveu de tal forma que na época da guerra imperialista a social-democracia demonstrou – e agora isso pode se afirmar com toda objetividade – ser o fator mais contra-revolucionário da história mundial. Porém, a social-democracia não é um acidente, não caiu do céu, mas foi criada pelos esforços da classe operária alemã no curso de décadas de construção ininterrupta e adaptação às condições imperantes no marco do Estado capitalista-junker (...). No momento em que a guerra estourou, e em consequência quando chegou o momento da maior prova histórica, resultou que a organização oficial da classe operária atuou e reagiu não como uma organização de luta do proletariado contra o Estado burguês, mas como um órgão auxiliar do Estado burguês, para disciplinar o proletariado. A classe operária ficou paralisada, pois pesava sobre ela não só o aparato militarista do Estado, como o aparato do seu próprio partido.” [28]

Esta dialética das conquistas parciais do proletariado voltando-se contra ele mesmo, em escala ampliada, foi o signo da época da restauração [29]. Não só as burocracias dos estados operários degenerados se colocaram à cabeça da restauração e se transformaram em capitalistas, como também foram, em muitos casos, as implementadoras dos planos do FMI. Nos estados capitalistas, a social-democracia, que a partir da eclosão da primeira guerra mundial havia demonstrado em repetidas oportunidades seu caráter politicamente contra-revolucionário, porém havia mantido um papel reformista no plano social, transformou-se em agente direto da ofensiva patronal como implementadora das contra-reformas neoliberais. Os PCs seguiram um curso parecido, sendo parte em várias oportunidades de governos “social-liberais” em aliança com os PS.

Seria um erro grosseiro subestimar este elemento na comparação entre a situação da burguesia após a Restauração absolutista e a situação do proletariado após a “restauração burguesa”, já que num caso enfrentavam-se duas classes exploradoras [30], e no outro caso não. Se a burguesia, sob o domínio da Santa Aliança, garantiu a maturação dos seus interesses através da acumulação de riqueza material, o proletariado não pode garantir a maturação de seus interesses históricos através da sua mera reprodução espontânea como sujeito de exploração.

Como dizia Lênin “a força da classe operária reside em sua organização. Sem organização das massas, o proletariado não é nada. Organizado, ele é tudo” [31], e neste sentido é de suma importância para a classe operária que, no marco do retrocesso geral, continuem existindo os sindicatos como organizações de massas, as mais estendidas da classe operária (apesar de todos os seus limites impostos pela burocracia como exclusão dos desempregados, a não representação dos trabalhadores precarizados e terceirizados, etc, que fazem com que só representem uma minoria da classe operária). Porém, isso é insuficiente, já que para a classe operária o elemento essencial da maturação de seus interesses está determinado por sua experiência histórica acumulada e educação no próprio processo de luta de classes, uma continuidade que só pode ser sustentada por sua vanguarda organizada, já que sob as condições do capitalismo nunca, e ainda mais em momentos de retrocesso, pode ser patrimônio da classe de conjunto.

Esta continuidade se quebrou após a II Guerra Mundial. Explicar por que se deu e como encontrar os fios históricos que permitam recompô-la, é hoje, no século XXI, uma tarefa fundamental para o marxismo revolucionário, sem a qual é impossível definir o marco estratégico da época, já que esta experiência é o único “patrimônio” que o proletariado pode acumular sob as cadeias do capitalismo, e como condição indispensável para retornar à luta revolucionária sem começar do zero.

Parte II - O legado de Trotski e da IV Internacional

Em suas Considerações sobre o Marxismo Ocidental Perry Anderson se encarregava de realizar o inventário do legado de Trotski começando por sua História da Revolução Russa como “o mais eminente exemplo de literatura histórica marxista”, e depois retomava os escritos de Trotski sobre a ascensão do fascismo como “estudos concretos de uma conjuntura histórica sem paralelo nos anais do materialismo histórico” e como “a primeira análise marxista verdadeira de um Estado capitalista do século XX”, também suas análises sobre a França, Inglaterra e Espanha, para finalmente destacar sua teoria sobre a natureza do Estado soviético e o destino da URSS de Stalin. Por sua vez, este legado teórico cuja escala histórica Anderson considerava “ainda difícil de apreciar hoje”, constituem só uma parte de seu legado teórico, que deveria se completar, com a teoria da revolução permanente, seus escritos militares, suas análises sobre o México de Cárdenas, seus escritos sobre literatura, etc.

Porém, este legado não é mais que a expressão no terreno da teoria de um legado mais vasto de Trotski. Após estar submetida à guerra imperialista e três anos de guerra civil e invasões imperialistas, com o isolamento que significou a derrota a revolução alemã, após a morte de Lênin e com as novas possibilidades de “diferenciação social” que os primeiros êxitos da NEP davam, vai ter início “Termidor” na URSS e, com ele, a grande batalha de Trotski contra a burocratização do Estado operário surgido da revolução russa e a degeneração da III Internacional. Como parte desta luta, após a Oposição de Esquerda, passando pela Liga Comunista Internacional, e depois pelo Movimento pró IV Internacional, dedicou a última parte de sua vida a educar a uma nova geração de revolucionários, e a fundação da IV Internacional, para os grandes acontecimentos catastróficos em uma situação assinalada pelo ascenso do fascismo, a crise mundial, e os preparativos para a II Guerra Mundial, tarefa para a qual o próprio Trotski se considerava insubstituível, diferentemente do triunfo da revolução de outubro quando Lênin ainda estava vivo.

Isaac Deutscher, o grande biógrafo de Trotski, considerou, ao contrário, esta tarefa como voluntarista. Em sua trilogia comenta ironicamente o congresso de Fundação da IV: “Durante todo o verão de 1938 Trotski se manteve ocupado na preparação do ‘Projeto de Programa’ e das resoluções para o ‘Congresso Constituinte’ da Internacional. Na realidade esta foi só uma pequena conferencia de trotskistas celebrada na casa de Alfred Rosmer em Perigny, uma aldeia próxima de Paris, em 3 de setembro de 1938” [32]. Para Deutscher teria sido melhor que Trotski tivesse se voltado a concluir seus projetos de elaboração inconclusos que “perder tempo” na formação das bases político-programáticas da IV e de seus quadros e militantes. Assim nomeou um dos tomos de sua biografia de Trotski O profeta desarmado em uma alusão implícita a Maquiavel quando dizia que “todos os profetas armados foram vencedores, e os desarmados vencidos”. Sugestivamente, se nos remetemos a O Príncipe esta apreciação parece ser coerente com suas expectativas de que a regeneração da revolução viesse pelas mãos de uma ala da burocracia, já que o fundamento de Maquiavel consistia em que “convém notar, além disso, que o natural dos povos é variável. Fácil é fazer-lhes crer numa coisa, mas difícil fazer-lhes persistir em sua crença. Por este motivo é chave compor-se de modo que, quando tenham parado de crer, seja possível obrigá-los a crer de novo” [33]. Porém Trotski, que se negou a tomar o poder com as baionetas do exército vermelho frente à ascensão de Stalin, era perfeitamente consciente de que o socialismo era uma construção consciente que não podia ser substituída por nenhum Bonaparte. Por isso a teoria e o programa marxistas e a organização revolucionária eram as únicas ferramentas das quais se poderia valer o proletariado em relação aos seus fins.

A IV Internacional não conseguiu adquirir, apesar do grande ascenso revolucionário do pós-guerra, o peso das massas que Trotski previa adquirir, o assassinato de Trotski e dos principais dirigentes da IV, e como veremos o resultado contraditório da guerra determinado pela derrota dos nazis em mãos da URSS, o que deu renovado prestígio à burocracia, o bloqueio da revolução nos países centrais produto dos pactos do stalinismo com o imperialismo, etc, impediram que se concretizasse esta perspectiva.

No entanto, Gramsci dizia que “a atividade que o segundo elemento (a direção de um partido) consagra à constituição desse fermento é em si, fundamental, devendo-se julgar em função 1) do que realmente faz; 2) do que prepara para o caso de ser destruído.” Ao que acrescenta: “Entre esses dois eixos é difícil indicar o mais importante.” [34] Se temos isso em consideração, desde o pós-guerra até hoje depois da restauração, a herança da IV Internacional, e as elaborações teórico-políticas de Trotski, são sem dúvida, o grande legado para os revolucionários do século XXI.

