Sexta 26 de Abril de 2024

Juventude

Conquista parcial na Unesp: a luta contra as suspensões e expulsões é a luta contra o regimento da ditadura, faltam 17!

18 Feb 2015   |   comentários

Com vitória parcial contra a repressão na Unesp, continuamos gritando com força: pela imediata reintegração dos 17 estudantes expulsos em Araraquara e pela anulação dos processos de suspensão!

Perseguição política instituída: o AI-5 da Unesp

Em 2014 o Conselho Universitário, cortando os microfones e expulsando os advogados de defesa dos estudantes, deliberou pela suspensão de 95 estudantes por 60 dias, o que poderia acarretar no abandono de cursos, perda de bolsas, entre outros problemas. Não foram ouvidas testemunhas de defesa. A polícia reconhece que entrou quebrando o patrimônio na reintegração de posse na ocasião da ocupação da reitoria de 2013. Qual o crime cometido pelos estudantes? Barraram o PIMESP (Programa que dificultaria o ingresso de negros e indígenas na universidade), e conquistaram ampliação das políticas de permanência estudantil, com a criação da Comissão Permanente de Permanência Estudantil. Para os herdeiros dos Senhores de Engenho, trata-se de um crime imperdoável.

Em 2015 o Diário Oficial anunciou a expulsão de 17 estudantes da Unesp de Araraquara. O movimento nos dois casos lutava por permanência estudantil, para que os estudantes pobres possam não apenas entrar, mas permanecer na universidade. Contra aqueles que lutaram pelo acesso dos negros à universidade, os capitães do mato de ontem, vivem na voz da Reitoria de hoje, que agora quer aplicar seus castigos exemplares.

Moradia, alimentação, bolsas socioeconômicas deveriam ser questões democráticas básicas a uma universidade pública. Então, por que os estudantes são punidos? Quais leis infringiram?

Precisamente as suspensões e expulsões, segundo destaca a reitoria, se dão com base nos seguintes artigos: 161 e 162 do Capítulo 3 do Título VI do Regimento Geral da Unesp:

Artigo 161 - Constituem infrações disciplinares do corpo discente:
I - inutilizar, alterar ou fazer qualquer inscrição em editais ou avisos afixados pela administração;
II - fazer inscrições em próprios da Universidade ou nos objetos de propriedade da Unesp e afixar cartazes fora dos locais a eles destinados;
III - retirar, sem prévia permissão da autoridade competente, objeto ou documento existente em qualquer dependência da Unesp;
IV - praticar ato atentatório à integridade física e moral de pessoas ou aos bons costumes;
V - praticar jogos de azar;
VI - guardar, transportar e utilizar arma ou substância que cause qualquer tipo de dependência;
VII - perturbar os trabalhos escolares, as atividades científicas ou o bom funcionamento da administração;
VIII - promover manifestações e propaganda de caráter político-partidário, racial ou religioso, bem como incitar, promover ou apoiar ausência coletiva aos trabalhos escolares a qualquer pretexto;
IX - desobedecer aos preceitos regulamentares do Estado, do Regimento Geral, dos Regimentos das unidades universitárias e de outras normas fixadas por autoridade competente;
X - desacatar membro da comunidade universitária;
XI - praticar atos que atentem contra o patrimônio científico, cultural e material da Unesp.

Artigo 162 - As penas disciplinares aplicáveis aos membros do corpo discente são:
I - advertência verbal;
II - repreensão;
III - suspensão;
IV – desligamento.

Para a Constituição de 1988, após a queda do regime militar, na teoria, não estão proibidas manifestações políticas e partidárias, nem afixar cartazes, nem atentar contra os “bons costumes”, leis estas afirmadas no contexto da ditadura, utilizadas para censura, torturas, perseguição política. Estas leis são completamente avessas à possibilidade de produção de conhecimento crítico. Mas para a Unesp, sim, são exatamente estes os artigos do regimento vigente destacados pelo Reitor, e enviados por correio aos estudantes justificando as punições. Estas foram as regras infringidas. Neste Estatuto redigido durante a ditadura por aqueles que perseguiam e torturavam militantes de esquerda, estão proibidos também a ausência coletiva (leia-se greves), “perturbar os trabalhos escolares” e o “bom funcionamento da administração”.

