Quinta 28 de Março de 2024

Movimento Operário

Balanço e perspectivas da greve dos funcionários da USP e da luta das estaduais paulistas

17 Jul 2009 | Esta luta se desenvolveu numa conjuntura nacional em que prima a passividade do movimento de massas, com as centrais sindicais pactuando o aumento da exploração dos trabalhadores diante dos impactos da crise econômica e atravessada pelas disputas eleitorais entre o PSDB e o PT com vistas à eleição de 2010 e pelos escândalos de corrupção que mostram a podridão deste regime e seus partidos, que não se desdobra em crises mais profundas pelo poder de contenção de Lula. Neste marco, a recente luta das universidades estaduais paulistas, que começou com a greve dos funcionários da USP, trouxe consigo indícios de como, frente à crise, os trabalhadores poderão recorrer aos métodos de ação direta para defender suas organizações e seus interesses de classe, como do papel que o movimento estudantil poderá cumprir e das suas consequências nas principais universidades de São Paulo. Essa luta de 2009 deve ser encarada como uma continuidade da greve/ocupação da reitoria em 2007, quando o movimento abriu uma forte crise na burocracia acadêmica, que foi respondida ao longo de 2008 com uma onda de perseguição aos setores de vanguarda e de criminalização do movimento; ao mesmo tempo em que Serra busca implementar, com uma máscara distinta, os mesmos ataques que não conseguiu aplicar em 2007.   |   comentários

A campanha pela reintegração do Brandão desemboca numa greve combativa, política e não corporativa dos trabalhadores da USP

A mobilização dos trabalhadores da USP se inicia desde dezembro, a partir da demissão do Brandão que foi o cume da política repressiva na USP. A categoria reage bravamente realizando assembléias massivas, paralisações em plenas férias, um ato com mais de 1000 pessoas em 16/12 e outras ações.
A campanha ganhou grande apoio dentro e fora da USP, com o abaixo assinado sendo apoiado por todas as organizações de esquerda, várias entidades sindicais e estudantis, setores petistas, intelectuais importantes como Emir Sader, Chico de Oliveira e Paulo Arantes, juristas como Fábio Konder Comparato e Jorge Luíz Souto Maior, além de apoios internacionais, dentre os quais se destaca viagem ao Brasil de Raul Godoy ’ dirigente operário ’ e Mariano Pedrero ’ advogado ’ ambos da fábrica Zanon da Argentina, que já se encontra a mais de 7 anos ocupada sob controle dos trabalhadores.
No dia 17/04, realizou-se o II Hip hop Ocupa a USP, que teve como um de seus eixos centrais a campanha pela reintegração de Brandão e reuniu mais de 500 jovens; e logo após o início da greve, realizou-se na FFLCH-USP um importante ato de intelectuais em defesa do Sintusp e de Brandão, com a presença de Chico de Oliveira, Paulo Arantes, Luiz Renato Martins, Leonel Itaussú, Ives Cohen, Henrique Carneiro e Bernardo Ricupero.
O caráter anti-democrático e anti-sindical da demissão de Brandão ficou atestado no julgamento favorável ao pedido de liminar por sua integração que alegava a inconstitucionalidade da demissão de um dirigente sindical democraticamente eleito; sendo que a cassação da liminar em menos de 5 horas constituiu uma prova da forte intervenção do governo do estado no conflito.
Mas a luta ganha um novo patamar quando os trabalhadores da USP desatam a greve em 05/05, que atingiu quase 70% da USP impactando fortemente seu funcionamento e ganhando grande projeção política. Diferente da maioria das greves recentes, combinou reivindicações económicas (reajuste, plano de carreira etc) com a defesa política do Sintusp frente à repressão e de 5.214 empregos ameaçados pelo Tribunal de Contas do Estado. Sua combatividade ressalta se consideramos que enfrentou um isolamento de vários dias, contra o qual teve muita política de se ligar aos estudantes (como se expressou na pauta contra a Univesp) e ao funcionalismo público estadual que estava em campanha salarial, o que foi bloqueado pela política das direções burocráticas. Além disso, a greve denunciou fortemente o caráter semi-escravo a que os terceirizados são submetidos na USP, assim como da corrupção em todo o país e da burocracia acadêmica. Esta combatividade dos trabalhadores da USP é o motivo da reitoria e Serra querer liquidar o Sintusp, buscando dar um “exemplo” , como um ensaio, da plataforma de Serra às eleições presidenciais de 2010.