Daniel Bensaid reconhecia a contragosto que “sua herança sem modo de uso é, sem dúvida, insuficiente, mas não menos necessária para desfazer o amálgama entre o stalinismo e o comunismo, liberar os vivos do peso dos mortos, virar as páginas das desilusões” [35]. Se por “herança sem modo de uso” entendemos a necessária revitalização de um legado por parte daqueles que dele se apropriam em novas condições, isso é indiscutível.

No entanto, se levamos em conta que nos chamados Escritos de Trotski pode-se seguir o desenvolvimento da política de lutar como frações no interior da Internacional Comunista e seus partidos até 33, as táticas frente ao “Bloco dos Quatro”, o entrismo no PS (“giro francês”) em vários países com o objetivo de confluir com operários revolucionários que, em uma década convulsiva, se radicalizavam e se integravam a ele (como a tendência Pivert na França), os combates para construir organizações revolucionárias independentes e a própria IV Internacional, para a qual, em sua fundação, foi escrito o Programa de Transição, então, vendo a derrota de correntes trotskistas depois da guerra, com mais justeza deveríamos dizer que o legado de Trotski mais que “uma herança sem modo de uso”, foi sobretudo, uma herança muito pouco usada.

O trotskismo no pós-guerra e uma herança pouco usada

Apesar de contar apenas com um punhado de aguerridos quadros e militantes, como dizíamos, Trotski sustentou que “quando celebrar-se o centenário do Manifesto Comunista, a IV Internacional terá se convertido na força revolucionária decisiva de nosso planeta” [36]. Contudo, o prognóstico de Trotski alternava: “Se o regime burguês sai impune da guerra, todos os partidos revolucionários degenerarão. Se a revolução proletária conquista o poder, desaparecerão as condições que provocam a degeneração” [37].

O resultado da segunda guerra foi tal que não se deu nenhuma dessas duas variantes por completo, nem o imperialismo saiu impune, já que depois do pós-guerra a burguesia de um terço do planeta havia sido expropriada, nem a conquista do poder pelo proletariado fez desaparecerem as condições de degeneração. A derrota do nazismo nas mãos do exército vermelho deu novo prestígio ao stalinismo, que por sua vez, se baseou nesse elemento para frear a revolução no pós-guerra (acordo de Yalta e Postdam). Teve êxito nos países centrais traindo a revolução na França, Itália e Grécia, mas não conseguiu contê-la nas colônias e semicolônias.

Nos processos nos quais a revolução triunfou, se deu a hipótese que Trotski considerava improvável, de que sob condições excepcionais (guerra, derrota, crack financeiro, ofensiva revolucionária de massas, etc.), “partidos pequeno-burgueses, incluindo os stalinistas, podem ir além de sua vontade no caminho da ruptura com a burguesia” [38], e de fato o fizeram, avançando na expropriação da burguesia (China, Iugoslávia, Vietnã, e um pouco depois do imediato pós-guerra, Cuba,etc.) em grande medida como forma de auto-defesa, Mao frente a Chiang Kai Shek e Tito frente a Mijailovich, Ho Chi Min e o General Giap frente aos franceses. Por sua vez, nos estados da Europa do Leste, produziram-se as chamadas “revoluções passivas proletárias” [39] onde, através do controle exercido pelo exército vermelho avançou-se na expropriação da burguesia, também como medida de “autodefesa”, estabelecendo uma “zona de amortecimento”. Esses novos estados operários surgem desde o início como estados degenerados e burocratizados, e, longe de impulsionar o internacionalismo proletário, essas revoluções deram lugar ao surgimento de “stalinismos nacionais”, submetidos a enfrentamentos mútuos (disputas entre RPCH e a URSS, conflito entre China e Vietnã, opressão nacional da URSS sobre os estados do Leste europeu, etc.).

Enquanto isso, a IV Internacional tinha sido dizimada, com seus principais dirigentes, começando por Trotski, assassinados pelo stalinismo ou pelos nazistas. Nesse marco, o que sobrou do trotskismo teve que enfrentar fortes pressões à degeneração centrista. Por um lado, o fortalecimento do stalinismo, fruto do resultado da guerra, e a proliferação de “stalinismos nacionais” nos novos estados operários burocratizados, que criava a ilusão de luta entre “campos” e não entre classes. Por outro lado, fortalecimento das tendências reformistas nos países centrais a partir das novas bases provenientes do “desenvolvimento parcial das forças produtivas” no chamado “boom” do pós-guerra, fruto da gigantesca destruição prévia de forças produtivas. E, por último, o florescimento dos movimentos “terceiro-mundistas” nas colônias e semi-colônias que negavam o papel revolucionário do proletariado nos países centrais.

Os trotskistas poderiam ter resistido a essas pressões atualizando as bases estratégicas do legado de Trotski para as novas condições do pós-guerra e a partir daí construir alas revolucionárias no movimento operário. No entanto, terminaram por adaptar-se a elas.

Depois das rupturas do fim dos anos 40 (Rousset, Schachtman, C.L.R. James, Dunayevskaya, Castoriadis, Tony Cliff, etc.) a maioria fica nas mãos de Mandel e Pablo. Esse último publica em 51 o documento “Aonde vamos?”, no qual contrariamente a uma das definições centrais de Trotski (a saber, o caráter instável das formações sociais transitórias surgidas da revolução proletária e sua instabilidade adicional, dada pelo domínio da burocracia bonapartista), sustenta que “a transição ocupará provavelmente um período histórico de vários séculos”. Depois, e ligado a isso, a visão do mundo dividido em dois campos (capitalista e stalinista) e a iminência de uma nova guerra mundial, são o fundamento para propor um “entrismo” generalizado nos partidos de massas (social-democratas, stalinistas e inclusive, nos partidos nacionalistas das semi-colônias como o MNR boliviano). O fundamento não podia ser mais alheio a Trotski. “Tentar substituir –dizia Pablo– desde fora a direção burocrática das massas opondo-a às nossas próprias organizações independentes, nessas condições, implica no risco de isolarmo-nos dessas massas”.

Por outro lado, o Comitê Internacional, conformado pelo SWP norte-americano, a SLL, a OCI na França, e a corrente de Nahuel Moreno, resistiria corretamente à política liquidacionista do Secretariado Internacional. Moreno, por sua vez, denunciou a política de “apoio crítico” ao governo de Paz Estensoro na Bolívia. Contudo, foram incapazes de apresentar uma alternativa estratégica. O mesmo Moreno em 52 propõe como “rearmamento programático” a Frente Única Anti-imperialista, e depois avançará em sua adaptação com o “entrismo no peronismo”.

O certo é que depois de 51-53, a IV Internacional converteu-se em um movimento centrista, ou seja, uma direção que perdeu sua orientação estratégica de partido independente, passando a adaptar-se ecleticamente a cada direção que se fortalecesse no movimento de massas, como foi sua adaptação à Tito, Mao, Castro, etc.; e rompendo assim a continuidade do marxismo revolucionário. Essa dinâmica de certas resistências parciais corretas frente às capitulações mais abertas (por exemplo, a que relatamos do CI), faz com que, tendo-se quebrado a continuidade revolucionária, nós tenhamos defendido que sobraram “fios de continuidade” que são um ponto de apoio para a reconstrução da estratégia trotskista.

Trotski assinalava, em relação ao desenvolvimento do proletariado depois da Comuna de Paris de 1871, que: “o período prolongado de prosperidade capitalista produziu, não a educação da vanguarda revolucionária, mas a degeneração burguesa da aristocracia operária, o que por sua vez converteu-se no principal freio à revolução proletária” [40]. Parafraseando Trotski, em relação ao próprio trotskismo do pós-guerra, poderíamos dizer que, o avanço reformista da classe operária nos países centrais, junto com o desenvolvimento dos nacionalismos burgueses e pequeno-burgueses nas colônias e semi-colônias, e sobretudo, com a sucessão de revoluções triunfantes com direções pequeno-burguesas ou stalinistas que avançaram, em condições excepcionais, à expropriação da burguesia, criou a ilusão do avanço do socialismo mediante estas direções e revoluções que davam lugar a estados operários deformados burocraticamente desde sua gênese, um marco estratégico segundo o qual o socialismo se estendia mediante “quaisquer revoluções” com “quaisquer direções”.

