Sábado 4 de Maio de 2024

Nacional

PRIVATIZAÇÃO DA CESP

Entre a nova ofensiva tucana e o oportunismo petista

06 Apr 2008   |   comentários

O Governo do Estado de São Paulo teve que recuar no processo de privatização da Cesp (Companhia Energética de São Paulo) marcado para o último dia 26 de março. Frente a problemas judiciais, o leilão da primeira das 18 empresas estatais que o governador José Serra pretende privatizar foi adiado. A Cesp, avaliada em mais de 15 bilhões pelo sindicato dos eletricitários, abriria seu leilão com um lance máximo de 6 bilhões. A disparidade de valores, comum a todas as privatizações das últimas duas décadas, faz parte da lógica de sucateamento das empresas para justificar a privatização, e apesar de estar presente em todo o período FHC, começou no final dos anos 80 com o então governador de São Paulo, Mário Covas, um dos pilares do neoliberalismo tucano.

Essa ofensiva privatista foi acelerada durante os anos 90, resultando na privatização de diversos serviços públicos (telefonia, transportes, energia elétrica etc) sob o discurso de “maior competitividade” , “democracia de mercado” e “redução dos gastos estatais” . O que se têm visto desde então é, ao contrário, a formação de poucos e gigantescos conglomerados multinacionais como a espanhola Telefónica ou a norte-americana AES/Eletropaulo, resultando na demissão em massa dos funcionários públicos, na criação de empregos precarizados e terceirizados, além do aumento exorbitante das tarifas dos serviços essenciais. Cada vez mais a classe trabalhadora sente na pele o peso de uma das mais caras contas de luz do mundo, vê a Telefónica bater recordes de reclamação sobre atendimento e serviços e perde grande parte de seu salário no gasto com transporte público de baixíssima qualidade.

O papel que cumpriu o neo-peleguismo dos 90

No auge da ofensiva do capital estrangeiro, os governos e a patronal contavam com importantes aliados no seio do movimento operário. O Sindicato dos eletricitários de São Paulo (Stieesp), por exemplo, dirigido nos anos 90 por Antonio Rogério Magri, da central sindical UGT, cumpriu um papel fundamental na privatização da Eletropaulo. Com o lema “sindicalismo de resultado” a direção desse sindicato e sua central educavam os trabalhadores que em tempos como aqueles, não existia “correlação de forças” para lutar. Ao mesmo tempo em que participavam diretamente das mesas de negociação com os políticos e as empresas, ensinavam aos trabalhadores que “em nome de garantir os empregos, devia-se abrir mão dos direitos” .

O resultado todos já sabem: demissão, privatização e aumento da exploração. Nos dias atuais, em que o governo de plantão é composto diretamente pelos burocratas e pelegos de ontem (principalmente do PT e PCdoB), os novos pelegos como Magri não são mais imprescindíveis nas mesas de negociação. Cumprem atualmente o mesmo papel traidor, mas utilizam uma tática um pouco diferente: fazem atos de rua isolados do conjunto da classe, que mais parecem “velar” o “defunto público” , totalmente adaptados e comprometidos com a legalidade burguesa. Limitam-se a pressionar deputados e políticos no parlamento ao mesmo tempo em que negociam pelas costas da categoria, para depois frente aos trabalhadores “lamentar” a luta perdida.

O Oportunismo petista...

Na campanha de reeleição, Lula convenceu os trabalhadores e o povo pobre de que existia uma polarização entre o suposto “projeto popular” , apoiado nas migalhas dos planos assistencialistas, contra o “entreguismo” e a “submissão internacional” da oposição liderada pelo bloco PSDB/ex-PFL (atual DEM). Alckmin, tentando se livrar da herança privatista deixada por FHC, chegou ao ridículo de posar frente às câmeras de TV com aventais onde se via o logotipo das poucas empresas que ainda são públicas nesse país, como a CEF (Caixa Económica Federal) e a Petrobrás. Lula utilizava toda a retórica antiprivatização, como defensor da “soberania nacional” , para angariar os votos dos indecisos. Porém, depois de eleito, cometeu um verdadeiro estelionato eleitoral.

Para aparecer menos “entreguista” frente às massas, Lula criou uma nova fórmula de privatização batizando seus projetos com o nome de PPP”™s (Parcerias Público-Privadas), e agora mais recentemente com as obras de infra-estrutura denominadas PAC (Plano de Aceleração do Crescimento). Desses, a nova linha 4 do metró que está sendo construída em São Paulo é um dos maiores exemplos. Em parceria com o governo Serra, essa obra de interesse e objetivo público está sendo construída por um consórcio privado que reúne grandes empreiteiras nacionais e internacionais e que vai lucrar com o metró por 30 anos. A sede de lucro desses capitalistas, e o interesse eleitoral de Serra em acabar rapidamente as obras, resultou em um “acidente” que matou no ano passado 7 pessoas. Com o nome de “desestatização” , Lula lançou o “projeto de reestruturação” dos bancos estaduais públicos. Privatizou o BEC (Banco do Estado do Ceará), comprado pelo Bradesco por R$ 700 mil em 2005 e o BEM (Banco do Estado do Maranhão) em 2004. Via PAC, Lula quer garantir a todo custo as obras de transposição do Rio São Francisco, feitas por empreiteiras particulares com dinheiro público, para favorecer os interesses dos agro-exportadores. Em nome do “PAC da Segurança” , além da repressão ao povo, Lula vai jogar dinheiro público nas mãos das mesmas empreiteiras para ”˜urbanizar”™ as favelas do RJ. Outra privatização disfarçada. Até no caso da Cesp, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social) pretende “emprestar” 40% do valor final à empresa vencedora do leilão, se já não bastassem todos os incentivos e facilidades que essas empresas têm para espoliar as empresas públicas.