Enquanto o DCE da USP e o PSOL travavam a mobilização na USP, os estudantes da Unesp e Unicamp saem na frente

O DCE da USP, dirigido pelo PSTU, colocou desde o começo do ano todos seus esforços estiveram para a construção do Congresso Nacional de Estudantes (CNE) e não da greve, utilizando o prestígio da USP para fundar uma nova entidade, sem dar peso para essa luta.
Por sua vez, o PSOL travava a mobilização para evitar uma luta com o DCE dirigido pelo PSTU e evitar que se fortalecessem como DCE. Além disso, separavam a luta contra a Univesp da luta contra a repressão para evitar uma radicalização estudantil a partir da aproximação com os trabalhadores. Por isso, não colocavam seu peso como maior corrente da USP a serviço da mobilização e, tampouco chamavam assembléias de base.
A ocupação do DCE, tão reivindicada pelo Negação da Negação, se transformou em um “Território Livre” ... de qualquer participação estudantil. Ficou como um ponto de apoio para o autodenominado “bloco radical” com o PCO utilizar de maneira burocrática seu “comando aberto” , que os fez inclusive deixar de lado a defesa da democracia direita, se colocando contra um comando de delegados a partir das bases.
Enquanto isso, os estudantes da Unesp de Marília deflagravam a greve com ocupação do prédio de aulas em 26/05, abrindo espaço para mobilização estudantil no estado. Suas assembléias massivas, com um patamar de radicalização política e dos métodos já os destacam como o embrião de uma nova tradição no movimento estudantil brasileiro.
Na Unicamp, mesmo com o total imobilismo do DCE dirigido pelo PSOL, os estudantes do IFCH e da Educação deflagraram uma forte greve, seguidos pelas Artes Cênicas. No IFCH, com o CACH (LER-QI, PSTU e independentes) adiante, a mobilização se deu fundamentalmente contra a Univesp, por contratação de professores, pela efetivação dos terceirizados sem concurso público e em apoio aos trabalhadores da USP, entre outras demandas, forjando uma greve com muito debate político e um forte sentimento da necessidade da aliança com os trabalhadores.
O Movimento A Plenos Pulmões (LER-QI e Independentes) cumpriu um importante papel, junto aos estudantes independentes da Unesp e Unicamp na estadualização da greve, inclusive na greve da Geografia de Rio Claro, assim como entre trabalhadores da Unesp de Marília, para tirar o isolamento dos grevistas da USP.

A militarização da USP desperta a mobilização de estudantes e professores da USP

Apesar dessas direções, a truculência da reitoria frente à greve de trabalhadores acendeu a chama na USP. Como única forma de exercer seu direito de greve frente ao (ilegal) assédio moral das chefias, os trabalhadores lançaram mão dos piquetes, que a reitoria tenta criminalizar porque é a via dos trabalhadores garantirem seu direito de greve, desta vez apoiando-se na reacionária resolução do Conselho Universitário para militarizar a USP a partir do dia 01/06. A busca para transformar em “legais” e “democráticas” a repressão de Suely e Serra, tem pontos de contato com os argumentos dos reacionários golpistas de Honduras.
A PM gerou um amplo rechaço em todo estado, sendo a principal demanda que levou os estudantes a passar por cima de suas direções e impor a greve dos estudantes da USP a partir de 04/06 com a Educação, a FFLCH e a ECA à frente.
A repressão de 09/06 foi histórica, com gases, balas de borracha, bombas e cacetetes do portão de entrada até a FFLCH, vários feridos e a absurda prisão de Brandão, junto com outro trabalhador e um estudante. Suely Vilela viu o movimento se dirigir contra ela como responsável da repressão, que até Serra disse que era responsabilidade dela.
A assembléia com mais de 2 mil estudantes dava uma nova dinâmica a greve, quando o DCE novamente se colocava na contra-mão da mobilização, com um pacifismo incrível, propondo uma “dispersão organizada” e aterrorizava dizendo que seríamos massacrados pela PM se fizéssemos a assembléia na rua, enquanto tentavam instalar uma assembléia com 100 estudantes no prédio! O movimento passou por cima gritando bem alto “Fora DCE” . Os professores também realizam assembléias cheias. Surgia um movimento democrático pelo Fora PM e Fora Suely.