No entanto, nada mais distante do pensamento de Trotski, que destacava em 1940 como a maior conquista da IV Internacional o manter-se “nadando contra a corrente”, depois de ter redefinido o marco estratégico do marxismo revolucionário de cara com a segunda guerra, no marco da burocratização da URSS e a degeneração da III Internacional, a ascensão do fascismo, etc. Longe de qualquer teleologia, Trotski poderia ter assinado embaixo da afirmação de Walter Benjamin quando diz que “Não há outra coisa que tenha corrompido mais a classe trabalhadora alemã que a idéia de que ela nada a favor da corrente.” Poderíamos dizer algo semelhante com relação ao trotskismo do pós-guerra, nada contribuiu mais para sua degeneração centrista que a idéia de que nadava a favor da corrente, que enquanto o mapa ia se pintando de vermelho, avançava progressivamente o socialismo internacional.

O ascenso de 68-81 e os custos de anos de adaptação

No final dos anos 60 com o fim do “boom” capitalista e o ascenso dos anos 68-81 volta a se abrir a perspectiva de que, com a luta do proletariado no ocidente contra os governos imperialistas, no Leste contra a burocracia stalinista e nas semi-colônias contra as burguesias pró-imperialistas, fortaleçam-se as tendências ao enfrentamento dos pilares da ordem de Yalta. Como conseqüência disso ressurgem as tendências à independência de classe expressa nos cordões industriais chilenos, a Assembléia Popular boliviana, os conselhos de moradores e soldados na revolução portuguesa, etc. No entanto, a ordem de Yalta e as direções que a sustentaram não foram derrotados, ainda que tenham se debilitado.

Em suas Considerações sobre o Marxismo Ocidental, Perry Anderson apontava que com a confluência entre o ascenso revolucionário iniciado com o Maio Francês e a primeira crise capitalista desde a segunda guerra mundial no ano de 1974 se colocava a probabilidade do restabelecimento da unidade entre a teoria marxista e a prática de massas através das lutas da classe operária industrial. Frente a essa possibilidade destacava a existência do trotskismo como tradição alternativa no marxismo: “ao longo de todo esse período subsistiu e se desenvolveu ‘fora do cenário’ outra tradição com um caráter muito diferente, que pela primeira vez atraiu a atenção política durante a explosão francesa e depois dela. Trata-se, é claro, da teoria e do legado de Trotski”.

No entanto, os anos anteriores ao ascenso não haviam sido aproveitados pelas diferentes correntes do trotskismo para se re-apropriar desse legado para definir o marco estratégico e construir correntes revolucionárias no movimento operário. A unificação de 63 em torno da revolução cubana realizou-se sem nenhum balanço sério das diferenças anteriores e das atuações de cada corrente. Em relação à América Latina, o IX Congresso (1969) aprova a luta armada como estratégia (“Resolução sobre a América Latina”, Livio Maitán). Por outro lado, os que não haviam entrado na unificação aceleraram sua degeneração, como o caso do lambertismo que terminou negando-se a participar da “noite das barricadas” em maio de 68, ou o healysmo que terminou impugnando a mais numerosa marcha contra a guerra do Vietnã na Inglaterra em outubro de 68.

Apesar de que no início do ascenso, as forças das correntes do trotskismo se encontravam em sua maioria dissolvidas no stalinismo e na social-democracia, as tendências à independência de classe que vinham do enfrentamento com as direções oficiais do movimento operário fortaleceram as correntes do centrismo trotskista, que em vários casos se transformam em correntes de alguns milhares de militantes (por exemplo, a Ligue Communiste na França, o SWP norte-americano, ou na Argentina o próprio desenvolvimento do PST). No entanto, os anos de “entrismo sui generis” e deriva estratégica (concessões ao guerrilheirismo,etc.) não foram gratuitos, mas terão expressão em sua debilidade organizativa e estratégica, que lhes impediu de se constituírem como alternativas de direção frente às direções oficiais.

Em 74, com a revolução portuguesa, dava-se um grande processo revolucionário de características clássicas num país central, que surgia diretamente ligado às conseqüências dos processos revolucionários nas colônias como Angola e Moçambique. E onde, por sua vez, se desenvolviam tendências ao duplo poder da mão dos comitês de moradores e soldados. As correntes que faziam parte do Secretariado Unificado, apesar de podermos dizer que em linhas muito gerais colocaram a necessidade do desenvolvimento dos comitês e de combater a subordinação que o PC e o PS queriam impor ao movimento de massas frente ao MFA (Movimento das Forças Armadas), se encontravam confinadas à debilidade extrema frente ao processo. No entanto, o mais importante foi que não levaram as lições estratégicas desse processo ao plano da orientação de cada um dos grupos nacionais.

Isso se faz mais sério se levarmos em conta que o processo de Portugal também foi um laboratório para o imperialismo que, debilitado com a derrota no Vietnã, impulsionará como política para frear os processos revolucionários as “transições à democracia”. Essa tática, que continuará na Espanha e na Grécia, depois de ser aplicada de forma defensiva passará a ter um caráter ofensivo desde o começo dos anos 80 como componente da “restauração burguesa”.

Entre 78 e 81 se dá a reabertura do ciclo de revoluções, depois de o primeiro ciclo ter sido desviado nos países centrais e ter sido esmagado violentamente na América do Sul. A derrota desse segundo ciclo se dará sem solução de continuidade com o início do processo de restauração capitalista com a derrota da revolução polaca como grande elemento.

A última grande oportunidade de frear a restauração foi perdida na Polônia

Em um artigo anterior nos perguntávamos: “Foi como assinalou Anderson, o processo ‘clássico’ da revolução de Portugal de 74-75 que combinou o levantamento anticolonial em Angola e Moçambique, contagiados pela luta do povo do Vietnã, com o ascenso operário e popular contra a ditadura de Salazar em um elo débil dos países imperialistas, o qual ofereceu a última grande oportunidade de restabelecer as bases estratégicas do trotskismo? Ou a história voltou a apresentar outra grande oportunidade no que foi o último grande “ensaio da revolução política” na Polônia de 80, a qual poderia ter permitido que a IV Internacional emergisse como grande força e se antecipasse aos processos de 89-91 no Leste da Europa, URSS e China?” [41]

Cremos que estamos certos ao afirmar claramente que a última oportunidade de frear a restauração foi perdida na Polônia. A restauração capitalista longe de ser um processo que caiu do céu, ou simples produto das mobilizações de 89, foi preparada por uma série de levantamentos contra a burocracia e revoluções políticas que foram derrotadas, e que incluem a Alemanha Oriental no ano de 53 e a revolução húngara de 56, a primavera de Praga em 68, e que sem dúvida tiveram um dos seus centros na Polônia com a revolução derrotada de 56, os processos de luta dos anos 70, e a última grande revolução política que se inicia com o estouro da onda de greves em 80, com seu centro emblemático nos estaleiros de Gdansk, e que deu lugar ao surgimento do sindicato Solidariedade que chegou a agrupar 10 milhões de membros. No curso deste processo se desenvolveram importantes elementos de democracia direta, mas contava com a forte influência da igreja católica que se ocupou de impulsionar as alas pró-capitalistas do movimento.

Sem dúvida, um dos pontos mais destacados do legado de Trotski foi o programa da revolução política, um tipo de revolução que ele previu, mas nunca presenciou. Este programa, plasmado no Programa de Transição era o único que poderia dar resposta à situação que se abriu na Polônia em 80, colocando a necessidade do questionamento do poder da burocracia e seus privilégios, bem como a constituição da democracia soviética, incluindo a liberdade de organização de sindicatos e partidos soviéticos ou que defendam as conquistas, mas ligando indissoluvelmente este programa democrático àquelas consignas como a revisão completa do plano de acordo com as demandas de produtores e consumidores, ou a maior igualdade salarial em toda espécie de trabalho, etc, que apontam para preservar as conquistas estruturais. Um elemento chave para não confundir as bandeiras dos revolucionários com seu oposto, os restauracionistas.

