Sexta 3 de Maio de 2024

Internacional

Democratas e Republicanos

As duas facetas da democracia imperialista nos Estados Unidos

10 Dec 2006   |   comentários

Muitos analistas, intelectuais, funcionários e governos latino-americanos celebraram o triunfo do partido Democrata nas eleições parlamentares de 7/11, conjeturando uma suposta mudança no cenário político. Sem dúvidas, ainda mais contundente que este triunfo, foi a derrota da política imperialista impulsionada por Bush e pela Casa Branca, sendo esta acompanhada e apoiada permanentemente pelos democratas.

A vitória conquistada pelos democratas se baseou no descontentamento frente à guerra no Iraque. Uma guerra que os democratas apoiaram e apóiam, e que apenas questionam alguns aspectos quanto à maneira como Bush a vem conduzido com setores neoconservadores, como o recente ex secretário de Defesa, Donald Rumsfeld. Desde os ataques de 11 de setembro de 2001 os democratas votaram junto à maioria republicana todas as leis que são os sustentáculos da política externa no Afeganistão e no Iraque, incluindo a nefasta Ata Patriótica, o multi-milhonário postulado de Defesa, até a legalização da tortura em setembro de 2006. A ínfima quantidade de candidatos democratas e republicanos que se “opuseram” à guerra nunca questionou a política imperialista dos EUA. Suas ressalvas estão relacionadas com os custos económicos, políticos e estratégicos da guerra no Iraque.

Apesar de estar provada a falsidade dos argumentos utilizados pela Casa Branca para invadir o Iraque, os democratas se comprometeram publicamente a não investigar Bush nem sugerir a possibilidade de um impeachment. Assim demonstram que suas propostas não têm intenção alguma de questionar o presidente.

Os democratas, mais uma vez, demonstraram ser a fração de um mesmo partido: o grande capital financeiro e corporativo. Estes e seus pares republicanos utilizam-se de escândalos morais e acusações pessoais para se diferenciar entre si, já que nos aspectos fundamentais da política norte-americana expressam um total acordo.

Com opositores assim...

A senadora democrata Hillary Clinton, é conhecida como “falcão democrata” , atraindo setores conservadores (sendo potencial candidata presidencial para 2008). Não apenas sempre ratificou o seu voto a favor da guerra, mas em 2006, somou seu voto à maioria que refutou um cronograma de retirada gradual no Iraque, à revelia de uma lealdade implacável para com o Estado terrorista de Israel enquanto este atacava o povo libanês. No início deste ano afirmou: “penso que perdemos um tempo precioso negociando com o Irã” , referindo-se às discussões no Conselho de Segurança da ONU. É a porta-estandarte da ala direitista do Partido Democrata que vem ganhando peso contra os setores (tibiamente) críticos. Somado a isto, durante o último governo democrata de Bill Clinton, este manteve duras sanções económicas contra o Iraque, bem como o bloqueio a Cuba. Fez intervenções militares na Somália e Serra Leoa, bombardeou uma indústria no Sudão em 1998 (produtora de 90% de medicamentos para curar doenças graves) sob o pretexto de que fabricava armas perigosas. O auge foi o bombardeio que durou 78 dias sobre a população da ex Iugoslávia em 1999, além de pactuar na OTAN a guerra contra esse país.

Nos próximos dois anos, Bush deverá lidar com um governo debilitado. Os democratas, porém, também deverão lidar com um novo tipo de oposição “com responsabilidades” e com as expectativas de seu eleitorado. Ainda não havia passado duas horas do triunfo eleitoral, quando a nova líder da maioria parlamentar, a democrata Nancy Pelosi (uma das congressistas “progressistas” mais ricas do país) assumiu o compromisso de seu partido de trabalhar a ferro e a fogo pela vitória da “guerra contra o terrorismo” e pela ocupação imperialista no Iraque.

Os democratas só têm a oferecer bons negócios para a patronal imperialista ianque: prometeram não tocar no corte de impostos até 2011, e uma de suas grandes bandeiras progressistas, a lei de imigração, se incumbe de zelar pela garantia da mão-de-obra barata para os empresários.

