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Epidemia de dengue: A grave situação castiga principalmente os trabalhadores e os pobres

23 Mar 2008   |   comentários

O Estado do Rio de Janeiro já registra 49 mortos por dengue este ano. São 32.615 casos registrados até o dia 20/03, sendo 23.555 só na capital. O crescimento dos infectados é exponencial, de uma média de 900 casos registrados por dia passou-se a absurdos 2053 só nesta última quinta-feira. São 80 casos registrados por hora na capital. Neste dia, 4 em cada 30 mil fluminenses pegaram dengue! E estes são os números oficiais, que não incluem aquelas pessoas que ainda aguardam para ser atendidas, as que foram diagnosticadas com outras doenças, ou que, por falta de tempo os médicos não informaram aos serviços estatísticos o que estavam tratando, e nem é claro aqueles que nem sequer foram aos hospitais e postos de saúde.

O Rio de Janeiro enfrenta uma calamidade pública

Nos Hospitais públicos falta de leitos, relatos de mais de 5 horas de espera no Miguel Couto e no Alberto Schweitzer para ser atendido ou na espera dos resultados do hemograma. Além de cenas, como as que foram vinculadas pela Rede Globo: crianças desmaiando enquanto aguardam para ser atendidas. A situação nos hospitais particulares é melhor, mas neles também se expressa a epidemia que atinge toda a cidade, a rede de hospitais particulares D”™Or queixa-se do aumento de casos de dengue em 25% e até nesses hospitais começa a ocorrer esperas de mais de hora. Para completar o quadro, o HemoRio informa que a partir de domingo a cidade pode sofrer falta bolsas de sangue de plaquetas ’ indispensáveis para o tratamento da variedade hemorrágica da doença.

Essa epidemia é sintoma de uma crise geral da saúde no Rio

Enquanto disputam entre si, os governos e a mídia não poupam esforços para colocar a culpa na própria população e nos trabalhadores da saúde, o que deixa ainda mais nítida o descaso geral de todas as esferas do governo com a saúde pública, ao tempo em que se gasta milhões e milhões de reais em aparato repressivo para, sob pretexto de “combater ao tráfico” , reprimir negros e pobres nas favelas; e outros milhões e milhões com o turismo. Os gastos da prefeitura em prevenção da dengue em 2007 somaram R$3,22 milhões (segundo Chico Alencar), valor que é inferior a licitação que o governo Estadual fez para aquisição de 9 novos caveirões (R$ 3,825 milhões - O Dia Online, 17/12/2007), também é inferior aos R$ 55 milhões que o governo federal liberou para policiamento no Rio com o Pac da Segurança (excluindo o valor gasto em obras, novas viaturas e os R$ 200 milhões para novas penitenciárias) e aos R$ 380 milhões gastos com o Engenhão, estádio construído para o PAN.

Uma crise como está que depende da proliferação do mosquito transmissor mostra claramente como este problema não é só de “saúde” . É muito mais amplo, é reflexo da situação de miséria a que está submetida parte importante da população carioca e fluminense com seus outros sintomas de desemprego, moradias precárias, falta de educação, saneamento, etc.

Nos hospitais públicos, sejam municipais, estaduais ou federais, a população sofre com o atendimento precário e os trabalhadores da saúde com as condições precárias de trabalho. O Hospital Universitário da UFRJ do Fundão é um exemplo, enquanto a universidade recebe verbas do REUNI (projeto do governo para expansão das vagas nas universidades federais sob custo de precarizar as condições de trabalho e ensino), o hospital não tem condições de absorver a demanda da dengue, tendo que retirar os leitos para o atendimento de HIV. Em janeiro deste ano, os hospitais sofreram uma crise com a infecção hospitalar, reflexo da mesma falta de material e falta de profissionais, forçando os enfermeiros e técnicos a terem que escolher entre as condições sanitárias adequadas, ou o atendimento a um maior número de pacientes.

A epidemia atinge de forma mais aguda os trabalhadores e os pobres

É evidente para todos como os maiores atingidos são os trabalhadores e o povo pobre. O esforço da rede Globo e seu jornal O Globo em relatar a situação no Copa D”™Or, e também do Jornal do Brasil com sua manchete “Dengue avança na classe média” (21/3) são mostras ao avesso disto. As estatísticas da Prefeitura do Rio não deixam dúvidas, enquanto o conjunto da cidade registra 386 casos a cada 100 mil habitantes, alguns bairros que concentram um grande número de morros, favelas e regiões populares como Jacarepaguá, a região portuária (Centro), Ramos, Penha, Cidade de Deus, Inhaúma, Pavuna têm médias de cerca de mil casos por 100 mil habitantes, ou seja, 1% da população !

Enquanto o Leblon registrou 148 casos para 100 mil habitantes, a Cidade de Deus registrou 2020 casos para a mesma proporção de habitantes e sua vizinha, Curicica 8196 casos!

Se a Secretaria Estadual da Saúde e as prefeituras da Baixada Fluminense também divulgassem seus dados veríamos, provavelmente, a mesma situação nas cidades-dormitório e nas concentrações operárias e populares.