No entanto, nenhuma das principais correntes do trotskismo daquele momento foi capaz de manter esta unidade de programa. O centro esteve posto não em como se devia derrubar a burocracia, mas na consigna “todo poder ao Solidariedade” e no armamento do sindicato como defendia Moreno, ou se os sovietes deveriam surgir por fora de Solidariedade como sustentava Lambert; mas nenhum deles levantou junto com isso a necessidade, por exemplo de revisar o plano em benefício de produtores e consumidores, e todas aquelas consignas que podiam dar resposta às reivindicações das massas e ao mesmo tempo sustentar a defesa das conquistas para poder se delimitar das correntes restauracionistas que dirigiam o Solidariedade. Isso conduziu à adaptação às correntes restauracionistas concebidas como parte de um bloco anti-burocrático. O Secretariado Unificado diferentemente das demais correntes sustentou uma política de auto-gestão para as empresas nacionalizadas, mas desligada da defesa do plano e do monopólio do comércio exterior, não era contraditória com um curso de restauração capitalista. Como cita Stutje, para Mandel, Walesa era qualquer coisa menos trotskista, porém, naquele momento ele era identificado como parte do bloco anti-burocrático: “O que importa ele (Walesa), se os milhões de trabalhadores estão em movimento; então não devemos nos manter ocupados buscando grupos pequenos, puros, mas apoiar simplesmente a dinâmica revolucionária de conjunto” [42].

Desta forma, o legado do programa da revolução política foi dissolvido em um anti-stalinismo em geral, capaz de confluir com a direção do movimento enquanto esta preparava as condições para negociar a restauração capitalista, e assim não foram capazes de apresentar uma posição independente (para além de que, do ponto de vista da intervenção - sem preparação nem organização - esta se encontrava muito limitada). Tampouco posteriormente foram tiradas as lições desta deriva estratégica.

O fato de não ter apresentado uma alternativa, e depois não compreender as causas da derrota, teve implicações muito para além da Polônia, já que foi um desarmamento completo frente ao processo de restauração que se estava gestando, enquanto que para a burocracia da URSS foi o fato que terminou de convencê-la da necessidade de acelerar o processo de restauração capitalista nos estados operários burocraticamente degenerados.

Assim é que, ante a incompreensão do centrismo trotskista, com a revolução polaca cai definitivamente o marco estratégico das “revoluções quaisquer” com “direções quaisquer”, que por fora do legado de Trotski e com resultados catastróficos haviam construído depois do segundo pós-guerra.

O grau zero da estratégia trotskista

As conseqüências da deriva estratégica pós-Polônia não tardaram. Mandel afirmará crescentemente sua adaptação à burocracia, primeiro depositando expectativas em Gorbachov e apoiando a Glasnost, e depois em Yeltsin. O SWP norte-americano sob a direção de Barnes, diretamente abandonará o trotskismo em 1983. Em seu documento “Seu Trotski e o nosso” irá assinalar as teses da revolução permanente como um obstáculo para seguir com a tradição de Marx e Lênin, apagando a revolução política como parte do programa, e reabilitando a fórmula de “ditadura democrática de operários e camponeses”. Por suas vez, Lambert chamará a votar por Miterrand na França, e desenvolverá a “linha da democracia” com a qual selará sua adaptação ao regime da V república, e se diluirá em um curso sindicalista, primeiro no “movimento pró-PT” e depois em um auto-proclamando Partido dos Trabalhadores. Por seu lado, Moreno que em 1977 analisava corretamente como “contra-revolução democrática” a política que o imperialismo havia implementado a partir de Portugal, mudaria o signo destes processos para falar de “revoluções democráticas” revisando a teoria da revolução permanente.

Assim é que a queda do muro e os processos com ideologia “democrática” e pró-capitalista de 89-91 encontraram estas correntes em uma aberta guinada à direita, distanciando-se cada vez mais do legado de Trotski e nadando a favor de uma corrente que, apesar das expectativas em Gorbachov, em Yeltsin, no castrismo, nas revoluções democráticas, no PS, etc, desembocavam irremediavelmente na restauração.

Se como diz Bensaid em relação à intelectualidade de esquerda, com Foucault e Deleuze se chega à “estratégia reduzida a zero” [43], em relação ao marxismo revolucionário, como resultado imediato desta guinada na situação mundial, a restauração capitalista e a deriva estratégica na qual se encontravam as correntes do centrismo, se chegou ao “grau zero” de estratégia trotskista. Neste marco, frente ao novo salto na degeneração centrista da LIT e em meio à maré reacionária daquele momento, começa a dar seus primeiros passos o núcleo do que é hoje a FT, como pequeno pólo principista do movimento trotskista internacional.

O que restou do morenismo, longe de encarar a tarefa de uma avaliação profunda de sua própria tradição, aprofundou contra todas as evidências da realidade as teses da revolução democrática. Desta forma os processos de 89-91 passariam a ser grandes revoluções que deram lugar não à restauração capitalista que já estava consumada (segundo a nova explicação da LIT) [44], mas a uma das maiores vitórias da classe operária internacional. O grande problema do trotskismo (e de qualquer marxista sensato) seria ter visto como uma profunda derrota onde havia um triunfo, o que se traduziu na incapacidade de dar conta da sucessão quase ininterrupta de “revoluções de fevereiro” triunfantes (que vão desde os processos que a América Latina viveu desde o início do século XXI, incluindo o “argentinazo”, até as revoluções laranja no Leste Europeu) às quais se supostamente seguirão em algum momento as “revoluções de outubro”; questão que no caso dos processos de 89-91 já estão demorando 20 anos. Para a LIT, isso mesmo se expressa hoje em Cuba onde, aplicando a mesma lógica que para aqueles processos, o capitalismo já estaria restaurado e a tarefa do momento seria derrubar a ditadura capitalista.

No outro extremo da obstinação irreflexiva, e diferentemente desta, soltando amarras definitivamente com o legado de Trotski, teve lugar a reflexão dócil do SU. Esta reflexão encarnada por seus principais referentes após a morte de Mandel, não se concentrou no balanço crítico da própria corrente, e nisso coincidiu com o morenismo, mas partiu de dar como finalizada a “hipótese da greve geral insurrecional” e com ela a “era da revolução de outubro”. A partir dos desenvolvimentos do próprio Mandel sobre a “democracia mista” baseados na revisão da relação entre sovietes e assembléia constituinte, a “dupla representação” era a fórmula por fim encontrada para exorcizar os perigos de burocratização das sociedades pós-capitalistas. Isso lhe permitiu, com o atraso de um par de décadas, emular o “eurocomunismo” e abandonar definitivamente a perspectiva da ditadura do proletariado em favor de uma suposta “democracia até o final” com a ajuda das instituições do regime democrático burguês.

No sentido inverso a estas “revisões” era necessário apelar ao mais avançado do pensamento revolucionário para compreender as novas condições da época. A “restauração burguesa” havia demonstrado, contra a visão de que “revoluções quaisquer” com “direções quaisquer”, que estas não eram simplesmente uma expressão da história indo a favor da classe operária, senão uma realidade muito mais complexa que ao mesmo tempo bloqueava o desenvolvimento internacionalista da revolução e era radicalmente incapaz de selar um curso de avanço para o socialismo, e desta forma, como havia sustentado Trotski, preparava as condições para a restauração capitalista.

O trotskismo em tempos de restauração

Se a guerra imperialista de 1914 selou o início da época de crises, guerras e revoluções, e em sua primeira etapa, que compreendeu as décadas de maiores convulsões do século XX, teve lugar o ressurgimento do marxismo revolucionário pelas mãos de Lenin, Trotski e da III Internacional; na segunda etapa, marcada pelo resultado do segundo pós-guerra que configurou a ordem de Yalta bloqueando parcialmente a dinâmica permanentista dos processos de revolução proletária (em seu aspecto internacional e de luta para a transformação das relações sociais no interior dos estados operários) teve lugar, como vimos, a degeneração centrista das organizações da IV Internacional.

No mesmo sentido, a terceira etapa caracterizada pela “restauração burguesa” significou um segundo salto em degeneração das correntes do trotskismo, uma espécie de “social-democratização” (mantendo seu caráter centrista em alguns casos e em outros passando ao aberto liquidacionismo) onde primará uma adaptação profunda aos cenários do regime burguês (sindicalismo “normal”, eleições, manifestações “folclorizadas”, vida universitária, etc.) baseada tanto no distanciamento do legado trotskista (que como vimos se preparou nos anos 80) como também no derrotismo para com o movimento operário.

