Quarta 1 de Maio de 2024

Mulher

Sobre o aborto e as demandas da mulher trabalhadora

29 Apr 2007   |   comentários

O dia 1º de maio, assim como o 8 de março, tem sua origem nas lutas e mobilizações dos(as) trabalhadores(as) e comemorá-lo é seguir os passos destes de luta pelos nossos direitos e melhores condições de vida. Nós mulheres compomos mais de 50% da classe trabalhadora e é essencial que neste dia reflitamos sobre as condições em que nos encontramos e levemos à frente a discussão em cada sindicato, local de trabalho e estudo para nos organizarmos e lutarmos pelo que nos é de direito. Hoje nos encontramos nos empregos mais precários e recebemos salários até 40% menores que os homens para realizar exatamente o mesmo trabalho. Toda trabalhadora sabe como não nos é garantido o mínimo para uma vida decente, salário digno, sem dupla jornada de trabalho e garantia por parte do Estado de assistência à saúde e educação de qualidade para nossos filhos.

Frente a tais condições precárias de vida, nós mulheres não podemos decidir e planejar se queremos e quando queremos ter ou não filhos, pois não temos condições de criá-los de maneira a garantir o mínimo para o desenvolvimento destes. Não podemos aceitar quando setores da Igreja posicionam-se contra o uso de preservativos ou de anticoncepcionais que evitam gravidez indesejada e que tem como resultado o abandono de crianças e morte de mulheres em operações de aborto clandestino.

Só na América Latina morrem 6000 mulheres por ano e mais de 800 mil são internadas por conseqüências dos mais de 4 milhões de abortos clandestinos, que hoje chega a ser a 4ª causa de mortalidade materna³. O aborto é um tema tratado há muitas décadas e as conseqüências de sua ilegalidade são tão drásticas que têm sido tema discussão em diversos países.

Em fevereiro deste ano, foi convocado um plebiscito em Portugal onde depois de um amplo e duro debate, mais de 50% da população votou pelo projeto de lei que não considera mais o aborto como crime. E no dia 24 de abril, houve uma importante votação de um projeto de lei para a Cidade do México, que também aprovou a descriminalização do aborto por qualquer que seja o motivo. Na maioria dos países da AL o aborto só é legalizado em caso de incesto, estupro e risco à saúde da mãe e no caso do Brasil, apesar de ser legal desde 1989 nestes dois últimos casos, a regulamentação dos serviços públicos de atendimento para tais operações só ocorreu em 1997 [1] e mesmo assim, o procedimento jurídico é demorado e pode ultrapassar o período para um aborto seguro à mãe e para além, não está disponível nos estados de Roraima, Amapá, Tocantins, Piauí e Mato Grosso, e nos outros, com exceção de São Paulo e Rio Grande do Sul, só está disponível nas capitais.

No Brasil, a questão do aborto é retomada por alguns governadores e pelo Ministro da Saúde Temporão, que começaram a compreendê-la como um problema de saúde pública, assim como por setores religiosos e organizações de direita que organizaram na Praça da Sé, um ato contra o aborto, citando o projeto de lei 1135/91 que autorizaria este até o 9o mês de gestação, o que é uma distorção deste projeto já que o mesmo prevê a legalização até o 3o mês.

Estes setores (religiosos e da direita), querem impor a todas as mulheres e ao conjunto da população suas crenças, sendo incapazes de separar estas das leis e políticas públicas do Estado laico. As críticas ao direito do aborto por motivos religiosos devem ser entendidas como questão de livre escolha aos que nestes acreditam e não impostos à todas e todos. Em nome de defender a vida, de seres que até o 3o mês de gestação não desenvolveram o córtex cerebral [2], e ignoram hipocritamente a vida destas milhares de mulheres, que por não terem acesso à educação sexual e métodos contraceptivos, recorrem como último apelo ao aborto clandestino. São estes mesmos setores que em Portugal ameaçaram de morte e agressão a quem defendesse o aborto publicamente.

Esta opressão histórica às mulheres e seu papel realizada pela Igreja e pela burguesia, levam também a que muitas mulheres não tenham o poder de negociar o uso de preservativos com seus parceiros sendo impedidas de decidir sobre sua vida e seu corpo.

O Estado tem a obrigação de garantir atendimento à saúde de qualidade e isso inclui a garantia de vida à estas mulheres que hoje só podem recorrer ao aborto clandestino quando não querem ou não podem ter filhos. Deve-se garantir todo o apoio médico e psicológico assim como os medicamentos necessários a um aborto seguro.

É urgente e necessário que as organizações de esquerda e as sindicais como a Conlutas e a Intersindical, tomem a iniciativa de impulsionar ofensivamente uma frente única com todos os setores que defendem o direito de escolha da mulher sobre sua vida e a maternidade como a Marcha Mundial de Mulheres, as Católicas Pelo Direito de Decidir e setores da CUT.

Foi convocada uma reunião no dia 05 de maio no CIM para discutir uma frente entre estas diversas organizações de esquerda que reivindicam a descriminalização do aborto e organizar um ato para o dia 28 de maio que é o Dia Internacional de Saúde da Mulher.

Aborto legal, seguro e gratuito para não morrer!
Por um salário mínimo digno! Igualdade salarial e de direitos!
Por creches, escolas, restaurantes e lavanderias para acabar com a dupla jornada de trabalho das mulheres!
Por educação sexual para escolher! Por anticoncepcionais e contraceptivos para não engravidar!

O CIM fica na Praça Roosevelt , 605 – no final da Av. Consolação, sentido Sé.

[1Depois da Resolução nº. 258 expedida pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) em 06 de novembro de 1997, determinando ao Ministério da Saúde a regulamentação e a normatização do atendimento ao aborto legal no Sistema Único de Saúde (SUS).

[2“A vida humana, para o direito, está intrinsecamente relacionada ao conceito de consciência, mesmo que potencial. É razoável, portanto, afirmar que a interrupção da vida natural antes do surgimento daquilo que possibilitará o desenvolvimento da consciência não implica, no sentido jurídico, em interrupção da vida humana. É inconstitucional, portanto, qualquer forma de sanção penal aplicada ao aborto praticado até o terceiro mês de gestação, porque, até esse momento, não existe vida no sentido jurídico da expressão. A potencialidade de vida humana vai existir quando houver o córtex cerebral, ou seja, a potencialidade de consciência.“ (Pedro Estevam Serran no texto “O direito ao aborto e os princípios republicanos e democráticos de direito“)

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