O movimento impacta a intelectualidade e coloca o debate sobre o conceito de democracia

Num primeiro momento, um movimento coordenado da grande mídia para “blindar” Serra legitimando a ação policial e buscando isolar o SINTUSP, ganhou destaque o posicionamento de intelectuais tucanos (aberta ou veladamente) como José Arthur Gianotti e Maria Hermínia Tavares de Almeida.
Nos dias seguintes (com uma relocalização da Folha com postura de maior “diálogo” com o movimento) entraram em cena figurões da intelectualidade do espectro petista a partir do ato de António Candido e Marilena Chauí, como parte de uma política do PT de explorar o conflito para desgastar Serra eleitoralmente.
Uma questão que cumpriu papel central no debate ideológico e que tende a seguir é a discussão sobre conceito de democracia, tanto em sua formulação mais geral quanto aplicada à universidade. Num país onde “déficit democrático” é evidente (para ficar numa formulação completamente eufemística) e com a correlação de forças dada pela popularidade de Lula, as medidas repressivas contra o movimento de massas, especialmente contra setores de classes médias como os universitários, necessitam da legitimação de serem apresentadas como medidas “democráticas” , destinadas a assegurar o “bem comum” . Assim, os ideólogos servis às aspirações da burguesia e em especial o tucanato de tratar os conflitos sociais como “caso de polícia” , tentam justificar ideologicamente a criminalização dos piquetes, apresentando os repressores como democratas. Isso abre um profundo debate ideológico em que devemos desmascarar teórica e politicamente a falsidade e a hipocrisia das formulações que mutilam a tal ponto o conceito de democracia (“democracia procedimental” , etc) de modo a fazê-lo ajustar-se às práticas degradadas necessárias à manutenção de uma ordem social decadente (no caso da USP, para sustentar o processo privatista e antipopular e anti-operário e manter seu caráter elitista).

Conteúdo e amplitude da luta estudantil

Esta mobilização foi menos massiva que a de 2007, porém mais avançada politicamente, destacadamente pelo progressivo rechaço à PM, que expressava ao mesmo tempo uma solidariedade com a greve de trabalhadores, pelo rechaço ao regime universitário, e inclusive a consciência em setores da necessidade de levantar um programa pela positiva em contraposição à Univesp.
Isso gerou um fenómeno novo de polarização entre os estudantes. De um lado, os cursos com maior tradição de luta entraram em movimento, sendo que o pico da mobilização se dá no ato na Avenida Paulista com mais de 5 mil pessoas. Do outro, cursos como POLI, Direito e FEA se blocaram contra a greve, com setores defendendo a PM no campus, chegando a gerar novas organizações de direita reacionárias como o CDIE (a mal chamada Comissão em Defesa dos Interesses dos Estudantes) e a FLACUSP (Frente Libertária Anti-comunista da USP), que nunca deixaram de ser uma ínfima minoria, fracassando em todas as tentativas de mobilizarem-se e sendo respondida à altura pelos setores mais combativos do movimento de estudantes e trabalhadores. Também na Unesp surgiram estudantes reacionários que ficaram em minoria. Essa incipiente polarização deve ser vista como os primeiros indícios do que passará na universidade frente à crise económica e seus reflexos na crise da universidade e nas posições dos estudantes que vão se dividir cada vez mais.