Os governos fazem vista grossa e se preparam para o combate eleitoral

Esta semana o Rio assistiu atónito à disputa dos governos municipal, estadual e federal tentando um colocar a culpa no outro pela crise, e nenhum deles oferecer, é claro, alguma saída ao povo. A prefeitura (DEM) culpou primeiro o governo federal, e em tom menos agudo o possível futuro aliado PMDB, e seu governo do Estado. O governo estadual culpou a meio tom o governo municipal; o governo federal bradou contra o município e se calou sobre sua responsabilidade. O governo do PT não ofereceu nenhuma crítica a si mesmo, uma vez que o PT já governou o Estado e deste modo tem responsabilidade pela saúde do estado, nem mencionou a prefeitura de Nova Iguaçu ’ dirigida pelo PT e segundo município com maior incidência de dengue ’ nem criticou o governo do aliado Sérgio Cabral. Somado ao clima pré-eleitoral que se intensifica, também abateu a cidade o debate se a crise da dengue já havia se transformado em uma epidemia ou não. O prefeito César Maia (DEM) negou várias vezes que tratava-se de uma epidemia, só no final da tarde de 21/3 admitiu que se trataria de uma epidemia em Jacarepaguá (e não também na Penha, no Porto, em Ramos, Pavuna, Cidade de Deus...). Enquanto especialistas chamados por estas autoridades debatiam quantos mortos e quantos infectados são necessários para se chamar epidemia, aumentavam as filas, as esperas e os mortos.

O governo do Estado (PMDB) resolveu depois de intensas críticas, esquivar-se do debate se é ou não é epidemia e oferecer suas desculpas à população. O secretário de saúde, Sérgio Cortês admitiu tratar-se de uma epidemia, e por estes dois feitos foi saudado como herói em toda imprensa escrita carioca. O governo federal por sua vez, fez propaganda do Programa Saúde da Família e culpou sua baixa adesão pelo município do Rio de Janeiro como causa da epidemia da doença, e ainda informou a todos que já previa a crise desde outubro de 2007 ’ previa e nada fez.

O candidato a prefeito Gabeira (PV em aliança com PSDB e PSB) tido como “progressista” e “com histórico de luta” por parte da esquerda carioca também tentou surfar na onda de debater a dengue, mas tal como os outros políticos da burguesia, não ofereceu a mais mínima resposta ao problema . Da parte do deputado federal Chico Alencar, candidato do PSOL à prefeitura ouviu-se a importante denúncia dos governos e a defesa de melhorias no Hospital do Caju (o especializado em doenças infecciosas) ’ importantes é certo - mas insuficiente para debelar a crise. Do PCdoB e sua candidata Jandira Feghali, que hoje iria ao segundo turno com Crivella, ouviu-se o mesmo que do governo federal: o problema seria a prefeitura e baixa implementação do Programa Saúde da Família.

Enquanto os olhos estão voltados a outubro, a mãe da 49ª vítima fatal (a 25ª criança) relata quem são os culpados e que classe é mais atingida pela crise: “É uma revolta muito grande. Os governantes falam que não há epidemia. E olha como nós estamos. Quem não tem plano de saúde vai morrer.” (O Globo, 22/3)

Jogar um contra o outro: a política oficial de combate à dengue

O eixo da “solução para epidemia” que os distintos governos estão dando, fora a criação de irrisórios 80 leitos e três tendas de hidratação pelo governo Estadual, barracas do exército pelo governo Federal é jogar a população contra ela mesma e contra os trabalhadores da saúde. Querem nos fazer acreditar que o problema são os médicos que não trabalham ou o vizinho. O disque-dengue virou disque-denúncia e parte fundamental da solução, e vai ganhando vida com a repetição do slogan de toda a mídia e todos governos: “mobilizar a sociedade” .
A prefeitura do Rio de Janeiro vai mais longe, além de oferecer novos disque-denúncia aconselha o uso de calça e sapatos e repelentes, para quem tiver recursos é claro. Quem não tiver que agüente as filas e arrisque a vida de seus filhos.

A Globo se apressou a mostrar ontem, 21/3, que a morte de um bebê (o mesmo que a mãe culpou os governos citado acima) em Bangu se deu porque não havia pediatra no posto. A secretaria da saúde foi procurada e informou que a médica terá de prestar contas e poderá ser demitida (fonte: G1). O prefeito César Maia também argumenta como a prefeitura está fazendo sua parte: cortando todas folgas dos trabalhadores da saúde e exigindo a duplicação das jornadas de técnicos, enfermeiros e médicos.

Por um programa de resposta à epidemia

É visível a todos como os governos, estão buscando cada um a seu modo passar a batata quente ao outro. Não podemos continuar aceitando o descaso com a saúde dos trabalhadores e do povo enquanto fortunas são desviadas todo ano para os grandes burgueses e banqueiros através das dívidas interna e externa.

As medidas propostas pelos governos são irrisórias frente ao tamanho da crise. A única solução sistemática que oferecem é jogar cada habitante contra o outro e ninguém culpar os governos ou questionar os lucros do sistema privado de saúde. Não podemos admitir que os donos desses hospitais, clínicas e laboratórios que lucram diariamente às custas das doenças da população agora lucrem ainda mais com a epidemia de dengue!