Após o “fim da história”, com a derrota da revolução polaca e dos processos de resistência à ofensiva neoliberal, simbolizados estes no movimento dos controladores de vôo norte-americanos e nos mineiros ingleses, o desvio dos processos de 89-91 em direção a objetivos restauracionistas, e a restauração capitalista nos ex-Estados operários burocratizados no Leste Europeu, Rússia, no Oriente, a situação de profunda reação começou a reverter-se a partir de 1995, quando a classe operária volta à cena na França com a greve dos trabalhadores públicos contra o plano Juppé, sendo seguidas pelas “guerras operárias” da Coréia do Sul em 96, a greve da UPS de 97 (Estados Unidos), etc. Na América Latina se dava a irrupção em cena do campesinato com o levante zapatista de 94, e na Argentina se desenvolverão os movimentos de desempregados [45].

Um segundo momento começou a partir das mobilizações de Seattle em 99, surgia o movimento “altermundista” que significou o despertar político de milhões de jovens, e que a seguir, em 2003, teve um novo salto em sua massificação transformado em movimento contra a guerra imperialista no Iraque. Junto a isto na América Latina deu-se a passagem à ação direta de setores de massas, com preeminência do campesinato e dos setores médios, contra os governos que haviam encarnado a ofensiva neoliberal, levando à queda de governos no Equador, Bolívia e Argentina.

Depois, num terceiro momento, o “altermundismo” foi canalizado finalmente pelas variantes reformistas de “humanizar o capitalismo” com os Fóruns Sociais, etc.; no caso dos processos na América Latina, estes foram desviados a partir do seguimento de diferentes matizes governamentais com tinturas reformistas, dando lugar a fenômenos políticos como o chavismo ou o evomoralismo.

Por outro lado, no seu papel de continuadores dos planos neoliberais, aprofundar-se-á a crise dos “partidos operário-burgueses”, assim como das direções históricas do movimento operário, como o Partido Social-Democrata Alemão, o Partido Socialista Frances, o Partido Trabalhista britânico, os PCs italiano e francês etc e das direções nacionalistas burguesas como o caso do peronismo, e também dos “partidos operário-burgueses” mais recentes como o PT brasileiro.

Se a partir do final do século passado e começo deste se deu, em termos gerais, como apontará Bensaïd, uma “volta do debate estratégico”, por parte do centrismo trotskista esta não tomou a forma da volta da estratégia revolucionária mas sim a de diferentes variantes de adaptação aos novos fenômenos, descartando a bússola da independência de classe.

Assim se configurou uma ala liquidacionista encabeçada pela LCR francesa e pelo SWP britânico, que se alinhou por trás do projeto de construir “partidos anti-capitalistas amplos [46]”, que teve suas últimas expressões na fundação da aliança eleitoral RESPECT na Grã-Bretanha em 2004, do SWP com figuras decadentes da política burguesa e líderes religiosos da comunidade muçulmana (em sua maioria comerciantes, clérigos e inclusive burgueses), e em 2009 na liquidação da LCR francesa no Novo Partido Anti-Capitalista, sem maiores delimitações de classe, e abandonando qualquer referência à ditadura do proletariado e a Trotski. Esta tendência se expressou na América do Sul na fundação do PSOL no Brasil, a partir da ruptura de um setor da esquerda do PT, na Venezuela com os setores que entraram no PSUV de Chávez, na Argentina com a falida tentativa do MST. Estes projetos acompanharam na maioria dos casos o abandono explícito do trotskismo por parte daqueles que os impulsionaram.

A perda de referência de classe também se mostrou na adaptação completa aos novos governos burgueses latino-americanos, e em especial ao chavismo. Não obstante, o chavismo e o evomoralismo não somente impactaram esta ala liquidacionista, senão que também arrastaram os setores de centro do movimento, como o PO da Argentina ou a própria LIT, que ainda que mantendo em geral o programa trotskista, rejuvenesceram velhas teorias superadas pelo movimento revolucionário, como a Frente Única Anti-imperialista, para dar seu apoio político a estes governos. Posteriormente, passaram sem maiores explicações à oposição a estes mesmos governos, sem guardar nem em um nem em outro caso a indispensável delimitação de classe.

Na atualidade, todos os projetos de “partidos amplos” já mostraram seus estreitos limites, ou bem eclipsaram ou então se encontram em crise total, não somente porque se demonstraram impotentes para dar uma alternativa frente à crise, senão também tomados do ponto de vista de seus próprios objetivos. O RESPECT explodiu; o PSOL depois de se dividir em torno das candidaturas mostrou nas eleições de 2010 ser um fenômeno eleitoral em retrocesso; o NPA demonstrou os limites de seu curso eleitoralista não somente nas próprias eleições mas também em seu pobre papel nos fatos recentes da luta de classes na França; a outrora “nova esquerda” do MST argentino terminou por se integrar ao projeto centro-esquerdista pequeno-burguês encabeçado por Pino Solanas.

Outro tanto sucede com o chavismo e o evomoralismo, que frente à crise se encontram cada vez mais enfrentados com os setores da classe trabalhadora que saem para lutar. No caso de Chávez avançando no controle e no disciplinamento do movimento operário, como demonstram as intenções de cercear o direito de greve, e as repressões aos conflitos de vanguarda, assim como a atitude passiva frente a proliferação das ações de pistoleiros e dos assassinatos de dirigentes operários. Também Evo Morales, que durante 2010 militou contra os aumentos salariais aos trabalhadores enfrentando paralisações e mobilizações, começou 2011 com um ataque em regra às condições de vida das grandes maiorias, com o chamado “gasolinazo”, do qual teve que recuar devido à mobilização operária e popular.

O derrotismo para com o movimento operário

Junto com os fenômenos assinalados na seção anterior, o último ciclo de crescimento mundial redundou em um fortalecimento social da classe operária (milhões de novos trabalhadores em todo o mundo) que também teve sua expressão no terreno da luta (na maioria dos casos reivindicativa).

A relativa recomposição no movimento operário não suscitou reorientações estratégicas. O denominador comum foi o abandono da perspectiva de construir alas revolucionários no movimento operário capazes de dar uma batalha nas organizações de massas por um programa transitório de independência de classe e contra a burocracia e a subordinação das organizações do movimento operário a diferentes alas da burguesia.

Na ala liquidacionista do centrismo, se expressou no abandono de qualquer perspectiva estratégica ligada ao desenvolvimento da classe operária, de sua luta e sua organização, mais preocupada pela aritmética da expressão eleitoral de fenômenos policlassistas. No caso da ala centro se expressou, seja na separação absoluta entre o sindical e o político (LO), ou na “colateralização” dos trabalhos no movimento operário (PSTU e PO), como forma de elidir a luta com a burocracia nas organizações de massas. Se no caso do PSTU, expressou-se na transformação da CONLUTAS em um “curral” para os trabalhos históricos que mantinha no movimento operário; no caso do PO se refletiu na constituição do Polo Obrero como fragmento do movimento de desempregados sem lutar por um movimento único com liberdade de tendências, e em seu isolamento com respeito aos sindicatos sob a teoria do “novo sujeito piqueteiro”. Nos primeiros, isto significou aprofundar o rotineirismo sindical, nos segundos, a adaptação aos mecanismos clientelistas do assistencialismo estatal e a retirada dos sindicatos.

Com as primeiras consequências da crise durante 2009 e 2010, de forma desigual, a classe operária já teve de enfrentar os primeiros embates do capital para descarregá-la sobre suas costas, e aqui se manifestaram todas as conseqüências do derrotismo destas correntes no movimento operário, levado à luta de classes.

A França foi, sem dúvida, o mais importante laboratório nesta primeira etapa. A classe operária francesa, junto com o combativo movimento estudantil secundarista, foram os protagonistas do grande processo de mobilização para enfrentar o projeto de reforma das aposentadorias de Sarkozy. Nas oito jornadas de greve e mobilizações onde chegaram a sair à rua três milhões e meio de pessoas em toda a França, e apesar da estratégia de desgaste da burocracia, desenvolveram-se greves renováveis (por tempo indeterminado) em setores estratégicos como as refinarias, os portos, as ferrovias, junto com o bloqueio de empresas, depósitos petroleiros, lugares públicos, etc., e junto com isso tendências à auto-organização expressadas nas Interprofissionais.