Balanço e perspectivas da luta pelo Fora PM e Fora Suely

A luta de estudantes, professores e funcionários não foi capaz de derrubar a reitora, pois para tal será necessário deflagrar um movimento mais massivo e ativo. Mas escancarou uma profunda crise na burocracia acadêmica, que no segundo semestre, frente ao processo de escolha do novo reitor, deve ser aproveitada pelo movimento para retomar a mobilização. Até mesmo setores da burocracia acadêmica passaram a defender demagogicamente a alteração da estrutura de poder, com propostas de “auto-reformas” cosméticas.
Uma das conclusões que é necessário tirar dessa primeira fase é que se por um lado o PT fez declarações de apoio e colocou uma figura como Marilena Chauí ao lado do movimento, por outro lado a CUT se negou a colocar seu peso dirigente a serviço de fortalecer a marcha do dia 18/06. Isso mostra não só que o “apoio” do PT estará restrito ao marco em que a situação não “saia do controle” (leia-se: milhares de estudantes radicalizados), mas também é um indício de que os que hoje aparecem como “aliados” , amanhã, com a ampliação da mobilização, estarão junto com os tucanos pactuando um “novo regime” em que os setores supostamente “progressistas” se contentarão em ter maior peso numa estrutura de poder compartilhada com os responsáveis pela militarização da universidade.
Chamamos todos os estudantes que honestamente acreditam que é possível desenvolver uma verdadeira luta pela democratização da universidade sob a bandeira da chamada “paridade” a refletirem sob o real conteúdo que se esconde por trás dessa política. A política da paridade se traveste de uma política de “unidade” , mas não passa de uma “concessão” ao “elitismo um pouco mais democrático” dos setores “progressistas” e “democráticos” de professores para a defesa de uma universidade “um pouco menos oligárquica” . Seja em sua versão mais de direita (paridade no voto direto para reitor, mantendo o caráter restritivo do setores que podem votar e ser eleitos e mantendo a eleição para os Conselhos tal como é feita hoje), em sua versão mais de esquerda (paridade para as eleições de todos os órgãos de direção da universidade, com toda a comunidade universitária podendo votar e ser eleita) ou nas várias possibilidades intermediárias; todo e qualquer tipo de paridade (que no caso concreto da USP significa dar para a camarilha professoral 16 vezes mais do peso que corresponde) significa um retrocesso em relação à própria Revolução Francesa de 1789 (!) ou a como são eleitos os representantes políticos na democracia burguesa que vivemos no Brasil: um homem = um voto. Alertamos desde já para que serão estes mesmos professores “progressistas” que irão querer pactuar com as camarilhas tucanas uma reforma “por cima” do regime se contrapondo à mobilização pela via da ação direta. É com esses fundamentos que chamamos os estudantes, funcionários e professores de esquerda a questionarem a política de paridade levantada pela Adusp e, no movimento estudantil, pelo PSOL e o PSTU.
Daí a necessidade de lutar por um programa para radicalizar verdadeiramente a universidade, lutando não só pela queda da reitora, mas também pela revogação da resolução do Conselho Universitário que “recomenda veementemente” a entrada da polícia na universidade para reprimir os movimentos de greve e pela derrubada do próprio Conselho Universitário. Nessa batalha, não podemos ficar presos a uma política de pressão sobre a burocracia acadêmica, não podemos nos contentar com uma “meia” democratização, como defendem o PSTU e o PSOL que no final terminam sempre negociando migalhas.
Nossa estratégia deve ser impor, pela força da mobilização, a dissolução do atual Conselho Universitário e que a USP seja gerida por um governo provisório das organizações e setores em luta, até colocar de pé um governo dos 3 setores com maioria estudantil que organize uma estatuinte livre e soberana. Só assim poderemos democratizar a USP, sua estrutura de poder, seu acesso e o conhecimento. Para concretizar essa perspectiva devemos trabalhar para colocar de pé um forte comando de mobilização unificado, com delegados eleitos nas assembléias de base dos 3 setores, mandatados e revogáveis. Essa é a maneira não somente de unificar nosso movimento em base à democracia direta, mas de começar a conformar uma alternativa de poder na universidade frente à possível queda da reitora, organizada de baixo para cima pelos 3 setores.

