Domingo 5 de Maio de 2024

Nacional

O que está por trás do “acidente” do metrô?

09 Feb 2007 | No dia 12 de janeiro vimos a tragédia ocorrida nas obras do metrô de São Paulo, que deixou 7 mortos e prejudicou mais de 60 famílias. Há tempos alguns moradores de regiões próximas às obras vinham reclamando de rachaduras em suas casas, e outros 9 acidentes já haviam ocorrido no ano passado, um deles chegando a matar um operário. Os governos do estado e do município, dirigidos há anos pelo PSDB-PFL, e as empresas responsáveis pela obra estão tentando demonstrar que foi um mero “acidente” tentando negar que os responsáveis são justamente estes setores.   |   comentários

A linha 4-Amarela do metró foi construída através de uma Parceria Público Privada (PPP). As PPPs são um projeto que está sendo aplicado por diversos governos em todo o país, mas este foi o primeiro aplicado. Governos e empresários fazem um discurso de que através da concorrência entre as empresas os custos das obras são barateados e os serviços melhoram de qualidade. As obras do metró são a prova de que os custos são muito altos, e que os trabalhadores pagam com suas vidas.

As PPPs são um acordo entre o governo e empresas privadas, no qual as empresas entram com a mão-de-obra e investimentos miseráveis, e o governo garante os lucros capitalistas. No caso da PPP utilizada na linha 4, o contrato permitia que as empresas explorassem por 30 anos a linha de 12 Km e 11 estações, investindo em troca R$ 340 milhões.

As empresas “concessionárias” que explorariam a Linha 4-Amarela, do Consórcio MetroQuatro [1], teriam apenas com a venda de bilhetes nos preços de hoje (R$ 2,30) uma receita de R$ 48 milhões por mês. Ou seja, recuperaria o total investido em apenas sete meses. Os restantes 29 anos e cinco meses seriam de lucro limpo. Um verdadeiro negócio da China para os capitalistas.

O governo contratou o Consórcio Via Amarela, através do método “turn key” (“preço fechado” ), em que as empresas têm um prazo para entregar as obras prontas para funcionar, sendo que o governo dá completa autonomia para fiscalização (ou falta dela) e para repassar tarefas a outras empreiteiras. Em troca, o governo fica isento de pagamento por gastos extras. Este contrato foi definido em acordo com o imperialismo, através do Banco Mundial, que financia 22,5% das obras, orçadas em 2 milhões de reais [2].

O Consórcio Via Amarela é composto pelas empreiteiras Odebrecht, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e OAS. Estas são, na ordem as 5 maiores construtoras do país e estão entre os 100 maiores grupos no ranking geral. Isso mostra como o discurso de que as PPPs aumentam a concorrência é uma mentira, já que se forma um cartel das construtoras mais monopolistas do país.

Mas não pára por aí. As empresas ainda utilizam o dinheiro público para beneficiar seus “amigos” . Um exemplo envolve o fiscal das obras da linha 4, Marco Antonio Buoncompagno, acusado de em outra obra do metró nos anos 90 ter sua empresa, a Engemab, favorecida através de vínculos irregulares na sub-contratação (permitida pelo método “turn key” ) feita pela construtora Andrade Gutierrez, gerando também enriquecimento ilícito do então presidente do metró, Antonio Sergio Fernandes.

Isso mostra como as empresas e o governo, ao contrário de se preocuparem com a melhora dos serviços para a população, estão preocupados em obter maiores lucros.

Uma tragédia anunciada

De fato, houve economia do dinheiro público para a construção das obras. E economia de tempo também. Além do interesse direto do tucanato (governador Alkmin e agora Serra) em acelerar as obras para obter mais votos nas eleições, as empresas e o governo queriam garantir uma obra económica para ter maiores lucros. E para isso economizaram em tudo, colocando a vida de centenas em risco.

Se as obras tivessem sido construídas com o “Tatuzão” (máquina para abrir túneis) elas estariam seguras, mas iriam demorar muito mais, então preferiram utilizar explosivos para abrir os túneis, o que era sabido que traria maiores riscos a todaa população. Se não ocorresse esta tragédia trazendo à tona a podridão do governo e das empresas, o crime contra a população poderia ter sido ainda pior, com o metró em funcionamento. Não utilizaram os técnicos do metró para “economizar” . Não garantiram direitos aos trabalhadores das obras, precarizados e terceirizados, para “economizar” . É uma prova de como a ganância capitalista é desumana e de como os grandes monopólios são anti-populares e anti-nacionais, pois não se importam com a vida não só dos trabalhadores, mas de toda a população.