De conjunto se expressaram tendências à greve geral. No entanto, a “extrema esquerda” francesa não esteve à altura das circunstâncias. Nem Lutte Ouvrière (LO), nem o Novo Partido Anticapitalista (NPA), constituíram-se como alternativa à burocracia da CFDT e da CGT, que passaram o conflito esperando que o governo abrisse uma porta à negociação que nunca chegou, sem defender a exigência de retirada do projeto de lei e apostando no desgaste do movimento. No caso da LO, diretamente se opôs a levantar a consigna de greve geral, subordinando-se às direções oficiais sob o argumento de que a “relação de forças” não estava dada para tanto. Enquanto que o NPA, apesar de que muitos de seus militantes estiveram na linha de frente dos bloqueios, a posição oficial foi de abster-se da crítica pública à burocracia, deixando de lado tanto a questão da retirada da lei, como a perspectiva de expulsar Sarkozy, assim como o chamado à greve geral. Somente o Coletivo por uma Tendência Revolucionária do NPA defendeu a necessidade de combater com a greve geral pela retirada da reforma e a expulsão de Sarkozy, e para estender os organismos de auto-organização aliando-se com os estudantes, contra a política de desgaste e divisionista da burocracia.

No entanto, nem a tendência à greve geral, nem a orientação conservadora da LO e da direção majoritária do NPA caíram do céu. Nas lutas que se desenvolveram na França desde 2009 (Continental, Molex, Sony, Freescale, Total, Philips, New Fabris, o SNCF, Toyota, Goodyear, Caterpillar, etc.) já tivemos os primeiros exemplos. Por um lado, vimos como o lambertismo nos lugares onde estava se fundia com a burocracia da FO para frear o desenvolvimento das lutas; por outro lado, pudemos ver como a LO era incapaz de apresentar qualquer alternativa ante o fechamento da Continental. No caso da LO se agregou a intervenção na greve geral com piquetes em Guadalupe, sendo como foi parte dirigente do “Coletivo contra a Exploração” (frente única de organizações políticas e sindicais) sem ser alternativa frente aos setores nacionalistas burgueses da UGTG, desenvolvendo as tendências à auto-organização ou ao questionamento da dominação colonialista francesa, e permitindo que a grande potencialidade do movimento pudesse ser contida com a obtenção de um aumento salarial sem propor-se a desenvolvê-lo num sentido revolucionário.

Por sua vez, pudemos ver a direção majoritária do NPA passando por alto estas lutas sem dar-lhes a mais mínima importância apesar de ter militantes de seu partido na própria direção do conflito como na Phillips Dreux. Não casualmente o dirigente da ala esquerda da fábrica passou a ser um dos fundadores do Coletivo por uma Tendência Revolucionária, para levantar uma alternativa frente à deriva eleitoralista da direção majoritária. Estamos falando de toda uma série de conflitos em que os trabalhadores travaram lutas duríssimas e nenhuma dessas direções foi capaz de estar minimamente à altura das circunstâncias.

Todos estes exemplos mostram, no terreno da luta de classes, não somente a negativa destas correntes a transformar cada um destes conflitos protagonizados pela classe trabalhadora em grandes combates de classe que tentem modificar de alguma maneira a relação de forças real, ou como dizia Rosa Luxemburgo transformar as “greves de protesto” em “greves de luta” [47], como também o derrotismo frente à possibilidade de fomentar a maturação de setores de vanguarda do movimento operário forjados nestes combates de classe. O processo de greves e mobilizações de outubro-novembro de 2010 na França mostrou as consequências desse derrotismo e sua impotência frente a fatos superiores da luta de classes. Estas conclusões são fundamentais, não apenas para a Europa mas também para aqueles países em que a crise capitalista, apesar dos golpes produzidos em 2009, não atingiu ainda em cheio.

No caso do Brasil e da atuação do PSTU, vimos como não se propôs sequer a apresentar uma luta séria frente à demissão de 4270 trabalhadores da Embraer, sendo que dirigiam o Sindicato dos Metalúrgicos de São Jose dos Campos (cidade onde se encontra a fábrica).

No caso do PO da Argentina, devido a seu abandono dos sindicatos, se encontra alheio ao principal fenômeno de organização por fora da burocracia que a classe operária argentina está dando em décadas, o chamado “sindicalismo de base”.

Pela positiva, no conflito de 2009 na Kraft Argentina, mostrou-se em pequena escala como a combinação entre a preparação de um setor de vanguarda no interior de uma fábrica, junto à disposição subjetiva por parte do PTS de transformar um conflito operário em uma grande batalha de classe, conquistando solidariedade com setores do movimento estudantil e de desempregados, forçando os reformistas à frente única e combatendo-os ao mesmo tempo, com um programa correto pôde permitir enfrentar o ataque de conjunto de uma das maiores multinacionais norte-americanas, do Estado argentino, da burocracia sindical, e até da embaixada norte-americana. Acreditamos não ser exagerado dizer que a luta de Kraft, de grande transcendência nacional, foi um elemento importante para deter a onda de demissões que se estavam realizando no setor industrial com a desculpa da crise econômica.

Mas não se trata de uma questão de triunfos ou derrotas. Nos exemplos mencionados antes, tanto o caso da Continental quanto o processo em Guadalupe, poderiam ser catalogados como triunfos ou triunfos parciais do ponto de vista das reivindicações básicas do conflito, no entanto, no caso dos trabalhadores da Continental significou o recebimento das indenizações e o desaparecimento da fábrica, enquanto que no caso de Guadalupe, significou o dispêndio de uma enorme energia revolucionária, com mais de cem dias de greve geral, para que o movimento obtivesse uma conquista tão provisória como o aumento salarial. A pergunta também é: o que deixa a intervenção da LO nestes conflitos quanto ao desenvolvimento de uma vanguarda operária revolucionária, ou potencialmente revolucionária? [48][5]

Seguindo com o exemplo da Kraft, e sem tomar outro grande exemplo neste sentido como foi e é o Sindicato Ceramista de Neuquén e Zanon, a nova comissão interna surgida durante o próprio conflito (integrada pela agrupação que conforma o PTS junto com independentes) depois que os trabalhadores fizeram sua experiência com a direção maoísta (que traiu a luta), junto com a interna da PepsiCo dirigida por esta mesma agrupação, está sendo o motor do reagrupamento da vanguarda operária na zona norte da Grande Buenos Aires, a maior concentração operária do país.

Mas outra vez, tampouco se trata somente de triunfos: teria sido impossível a existência de Kraft sem que antes, nos momentos de fortaleza do governo, tivessem existido lutas emblemáticas que foram derrotadas como a têxtil Mafissa ou semi-derrotas como a Jabón Federal. Foram as experiências e as lições desses conflitos o que permitiu preparar um conflito como o da Kraft. Ora bem, que lições revolucionárias para futuros combates podem-se tirar de uma luta não dada como na Embraer?

Por último, estes conflitos, não apenas podem ou não ser aproveitados como verdadeiras “escolas de guerra”, como parte da preparação para processos generalizados como o de outubro-novembro de 2010 na França, e em maior escala para a própria guerra de classes, a revolução; não apenas isso, mas também as próprias “escolas de guerra” colocam exigências quanto a sua própria preparação para que possam chegar a sê-lo, o que implica a construção de frações revolucionárias que possam dirigir as batalhas. Assim foi na Kraft, assim foi em Zanon, e assim foi também em 2010 na luta dos trabalhadores da ferrovia Roca de Buenos Aires.

Uma luta contra a terceirização e pela incorporação aos efetivos de 2052 trabalhadores passou ao centro do cenário político argentino, quando no marco da luta a burocracia da União Ferroviária assassinou o militante do PO e da Federação Universitária de Buenos Aires, Mariano Ferreyra, motivando uma crise nacional, que só foi amortecida pelo falecimento do próprio Néstor Kirchner. Esta luta foi o ponto mais alto de uma série de batalhas que vem se dando desde 2002. Desde aquele ano, a agrupação Bordô (PTS e independentes) vem encabeçando as lutas contra a terceirização, primeiro contra as demissões nas terceirizadas Técnica Industrial e depois em Poliservicios, até 2005 quanto em unidade com os movimentos de desempregados foi conquistada a efetivação dos trabalhadores da Catering World. Assim foi que se eliminou a terceirização na ferrovia Roca, conseguindo também incorporar desempregados como efetivos. Foram 38 cortes de vias, 127 bloqueios de bilheterias, como parte dessa luta, que permitiram preparar-se para a batalha que se deu em 2010 para a efetivação dos 2052 novos terceirizados contratados depois de 2005.