Importante triunfo dos trabalhadores da USP

Como resultado final da greve, apesar de que a principal reivindicação dos setores de vanguarda da categoria não foi atendida, pois Brandão não foi readmitido, a categoria conseguiu encaminhar um projeto de lei junto à reitoria, a Assembléia Legislativa e o TCE que garante a estabilidade no emprego para as 5.214 vagas questionadas; conseguiu encaminhar um compromisso da reitora em não implementar seu projeto de carreira e discutir um novo projeto com os trabalhadores; conseguiu a ampliação de alguns benefícios, como o vale-refeição, o auxílio creche e o auxílio para filhos portadores de deficiências especiais; e conseguiu a instituição de uma comissão formada pela reitoria e representantes dos trabalhadores para discutir os problemas de atendimento à saúde, que têm muita importância para a categoria dado seu elevado nível médio de idade. Desde o ponto de vista económico, o reajuste final de 6,05%, que cobre apenas a reposição da inflação no último ano, significa um empate, principalmente levando em consideração o aumento de R$ 80,00 no vale-alimentação, que para os setores que recebem salários mais baixos (manutenção, restaurante etc.) significa um ganho económico superior ao do reajuste salarial. Além disso, os trabalhadores conseguiram arrancar um acordo de fim de greve que prevê o pagamento integral dos 57 dias parados, nenhuma reposição de horas de trabalho e nenhuma perseguição aos grevistas.
Se levamos em consideração exclusivamente as consignas que inicialmente motorizaram a greve, sem analisar as relações de força mais de conjunto que interferiram no conflito e o cenário nacional em que este se inseriu, poderíamos definir que houve importantes conquistas parciais, ainda que algumas das reivindicações centrais não foram atendidas. Entretanto, para uma justa avaliação do movimento, é necessário levarmos em consideração que a greve dos trabalhadores da USP foi praticamente o único conflito duro da luta de classes durante todo o período em que esteve em curso; que a greve incluía uma demanda política (a reintegração de Brandão) que se enfrentava diretamente com o governo Serra, sua plataforma educacional e seu projeto de “linha dura” para lidar com os sindicatos combativos frente à crise; que não tinha acompanhando nenhuma categoria em greve; e que os aliados que conquistou nas estaduais paulistas a determinada altura dos acontecimentos tiveram debilidade para atingir a capacidade de mobilização necessária para, por hora, colocar o conflito em um patamar superior em que fosse possível derrubar a reitora. Um conflito que se desenvolveu num cenário nacional marcado pela passividade, o alto nível de popularidade do governo nacional e conformismo social.
Levando em consideração este conjunto de elementos, a greve dos trabalhadores da USP teve como subproduto três conquistas extremamente importantes que não constavam em suas demandas iniciais e que servem como exemplo para o conjunto da classe trabalhadora: 1) foi um exemplo de como se deve lutar para resistir aos ataques que serão descarregados sobre a classe trabalhadora frente aos impactos da crise económica mundial; 2) foi um exemplo de como os trabalhadores podem e devem levantar as demandas dos demais setores explorados e oprimidos da sociedade, colocando em discussão na universidade a defesa dos terceirizados diante das condições de semi-escravidão a que estão submetidos e lutando pela aliança operário-estudantil em defesa da educação pública; e 3) colocou em evidência o caráter oligárquico e reacionário da estrutura de poder e das camarilhas que governam a universidade.
Ao barrar a política de Serra de arrebentar o Sintusp e de ter sido extremamente moralizadora para a vanguarda dos trabalhadores, que mostraram sua combatividade mantendo uma greve forte sem os professores pela primeira vez em muitos anos, essa greve foi uma importante vitória do ponto de vista subjetivo. Uma das principais evidências disso se expressa no Comando de Greve, órgão em que a diretoria do sindicato se dissolveu ’ como ocorre em todas as greves da categoria ’ junto aos delegados eleitos pela base em suas unidades e que foi quem de fato exerceu a direção do conflito subordinando-se às decisões soberanas da assembléia geral da categoria; onde se destacou uma nova geração de valorosos ativistas (junto ao retorno à militância de ativistas de experiência que haviam se afastado do movimento).
Apesar da reintegração de Brandão não ter se concretizado, a greve tratou de transformar essa luta em um grande fato nacional, assentando as bases para que a continuidade dessa luta a partir de agora se dê em um novo patamar.
Queremos reivindicar também a atuação do grupo de mulheres Pão e Rosas (LER-QI e independentes), que estiveram na linha de frente da mobilização. As trabalhadoras da USP que compõe o Pão e Rosas não somente foram importantes combatentes durante toda a greve, mas também foram porta-vozes das mulheres oprimidas, levantando a bandeira do direito ao aborto, assim como a bandeira em defesa das trabalhadoras e trabalhadores terceirizados. Foram elas também as primeiras a se levantar contra o brutal assassinato do jovem negro e homossexual Marcelo Campos. Mais de conjunto, a importância que tiveram as mulheres na greve se demonstrou no emocionante e combativo ato das mulheres trabalhadoras da USP reivindicando seus direitos, exigindo o fim da repressão e nenhuma perseguição aos grevistas.

