Sábado 20 de Abril de 2024

História

Revolução Mexicana e as mulheres

Dolores Jiménez y Muro: Quem é esta mulher?

20 Dec 2014   |   comentários

A fotografia que ilustra este artigo é, talvez, uma das mais famosas da Revolução mexicana iniciada em 1910. Na fotografia há apenas uma mulher, freqüentemente invisível atrás de Pancho Villa e Emiliano Zapata. Quem é esta mulher?

A grande revolução mexicana de 1910 compreendeu um processo amplo e complexo, que incluiu a mobilização de enormes setores do campesinato, e incipientes setores operários e urbanos.

As mulheres, como ocorre nos processos revolucionários, foram participantes e protagonistas da revolução em um nível muito maior do que é refletido na história oficial. Figuras como Amélia Robles, Lucrecia Tóriz, a própria Dolores Jiménez y Muro e outras milhares de combatentes anônimas se somaram às fileiras revolucionárias

Mulheres como Amelia Robles fizeram parte do Exército revolucionário, encabeçaram suas divisões e assumiram postos importantes no zapatismo. Depois de uma de suas últimas campanhas, Amélia Robles toma a decisão de adotar outro nome: coronel Amélio Robles. Poucos anos depois conheceria sua companheira por mais de uma década, Ángela Torres, e foi uma das primeiras e poucas mulheres que, no início do século XX, viveu sua orientação sexual plena e publicamente (Lutadoras, 2009).

Desde os anos prévios à revolução havia surgido grupos de mulheres dos quais participavam operárias, camponesas, intelectuais e professoras. Lutavam pela revolução e também por salários iguais aos dos homens, licença-maternidade e educação para as mulheres indígenas e camponesas. Nas tentativas iniciais de organização da classe operária, as mulheres tiveram um papel destacado.
Dolores Jiménez y Muro nasceu em Aguascalientes em 7 de junho de 1848. Formada nos círculos liberais de San Luis Potosí, desde a sua juventude apoiou os ideais juaristas, a resistência à invasão francesa e o Império de Maximiliano. Em 1901 colaborou na redação do programa do Partido Liberal Mexicano, onde compartilhou a militância com Ricardo Flores Magón. Durante o regime de Porfírio Díaz, em sua crescente participação em ações filantrópicas, se aproximou dos trabalhadores, conhecendo e denunciado a miséria e a exploração.

Esses anos serão lembrados por Dolores quando escreve durante uma de suas passagens pela prisão: “Desde então compreendi que a revolução atual [se refere à revolução de 1910] não estava distante, porque ideias germinavam por todas as partes. Pouco depois vim ao México, onde vi que milhares de cidadãos iam se inscrever nos clubes políticos, de onde deveria surgir a revolução, como ocorreu”.
Desde 1904, começou a se gestar no México o movimento “antireelecionista” contra Díaz; Dolores participa junto a muitas mulheres. Editava o jornal “A mulher mexicana” e presidiu o Clube Feminino Filhas de Cuauhtémoc, com o qual liderou um protesto contra a fraude sob a consigna “É hora das mulheres mexicanas reconhecerem que seus direitos e obrigações estão além do lar”.

Emiliano Zapata a convidou a se unir às fileiras do zapatismo, onde realiza tarefas de professora, escritora, jornalista e oradora. Ainda que já tivesse passado dos 60 anos, acompanhou muitas campanhas do Exército do Sul. Redigiu o preâmbulo do Plan de Ayala, proclamado em 1911; um plano que sintetizava o programa zapatista, reivindicava a renúncia de todos os funcionários do governo e chefes militares, a desmilitarização das zonas ocupadas pelo exército, a expropriação e repartição de todas as terras e os recursos naturais entre os camponeses e a liberdade a todos os presos políticos. Foi nomeada pelo general Emiliano Zapata como coronel do Exército Libertador do Sul.

Dolores se destacou entre as mulheres que, diferente da imagem popularizada das adelitas (uma retaguarda indispensável dos exércitos revolucionários) e as mulheres camponesas que acompanharam, fundavam grupos políticos, organizavam sindicatos, colocavam em pé jornais e revistas, discutiam com parceiros e superiores, mesmo em um momento em que as mulheres tinham um status legal inferior. Mais tarde, em 1917, fez parte da Secretaria de Educação, a partir da qual foi impulsionada a primeira campanha de alfabetização, e participou também das Missões Culturais.

Dolores Jiménez y Muro morreu em 1925 quando tinha 77 anos, suas amigas e companheiras a chamavam de “tocha da revolução”. Soube estabelecer laços entre as gerações que haviam enfrentado ditaduras e resistido invasões, e a geração que abraçou a revolução de 1910. Ganhou um lugar entre os generais da Revolução, reunido as ideias e redigindo documentos chave como o Plan de Tacubaya e o prólogo do Plan de Ayala.

Sua participação na Revolução não passou despercebida. A pouca visibilidade de sua figura não faz justiça à mulher valente que entrou na Cidade do México em 1914 com os exércitos revolucionários de Zapata e Villa. Seu lugar na foto não é casual, sua contribuição para a revolução está entre as fundamentais. A história oficial, e esse caro costume de esconder organizadamente a participação das mulheres nos processos históricos, são os únicos responsáveis de que ainda alguém veja a foto e, surpreendido, pergunte “Quem é essa mulher atrás de Zapata e Villa?”.

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