Sábado 27 de Abril de 2024

Movimento Operário

PRIMEIRO DE MAIO

Bloco Somos Todos José Ferreira da Silva no 1º de maio da Praça da Sé reúne mais de 300 participantes

02 May 2011   |   comentários

Em mais um 1º de maio em que as grandes centrais sindicais fizeram mega-shows com distribuição de prêmios, realizou-se um ato na Praça da Sé com o PSTU, PSOL, PCB, MTST e outras organizações e movimentos populares. Apesar de chamado como um ato combativo e classista, uma vez mais reinava a apatia e apenas 1200 pessoas. Mesmo depois das lutas em diversos canteiros de obras, de terceirizados em vários locais do país, da ameaça de 6 mil demissões na grande obra do PAC em Jirau após a rebelião dos trabalhadores na mesma, as falas de dezenas de representantes das correntes e dos sindicatos abordavam desde os acordos nas eleições sindicais até homenagens abstratas ao socialismo. Shows de música cumpriam o papel de tentar dar algum entusiasmo aos presentes que, em sua maioria, vão ali como uma atividade rotineira do “calendário de luta”. Tudo isso depois de uma missa, que uma vez mais é convocada por todas as organizações, inclusive as que se reivindicam revolucionárias.

Mas a dinâmica do ato se rompeu por dois acontecimentos. Um deles foi a repressão policial completamente gratuita a alguns manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha, para deter um manifestante que, segundo a PM, teria “desacatado” os policiais com uma camiseta, e para levá-lo detido, utilizaram-se da truculência típica da polícia, avançando inclusive contra o Bloco Somos Todos José Ferreira da Silva, que foi o outro elemento que rompeu a dinâmica rotineira do ato.

Este bloco foi organizado a partir de um chamado das terceirizadas e terceirizados da empresa União, que vem protagonizando uma heróica luta na USP, na qual arrancaram da reitoria o pagamento dos salários atrasados e direitos (falta apenas os 40% da multa do FGTS) que a empresa não queria pagar, devido a que abriram uma verdadeira crise política na USP, contagiado centenas e centenas de estudantes, funcionários, juristas e professores com sua luta e organização. O Sintusp cumpriu um papel essencial, pois o sindicato oficial, o SIEMACO, é de burocratas vendidos que atuam a serviço da patronal. Os terceirizados avançaram não somente na consciência da necessidade de lutar pela efetivação sem concurso público, mas da necessidade de sair às ruas no 1º de maio para levantar suas bandeiras para a classe trabalhadora de todo o país, e homenagear o companheiro José Ferreira da Silva, 23 anos, terceirizado da Faculdade de Medicina da USP que morreu recentemente enquanto limpava vidros. A reitoria simplesmente se calou frente a este crime e a empresa continua completamente impune, mesmo tendo sido mais uma das tantas mortes em todo o país pelas terríveis condições de trabalho que são obrigados a ter os setores mais explorados da classe. Essa homenagem foi só uma primeira demonstração de que não vamos deixar passar mais esta morte impunemente.

Longe de uma votação formal, como tanto se faz na esquerda brasileira, a assembléia dos terceirizados, que é o organismo máximo de democracia direta dos trabalhadores, votou a ida ao 1º de maio como uma tarefa de primeira ordem e estiveram presentes massivamente, com mais de 100 companheiras e companheiros terceirizados, sendo a única delegação expressiva de trabalhadores em luta claramente organizada na Praça da Sé. O que diz mais do que mil palavras sobre o ato da Praça da Sé, é o fato de que estas lutadoras e lutadores não puderam dar sequer uma saudação entre as dezenas de falas de todos os aparatos no palco do “1º de maio de luta”.

Mas o Bloco Somos Todos José Ferreira fez o seu papel com uma enorme combatividade, vivacidade e politização. Nós da LER-QI nos somamos ao chamado dos terceirizados, assim como o Sintusp e o Comitê de Luta Contra a Terceirização e pela Efetivação dos Terceirizados na USP, compondo um bloco com mais de 300 pessoas. Desde a concentração a emoção já tomou conta do bloco. Depois de agitarmos nossas músicas, com a chegada dos ônibus da delegação de terceirizados, começamos nosso ato com um depoimento de familiares de José Ferreira da Silva que, profundamente emocionados, disseram que aquela homenagem confortava um pouco o enorme sofrimento que estão passando. Todos juntos gritamos: José Ferreira! Presente! E afirmamos uma vez mais que este era só um passo importante na luta pela punição dos responsáveis. Logo depois, o jurista e professor da Faculdade de Direito da USP, Jorge Luiz Souto Maior, que apoiou enormemente a luta dos terceirizados, como parte do combate que já vem travando a anos contra os males da terceirização, leu uma saudação ao ato.

