Sexta 3 de Maio de 2024

Nacional

CHUVAS E A REPETIÇÃO DE MAIS TRAGÉDIAS ANUNCIADAS!

Chuva e mortes em Angra dos Reis e diversas regiões do país. Tragédias inevitáveis?

07 Jan 2010   |   comentários

“A festa da integração”, “O réveillon da pacificação”, eram essas as manchetes exaltantes do jornal O Globo no primeiro dia do ano ao descrever o réveillon carioca, porém, juntamente com as imagens das festas de final de ano, destacaram-se as imagens trágicas dos alagamentos e desabamentos por todo o Estado com suas inúmeras vítimas, contrastando com as esperanças do povo de um ano melhor. As tragédias do último dia do ano revelam não só uma realidade em constante retrospectiva, mas são também as tragédias dos primeiros dias do ano, que anunciam suas continuidades cada vez mais freqüentes no sistema capitalista.

Frente à grande quantidade de chuva dos últimos dias, o saldo ultrapassa o absurdo número de mais de 70 mortes no estado do Rio de Janeiro, além de cerca de 780 desalojados e 689 desabrigados por ora, segundo os dados da Defesa Civil. Destas, 50 mortes só no município de Angra dos Reis, onde deslizamentos atingiram diversos pontos do Morro da Carioca e a Enseada do Bananal na Ilha Grande, soterrando casas e barracos da favela e resultando em mais de 20 mortes [1] entre essas, muitas crianças e idosos, além de praticamente famílias inteiras. Diversas regiões da Baixada Fluminense também sofreram alagamentos e deslizamentos de terras e mais uma vez ceifando a vida de dezenas de pessoas e deixando centenas de desabrigados e sem seus parcos bens adquiridos com imenso sacrifício, numa repetição trágica do que ocorreu há poucos dias.

Longe de ser um problema só regional do Rio de Janeiro, as catástrofes e estragos provenientes das fortes chuvas estendem-se por diversos pontos, sobretudo da regiões sul e sudeste do território nacional.

Em São Paulo, mesmo antes das águas das enchentes que atingiram a cidade e deixou bairros inteiros da zona leste debaixo d’água por várias semanas, ou mesmo antes que as vítimas pudessem contabilizar os inúmeros estragos, a nova onda de chuvas afeta 15 cidades e já fez com que cerca de 12,2 mil pessoas deixassem suas casas, além de um saldo de 10 mortes segundo os últimos dados. As regiões do Vale do Paraíba e de Ubatuba estão entre as mais afetadas e somam 7.200 desalojados e 5.000 desabrigados. A cidade de São Luiz do Paraitinga está isolada devido a elevação do nível do rio que corta a cidade provocando a enchente que obrigou praticamente nove mil pessoas, mais de 70% da população, a deixar suas casas fechando o aceso à cidade e deixando milhares sem aceso a luz, água e comida. As trágicas cenas se repetem nas enchentes e deslizamentos que atingem as cidades de Cunha, Guaratinguetá, Aparecida, Cruzeiro, Campos de Jordão, Caçapava, São José dos Campos, Bananal, Paraibuna, Natividade da Serra, entre outras [2]. No estado de Minas Gerais também foram registradas diversas ocorrências de alagamentos, deslizamentos e enchentes em decorrência das chuvas.

Os governantes e a imprensa burguesa, como O Globo, ao mesmo tempo em que presta o serviço de amenizar a tragédia, situando-a cinicamente como ocasional frente a um ano de “boas notícias para os cariocas” [3] (escolha do Rio como sede olímpica, hexacampeonato do Flamengo e até as aplicações da UPP nos morros), busca indeterminar culpados, já que afirma se tratar de uma tragédia natural. Como já afirmamos anteriormente em outros textos, se queremos caracterizar tragédias como essa de naturais, dizemos então que são tragédias “naturalmente capitalistas”. É o capitalismo que com sua produção anárquica voltada para o lucro é incapaz de resolver a acentuação das problemáticas climáticas que ele mesmo ocasiona, como nos mostrou a recente reunião dos líderes mundiais em Bruxelas. É o capitalismo que com seu sistema de exploração para garantir o enriquecimento de poucos, joga milhões na pobreza e os reserva a condição de morar nas regiões de risco como em barracos nos morros e encostas e em regiões de alagamento natural dos rios, os transformando em vítimas em potencial. Ou então, como se vê na Ilha Grande, a especulação imobiliária e as negociatas dos governantes com os empresários e comerciantes invadem esses locais com construções de pousadas, hotéis e comércios sem qualquer planejamento e prevenção contra desequilíbrios ambientais, tudo para aproveitar esses pontos como potenciais turísticos geradores de altos lucros.

São os trabalhadores e a população pobre que compõem os dados frios das vítimas pouco reveladas nas páginas dos jornais, ou que tem seus imóveis e seus pertences, resultados de economias e esforços de toda uma vida, destruídos. Tendo sempre que recomeçar a cada chuva. Basta notar que as regiões geralmente afetadas são bairros populares, morros ou favelas, como a zona leste em São Paulo, o morro da Carioca e as cidades da Baixada Fluminense no Rio de Janeiro. Mesmo quando o desastre ocorre em um hotel, como vem noticiando bastante a imprensa no recente caso em Angra dos Reis, não se ouve palavra alguma sobre grande parte das vítimas, que eram funcionários ou moradores da região que estavam em serviço.