Lutar por uma investigação independente e pelo fim da privatização

Qual foi o papel do Sindicato dos Metroviários, dirigido pela CUT, e da Construção Civil, dirigido pela Força Sindical? A direção do Sindicato dos Metroviários, o PCdoB, busca no sindicato se localizar melhor frente aos trabalhadores se colocando contra o governo de Alckmin. Porém, na Câmara dos Deputados e no Congresso Nacional, ajuda os governos aprovando as PPPs. Nacionalmente defendem a PPP de Lula, que não é menos criminosa. Na verdade, a preocupação do PCdoB é enfraquecer o PSDB estadualmente, para se fortalecer, ao PT e a base do governo Lula, que aplicam os mesmos projetos que o PSDB no estado.

Colocam como saída para os trabalhadores mais uma CPI, que sabemos, não vai punir ninguém, pois será composta pelos mesmos partidos, PT, PCdoB, PSDB, PMDB, PFL, que apóiam as PPPs. O sindicato, além da CPI, defende a participação na comissão de investigação que propõe o governo, junto com as empresas. Devemos sim exigir que os representantes dos trabalhadores participem na comissão de investigação oficial. Mas para desmascarar a farsa que vai ser essa investigação, pois não podemos confiar nas investigações do próprio governador, do presidente do Metró e das empreiteiras. Eles são interessados na questão, precisam esconder suas responsabilidades para garantir seus lucros financeiros e políticos. Eles são os verdadeiros responsáveis pela tragédia, pelas mortes e prejuízos.

O mínimo que os sindicatos e suas centrais devem fazer é convocar uma reunião para constituir uma Comissão Independente de Investigação que apure a verdade e exija a punição dos responsáveis, além do ressarcimento aos moradores, famílias das vítimas e aos cofres públicos. Só uma comissão na qual estejam os sindicatos e organizações populares aberta aos trabalhadores, livre dos patrões e dos governos corruptos pode apurar todas as responsabilidades.

Mas mesmo assim uma comissão independente não basta para punir os verdadeiros responsáveis e barrar as PPPs. Por isso, uma comissão assim deveria ser apenas o primeiro passo de um amplo processo de mobilização que unificasse os trabalhadores do metro e da construção civil, com os moradores da região e todos os usuários do metró.

Não podemos deixar que se esconda a causa dessas calamidades: a privatização da Linha 4-Amarela. Isto exige que se cancele imediatamente o processo de privatização, pois as empreiteiras responsáveis pela tragédia nas obras são também as “concessionárias” da Linha. Como poderemos utilizar com segurança um metró que estará sob administração das mesmas empresas que causaram este acidente? Devemos, a partir de exigir o fim da privatização da linha, lutar para que os próprios trabalhadores, junto com os usuários tomem o controle do metró. Somente grandes mobilizações e greves, unificadas com a luta das universidades contra os ataques do governador, podem garantir a concretização destas demandas.

A Conlutas e a Intersindical, que reúnem os sindicatos de esquerda e integram a direção do sindicato dos metroviários de São Paulo, devem superar a atual passividade e impulsionar uma campanha pelas demandas acima e exigir da CUT e da Força Sindical que façam o mesmo. Somente barrando a privatização, e colocando o metró sob controle dos trabalhadores e usuários, podemos impedir novas tragédias, geradas pela ganância de lucro dos capitalistas, a garantir um serviço seguro para a população.

[1O Consórcio MetroQuatro é constituído pela CCR ’ Companhia de Concessões Rodoviárias, Montgomery Participações S.A., Benito Roggio Transportes S.A. (concessionário do Metró de Buenos Aires) e RATP Développement S.A (Metró de Paris). O grupo CCR foi formado em 1998 é constituído pelas empreiteiras Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Serveng Civilsan e a participação da portuguesa Brisa. É a maior referência na operação privada de rodovias na América Latina, atualmente com 1.452 quilómetros de rodovias nacionais, cerca de 15% da malha rodoviária do país. Controla a Ponte Rio-Niterói (RJ), a Nova Dutra (SP/RJ), a ViaLagos (RJ), a Rodonorte (PR), a AutoBan e a ViaOeste, em São Paulo; além de administrar as prestadoras de serviços Actua e Engelog e participação na STP, serviços de pagamentos por meios eletrónicos.

[2O restante, seria dividido entre o estado (58%) e investimentos privados internacionais (19,5%).

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