Depois de enfrentar a repressão quando estávamos chegando à Praça, que atacou inclusive mulheres grávidas e provocou um desmaio de uma terceirizada, reorganizamos o bloco e fomos até a Praça da Sé, onde levamos as nossas bandeiras, cantos e demandas, apesar de não termos conseguido falar no palco. Depois, marchamos até o Largo São Francisco e fizemos o encerramento do ato, com falas das terceirizadas Conceição e Glória, e de Caio, estudante do comitê.

Depois disso, falaram André Bof, pela juventude da LER-QI colocando qual é para nós o significado do processo de luta dos terceirizados, da aliança operário-estudantil, da necessidade de levantarmos a luta por demandas democráticas, contra a repressão, contra a homofobia e chamou os estudantes ali presentes a, juntamente conosco, impulsionar uma grande juventude revolucionária.

Pablito, diretor do Sintusp e dirigente da LER-QI, fez uma fala colocando o caráter estratégico do combate à terceirização, abordando o problema do trabalho precário como parte estrutural do tão propagado Brasil potência. Colocou como este bloco luta contra as demissões em Jirau, contra a militarização e a polícia nos canteiros de obras, contra o trabalho precário e pela efetivação dos terceirizados. Concluiu afirmando o papel da luta contra a repressão de ontem e hoje, pelo fim da lei da anistia e punição de todos torturadores, assassinos e seus colaboradores, e fez homenagens a vários símbolos da nossa luta de ontem e hoje.

Simone Ishibashi, socióloga e dirigente da LER-QI, fechou o ato colocando como o significado para nós da unidade da classe trabalhadora extrapola a questão da unidade entre efetivos e terceirizados, chegando à necessidade da unidade da classe trabalhadora de todos os países. Colocou como a primavera árabe está colocando novamente em cena a luta de classes, saudando as lutas que estão sendo protagonizadas em diversos países contra as ditaduras, mas colocando a necessidade de expulsar o imperialismo e a OTAN da região, em particular da Líbia, defendendo a necessidade da derrubada revolucionária de Kadafi pelas mãos dos trabalhadores.


Saudações ao Bloco José Ferreira no 1º de Maio de 2011

De Andrés Padellaro, ex tercerizado do setor de limpeza dos ferroviários em Buenos Aires, na Argentina, representando a agrupação Bordó de ferroviários efetivos e terceirizados

Às companheiras e companheiros da USP e a todos os trabalhadores brasileiros em nosso dia, o 1º de maio

Este é o primeiro aniversário do dia internacional dos trabalhadores que viveremos como trabalhadores efetivos. Depois de meses de organização e de luta, hoje podemos dizer aos operários terceirizados ferroviários de Roca, na Argentina, demos um grande golpe contra a terceirização. Essa herança nefasta que sofremos e que padecem milhões de trabalhadores em todo o mundo. Com grande alegria, ficamos sabendo da luta das companheiras e companheiros que se encarregam de algo tão fundamental como é a limpeza, na Universidade de São Paulo. Recebemos diferentes notícias da “rebelião das vassouras”, e não queríamos deixar passar a oportunidade de mandar uma saudação para vocês neste 1º de maio. Não só para dar força para que sigam nesta luta, que depois de vocês terem conquistado o pagamento dos salários e direitos agora tem condições de avançar para a efetivação, mas também porque acreditamos firmemente que nós trabalhadores de todos os países temos que lutar juntos, e ajudar-nos mutuamente contra os empresários e os governos que nos exploram em todo o mundo. Envio então uma saudação, como um dos mais de 1500 trabalhadores terceirizados que, depois de lutar duramente conquistou a efetivação. Junto a meus companheiros, nos colocamos à disposição do que necessitem, levantando neste dia internacional dos trabalhadores a bandeira da unidade de todos os trabalhadores do mundo. Força companheiras! Viva a luta internacional dos trabalhadores!


