Sexta 26 de Abril de 2024

Movimento Operário

Greve dos trabalhadores da USP foi exemplo de politização e radicalização

10 Sep 2004   |   comentários

A greve de trabalhadores e professores da USP, Unesp e Unicamp durou 65 dias, a mais longa da história, reivindicando 16% de reajuste salarial e R$ 135,00 em ticket alimentação, entre outras demandas, que se enfrentaram com a intransigência dos reitores que em seis negociações consecutivas mantinham 0% de reajuste.

De 27 de maio a 30 de julho, os trabalhadores da USP ’ Capital e Interior, principalmente os de menores salários e ligados aos serviços de manutenção e assistência ’ foram a vanguarda da greve destacando-se pelos métodos radicais e avanços subjetivos. Já no primeiro dia a greve atingiu 70% de adesão com piquetes, passeatas, atos públicos e assembléias massivas, coordenado e dirigido por um comando de greve com representantes eleitos por locais de trabalho, que discutia e decidia tudo, inclusive acima da direção do Sintusp que esteve em sua maioria ao lado dos grevistas.

O alto grau de politização se expressou nas consignas aprovadas, como a exigência da Abertura da Contabilidade das três universidades para demonstrar que havia dinheiro para o atendimento das reivindicações e para acabar com o “segredo contábil” das universidades que, apesar de serem públicas, não prestam contas das verbas públicas. Assim seria possível mostrar para onde vão os recursos da universidade e desmascarar o desvio de verbas para as fundações privadas que atuam em prol dos interesses dos monopólios capitalistas.

Consignas democráticas como o Fora Melfi (reitor), Eleições Diretas e Fora a Polícia da USP demonstravam que a politização se combinava com elementos de radicalização.

Os piquetes mostravam a determinação para quebrar a intransigência dos reitores. Quando o reitor da USP conseguiu ordem judicial para desalojar os piquetes com o uso da força policial, os trabalhadores, em Assembléia, não vacilaram e aprovaram a resistência para garantir os piquetes, o que os transformou, na prática, em destacamentos operários de auto-defesa, armados de paus, ferros e pedras para se defender. Foram cinco dias e noites de tensão, com trabalhadores de avançada idade junto com os mais jovens e estudantes que se dispunham a enfrentar a polícia e dobrar os reitores. Setores moderados dos professores tentavam convencer os trabalhadores para que não resistissem “para evitar um banho de sangue em nossa universidade” . Até o senador Eduardo Suplicy (PT), no dia 20 de julho, ao lado do major comandante do batalhão de polícia, tentava uma conciliação entre os trabalhadores e o reitor da USP, mas a firmeza, politização e radicalização impuseram a negociação com a manutenção dos piquetes, derrotando os reitores e a estratégia conciliadora das correntes centristas e governistas.

A situação política na USP mostrava claramente que os trabalhadores impunham sua força e abriam uma crise nas “alturas” do poder universitário, definindo uma correlação de forças favorável aos grevistas radicais e combativos, distintamente da correlação existente nas demais universidades, onde os reitores puderam manter um equilíbrio favorável para impor limites à greve, contando com a falta ou pouca radicalização e a preponderância da estratégia conciliadora dos sindicatos de trabalhadores e associações de docentes da Unesp e Unicamp, dirigidas pelo PT, PCdoB em aliança com o PSTU e o P-SOL.

Fruto da resistência dos métodos radicais dos trabalhadores os reitores apresentaram a proposta de reajuste imediato de 4,18% e outro dependente das arrecadação do ICMS em janeiro. Produto do protagonismo dos trabalhadores da USP, foi possível conquistar o aumento do valor do ticket alimentação de R$ 45,00 para R$ 135,00. Além dessas conquistas económicas impós-se um acordo garantindo o pagamento de todos os dias parados, a não reposição de horas de trabalho e nenhuma punição aos grevistas.

Se os ganhos económicos dessa greve não estiveram à altura da energia dos trabalhadores, deve-se ao papel burocrático e conciliador dos sindicatos do Fórum das Seis, com exceção do Sintusp que cumpria as decisões das assembléias e do comando de greve. Contudo, as vitórias políticas foram produto incontestável dos métodos de radicalização que se assentavam num alto grau de politização e recomposição dos trabalhadores da USP e, em menor medida, entre os da Unesp e Unicamp. Outro elemento negativo que condicionou o resultado da greve foi a impotência do movimento estudantil, dirigido por correntes petistas (DS e APS) e do P-Sol (MTL e SR), que não póde superar suas direções e avançar para uma greve estudantil que se combinasse com a dos trabalhadores e impusesse uma verdadeira greve geral universitária nas três universidades.

Os trabalhadores da USP saíram moralizados e fortes para avançar em sua politização e radicalização, abrindo as condições para que se organizem como uma corrente político-sindical antiburocrática, combativa e classista, a partir das universidades, contra as reformas “neoliberais” de Lula e do imperialismo, em defesa da unidade da classe trabalhadora e de um programa operário de saída para a crise.

O Sintusp, ao atuar de maneira antiburocrática esteve à frente desse combativo processo, saindo fortalecido, inclusive porque os trabalhadores vivenciaram os ataques advindos não apenas dos reitores, da imprensa, mas também dos sindicatos do Fórum das Seis, dirigidos por correntes petistas e do P-SOL e que contam com a participação do PSTU, que reproduzem a estratégia conciliadora e negociadora petista contra a estratégia combativa e antiburocrática da auto-organização e autodeterminação dos que lutam, dos seus métodos e avanços subjetivos e organizativos contra a exploração capitalista que se expressa mascaradamente na universidade.

Nos orgulhamos de ter sido parte ativa desse processo avançado

Desde o primeiro dia nos colocamos à frente desta greve para nos ligarmos aos trabalhadores que protagonizaram esse combate exemplar, abrindo a perspectiva concreta de consolidar uma corrente político-sindical antigovernamental, antiburocrática e classista em defesa de um programa operário e da luta pela independência de classe. Nosso esforço e determinação, ao não vacilar em colocar nossos recursos materiais e militantes na linha de frente dos piquetes, no enfrentamento com a polícia, na luta pelas demandas dos trabalhadores reafirmam nossa certeza de que uma organização marxista revolucionária deve aproveitar as oportunidades para forjar, na prática, no combate real, a estratégia revolucionária para se inserir no movimento operário e ligar-se aos setores mais avançados.

A Liga Estratégia Revolucionária ’ Quarta Internacional, soube soldar uma aliança revolucionária entre os seus jovens estudantes e os mais avançados trabalhadores da USP e as melhores tradições combativas das lutas.

Essa vitória política da greve da USP é, também, uma vitória de nossa organização em seu processo de transição para uma liga marxista revolucionária que gira ao movimento operário na estratégia histórica de reconstrução da Quarta Internacional, propondo um “programa baseado na experiência internacional da luta emancipadora do proletariado” , como dizia Trotsky no Programa de Transição.

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