Frente aos que classificavam como “ultimatista” a reivindicação pela efetivação dos 2052 terceirizzados, a agrupação Bordô se pôs à cabeça da continuidade da luta por este objetivo que finalmente se avança para conquistar, constituindo talvez um dos mais importantes triunfos em um conflito de empresa desde a queda da ditadura, transformando-se hoje em uma das grandes bandeiras da vanguarda operária argentina.

Para concluir, podemos dizer que terminar com o derrotismo para com o movimento operário é o ponto de partida fundamental para que o trotskismo, como continuidade do marxismo revolucionário, possa recuperar aquilo que o distingue de todas as demais tradições, o de ser um método para a fusão com a vanguarda operária para uma perspectiva revolucionária.

Parte III – Os limites da restauração burguesa e as novas condições para a reconstrução do marxismo revolucionário

A crise que o capitalismo atravessa na atualidade coloca novas condições históricas que situam a etapa da “restauração burguesa” ante seus próprios limites. Se bem que esta tenha significado uma ampla derrota para o proletariado mundial que deu um novo impulso à dominação capitalista (e neste sentido pode se falar em “restauração” fazendo um paralelo com a restauração bourbônica), como apontávamos no início esta restauração não significou o surgimento de um capitalismo a la Adam Smith, senão um aprofundamento das contradições do capitalismo conferindo-lhes um caráter cada vez mais explosivo. Por sua vez, ainda que em condições de alta fragmentação interna, a classe operária estendeu suas fileiras em níveis sem precedentes.

Hoje nos encontramos apenas ante as primeiras consequências da crise. Guerra de moedas, fricções no G20 para definir quem paga os custos, renovadas tensões geopolíticas, como nas Coréias, situações que põem a nu a diplomacia imperialista e o retrocesso dos EUA como potência hegemônica. Na Europa, ao tempo em que se encontra ameaçada a própria existência do euro, são produzidos uma sucessão de ataques deflacionários, na Grécia, na Espanha, em Portugal, etc., num contexto em que os dois anos de crise já haviam começada a degradar as condições de vida das massas e em especial dos mais explorados.

Começam as primeiras respostas da classe operária e dos oprimidos. Em 2010 vimos como o explosivo proletariado do Oriente começa a exercitar seus músculos em conflitos por empresa, que no caso da China conta com quase 200 milhões de novos trabalhadores que migraram para as cidades nos últimos 20 anos. A poderosa classe operária européia protagoniza os primeiros enfrentamentos contra a burguesia imperialista que pretende descarregar a crise sobre os trabalhadores, com epicentro na França com greves e mobilizações massivas contra os ataques de Sarkozy.

Estas são as condições para a reconstrução do marxismo revolucionário no princípio do presente século, ao calor da crise e dos processos de luta de classes que inevitavelmente se desenvolverão.

Neste marco é que se torna, ao mesmo tempo, cada vez mais necessário retomar as bandeiras do marxismo revolucionário, porque como apontávamos ao princípio, para a classe operária o elemento essencial para a maturidade de seus interesses está determinado por sua experiência histórica acumulada e sua educação no próprio processo da luta de classes, e esta continuidade só pode ser sustentada por sua vanguarda organizada, já que sob as condições do capitalismo nunca pode ser patrimônio da classe em conjunto. Estas experiências acumuladas tiveram sua expressão mais elevada na III Internacional, em seus quatro primeiros Congressos antes que se produzisse sua degeneração, e teve sua continuidade no legado de Trotski e da IV Internacional. Esta tradição, como assinalávamos, quebrou-se logo da Segunda Guerra Mundial, mantendo-se tenuemente no trotskismo pós-Yalta como “fios de continuidade”, refletidos nas resistências parciais corretas contra as vacilações mais abertas.

A ruptura da tradição revolucionária depois do segundo pós-guerra (com um novo salto pós-restauração) e a ausência de novas revoluções, faz com que estabelecer uma estreita relação com a classe operária sem reconstruir um marco estratégico partindo do mais avançado que deu a experiência do movimento operário e a teoria revolucionária, junto a um balanço profundo da experiência anterior, signifique degenerar, já que a classe operária é na atualidade reformista, no melhor dos casos; como dizia Lênin “sem teoria revolucionária não pode haver movimento revolucionário”.

Porém, como assinala o fundador do partido bolchevique, uma “acertada teoria revolucionária (...) só se forma de maneira definitiva em estreita conexão com a experiência prática de um movimento verdadeiramente de massas e verdadeiramente revolucionário”. Por isso é impossível redefinir este marco estratégico por fora da estreita conexão com a classe trabalhadora real, porque apesar de que a teoria revolucionária possa se desenvolver circunstancialmente em condições de relativo isolamento (como Marx no Museu Britânico ou Lênin na Suíça durante a primeira guerra mundial), o marxismo revolucionário só pode avançar para suas formas vivas e definitivas quando está vinculado com a luta e a organização da classe operária.

É tendo em conta ambos os aspectos que nos propomos a aprofundar a elaboração do marco estratégico, rompendo com toda visão “ocidentalista” avançar em uma visão mais ampla das condições da época, integrando muito especialmente a China na análise estratégica para pensar a teoria programa da revolução permanente na atualidade. Ao mesmo tempo, continuar desenvolvendo a análise da crise capitalista e suas conseqüências em nível mundial, e hoje particularmente o desenvolvimento da crise na Europa, para precisar as características e a evolução da etapa aberta após a queda do Lehman Brothers.

Por sua vez, colocaremos no primeiro plano o debate estratégico sobre Cuba [49], que hoje se encontra em uma encruzilhada frente ao imperialismo, os gusanos, e a dissidência pró-capitalista por um lado, e a burocracia que adota um curso cada vez mais abertamente restauracionista, com setores que se preparam para capitalizar os “benefícios” do desmantelamento do Estado operário, por outro. Somos os trotskistas os únicos que partindo do legado de Trotski e da IV Internacional, podemos pensar a contradição entre o domínio ditatorial da burocracia privilegiada e a permanência das conquistas da revolução. Nem os “amigos de Cuba” que se opõem à ofensiva imperialista mas confiam na burocracia que se prepara para a restauração, nem muito menos aqueles que colocam suas expectativas em um “movimento democrático” sem delimitação de classe que derrube a burocracia, podem colocar uma alternativa à restauração capitalista, como só pode ser o programa da revolução política que parta das conquistas que ainda se mantêm da revolução [50], para colocar a necessidade de revisar toda a planificação econômica em benefício da classe trabalhadora, assim como a luta por plenas liberdades democráticas para todos aqueles que defendam as conquistas da revolução. Um programa desse tipo é justamente o que se desprende das lições dos tortuosos processos que sacudiram os ex-Estados operários entre 1989 e 1991.

É junto com isso, com o desenvolvimento do marco estratégico do marxismo revolucionário e do internacionalismo, que nos propomos a aprofundar a proletarização de nossas organizações, bem como amplificar nossa influência nas organizações de massas da classe operária. E desta forma lutar no século XXI para erguer novamente as bandeiras da IV Internacional.

[1Ver: Juan Chingo, “La difícil vuelta a un nuevo equilibrio capitalista”, EI n° 26.

[2Laura Lif e Juan Chingo, “Transições à democracia”, em Estrategia Internacional no. 16.

[3Segundo a OIT, ao fim de 2009 45,6% dos trabalhadores do mundo vivem na pobreza com menos de 2 dólares por dia. Cerca de metade dos trabalhadores do mundo contam com um emprego precário (“vunerable employment”). ILO “Global employment trends”, janeiro de 2010.

[4Ver Claudia Cinatti, “A atualidade da análise de Trotski frente às novas (e velhas) controvérsias sobre a transição ao socialismo”, em EI no. 22.

[5Estes processos contra os regimes stalinistas, com mobilizações de massas em sua maioria pacíficas, à exceção da Romênia que terminou com milhares de mortos e com a execução de Ceausescu, surgiram enfrentando os ataques contra as condições de vida das massas e os planos do FMI implementados pela burocracia, porém ante a ausência de uma direção revolucionária terminaram dirigidos por setores restauracionistas, o que fez com que tivessem como resultado, pela via da restauração capitalista, novas penúrias para as massas e um amplo retrocesso nas condições de vida.