O movimento estudantil de conjunto não sai vitorioso, mas acumula forças para uma luta superior

Se entre trabalhadores da USP e estudantes de Marília é nítida a vitória, não podemos generalizar este balanço para o movimento em todo o estado. Dentro do movimento estudantil, há dois balanços polares que expressam duas posições políticas equivocadas.
De um lado, está o bloco encabeçado pelo DCE da USP, que contém também o PSOL, que querem apresentar o movimento como vitorioso em toda linha, como sempre. O PSTU chega a falar de “luta exemplar” até mesmo diante das 4.200 demissões na Embraer. Não é coincidência que sejam justamente os que cumpriram o papel de travar a mobilização venham agora com este balanço. Trata-se de uma operação para não assumir sua responsabilidade. Para isso, se apóiam principalmente no adiamento da Univesp. Este balanço “vitorioso” sem conteúdo tem um claro objetivo eleitoralista por parte do DCE, que já está preparando seu slogan da campanha eleitoral do fim do ano, como “a chapa que derrotou a Univesp” . No caso do PSOL, que de maneira oportunista tentou aparecer como “oposição” ao DCE e criticando que estes não mobilizavam o suficiente, trata-se de um descaramento total, já que foram DCE durante anos e nunca impulsionaram uma mobilização séria, o que repetiram novamente neste ano.
De outro lado, está o Negação da Negação, que mais uma vez repete seu script vazio de gritar o mais alto possível a derrota de qualquer movimento com uma completa miopia para verificar qualquer tipo de avanço. Para desmascarar a “radicalidade” do MNN bastaria saber que a FAU, único curso onde têm algum peso, foi o último a entrar em greve (não conseguiam aprovar nem paralisações) e o primeiro a sair, além de que nunca se via ativistas dessa unidade nas assembléias para além dos militantes do MNN. Mas vale a pena agregar que essa corrente não colocou durante toda a greve nenhuma proposta importante para os rumos do movimento, que superasse a discussão das chaves do espaço do DCE, dos locais dos atos, de como compor as mesas das assembléias, como organizar as falas e outras coisas do tipo. Fora isso, era só grito de vamos! Avançemos! Greve! Fora DCE! Esses “radicais” também queriam fazer uma reunião de comando enquanto os setores mais avançados dos estudantes colocavam os estudantes reacionários do “greve da greve” para correr. Não à toa, essa corrente foi sendo cada vez mais rechaçada na vanguarda. O MNN, que luta por um “Território Livre” que nem eles sabem explicar o que significa, acaba se restringindo a demandas moderadas e muitas vezes sem sentido (como a luta contra os tapumes dos canteiros de obras na FAU). Ao mesmo tempo em que ao não ter nenhum programa real para “libertar” a universidade do domínio da burguesia acabam se opondo a outras demandas mínimas elementares, como mais verbas para a educação publica e ampliação da assistência estudantil, se colocando contra qualquer política para que os filhos dos trabalhadores e do povo pobre possam ter acesso à universidade pública e gratuita (ao mesmo tempo em que eles mesmos tiram seus diplomas “dourados” na FAU).
O PCO durante toda a greve seguiu a “política” do MNN sem nenhuma criatividade como já é característico, diferenciando-se apenas por ser mais truculento e, na internet, pelos textos que escreve Rui Costa Pimenta defendendo o governo tripartite com maioria estudantil, mas que sua militância é sindicalista o suficiente para nunca defendê-lo na USP. Não poderíamos deixar de ressaltar o cómico das várias linhas de seu balanço da greve dedicados a LER-QI apesar de tanto dizerem que somos pequenos. Sua psicologia peculiar os faz sentir enormes com esse tipo de afirmação.
Contra estas duas concepções vazias de conteúdo, opinamos que o movimento estudantil de conjunto, exceto o de Marília, não saiu vitorioso porque não derrubou a reitora nem a resolução do CO que permite a entrada da PM, para além do adiamento da Univesp, o que obviamente foi fruto da força da nossa mobilização e representa uma conquista tática ao dar tempo para que o movimento estudantil possa se reorganizar e preparar uma luta superior. Neste âmbito, é importante remarcar que a greve teve o mérito de colocar em debate na mídia o significado do projeto de ensino a distância. Para avançar nessa questão, professores, funcionários e estudantes precisam levantar um programa