Mais cínico que O Globo consegue ser o governador Sergio Cabral. Frente aos desastres o governador afirmou em recente ocasião em Angra que: “O que aconteceu aqui foi a crônica de uma tragédia anunciada” [4]. Está claro que essas tragédias não surpreendem nossos governantes. Há muito se conhece o problema das moradias nas áreas de risco, seja nos morros ou nas regiões de alagamentos próximas aos rios. Há muito se conhece o problema da construção de represas próximas às cidades (em grande parte antes mesmo da construção). O próprio Cabral em junho do ano passado promulgou decreto flexibilizando as construções em áreas de encostas na região de Angra para favorecer a especulação imobiliária e o lucro com o turismo E agora, dizendo fazer frente à calamidade o que o governo do estado do Rio de Janeiro e a prefeitura de Angra destinam para o povo é o despejo de mais de mil pessoas, sem garantia de local para morar e uma promessa para no futuro receber uma bolsa de R$ 250 para cobrir custos de aluguel, deixando-nas sem seus pertences duramente acumulados durante toda uma vida e sem um teto para viver e fechando os olhos para o problema social que levará em curto tempo, novas pessoas a terem que morar em locais arriscados. Cabral juntamente com o restante dos governadores e mesmo o governo Lula não hesitou nem um segundo em destinar milhões para salvar os capitalistas frente à crise, mas são incapazes de promover uma política de habitação que resolva realmente o problema dos milhares de trabalhadores e da população pobre que continua a habitar as áreas de risco. A cada tragédia culpa-se os pobres e os trabalhadores por construírem seus casebres em áreas de risco, como se fosse por puro gosto e exotismo. Os trabalhadores e os pobres vivem em morros e áreas de risco porque não há outra alternativa num país em que se constrói milhares de prédios suntuosos para as classes médias e a burguesia enquanto persiste o escandaloso déficit de 7 milhões de moradias populares, suficiente para eliminar as favelas e as moradias de risco e insalubres. Para isso os governantes nunca têm dinheiro!

Só podemos esperar da burguesia e do capitalism a repetição de mais tragédias e catástrofes como essa. O cinismo e a demagogia dos Kassab, Serra, Cabral e Cia. apenas pretendem esconder que esses governantes e seus partidos patronais dominam as cidades há décadas e por isso são os responsáveis diretos de todas essas catástrofes, produto de anos de descaso e negociatas com o dinheiro público, deixando os trabalhadores e os pobres em condições cada vez piores.

Somente a organização independente dos trabalhadores arrastando atrás de si o conjunto dos explorados e oprimidos pode por de pé um verdadeiro plano de habitação popular e obras públicas sob controle dos sindicatos e associações de moradores, garantir a ocupação de milhares de propriedades que ficam abandonadas e imóveis vazios que pertencem ao Estado e a grandes burgueses que lucram com a especulação imobiliária e as péssimas condições de moradia do povo. Este plano de obras públicas e as reformas necessárias para habitar os imóveis abandonados pelo Estado e pela especulação imobiliária poderiam ser facilmente pagos através do não pagamento das dívidas interna e externa e a imposição de impostos progressivos sobre as grandes fortunas e as propriedades especulativas dos ricos. É através de uma forte organização independente dos trabalhadores e do povo que será possível atacar a problemática em sua raiz, a miséria social na qual a burguesia e o capitalismo destinam a grande parte dos trabalhadores e da população. Não há meia solução: para acabar com as tragédias capitalistas se exige medidas radicais para garantir moradia digna e segura e um aproveitamento cientificamente preparado para as áreas turísticas.

É neste sentido que os sindicatos da CUT, da Força Sindical, da CTB, UGT e demais centrais sindicais devem se posicionar para impulsionar uma grande campanha de denúncia destas tragédias ditas naturais, assim como assumir uma campanha nacional de solidariedade ativa e efetiva, recolhendo gêneros e dinheiro para as urgências do povo desabrigado, preparando um plano de luta para impor aos governantes as medidas eficazes para eliminar as repetitivas tragédias contra os trabalhadores e os pobres, assumindo o programa de obras públicas. Chamamos a Conlutas em seu processo de unificação com a Intersindical a liderar esta campanha e exigir das centrais sindicais aportes concretos para que a classe trabalhadora responda aos problemas e ganhe o apoio do conjunto dos explorados e oprimidos pelo capitalismo. Dos capitalistas e governantes nada podemos esperar a não ser mais catástrofes.

[1Dados retirados do jornal O globo em 03/01/2010.

[2Dados retirados do jornal Folha de S.Paulo em 01/01/2010.

[3Retirado do jornal O Globo em 01/01/2010.

[4Retirado do jornal O Globo em 03/01/2010.

Artigos relacionados: Nacional









  • Não há comentários para este artigo