Devemos nos perguntar, qual é o “bom funcionamento da administração”, ou melhor, bom para quem?

Bom para o Santander que defende o Ensino à Distância e que tem voz garantida nos rumos políticos da instituição, ou para os estudantes, funcionários e professores preocupados com a qualidade do ensino? Bom para as empresas que garantem que diversas pesquisas da Unesp sejam voltadas aos seus lucros, ou à população que sustenta a Unesp através dos impostos, mas é impedida de estudar pelo filtro social que é o vestibular? Bom para os altos cargos da burocracia acadêmica com seus super-salários, ou para a população atendida por projetos de extensão que tiveram mais de 50% de cortes em 2014? Bom para os rankings internacionais e para a cartilha do Banco Mundial aumentando vagas sem amento de verbas suficiente, ou para os trabalhadores terceirizados que assediados por patrões, que são super-explorados todos os dias nas Unesps sustentando com dor nas costas as estrelas da instituição? Bom para os negros e negras que pagam os impostos, mas estão fora dos cursos mais concorridos da instituição? Bom para os funcionários que já receberam a ameaça de congelamento de contratações e de salários, e que padecem com problemas de saúde, também assediados e perseguidos pela reitoria? Bom para as mulheres que padecem com políticas insuficientes de permanência, como creches, assediadas em trotes e festas universitárias com conivência da instituição (Vide o caso do Rodeio das Gordas, episódio em que estudantes organizaram um torneio de montagem em garotas gordas. Os estudantes envolvidos, após muita pressão do movimento estudantil, tiveram apenas poucos dias de suspensão durante as férias. Os estudantes que organizaram um festival contra as opressões, em repúdio ao episódio, foram igualmente sindicados.)? Bom para as travestis que dificilmente conseguem adentrar na universidade dado um conjunto de barreiras institucionais que insistem em não reconhecer suas identidades?

Nas periferias, com o genocídio da população negra, e em outro contexto, nas universidades, com a perseguição de lutadores, ao se utilizar destes artigos para punir os estudantes a reitoria não faz outra coisa senão mostrar o que temos defendido: a ditadura de ontem vive na repressão de hoje! A moral deles é a dos torturadores, a democracia deles é a nossa ditadura, que nossa moral seja a de Palmares, e que ergamos um movimento forte com democracia proletária confiando nas forças de nossa classe, lutando não apenas por nossas demandas mais imediatas, mas para as demandas mais sentidas de nossa classe!

A repressão é pilar de um projeto de universidade de classe, só é possível uma saída com independência de classe!

Sabemos que a transição pactuada da ditadura à democracia no Brasil em meados dos anos 1980 se deu com a manutenção de instituições repressivas, conservando ditadores nos governos, e garantindo a não punição aos torturadores. Com o fim da ditadura militar não foram desfeitos mecanismos de perseguição política. Em 2011 a Revista Fórum divulgou documentos vazados da Reitoria da USP que revelam existir uma “sala de crises” ligada ao gabinete do reitor. Esta sala revela a existência de um aparato de espionagem semelhante ao AESI existente durante os anos 1970 na ditadura, com relatórios a respeito das atividades políticas dentro do campus. A partir da espionagem há fotos de “lideranças” do movimento de trabalhadores e estudantes. Também na Unesp são registradas as atividades políticas do movimento. Certamente, é o que dá base a que, por exemplo, três dos estudantes expulsos de Araraquara tenham sido escolhidos a dedo pela direção, sem nem estar presentes na ocupação de direção contra as expulsões da moradia na ocasião.

