Sexta 26 de Abril de 2024

Juventude

Depois da Greve da USP:

Avançar na democratização da universidade com um programa independente da burocracia, das reformas superficiais e dos interesses eleitorais

11 Aug 2009   |   comentários

Por conta da pandemia da gripe suína o semestre letivo ainda não foi reiniciado, mas a disputa em torno da sucessão da reitora Suely Vilela ganha cada vez mais contornos reais. Os nomes dos possíveis candidatos foram apresentados pela reitoria, como se nada tivesse acontecido. Distintos setores da camarilha universitária também começam a apresentar propostas cosméticas para tentar desviar a grande crise aberta na USP desde a greve/ocupação da reitoria em 2007 e da recente greve de 57 dias. Entre os estudantes algumas propostas também surgem como alternativa. O que está claro para todos é que o fim da greve da USP e das estaduais paulistas marcou o encerramento de apenas um primeiro ciclo do processo político em andamento.

Desde a repressão de 09/06, sem precedentes nos últimos 30 anos, o conflito na USP extrapolou os muros da universidade e distintos partidos e intelectuais do regime tem se posicionado sobre o assunto tentando capitalizar para si a bandeira da democracia. Nomes de peso da intelectualidade petista como António Cândido e Marilena Chauí rapidamente se posicionaram contra a polícia e pela democratização da USP para tentar desgastar a figura do governador José Serra, principal nome do PSDB para a sucessão presidencial de 2010.

Uma conseqüência importante deste fenómeno é a divisão da burocracia acadêmica em um grande número de setores, desde os mais conservadores, defendendo o esmagamento do movimento estudantil e de trabalhadores como única forma de evitar que se imponha uma situação mais democrática na universidade, até aqueles que, fantasiando-se de progressistas, estão dispostos a oferecer pequenas concessões ao movimento, vendo aí a melhor maneira de domesticá-lo e, essencialmente, preservar o status quo universitário. A partir dos resultados do processo de 2007, a extrema direita da burocracia acadêmica ganha preponderância política no regime universitário, o que se mostrou claramente nas respostas que esta ofereceu ao movimento em 2009: a completa indisposição a qualquer negociação, apoiada nas botas da polícia na USP. Porém, todos esses distintos setores da burocracia acadêmica mantêm um projeto em comum: manter a universidade elitista e racista que impede o acesso de trabalhadores e seus filhos através do filtro social do vestibular e de sua crescente vinculação ao grande capital na produção de conhecimento, e assim impedir qualquer democratização real da universidade.

As armadilhas que o movimento não pode aceitar

Em primeiro lugar, não podemos nos iludir de que as conquistas firmadas no termo de fim de greve, que garantem também nenhuma punição aos grevistas, serão automaticamente implementadas pela reitoria. É fundamental o reconhecimento, por parte do movimento da USP, da permanência dos inimigos que este enfrentou neste último período: a polícia no campus e a manutenção do instrumento do CO (Conselho Universitário) que “recomenda veementemente” sua ação dentro da universidade para reprimir movimentos políticos, além da manutenção de Suely Vilela na reitoria e dos órgãos de poder ditatoriais que continuam de pé.

Apesar da importante votação da ultima semana - que elegeu os indicados do Sintusp ao CO para lutar pelas conquistas da greve, mas principalmente para serem tribunos a serviço de impulsionar uma mobilização pela derrubada do próprio CO - só conseguiremos modificar radicalmente a estrutura de poder e expulsar a PM do Campus se tivermos a clareza de que a campanha pela democratização da USP deve se dar de forma totalmente independente de qualquer setor da burocracia acadêmica, com um programa que avance radicalmente contra esta reacionária estrutura de poder.

Justamente porque a estrutura de poder oligárquica está a serviço de um projeto para avançar na privatização da infra-estrutura universitária e no conhecimento nela produzido, as propostas de “auto-reformas” que já aparecem em jogo nos corredores palacianos das camarilhas uspianas se reduzem a eliminar o segundo turno das eleições para reitor e garantir uma representação mais proporcional entre as distintas unidades, deslocando o fato de os estudantes, maioria absoluta na universidade junto aos trabalhadores, fazerem valer seu peso nas decisões. O elitismo destas camarilhas, dispostas no máximo a se reacomodarem entre si, está em função de seu projeto de manter a universidade ligada ao grande capital, temendo que uma maior abertura para os estudantes e trabalhadores pesem nas decisões conforme seu peso proporcional, e seja a aresta por onde o conteúdo elitista e racista de lugar a uma universidade ligada as necessidades dos trabalhadores e do povo pobre.

