Sábado 18 de Maio de 2024

Juventude

Lições da história do movimento estudantil brasileiro e balanço da história da UNE

05 May 2006 | Este artigo tenta resumir algumas lições depreendidas da história do movimento estudantil no Brasil e da UNE. Ele se baseia em um estudo que iniciamos e que em breve será publicado e apresentado em universidades e escolas.   |   comentários

1. A universidade no Brasil sempre foi e ainda é elitista. "Evoluiu" de 0,1% a "massivos" 2,5% da população do país. Historicamente seu projeto atende aos interesses da burguesia nacional e, de forma mais mediada, de distintos imperialismos. A universidade no Brasil nunca foi de uma só classe, antes policlassista, mas sempre à serviço da burguesia.

2. No Brasil, a maioria dos estudantes universitários é recrutada da burguesia, classes médias e de uma pequena-burguesia abastada. Isto continua mesmo com o PROUNI. Apesar de "abastados" a maioria dos estudantes ’ mais ainda nos últimos anos de faculdade ’ hoje como antes trabalham. Fato que expressa a decadência da pequena-burguesia ’ tendência histórica ao empobrecimento, fruto da concentração do capital ’, uma ideologia do “valor do trabalho” que a permeia e também, ao mesmo tempo, muitos vivem tão confortavelmente como seus pais. Os estudantes por seu caráter jovem, sua situação social transitória, por sua composição social diversa e pela influência de diferentes ideologias, nunca expressam de forma mecânica os interesses de suas classes de origem nem de sua condição de vida.

3. É por isso que os estudantes tendem a se dividir entre a burguesia e o proletariado frente aos grandes processos da luta de classes. No Brasil, como em outros países, já cumpriram um papel importante na luta de classes. Às vezes contra-revolucionário, como o evidenciado pelo apoio que a UNE promovia ao Estado Novo, sua convocação de trabalhadores para virarem bucha-de-canhão do imperialismo na Itália e repressão as mulheres no mesmo período e durante a Segunda Guerra Mundial. Por outro lado, durante o ascenso operário e popular dos anos 60, enquanto um setor dos estudantes formava o CCC, uma ampla camada dos estudantes tendeu a confiar no setor tido como o mais revolucionário: a força do PCB, da AP sobre a JUC, das frações guerrilheiras sobre o PCB, os trotskistas em Brasília em 68, e o que também se expressou mais tarde em algumas correntes do PT. Mais do que confiar nestas direções, os estudantes no Brasil demonstraram grande vontade de enfrentar ditaduras e outros regimes burgueses nas ruas, e ainda demonstraram uma vontade que atingia amplas camadas (4 a 6% na AP em 59-64, por exemplo) de se organizarem politicamente, de militarem sistematicamente pela revolução (ainda que fosse a burguesa do PCB, a nacionalista da AP, a democrática ’ com vários matizes ’ das correntes do PT, ou a operária e socialista.)

4. Os estudantes brasileiros construíram mais de uma vez uma poderosa entidade. Na maioria das vezes esta entidade esteve bastante afastada da massa estudantil e longe de qualquer perspectiva de democracia direta. O momento de maior influência política do movimento estudantil e da UNE não foi quando era maior, ou “gigante” como hoje, mas quando questionava mais a universidade burguesa e a sociedade capitalista. Isto se expressou marcadamente em 61-68 e ainda 75-79 (onde a UNE não existia). No ascenso operário, camponês e estudantil dos 60, a UNE e setores próximos a sua direção (como o Centro Popular de Cultura - CPC) fizeram importantes questionamentos. Nos Seminários Nacionais sobre a Reforma Universitária, por exemplo, era pauta a discussão da revolução brasileira e internacional, seu caráter, tarefas, e papel dos estudantes. No mesmo período foi desenvolvida a importante tática do CPC para poder produzir e difundir arte e conhecimento entre os estudantes e trabalhadores que servissem à revolução. O CPC servia para ligar os estudantes aos trabalhadores, cumprindo um papel revolucionário quando submetia suas publicações e seu conhecimento à decisão política dos trabalhadores.