A Reitoria está aí para garantir o “bom funcionamento” com o AI-5 da Unesp. A perseguição política está instaurada. A cada impasse, longe de instituir espaços de discussão e deliberação democráticos, os órgãos de deliberação seguem tendo 70% de peso decisório aos professores, e para os estudantes e funcionários apenas 15% para cada. O próprio Reitor é escolhido a dedo pelo governador do Estado, à revelia de qualquer processo de eleição democrático. Apenas com esta estrutura de poder montada eles não conseguem passar sua política, então recorrem à perseguição sistemática de lutadores, a expulsões, suspensões e à polícia!

A cada política nefasta que a Reitoria tenta passar, lá estão o movimento estudantil organizado e o movimento dos trabalhadores para barrar. Não calarão nossas vozes!

O “bom funcionamento” da Unesp, e os “bons costumes” não nos servem. Para um povo que conheceu séculos de escravidão, não aceitaremos mais estes açoites, estas mordaças. Não nos enganam mais com estes regimentos, já sabemos que não tem nada ver com democracia, ou melhor dizendo, em uma sociedade dividida em classes, nossos interesses são opostos, a democracia do governo burguês só pode ser para nós uma ditadura.

Lutemos para um “bom funcionamento” da Unesp à serviço da classe que tudo produz, e que sustenta a universidade. Quem são os únicos interessados em um conhecimento voltado à população pobre senão a própria classe trabalhadora? Quem são os interessados em uma universidade sem exploração do trabalho, sem terceirizações, sem perseguições aos lutadores?

Os trabalhadores da USP, ao buscarem saídas para a questão da saúde da população, deram uma lição na greve de 2014 que devemos seguir , devemos confiar em nossas próprias forças enquanto classe, pois só nós podemos dar uma saída a nossos problemas.

A democracia dos trabalhadores deve se sobrepor à democracia da classe dominante, que para nós é a própria ditadura. Lutemos pelo fim do Reitorado!
Devemos lutar pela autogestão da universidade, pelo fim do vestibular e estatização das instituições privadas, que só lucram com dinheiro público na lógica da educação como sendo uma mercadoria.

Uma conquista parcial frente à voz da ditadura na Unesp! Ampliemos a luta!

As punições foram divulgadas em período estratégico para a reitoria, próximo às férias, com difícil mobilização. Ainda assim, com uma ampla campanha democrática foi possível impor à Reitoria uma vitória parcial quanto às expulsões: passou o recurso de adiamento da decisão sobre as expulsões, ficando em suspenso ao menos até o dia 26, dia do Conselho Universitário.

Também as suspensões passam por uma vitória parcial: após a deliberação pelas suspensões no Conselho Universitário, com Mandato de Segurança no Judiciário, parte dos estudantes suspensos receberam uma liminar positiva, estando a punição, portanto, de 39 estudantes suspensa. Ainda cabem recursos por parte dos advogados de defesa dos estudantes e também da Reitoria, portanto, o processo ainda está em aberto. É necessário caminharmos na campanha contra as expulsões e contra as suspensões de forma cada vez mais forte, divulgando as páginas e manifestos, politizando nas ingressadas, e buscando respostas estaduais organizadas frente à Reitoria!

Com a redução da arrecadação do ICMS, os cortes serão seletivos! Longe de admitir seus super-salários, ou de restringirem verbas em benefício das grandes empresas na Unesp, dizem que o problema é o salário dos trabalhadores! A luta contra estes cortes é indissociável à luta contra a repressão ao movimento! É o direito de lutar que está em jogo! Lutar pela reintegração dos 17 e pela anulação dos processos de suspensão é lutar para que os trabalhadores e demais setores oprimidos possam se manifestar na universidade, e lutar por suas demandas, em um ano no qual os cortes já estão anunciados!

Pela imediata reintegração dos 17 estudantes expulsos da Unesp!

Ninguém fica pra trás!

Tá faltando 17!

Pela imediata revogação das suspensões!

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