Como a “herança maldita” deixada por FHC traz lembranças negativas para o conjunto das classes oprimidas e do povo pobre, Lula camufla a continuidade da mesma política neoliberal do PSDB com pequenas concessões e muita demagogia. Vestindo a camisa de oposição em SP, quer continuar mascarando que é aplicador direto das privatizações federais, pois ganhar as eleições municipais desse ano pode significar um passo à frente para a corrida das eleições presidenciais de 2010. O PT até criou uma tal “Frente paulista em defesa dos serviços públicos, contra a privatização” , que reúne também o PCdoB, a CUT ’ com a Apeoesp (Associação dos Professores do Estado de São Paulo) à frente ’ outras centrais sindicais, e até o PSOL/Intersindical e o PSTU/Conlutas. Essa frente nada mais é do que um palanque oportunista do PT para as eleições municipais, porque além de não falar nada das novas formas de privatização petista, ainda alimenta nas massas a ilusão de que com processos mais “transparentes” e com licitações mais “amplas e democráticas” , pode-se conseguir uma prestação de serviços públicos mais “justa e barata” ; promovendo a idéia de privatizar esses serviços.

Unidade na ação... Mas com independência de classe

Achamos fundamental que as organizações de esquerda, em especial o PSTU, se coloquem a frente desta luta e, como diz Zafalão da Apeoesp: “essa luta deve se unificar com as campanhas salariais que estão por vir” . Devemos educar a vanguarda de trabalhadores que começa a se levantar contra os ataques, a fazer uma experiência concreta de lutas que ultrapassem o patamar económico de melhores condições de salário e discutam os problemas centrais da terceirização e precarização dos empregos, com reivindicações políticas e baseadas em seus métodos independentes de luta.

Para que essa “Frente” com as direções sindicais governistas e pró-patronais como a CUT, Força Sindical, CTB etc. faça sentido, deve estar subordinada a que essas direções mobilizem a base de seus sindicatos para barrar a privatização da Cesp de forma efetiva, com os métodos de luta da classe trabalhadora. O PSTU/Conlutas e a Intersindical deveriam fazer claras exigências neste sentido, por exemplo, exigindo que se unifique as campanhas salariais do 1º semestre em São Paulo ao redor dessa reivindicação, organizando paralisações e atos massivos no centro que mostrem realmente para a burguesia e o governo as conseqüências que podem sofrer se avançam em seus planos privatizadores. Essa não é uma realidade distante, haja visto que, pressionados por sua base, a direção do sindicato dos metroviários no ano passado organizou um dia de paralisação contra a privatização da linha amarela.

Para que a consigna de barras a privatização da Cesp seja conseqüente com um programa classista, a Conlutas deve mobilizar a base dos seus sindicatos e o Congresso Sindical unificado com a Intersindical, marcado para o início de julho, nesse sentido. Em nome de uma frente única na ação com todos os setores das fileiras operárias, não podemos rebaixar o programa e deixar de denunciar a ligação entre os burocratas e o governo. Está correta a denuncia que o PSTU faz nas páginas do Opinião Socialista, mas ela deve estar presente também nos documentos e reuniões feitos na superestrutura sindical, nas estruturas em que esta presente, desmascarando os burocratas das centrais governistas. Ao mesmo tempo em que participa da Frente, se diferenciando política e programaticamente do PT, da CUT e do PCdoB, o PSTU/Conlutas deve ter uma política conseqüente desde os sindicatos que dirige, com uma sólida campanha que possa preparar os trabalhadores para lutar com paralisações, greves e ações de solidariedade ativa, unificando a luta do funcionalismo contra as privatizações de Serra e Lula.

O PSOL, infelizmente está centrando eixo em um recurso denominado ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade), que consiste em reclamar da proibição de empresas públicas em participar do processo. Defendem que com “igualdade de condições” a todos os participantes e com mais empresas envolvidas, existiriam “melhores condições de defender o interesse público” com “propostas mais vantajosas para a sociedade brasileira” [1]. Ou seja, canalizam o partido e toda a sua militância estritamente nos marcos da legalidade burguesa, cedendo abertamente a democracia dos ricos, legitimando as instituições do regime e, finalmente, liquidando todo o discurso de “oposição de esquerda” com uma política policlassista que nada tem a ver com os métodos da classe trabalhadora. É lamentável que esse partido se dilua na “Frente” impulsionada pelo PT, de forma acrítica e eleitoralista, sem impulsionar medidas concretas de mobilização independente das massas. As correntes internas do PSOL que se colocam no campo da independência de classe não podem se diluir na política da ala hegemónica (MES, APS e MTL-Poder Popular) e devem levantar a partir dos sindicatos e de suas figuras públicas um programa independente que responda as demandas elementares da classe trabalhadora e do povo pobre.

Contra as privatizações, as organizações de esquerda devem levantar um programa de reestatização sem indenização dos serviços públicos sob controle dos trabalhadores, e de comitês de usuários. E se a burguesia alega que as empresas dão prejuízo, propomos garantir os serviços baratos a partir do não pagamento das dívidas externa e interna. A única maneira conseqüente de combater os planos de privatização dos governos estaduais e federal é impulsionar esse programa nos sindicatos de base dirigidos pela Intersindical e pela Conlutas, através de um plano de lutas para unificar os setores do funcionalismo, baseados nos métodos independentes da classe trabalhadora.

[1Trecho extraído do site do PSOL: www.psol.org.br “PSOL entra com ADIN contra privatização da Cesp”

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