5. Grande parte das lutas mais massivas do movimento estudantil, ou que conseguiram maior apoio operário e popular, incluíram ou foram dirigidas pelos secundaristas, atestam isto a luta contra o aumento dos bondes no Rio em 56, o “Fora Collor” , e mais incipientemente as recentes lutas contra aumento de passagens de ónibus.

6. A história da UNE é a história da falta de uma direção revolucionária. Suas direções caudatárias das teorias-programas da revolução burguesa, nacionalista e democrática sempre vacilaram em se aliar aos trabalhadores. Sua vacilação é decorrência direta de sua estratégia política de conciliação de classes. Todas lutas por liberdades políticas e tarefas democráticas da revolução brasileira que a UNE já dirigiu foram feitas de forma formal ou abstraídas da compreensão estratégica do capitalismo de que só os trabalhadores poderiam (e podem) garantir qualquer conquista democrática séria devido ao seu papel antagonista à burguesia na reprodução material desta sociedade. A “liberdade” de 45 seguida da proibição do PCB em 47, o “petróleo é nosso” e hoje a Petrobrás que produz para os lucros, a constituinte de 88 e todas suas futuras revisões, entre outros exemplos atestam isto. Para implementar este programa pequeno-burguês radicalizado ou diretamente burguês poucas vezes a UNE se aliou aos trabalhadores sem estar ao mesmo tempo atrelada a direções burguesas, fossem elas o "latifundiário progressista" Brizola ou nas “Diretas Já” que aglutinavam a UNE, CUT, PT e ao mesmo tempo OAB, PSDB, PMDB e até setores do futuro PFL.

7. O movimento estudantil depois das derrotas no período de 1979-1984 é uma sombra do que foi na década de 60, a UNE que foi reconstruída uma caricatura. Isto é culpa de suas direções, principalmente o PT e PCdoB. Mesmo com um ascenso operário nos 80 não se viu um papel minimamente similar ao dos anos 60. A UNE sob estas direções deixa de dar importância a questões ideológicas, permitindo a crescente contra-ofensiva do capital na universidade. A UNE nunca mais se preocupou em chegar às massas no Brasil (como fizera no Estado Novo e na década de 60), resolveu ser entidade de estudantes exclusiva aos estudantes. Fizeram predominar no movimento estudantil o corporativismo.

8. A UNE hoje de todos presidentes ocupando algum ministério é uma caricatura da caricatura. É necessário superá-la. Sua superação só poderá se dar até o fim sendo parte da recuperação e reorganização do conjunto das massas brasileiras. Hoje surgiu a CONLUTE que é uma expressão inicial desse processo. Ela seguramente vai dar origem a outras formas transitórias de reagrupamento, até decantar em uma grande ferramenta capaz de alcançar e superar os momentos mais elevados das lutas estudantis do passado, tanto no aspecto de sua implantação nas bases do movimento estudantil, quanto na sua relação com as demais classes exploradas e oprimidas da sociedade.

9. Para isto é necessário mais que as ferramentas capazes de organizar e mobilizar o movimento estudantil como uma força social e política de verdadeira expressão nacional. Faz-se necessário retomar os questionamentos sobre a revolução brasileira e internacional que o movimento estudantil e a UNE faziam. Os estudantes devem avançar para a consciência da necessidade de apoiar a classe trabalhadora como classe de vanguarda na luta pela completa emancipação humana. Os trabalhadores e jovens que queiram atuar para superar na prática a conciliação e enfrentar toda concentração de recursos e meios que a burguesia dispõe precisam construir também uma ferramenta centralizada, um partido revolucionário de trabalhadores. E no caso dos jovens também colocar o conhecimento teórico, técnico e científico ”” que sob o capitalismo visa ao lucro e portanto a exploração de muitos em favor de poucos ””para aprofundar esse processo de transformação social

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