Jorge Luiz Souto Maior - Direito USP

Manifesto todo o meu apoio à iniciativa dos trabalhadores terceirizados da USP, ex-empregados da empresa União, de chamar à atenção dos demais trabalhadores brasileiros quanto ao verdadeiro sentido do 1o. de maio, como um dia de luta da classe trabalhadora, sendo de se destacar que, no Brasil, pouco os trabalhadores tem a comemorar, vez que seus direitos são reiteradamente atacados pela mídia, são desrespeitados com convicção e sem qualquer medo de punição por vários segmentos da classe empresarial e estão muito aquém da efetiva aplicação do preceito constitucional que lhes assegura a constante melhoria de sua condição sócio-econômica. É sintomático neste sentido, aliás, o convívio pacífico com a prática da terceirização, que, diante de uma análise jurídica mais séria e desprovida de preconceitos, não encontra qualquer respaldo no direito do trabalho, ainda mais quando o tal “tomador dos serviços” é um ente público.

O mais interessante da situação é que são exatamente os trabalhadores terceirizados, ou seja, essas pessoas que pela prática da intermediação de mão-de-obra foram conduzidas ao estágio da invisibilidade, que estão demonstrando possuir a consciência necessária para compreender que se concretizara uma perda do sentimento de classe entre os trabalhadores, sendo certo que uma das mais eficientes formas utilizadas para se produzir esse efeito foi, exatamente, a terceirização, que pulveriza os trabalhadores, em diversos sentidos.

Os terceirizados da USP, empregados da empresa União, deram, ademais, uma grande lição a todos quanto ao modo de agir coletivamente. Demonstraram possuir qualidades essenciais à autêntica luta operária: organização, superação, indignação, solidariedade, humanismo, perseverança, coragem, confiança e, com o perdão do trocadilho, união...

A atuação desses trabalhadores, que se tornaram, se assim me permitem dizer, em razão do contato que tivemos, meus amigos, foi um grande exemplo para o Brasil; um exemplo que nos permite acreditar que as necessárias mudanças sociais que este país precisa podem advir pelas mãos de inesperados atores sociais. A luta dos terceirizados da USP, além disso, deixa todos os demais atores sociais sob a obrigação de engajamento. O silêncio, neste momento, representa uma comprometedora conivência com as diversas formas de superexploração da força de trabalho, que são, como se deveria saber, em muitas ocasiões, degradantes da condição humana.

É hora, mesmo, portanto, de unir esforços para eliminar de vez todas as forças de precarização, tais como: a terceirização; o banco de horas; a transformação de trabalhadores em pessoas jurídicas; o trabalho ordinário em horas extras; a dispensa imotivada de trabalhadores; as agressões reincidentes dos direitos trabalhistas; a discriminação para o acesso e manutenção do emprego; o assédio moral no trabalho; as condições agressivas à integridade física e moral dos trabalhadores no ambiente de trabalho...

No caso específico dos trabalhadores terceirizados da USP, parece-me extremamente pertinente a sua luta para que sejam definitivamente integrados, sem concurso, ao corpo de servidores da Universidade, como forma de reparação pelos longos anos em que foram superexplorados, valendo lembrar que alguns trabalham na USP há mais de dezessete anos.

De outra forma, deverão estes trabalhadores receber vultosa indenização em razão do grande sofrimento que experimentaram, e ainda experimentam pelo atraso no pagamento do salário, pela perda do emprego sem o correspondente pagamento integral de suas verbas rescisórias e por todos os demais assédios e constrangimentos a que foram submetidos nos últimos dias...

A mim pessoalmente, cumpre agradecer a essas pessoas pela oportunidade do convívio e pela lição de vida. O que devo lhes dizer, diretamente, é que aprendi muito com vocês e que levarei essas lições para sempre, transmitindo-as aos meus alunos e incorporando-as às minhas reflexões e atuações jurídicas.

Cumpre, também, renovar a mensagem transmitida na carta que antes lhes havia enviado no sentido de que

“...não há mesmo espaço para desânimo ou acomodação, como se estivéssemos marcados, como gados, pela inexorabilidade da injustiça social. Neste assunto, mais do que nunca, impõe-se uma luta vigilante e comprometida, mantendo-se, sempre, a esperança de que a vitória não será daqueles que não se importam com a vida alheia e com o respeito à ordem jurídica constitucional, cujo pilar é a preservação da dignidade humana.