Devemos chamar a Conlutas, a Intersindical, o PSTU, o PSOL, os parlamentares do PSOL, os sindicatos, os intelectuais, as organizações operárias, populares, democráticas e de estudantes, a denunciar os governos federal, estadual e municipal e levantar um programa, tal como o que propomos, que dê conta do tamanho desta crise e ofereça algumas respostas mais estruturais ao problema.

A situação de calamidade pública criada pelos governos, o descaso com que tratam esta crise, as “respostas” que dão como usar calças e passar repelente são inaceitáveis. Pela apuração e punição dos culpados!

Governos que permitem que duas mil pessoas sejam infectadas por dia e dezenas morram por uma doença erradicável não podem existir, começando pelo responsável mais direto, o prefeito César Maia. Fora César Maia!

A falta de leitos é séria, no entanto o governo Estadual ainda estuda se alugará leitos dos hospitais particulares, sem revelar quantos, em que condições e a que valor. O governo federal improvisará tendas e leitos. Enquanto pessoas se amontoam nos hospitais públicos há leitos disponíveis somente para quem pode pagar a consulta particular ou tem convênio nos hospitais e clínicas particulares. Estes leitos devem ser utilizados por todos. As esperas nos hospitais para obter um hemograma também desgastam a população, além de aumentar os riscos de transmissão ao concentrar muitos infectados, os riscos de desidratação devido a lotação e condições dos hospitais, além de a demora no diagnóstico colocar vidas em risco. No Rio de Janeiro há muitos laboratórios particulares que fazem rapidamente hemogramas e outros exames para quem puder pagar. O atendimento à população deve vir em primeiro lugar, a proposta do governo do Estado de pagar pelo uso dos hospitais particulares serve para atenuar o problema enquanto transfere mais recursos a estes empresários que lucram com a doença. Pelo confisco pelo Estado dos leitos ociosos e capacidade ociosa dos laboratórios privados! Pela abertura dos hospitais particulares, das clínicas e dos laboratórios sem nenhum pagamento! A necessidade de atendimento não pode estar condicionada ao lucro dos empresários da saúde, o uso gratuito de suas instalações deve servir de base para uma luta pela estatização, sem indenização, de todos os hospitais, clínicas e laboratórios privados, sob controle dos trabalhadores da saúde e usuários!

Contra o jogo dos governos e da mídia burguesa de jogar a população contra os trabalhadores da saúde devemos exigir mais verbas para saúde mediante o não pagamento das dívidas interna e externa para atender à população e defender melhores condições de trabalho aos técnicos, enfermeiros, médicos e outros profissionais da saúde, efetivos ou terceirizados, para garantir melhor atendimento. O salário inicial atual de um médico da rede municipal é de R$ 669, a situação de outros trabalhadores da saúde, começando pela limpeza, é ainda mais miserável ’ nestas condições é impensável o atendimento digno e responsável aos usuários. Pelo salário mínimo do DIEESE de R$ 1.900,31, concursos públicos e redução da jornada de trabalho!
Esta crise de dengue não é só um problema “hospitalar” . É reflexo da falta de emprego, precárias condições de moradia, saneamento básico e educação. Qualquer tentativa séria de resolver esta crise e melhorar a situação para o verão do ano que vem passa por um plano de obras públicas nos morros, favelas e bairros populares. Garantindo emprego e treinamento à milhares de desempregados e melhorando as condições de moradia e vida.

A situação da saúde é grave, é necessário transformá-la radicalmente para atender às necessidades da população e dos trabalhadores da saúde. Pela estatização dos hospitais, clínicas e laboratórios privados e controle pelos trabalhadores e usuários de todo o sistema de saúde. Esta transformação não virá pela mão dos governos nem dos empresários de hospitais, clínicas e laboratórios, somente através da mobilização independente dos trabalhadores da saúde e dos usuários será possível organizar uma força capaz de reorganizar o sistema de saúde e atender os interesses da população. Por comitês de médicos, trabalhadores da saúde e usuários!

As organizações de oposição de esquerda ao governo Lula como a CONLUTAS e a INTERSINDICAL devem encampar este programa e junto dos sindicatos, a começar pelo SINDISPREV, dirigido por uma corrente do PSOL e que agrupa os trabalhadores federais da saúde, se dirigir aos trabalhadores para organizar um comitê de médicos, trabalhadores da saúde e usuários. O SINDISPREV deveria começar chamando o sindicato dos médicos, outros sindicatos e os usuários a conformarem esta organização e através da Conlutas e Intersindical chamar outros sindicatos, a CUT e outras centrais a organizarem já um dia de doação de sangue nas ruas, nos locais de trabalho, nas faculdades, em solidariedade ao infectados. Esta tática, junto de outras, permitiria em sua combinação com as denúncias e exigências que apareça, inclusive para o setor mais atrasado da população, como ao contrário do que diz o governo, a culpa não são dos trabalhadores da saúde, e que classe operária através de suas organizações sindicais e políticas a esquerda do governo Lula busca seriamente responder a esta crise.

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