que seja de fato capaz de democratizar o acesso à universidade, forjando uma forte aliança com os estudantes ’ em sua maioria trabalhadores ’ que pagam mensalidades absurdas nas universidades privadas. É necessário, como parte da luta contra a Univesp e pela democratização da estrutura de poder na universidade, colocar de pé uma forte campanha para que as fortunas destinadas ao pagamento dos juros da dívida pública aos capitalistas sejam destinadas ao aumento de verbas para o ensino superior, ampliando as vagas das universidades públicas e estatizando os grandes monopólios do ensino superior privado, garantindo o acesso livre e direto da classe trabalhadora e do povo à universidade gratuita e de qualidade.
Outra questão fundamental a destacar é o fato de que embora o movimento não tenha conseguido derrubar a Suely, conseguimos aprofundar a crise do regime universitário e abrir um debate cada vez mais profundo sobre os caminhos e o programa na luta pela democratização da universidade, sobre o quê algumas correntes não tem o que opinar.
Por fim, é necessário destacar como mais uma conquista do movimento estudantil o amadurecimento político que se expressou no avanço na qualidade deste movimento, em que pese sua menor extensão que o de 2007, expressa mais claramente no seu ódio contra a polícia e Suely, mas também no seu apoio aos trabalhadores da USP (bem diferente daqueles que ficam chamando-os de “pelegos” por baixo). Assim, depois do refluxo de 2008, constitui-se um elo de continuidade com aquele movimento de 2007 (que neste ano voltou à ativa em peso), o que no movimento estudantil é muito difícil de conquistar dada a condição transitória do estudante na universidade. Uma outra expressão que o movimento não sai derrotado é o fato de que, diferentemente de 2007, o movimento recuou votando uma série de medidas de luta para o começo das aulas e inclusive em julho.
Diferenciamos o balanço da luta da Unesp de Marília do conjunto porque os estudantes tiveram a preocupação central de defender os interesses da maioria da população. Saíram às ruas em defesa de mais verbas para o conjunto da educação, por uma expansão de vagas com qualidade em oposição ao sucateamento da UNIVESP. Os jornais locais chegaram a noticiar que os estudantes estavam em greve “para que todos possam ter acesso à educação de qualidade” . Este programa serve de exemplo para o movimento estudantil brasileiro romper o isolamento social e transformar o tão falado “romper os muros da universidade” em fatos. Após a primeira assembléia estudantil, a reitoria disse que não negociaria com estudantes ocupados. A assembléia seguinte, com mais de 500 estudantes, não caiu na chantagem da reitoria e decidiu por unanimidade a continuidade da greve e da ocupação. Logo em seguida as negociações com a diretoria do campus começam a avançar e a reitoria é obrigada a negociar cedendo importantes itens da pauta específica como a abertura do Restaurante Universitário a noite, a implantação de um Centro de Línguas com bolsas de estudo e R$198 mil para a reforma da unidade de saúde (CEES). Mesmo com sua pauta parcialmente atendida e o refluxo do movimento estadual, os estudantes só saem da greve após o fim da mesma em funcionários e votam uma série de medidas para retomar a mobilização no segundo semestre.
Na Unicamp, a greve, que seguia com um nível de mobilização incomum para o fim do semestre, só foi encerrada fruto da atitude traidora de alguns professores que, ainda que dissessem respeitar a greve estudantil, pressionavam para a entrega de trabalhos, o que colocou os militantes da greve numa encruzilhada que objetivamente determinava o fim da greve ainda que este não estivesse declarado. Entretanto, a nova camada de ativismo que surgiu com a greve, seguida da politização que conseguimos construir inclusive sobre a pauta especifica é o que permitiu que se votasse com ampla maioria numa assembléia de 300 estudantes um novo indicativo de greve para agosto, com o foco na questão da contratação de professores e funcionários. O importante papel que o CACH cumpriu desde o começo do ano na construção da mobilização no IFCH mostra, de fato, a recorrente contradição das políticas do PSTU, pois enquanto na Unicamp eram nossos aliados na construção da greve, na USP eram aliados do PSOL com uma política que na pratica era um entrave à mobilização estudantil.