A luta continua meus amigos... É como dito na belíssima canção de Ivan Lins e Vitor Martins:

Desesperar jamais Aprendemos muito nesses anos
Afinal de contas não tem cabimento
Entregar o jogo no primeiro tempo
Nada de correr da raia
Nada de morrer na praia
Nada! Nada! Nada de esquecer
No balanço de perdas e danos
Já tivemos muitos desenganos
Já tivemos muito que chorar
Mas agora, acho que chegou a hora
De fazer Valer o dito popular
Desesperar jamais
Cutucou por baixo, o de cima cai
Desesperar jamais
Cutucou com jeito, não levanta mais”

Resta, por fim, desejar que o exemplo de vocês consiga demonstrar aos demais terceirizados que vale a pena lutar e também que sirva para esclarecer aos demais trabalhadores que a felicidade não significa ganhar um prêmio no 1º. de maio e sim ter a consciência de cantar:

“Lutar, lutar, lutar, prá gente ser feliz!”


Ricardo Antunes – professor da Unicamp

"A terceirização reduz os salários, quebra direitos, fratura os trabalhadores e as trabalhadoras, aumentando ainda mais os perversos níveis de precarização e o flagelo do trabalho. A quem isso interessa? Certamente, não às forças sociais do trabalho. Assim, lutar contra a terceirização é um embate vital em nossos dias."


Homenagens: Companheiros e Companheiras, Presente!

José Ferreira da Silva, presente! – trabalhador terceirizado da USP que morreu trabalhando no regime de semi-escravidão imposto na USP

Konstantina Kuneva, presente! – terceirizada grega da limpeza que dirigiu um processo de luta e sofreu atentado da patronal com ácido sulfúrico

Mariano Ferreyra, presente! – militante trotskista do Partido Obrero Argentino assassinado pela burocracia sindical na luta pela efetivação dos ferroviários tercerizados

Cícera, presente! – terceirizada morta pela polícia na favela São Remo ao lado da USP

Marcelo Campos, presente! - jovem negro e homosexual espancado até morrer em junho de 2009 por um grupo de extrema direita na Parada Gay

Camille Gerin, presente! – travesti de Campinas espancada até a morte em agosto de 2010 por um grupo de extrema direita

Milhares de mulheres mortas por aborto clandestino, presente!

Olavo Hansen, presente! – militante trotskista, operário da indústria química, preso, torturado e assassinado pela ditadura brasileira em 1970

Centenas de mortos por lutar contra as ditaduras sangrentas no mundo árabe, presente!

Algumas das músicas cantadas pelo Bloco José Ferreira da Silva

Só vemos precarização Na USP: terceirização Em Jirau é demissão E o governo Dilma que manda repressão! Temos que nos organizar Terceirizados vamos efetivar As demissões vamos barrar E a classe operária vamos unificar!


Trabalho precário não pode existir Jirau anuncia o que está por vir Com a nossa União somos todos Jirau Nos rebelamos contra a patronal José Ferreira eu vou homenagear E morte sem punição nós não vamos mais deixar José Ferreira eu vou homenagear Lutando até o final pra todos efetivar!


Domingo, eu vou na Praça da Sé (eu vou, eu vou), juntos homem e mulher Vamos levar foguetes e bandeiras, não vai ser de brincadeira pro governo e o patrão Não tem pelego, nem casa sorteada mas tem muito camarada cheio de disposição Somos classistas e vamos combater a divisão da classe que os patrões querem manter Ôô ôôôôô ôôôôô ôôô, Bloco Classista!


E basta de sangue, de mutilações Eu quero meu corpo sem esses grilhões Direito ao Aborto não querem nos dar Nos organizando vamos arrancar Sou Pão e Rosas Direito ao aborto já E na América Latina Mulheres mortas não vamos deixar!


Somos as negras do Haiti Lutamos juntas contra as tropas Que assassinam o nosso povo No Haiti não passarão! E fora Hillary daqui! Mulher, ianque e assassina Está com Lula e com Dilma No Haiti não passarão!


Pra derrotar os ataques e a precarização Contra a burocracia, o governo e o patrão U-NI-DA-DE! Unidade da classe trabalhadora e o capitalismo que morra!

Artigos relacionados: Movimento Operário , São Paulo Capital









  • Não há comentários para este artigo