[6Leon Trotski, “Estado operário, termidor e bonapartismo”, disponível em www.ceip.org.ar e www.marxists.org

[7Giovanni Arrighi, Adam Smith em Pequim. São Paulo, Boitempo, 2008.

[8Perry Anderson, “Duas Revoluções”, em New Left Review no. 61.

[9Juan Chingo, “Mitos e realidade da China atual”, em EIB no. 1 (EI no. 21).

[10Estas constituem 80% dos ingressos dos camponeses. Rafael Poch-de-Feliu, La actualidad de China. Un mundo en crisis, una sociedad en gestación, Barcelona, Ed. Crítica, 2009. p. 109.

[11Idem, p. 94.

[12Ver: Juan Chingo, “O capitalismo mundial em uma crise histórica”, EIB no. 4 (EI no. 25).

[13Conceito cunhado por David Harvey, que tende a contrapô-lo aos mecanismos de acumulação através da exploração capitalista propriamente dita. Ver: Martín Noda, “Países imperialistas e imperialismo capitalista”, revista Lucha de Clases no. 4.

[14Richard Walker, “Karl Marx between two worlds: the antinomies of Giovanni Arrighi’s Adam Smith in Beijing”, em Historical Materialism no. 18 (2010). [Karl Marx entre dois mundos: as antinomias do Adam Smith em Pequim de Giovanni Arrighi].

[15Ver: Martin Noda, obra citada.

[16David Harvey, “El neoliberalismo como destrucción creativa”, disponível em http://www.rebelion.org/noticia.php?id=65709

[17David Harvey, O novo imperialismo, Ed. Loyola, 2004.

[18Na sigla em inglês, os “Novos Países Industrializados”, conhecidos também como “tigres asiáticos”, (nota da tradução brasileira).

[19Ou seja, os setores ligados à informática, telecomunicações e demais setores de alta tecnologia.

[20Juan Chingo, “Crise e contradições do ‘capitalismo do século XXI’”, EIB no. 3 (EI no. 24).

[21Alain Badiou, De un desastre oscuro, Amorrortu editores, Buenos Aires, 2006.

[22Daniel Bensaïd, La discordancia de los tiempos, tradução ao castelhano de Julio Rovelli, inédito.

[23Depois disso haveria somente “revoluções passivas”, como bem assinalou Gramsci, e se deram de maneira muito diferente, postas em xeque pelo surgimento da revolução proletária.

[24Como assinalara Trotski em Resultados e Perspectivas, “Já o ano de 1848 apresenta uma grande diferença com respeito ao ano de 1789. Em comparação com a grande revolução, a prussiana e a austríaca surpreenderam pela falta de brio. Por um lado chegaram demasiado prontamente; por outro, demasiado tarde. O gigantesco esforço que necessita a sociedade burguesa para acertar contas radicalmente com os senhores do passado, só pode ser conseguido, ou bem mediante a poderosa unidade da nação inteira que se subleva contra o despotismo feudal, ou então mediante uma evolução acelerada da luta de classes dentro desta nação em vias de emancipação. O primeiro caso se deu entre 1789 e 1793; toda a energia nacional que se vinha acumulando na tremenda resistência contra a velha ordem, voltou-se por completo na luta contra a reação. No segundo caso, que até agora não se deu na história e que consideramos apenas como uma possibilidade, produz-se, dentro da nação burguesa, o grau de energia necessário para conseguir a vitória sobre as forças obscuras do passado, mediante uma ’discutível’ luta de classes.”

[25Richard Freeman, “China, India and the doubling of the global labor force: who pays the price of globalization?”, The Globalist, 03/06/2005. [China, Índia e a duplicação da força de trabalho mundial: quem paga o preço da globalização?

[26Eduardo Molina, “¿A dónde va América Latina?”, em EI no. 22.

[27Daniel Bensaïd, obra citada.

[28Leon Trotski, “A creeping revolution”, The First Five Years of the Communist International,disponível em http://www.marxists.org/archive/trotski/1924/ffyci-1/ch05.htm

[29Com relação a um período histórico mais amplo, essa dialética atuou em duas fases. No pós-guerra, quando cada conquista, nos marcos do “boom” capitalista, servia para reforçar a burocracia e os aparatos contra-revolucionários, moldando o movimento operário no reformismo. E na etapa de restauração, quando estas conquistas se perdem, o fenômeno “perverso” das décadas anteriores, que é fundamental nas derrotas dos anos 70, passa a revelar toda sua significação histórica nos anos 80 e 90.

[30Naquele momento já contavam, inclusive, com certos interesses comuns, sobretudo as camadas altas da burguesia, o que se demonstrou depois com Felipe de Orleans, diferentemente do proletariado que em seu intento de construir uma sociedade sem exploração é irreconciliavelmente antagônico à burguesia.

[31V. I. Lenin, “A luta contra os social-democratas kadetizantes e a disciplina do partido”, Obras Completas.

[32Isaac Deutscher, O profeta banido. Ed. Civilização Brasileira, 2006. [El profeta desterrado, p. 379].

[33Nicolau Maquiavel, O Príncipe, Ed. Paz e Terra, 1996.

[34Antonio Gramsci, “O partido político”, em Cadernos do Cárcere,vol.3, Civilização Brasileira.

[35D. Bensaïd, Trotskismos, Ed. El Viejo Topo, 2007.

[36Leon Trotski, “Os 90 anos do Manifesto Comunista”, em O Programa de Transição. Documentos da IV Internacional. Ed. Iskra.

[37Leon Trotski, “Manifesto da Quarta Internacional sobre a guerra imperialista e a revolução proletária mundial”, disponível em http://www.ceip.org.ar/escritos/Libro6/html/T11V201.htm

[38Leon Trotski, O Programa de Transição. edição citada.

[39Ver: Emilio Albamonte e Manolo Romano, “Trotski y Gramsci. Convergencias y divergencias”, em EI no. 19.

[40Leon Trotski, “Os 90 anos do Manifesto Comunista”, edição citada.

[41Emilio Albamonte e Manolo Romano, obra citada.

[42Jan Willem Stutje, Ernest Mandel: A Rebel’s Dream Deferred, Londres, Verso, 2009.

[43Ver: Daniel Bensaïd, Elogio de la política profana, Península, Granada, 2009.

[44Martín Hernández, O veredito da história. Ed. Sundermann, 2008.

[45No terreno ideológico, frente ao vendaval pós-moderno se produz um giro à esquerda na intelectualidade que fica marcada na publicação de 1993 dos Espectros de Marx de Derrida e um ano depois A miséria do mundo de Pierre Bordieu. No caso do primeiro, onde o próprio Derrida se definia como não marxista, cumpre a função de relegitimar a discussão sobre Marx, enquanto que o segundo contém uma pormenorizada investigação sobre as condições de vida da classe trabalhadora francesa de parte de um dos sociólogos mais prestigiosos daquele momento.

[46Política que se expressou previamente e na fundação do Scottish Socialist Party em 1998, no Bloco de Esquerda em Portugal em 1999, o Partido da Esquerda na Suécia, a Aliança Vermelho-Verde na Dinamarca de princípios de 1990, a Socialist Alliance na Grã Bretanha. Ver: Cinatti, Claudia, “Que partido para qual estratégia?”, em EIB no. 3 (EI 24).

[47Rosa Luxemburgo, Huelga de masas partido y sindicatos, Fundación Federico Engels, Madrid, 2003.

[48Nos textos de seu último congresso, LO mostra seu derrotismo para com a classe trabalhadora. Uma “verdadeira luta contra os fechamentos de empresas –dizem- exigiria um alto nível de consciência e de combatividade, já que como impedir a patrões que querem realmente fechar suas empresas de fazê-lo… se não for lutando pela expropriação destas empresas e pelo controle operário? Mas quem poderia sequer pretender que, nas circunstâncias atuais, isso está na ordem do dia?”.

[49Ver: Declaração da Fração Trotskista – Quarta Internacional: “Cuba na encruzilhada”, em http://www.ft-ci.org/article.php3?id_article=3152

[50Como o predomínio da propriedade nacionalizada onde o Estado continua sendo o empregador de 80% dos trabalhadores; a propriedade estatal da terra; os padrões de educação e saúde, assim como o resto das conquistas históricas que a classe operária cubana mantém; os elementos que ainda perduram do controle do comercio exterior, etc.

Artigos relacionados: Teoria









  • Não há comentários para este artigo