Ainda que o seu projeto de lei de imigração (impulsionado conjuntamente com Bush e um setor republicano) possa gerar certa comoção em meio aos setores mais reacionários, os democratas deram seu voto na realização do monstruoso muro e da militarização da fronteira com o México. Como se isso não bastasse, grande parte dos legisladores eleitos se revelam tão conservadores quanto os republicanos em temas sociais (são contrários ao direito ao aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, etc). A onda de rechaço ao curso da guerra no Iraque da qual os democratas vem tirando proveito, dita enormemente sua política. Ao estar no epicentro do repúdio ao governo, os democratas obtiveram uma vitória sem precisar apresentar quase nenhuma proposta alternativa ou se enfrentar em pontos chave com os republicanos.

A agenda “inovadora” dos democratas se restringe a discutir um aumento ínfimo no salário mínimo, rever as negociações com a indústria farmacêutica e investigar os aspectos mais obscuros da guerra. A “grande mudança” sobre a política exterior virá (caso finalmente venha a ocorrer) da mão dos assessores de Bush pai, encabeçados por James Baker III e pelo novo secretário de Defesa, Robert Gates (que compartilha das idéias de Baker).

Frente a isto, republicanos e democratas são agentes de um regime que invade países, tortura e assassina, subordina continentes inteiros aos planos económicos neoliberais; tudo em “defesa da democracia e da liberdade” . Nenhum destes partidos está do lado dos trabalhadores, do povo pobre e da juventude que lutam contra a opressão e a exploração imperialista.

Assim funciona a república norte-americana

A corrupção imperante na “democracia” norte-americana se dá de modo descarado. Ninguém se apressa em esconder as contribuições das grandes empresas para ambos os partidos em troca de favores. Um dos escândalos mais recentes, que se incumbiu de arrancar a cabeça do ex-líder parlamentar republicano Tom Delay, tratava-se justamente de aplicações expúrias de milhões de dólares em contribuições de empresas aos partidos. Considerando que ambos partidos gastaram mais de 2.600 milhões de dólares durante a última campanha eleitoral, está mais do que evidente que só os partidos e os candidatos com financiamento multimilionário podem participar do processo eleitoral.

A democracia imperialista está baseada em uma profunda desigualdade social e na carência dos direitos essenciais para os milhões que são marginalizados. As possibilidades de participação no excludente sistema eleitoral norte-americano são reduzidas quando se trata de um pobre, trabalhador/a sem qualificação, negro ou latino (a maioria da população).
40 milhões de pessoas vivem abaixo da linha de pobreza, o que corresponde a 12.6% da população (em sua maioria negra e latina).

21 de cada 100 norte-americanos são pobres (ainda que a comunidade negra represente 12%, 1 em cada 4 pessoas negras é pobre).

46,6 milhões de pessoas nos EUA não têm cobertura médica - agravado pelo fato de que lá não existe nada parecido com saúde pública ou obras sociais.

Nas eleições, como nessas últimas, participa uma porção ínfima da população, enquanto milhões de pessoas não têm nenhum direito democrático, sendo as eleições realizadas impreterivelmente em dias de semana. Se um trabalhador quer votar, deve pedir permissão para chegar tarde, um privilégio apenas de alguns setores sindicalizados (que não chegam a 12% do contingente de trabalhadores e trabalhadoras).

Os Estados Unidos é praticamente o único país no mundo que nega às pessoas que tenham cometido algum crime em algum momento de sua vida o direito ao voto, e em muitos casos, perdem-no para sempre. Os grandes perdedores deste sistema são os norte-americanos negros. Segundo a ACLU (União pelas Liberdades Civis Americanas):

1 em cada 35 negros está preso.

1 em cada 3 jovens negros está sob algum tipo de supervisão judicial.

Estes são motivos suficientes para se perder o direito ao voto. Estima-se que 1 em cada oito negros perdeu o seu direito de votar por já ter sido preso ou ter alguma sentença (Fast Food Nation, Eric Schlosser). No caso das mulheres negras, mais de 600.000 estão impedidas de votar pelo mesmo motivo.

O Partido de los Trabajadores Socialistas (PTS) é a organização irmã da LER-QI na Argentina, e também faz parte da Fração Trotskista - Quarta Internacional

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