Quinta 16 de Maio de 2024

Nacional

Entrevista com delegados dos trabalhadores da USP na Conlutas

Tarefas da vanguarda do movimento sindical brasileiro

20 Jan 2005 | Neste artigo reproduzimos uma entrevista com Claudionor Brandão e Mazé Cutinhola, delegados mandatados em assembléia pelos trabalhadores da USP para representá-los na Conlutas.   |   comentários

Jornal Palavra Operária: Quais são as posições de vocês para o Encontro Nacional da Conlutas?

Mazé: Desde agosto viemos discutindo com o conjunto dos trabalhadores da USP, a necessidade de nos integrarmos à Conlutas por acharmos que os setores mais avançados do movimento sindical brasileiro tem um papel muito importante a cumprir neste momento, em que o Governo Lula e o PT buscam transformar a CUT e os seus sindicatos em um braço deste governo capitalista no movimento dos trabalhadores. No processo que se desenvolveu na categoria desde então, avançamos em uma série de discussões importantes que estão expressas nas propostas de resoluções do Sintusp para o Encontro Nacional. Temos total acordo com o conteúdo dessas propostas, mas queremos dedicar este espaço a uma discussão que, embora ainda não tenha sido levada até o final entre os trabalhadores, consideramos de fundamental importância para o debate.

Trata-se da necessidade de construir um grande Partido Operário Independente dirigido pelos trabalhadores a partir dos sindicatos e de suas organizações de base. Nos referimos a um verdadeiro partido que arranque a influência do petismo sobre as massas e que possa decidir o curso dos acontecimentos da vida política nacional. Um partido que possa expressar no terreno político a força social dos mas de 40 milhões de assalariados urbanos, número esse ao qual deve ser agregado as dezenas de milhões de trabalhadores informais e precarizados e os milhões de desempregados que sofrem com a miséria capitalista que esmaga a maioria da população do país.

Jornal Palavra Operária: O que seria e como se constituiria este partido?

Brandão: Os trabalhadores brasileiros estão vivendo um processo muito importante de retomada das lutas e de avanço na sua consciência e na sua experiência com o PT. Isso se expressa no processo de reorganização em setores de vanguarda do movimento sindical que, frente ao controle que o PT exerce sobre a CUT, buscam se organizar de forma independente. A Conlutas é hoje o principal organismo que reúne os sindicatos que fazem parte desse processo, e o SINTUSP é um dos principais sindicatos da capital de São Paulo que hoje integram a Conlutas, lutando por um programa votado pela base da categoria em uma assembléia na qual elegeu representantes para defender esse programa dentro da Conlutas. Essa reorganização é muito importante, porém, para combater a influência do PT e do governo dentro da CUT é necessário elevar esse processo a um patamar político. Isso significa dizer aos trabalhadores que o PT desde sua origem separou as decisões tomadas pelo partido das decisões tomadas pelos trabalhadores organizados nos sindicatos; que essa separação permitiu que os parlamentares e governantes petistas se aliassem com a burguesia pelas costas e contra os trabalhadores. A burguesia sempre teve seus partidos que expressam seus interesses no terreno político. Os trabalhadores necessitamos de um partido que, ao contrário do que foi o PT, seja completamente independente de qualquer setor da burguesia. Esta é a questão estratégica que queremos colocar em discussão

Por isso queremos, a partir destes setores mais avançados do movimento sindical, que estão na Conlutas, lançar a exigência de que a CUT e os seus sindicatos rompam com o governo e com o PT para impulsionar um partido baseado na independência de classe. Pretendemos, assim, abrir uma discussão com os trabalhadores dos sindicatos que ainda não romperam com o governo e que não estão na Conlutas. A CUT é uma organização dos trabalhadores e não vamos entregá-la, e aos milhões de trabalhadores que fazem parte de sua base, nas mãos deste governo que está contra os trabalhadores.

O PT deixou marcado na classe trabalhadora, ainda que de forma distorcida, o sentimento de que é possível e necessário se organizar de forma independente. Apesar da traição do PT e do governo Lula, essa marca hoje ainda se expressa na referência e na identificação que amplos setores da classe trabalhadora brasileira têm em seus sindicatos, que vêem como forma de organização independente da burguesia. Essas marcas são ainda mais fortes nos sindicatos ligados à CUT, que cumpriu um papel fundamental na formação do PT. A própria influência que o PT e o governo ainda exercem sobre a maioria da classe trabalhadora se dá em grande medida a partir da burocracia sindical ligada a este partido. Para se contrapor conseqüentemente ao PT, é necessário partir desse nível de consciência, buscando elevar os sindicatos à luta política, mas agora criando mecanismos para impedir novas traições. Esses mecanismos se resumem num estatuto que garanta que são os trabalhadores, a partir de cada sindicato e organização de base quem decida cada passo desse partido, através da democracia operária.

Jornal Palavra Operária: Mas e a burocracia ligada ao governo e ao PT, não se oporia à formação desse partido?

Mazé: Obviamente, não desconsideramos que a burocracia sindical e as ilusões no governo Lula são obstáculos para a formação deste partido. Mas é a primeira vez na história do país que os trabalhadores fazem uma experiência com o PT no poder, e antes disso era mais difícil que os trabalhadores percebessem que o PT é um partido traidor. Aqui na USP, durante a greve, ficou muito claro que a mobilização acelera esse processo. Trabalhadores que durante mais de uma década defenderam com unhas e dentes o PT, começam a ver que isso entra em contradição com as tarefas da luta e a necessidade de conquistar melhores condições de vida. O fundamental é que a CUT é uma organização dos trabalhadores e que hoje fica cada vez mais claro que, para defender seus interesses, ela não pode ser dirigida por um governo que ataca os trabalhadores. As próprias experiências dos trabalhadores em suas lutas salariais demonstra isso. Se o setor que defende a política do PT e do governo dentro da CUT se opuser à independência política da central e à formação de um partido operário que lute contra as traições do PT, teremos que travar uma dura batalha contra eles, e se ficar claro que eles estão dispostos a ficar contra os trabalhadores e a favor dos patrões, a política natural será expulsá-los. Mas isso é um outro problema, que se resolverá no decorrer do processo.

A política de construir um grande Partido Operário Independente é para que os sindicatos se tornem independentes do poder político e da patronal, e nesse sentido é também contra a burocracia, que se sustenta justamente em dividir os trabalhadores e negociar com o governo e com os patrões. Defendemos um programa de conjunto pela democracia operária no interior das organizações de massas, para construir sindicatos militantes que ponham à sua frente novos dirigentes eleitos pela base, que atuem de acordo com mandatos discutidos em assembléias de base, como no SINTUSP, que sejam revogáveis e que não tenham nenhum tipo de privilégio. Essa é a maneira de evitar novas traições e a formação de burocratas que decidem em lugar dos trabalhadores. Ao Sintusp e aos outros sindicatos da Conlutas, cabe ser a linha de frente deste processo, lutando para materializar a exigência de independência da CUT e a formação de um partido dirigido pelos trabalhadores, e de ser exemplo de como é possível organizar democraticamente os sindicatos.

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