O PSOL apresenta propostas visando as eleições estudantis e o DCE não pode manter tudo mais ou menos como antes...

Já desde meados da greve o PSOL tem impulsionado em torno do seu programa o movimento “camisas amarelas” , em referência ao movimento por “Diretas Já” que surgiu durante a ditadura. Naquele momento a transição à democracia, enfim, se deu de forma pactuada entre os setores reformistas da esquerda, a burguesia e os militares, se constituindo como uma saída que permitisse a manutenção da hegemonia burguesa. Na USP, hoje, vivemos um processo no qual, apesar de distinto, se aplicam as lições daquele período, e é preciso que se tenha clareza desde já da necessidade de rejeitar qualquer conciliação com as diferentes políticas de auto-reforma do regime universitário. Nesse sentido, a analogia dos “camisas amarelas” ganha um sentido mais profundo, permitindo que já se anteveja no PSOL a política conciliadora que aceita pequenos aumentos na representação discente nos órgão colegiados de poder como conquistas com as quais o movimento deve se conformar.

Qualquer medida que vise dar uma saída independente para a crise aberta na burocracia acadêmica deve estar a serviço de um programa que avance radicalmente na democratização da universidade e no combate desta casta burocrática que a controla por via do CO. Não pode se colocar apenas pela derrubada da reitora, por diretas e por paridade sem questionar de conjunto esta estrutura, e que por fim tenha como objetivo levantar plataforma eleitoral para as disputas de CA e DCE no final do ano.

O DCE da USP, gestão Nada Será Como Antes (PSTU e independentes) tem a obrigação de corrigir nesse IIº Semestre a orientação equivocada pela qual se pautou durante a greve dos trabalhadores. Após duas semanas de deflagrada a greve entre os estudantes, ocorreu no Rio de Janeiro o Congresso Nacional de Estudantes que fundou a ANEL (Assembléia Nacional dos Estudantes-Livre) e, apesar de reunir setores importantes do movimento estudantil combativo nacionalmente, não teve no centro das discussões armar os estudantes em todo o país, ligar-se à luta da USP e colocar o movimento estudantil nacional na ofensiva, partindo, inclusive, de transferir o Congresso para a USP. É necessário que agora o DCE coloque todo o peso que tem como direção geral do movimento para construir uma forte mobilização que avance numa perspectiva radical pela democratização da universidade que consiga derrubar pela força da mobilização toda essa estrutura arcaica e antidemocrática.

Um programa que avance até o final no questionamento da universidade de classes

Daí a necessidade de lutar por um programa para radicalizar verdadeiramente a universidade, lutando não só pela queda da reitora, mas também pela revogação da resolução do Conselho Universitário que “recomenda veementemente” a entrada da polícia na universidade para reprimir os movimentos de greve e pela derrubada do próprio Conselho Universitário. Nessa batalha, não podemos nos contentar com uma “meia” democratização, com uma estrutura de poder “um pouco menos restrita” , como defendem os que levantam a bandeira da paridade.

Nossa estratégia deve ser impor, pela força da mobilização, a dissolução do atual Conselho Universitário para que a USP seja gerida por um governo provisório das organizações e setores em luta, até colocar de pé um governo tripartite que organize uma estatuinte livre e soberana. Só assim poderemos democratizar a USP, sua estrutura de poder, seu acesso e o conhecimento.

Para concretizar essa perspectiva é preciso conformar um amplo setor de trabalhadores em cada unidade de ensino e trabalho que milite por essas bandeiras; estudantes que passem a se colocar ativa e publicamente nas salas de aula aliados a um setor dos professores dispostos a implementar esse programa, que tenha como conseqüência colocar de pé um forte comando de mobilização unificado, com delegados eleitos nas assembléias de base dos 3 setores, mandatados e revogáveis. Essa é a maneira não somente de unificar nosso movimento em base à democracia direta, mas de começar a conformar uma alternativa de poder na universidade frente à possível queda da reitora, organizada de baixo para cima pelos 3 setores.

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