Faltou uma organização democrática no movimento estudantil da USP e uma coordenação estadual

Desde o começo da greve, defendemos a política de auto-organização para organizar o movimento estudantil de baixo para cima, a partir dos cursos mobilizados, como a única forma de garantir a massividade e a democracia do movimento. Se tivéssemos conformado um comando de greve com delegados mandatados pelas assembléias de base, revogáveis a qualquer momento, poderíamos ter constituído uma alternativa de direção democrática a forma burocrática como o movimento é hoje dirigido.
Contra essa política unificam-se todas as correntes. Para citar somente algumas expressões: o PSOL não convocou assembléias em vários cursos, boicota qualquer coordenação geral do movimento e, defendeu um “comando de delegados” de maneira oportunista, assim como o PSTU, não com o conteúdo de unificar democraticamente todos os cursos em luta como defendemos, mas simplesmente para deslegitimar outro “comando” , o da ocupação do DCE que era dirigido burocraticamente pelo MNN e o PCO.
Além disso, mais uma vez o movimento estudantil da USP padece de suas próprias enfermidades impostas pela “luta” estéril e histérica entre (principalmente) o PSTU, o MNN e o PCO que impediam completamente que as assembléias fossem um terreno de discussão política se perdendo em mil discussões de encaminhamento. Mas depois, se unificavam todos contra uma política para que os independentes pudessem se expressar, como era nossa proposta de que fosse garantida somente uma fala para cada corrente política (que poderia ser de 5 minutos, por exemplo) e que se abrisse a fala para todos os independentes.
Somado a isso, houve uma política de boicote por parte do PSOL e do PSTU de impulsionar qualquer tipo de coordenação estadual. Primeiro, escandalosamente boicotaram o encontro estadual votado em assembléia e depois o comando de delegados estadual votado numa das reuniões estaduais que os estudantes do interior conseguiram impor ao DCE da USP.

Faltou uma coordenação combativa alternativa ao Fórum das Seis

Mais uma vez, o Fórum das Seis mostrou-se um organismo que serve para que as associações de docentes das três universidades, que vêm sendo os setores mais atrasados nos processos de mobilização, coloquem amarras sobre os funcionários e estudantes, que vêm se colocando na vanguarda das lutas mais importantes que ocorreram nos últimos anos, não só em defesa de reivindicações económicas, mas também na defesa da universidade pública diante dos ataques privatizadores e sucateadores do governo. Ao contrário dos professores, que vêm cumprindo um papel cada vez mais conservador, com a maioria de seus quadros em grande medida materialmente atrelados ao processo de privatização da universidade através das fundações de direito privado.
Devemos colocar de pé uma coordenação dos setores mais combativos de funcionários, professores e estudantes das três universidades, que funcione democraticamente através das votações de maioria e minoria das assembléias de base e da eleição de delegados revogáveis e rotativos eleitos nessas assembléias; não só para coordenar as lutas nas estaduais paulistas, mas também para fortalecer a atuação destes setores no Fórum das Seis e lutar por sua democratização, sem aceitar os “consensos” impostos pelas associações de docentes e direções de trabalhadores ligadas ao governo e às reitorias.

Como encarar a continuidade da luta das estaduais

Vários setores que suspenderam a greve ao final do semestre apesar de ainda terem suas bases mobilizadas e com disposição de luta já votaram calendários para retomar a mobilização em agosto. Os estudantes do IFICH/Unicamp, por exemplo, tem marcada paralisação com assembléia já no primeiro dia de aula com indicativo para retomar a greve. Está marcada para o dia 15/08 uma plenária de estudantes, funcionários e professores das três universidades.
Precisamos encarar a continuidade do movimento no segundo semestre combinando: a luta pela democratização da estrutura de poder nas universidades; a luta contra a repressão e a criminalização do movimento, dentro da qual deve cumprir um papel chave a campanha pela reintegração de Brandão e pela retirada dos processos judiciais que a reitoria da USP acabar de colocar contra 15 estudantes que ocuparam a reitoria em 2007; e a luta contra a Univesp, que deve ser encarada não somente como uma resistência à política de sucateamento do ensino superior, mas também com o movimento assumindo para si a bandeira da verdadeira democratização da universidade, lutando pelo aceso dos trabalhadores e do povo pobre ao ensino público e gratuito; articulando essas lutas políticas que envolvem o conjunto do movimento com as demandas específicas de cada setor.
Para fortalecer esta perspectiva, chamamos os estudantes a construir o Movimento A Plenos Pulmões junto com a LER-QI; e chamamos os trabalhadores da USP, Unesp e Unicamp a construir junto conosco uma corrente político-sindical classista como parte da Conlutas, que defenda a independência política dos trabalhadores em relação aos governos burgueses latino-americanos, que se coloque na perspectiva de construção de um partido dos explorados para lutar contra os partidos que estão a serviço dos exploradores ou da conciliação de classes.

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