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Juventude

Crise nacional da universidade

A PUC-SP em crise

05 May 2006   |   comentários

Um importante processo de greve se desenvolveu na PUC, após mais uma absurda onda de demissões patrocinada pela reitoria, nessa universidade considerada como referência nacional pelo papel que cumpre na formação dos quadros da burguesia e, recorrentemente, pelo papel que teve durante a luta contra a ditadura e no próprio processo de auto-reforma do regime militar. A palavra de ordem da “sustentabilidade com autonomia” veio acompanhada de uma dura intervenção da Igreja Católica e ataques ao conjunto da comunidade universitária como demissões em massa e repressão política.

A greve da PUC, desatada depois de que a reitoria demitiu nada menos que 413 funcionários (!) e 472 professores (!) antes do início das aulas neste ano, durou pouco mais de uma semana, embora a repercussão de sua crise tenha ocupado as páginas de muitos jornais da burguesia durante meses. Em seus primeiros dias a greve, com exceção das faculdades do “Prédio Novo” (Direito e FEA), teve uma média de 70% de paralisação. Pelos corredores ainda discutem-se as ações do movimento de greve, atacam-se suas principais figuras, o seu programa de lutas e assim por diante. O histórico teatro TUCA, símbolo da luta contra a repressão da ditadura, se encheu mais de uma vez nesse ano. Foi palco de uma belíssima derrota dos estudantes de direita, e depois da votação da greve por cerca de 1.500 pessoas, a maioria de estudantes.

No entanto, afinal foi vitoriosa a palavra de ordem “voltar à normalidade” , difundida pela reitora Maura Véras, que foi promovida a interventora pela Igreja, com a aceitação passiva da maior parte da burocracia acadêmica. Apesar da crise ainda latente que existe no seio dessa burocracia e que foi abertamente crítica no início do ano, a reitoria conseguiu vencer essa primeira batalha. Avançou o projeto de vender a PUC para os bancos Bradesco e Real, com a participação ativa da intervenção da Igreja, que representou o grande acordo entre a reitora, Igreja e bancos, que teve inclusive uma entrada do governo pelos bastidores, logo descartada.

Perguntar-se sobre o caminho que a PUC “escolheu” é uma falsa questão. Os professores da Apropuc muitas vezes dizem que "o caminho da elitização" não é a resposta e se esquecem de dizer que ele já está posto, quer dizer, a PUC já é uma universidade elitista que manteve uma sombra "comunitária" e uma sombra de democracia... O que a greve mostrou foi um outro caminho para ser aberto. Organizar, construir e discutir uma nova alternativa baseada na gestão da comunidade, que discuta transformar a PUC em uma universidade pública, que seja a base de um regime verdadeiramente democrático, sobre o qual possa se erguer uma nova universidade, a serviço dos trabalhadores e do povo.

A greve é e foi o instrumento político mais forte que possuímos. Há cerca de 10 anos a chamada "universidade grevista" não se colocava a tarefa de uma ruptura aberta com o caminho trilhado. O ciclo de "democracia e autonomia" acabou. Há mais de 20 anos temos um regime “democrático e autónomo” para amortecer a contradição de ser “popular” e ao mesmo tempo particular, que ainda na sua “juventude” serviu para bloquear a transformação da PUC em universidade pública nos anos 80. Importantes sujeitos da transformação da PUC em uma universidade supostamente democrática, os professores e funcionários, que também foram a cabeça do processo derrotado de estatização, permaneceram impassíveis. Por um lado a Apropuc (Associação dos Professores) mostrou como os seus quadros estão completamente esvaziados e se apóia numa bela história criada nos anos 80 (com algumas de suas virtudes e muitos dos seus vícios) e, por outro a Afapuc (funcionários) praticamente se escondeu para não atuar e mostrar a que veio a “diretoria de luta” (burocrática, aparelhada pelo PCdoB). Desses setores, pouquíssimos professores mostraram sua disposição de luta, como indivíduos isolados somente. A crise fez surgir uma ala direita da própria reitoria. Os setores que formalmente se localizaram contra a reitora e a intervenção prefere, sob a pena de derrotar o próprio movimento, não combater essa ala direita para fortalecer ou diretamente a reitora, ou as instituições da “democracia puquiana” , que já deu mostras de falência generalizada. Os pequenos porém importantes setores de vanguarda no movimento estudantil não poderão se deixar confundir por esse ardiloso campo.

Diferentemente do que muitos pessimistas ou representantes da burocracia universitária disseram, a greve foi votada em uma importante Assembléia Geral (e não por "grupos que querem inviabilizar nossas atividades acadêmicas", como é afirmado na nota anti-greve da reitoria, 15/março), cresceu e se manteve nos dias posteriores. Criou um programa inicial de resposta à crise e se constituiu como o único espaço verdadeiramente democrático para discutir a crise da PUC e que caminhos rumar; essa foi sua fortaleza. A sua debilidade foi encontrar-se frente a um dilema: uma greve de contra-golpe aos ataques da burocracia como foi teria que necessariamente passar para a ofensiva, levantando não somente as demandas mais sentidas pela comunidade (como a retirada da intervenção e nenhuma demissão) para estruturar um programa de ação que questionasse os pilares do “regime democrático” falido atualmente existente e chegasse a propor uma nova forma de poder, baseada em uma assembléia geral da comunidade, forma esta muito utilizada nos anos 80. Essa foi a única maneira de expandir o conflito pela qual lutamos em todas as assembléias. O Movimento A Plenos Pulmões teve uma atuação bastante destacada e desde o primeiro dia de aula conseguimos construir assembléias com centenas de pessoas na Faculdade de Ciências Sociais, à revelia da direção do CACS (gestão “Palmares” , encabeçada por PSTU e PSOL) que se mostrou mais do que vacilante. Fruto de um amálgama sem princípios e unidade entre essas correntes, atuou diluído, geralmente não conseguindo sair do buraco em que se escondeu. Quando o momento político exigiu mais do centro acadêmico como ponta de lança da mobilização e da resistência, o CACS não foi uma ferramenta potente para a luta que os estudantes necessitaram travar.

Por outro lado, atuamos também em todos os fóruns do movimento buscando sempre a unidade concreta e prática pela base e não as “unidades” das diretorias das entidades, estéreis em sua efetividade prática; ao mesmo tempo em que atuamos a todo momento impulsionando a mobilização direta e a auto-organização dos três setores, pudemos combinar essa perspectiva com uma importante atuação no Conselho Universitário, espaço político que buscamos transformar em uma grande plataforma para desmascarar o regime de farsa democrática da PUC, e impulsionar o programa de ação discutido no seio do movimento estudantil. Desnecessário dizer que isso proporcionou a nosso conselheiro discente o ódio por parte da reitora, assim como ainda hoje é combatido a duras penas pela dividida burocracia universitária.

A crise da PUC entrou no turbilhão da crise da universidade nacional. A partir daí, começamos a impulsionar uma ampla campanha pela estatização das universidades particulares e, junto às públicas, por mais verbas para a educação para transformar esse conflito local em nacional. Embora o processo de greve tenha sido derrotado, a crise da PUC continua pulsando, até porque nenhuma de suas contradições mais fundamentais foi resolvida. Uma importante vanguarda política de estudantes restou para se preparar para novos capítulos da crise de 2006 ’ certamente poderá cumprir um papel destacado em futuros processos.

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