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Nacional

EDITORIAL

Por uma resposta dos trabalhadores ao aumento da inflação

01 Jul 2008   |   comentários

Os últimos anos de crescimento económico consolidaram nos trabalhadores a ilusão de que o governo Lula avançou na distribuição de renda, de que apesar no enorme aumento do lucro dos patrões, também os trabalhadores e o povo pobre conseguiram recuperar o perdido ao longo da década de 90. A geração de empregos com carteira assinada, os aumentos salariais acima da inflação em 84% das empresas listadas do Dieese em 2007, o aumento do salário mínimo, a amplitude do bolsa família, parecem confirmar o caráter popular e social do governo Lula.

Olhando mais de perto a realidade, veremos que esse governo soube também aumentar o lucro das empresas, e numa proporção muito maior do que aumentou a renda dos trabalhadores que só receberam as migalhas. E que nesse momento, quando a inflação começa a corroer novamente o salário do trabalhador, todas as medidas do governo são também para salvar o lucro dos capitalistas.

Com o crescimento económico de Lula, o salário avançou menos que o lucro

Em 2007, por exemplo, segundo estudo do Iedi, enquanto a produção por trabalhador nas fábricas cresceu 4,2%, o aumento real da remuneração foi de 3,1%. Isso significa que apesar dos aumentos acima da inflação e do crescimento do emprego o nível de exploração nas fábricas aumentou, o que ajuda a explicar o aumento exorbitante dos lucros da patronal.

Não é a toa que segundo levantamento da consultoria Economática, de 2003 a 2007 o lucro somado de 257 empresas listadas na Bovespa aumentou mais de 100%, alcançando 123 bilhões de reais em 2007.

Apesar dos aumentos acima da inflação, nenhuma categoria de trabalhadores apresenta um aumento salarial nem próximo disso. Pelo contrário, um dos fatores que explica o crescimento do lucro das empresas é que o crescimento económico de Lula se apóia no arrocho salarial dos anos FHC. De 1998 a 2002, a renda dos trabalhadores recuou 10% (“Era FHC” : A corrosão dos salários. Altamiro Borges 16/07/2002). Até 2007, o crescimento económico e os aumentos acima da inflação tinham feito o rendimento do trabalho subir acima do nível de 2002, sem recuperar o nível de 1998. Nos primeiros meses de 2008, no entanto, até essa pequena recuperação em relação a 2002 já foi para o buraco. “Estimado em R$ 1.208 em maio, o rendimento ficou 5,1% menor do que no mesmo mês de 2002.” (Alta da inflação afeta renda do trabalhador. Folha de S. Paulo, 27/06/2008).

A política de Lula frente a inflação: manter a rentabilidade das empresas

A estabilidade política do governo Lula se deve em grande medida ao crescimento económico e à ajuda que recebe da CUT e da Força Sindical, que se apoiaram nos aumentos acima da inflação para evitar greves e protestos de trabalhadores. A baixa inflação foi um dos elementos cruciais para garantir esses pequenos aumentos, ajudando a patronal a aumentar muito a rentabilidade, isto é, aumentar a produtividade sem grandes aumentos de custos e sem aumentar os salários na mesma proporção. O que fez com que mesmo setores patronais que em função do real valorizado perderam partes do mercado externo e interno para concorrentes chineses conseguissem manter e aumentar sua margem de lucro. Sem falar das empresas produtoras de commodities e dos bancos, que tiveram lucros exorbitantes nos últimos anos.

Essa situação, que unificou toda a burguesia em torno de Lula e impediu que surgisse descontentamento por parte dos trabalhadores, vai ser cada vez mais colocada em questão com o aumento da inflação. De um lado a patronal começa a repassar os aumentos de custos com matéria prima para o preço das mercadorias, o que de outro lado vai jogar o valor real do salário cada vez mais para baixo.

Para tentar evitar um cenário como esse, que pode romper a unidade burguesa em torno do governo Lula e provocar ondas de greves que a CUT e a Força Sindical, por mais governistas que sejam, serão incapazes de conter, o governo Lula avança em medidas que beneficiam somente os patrões.

De um lado o Banco Central aumenta os juros para tentar conter a expansão do consumo, um dos fatores que causa inflação. Mas com o aumento dos juros aumentam também as despesas do governo com a dívida pública, já que grande parte dela está atrelada aos juros do BC. Os capitalistas, bancos, empresas e fundos de investimentos, que compram títulos da dívida interna, vão ter um lucro extra. De outro lado, o governo acena com pacotes de isenção fiscal, anistia de dívidas e outros favorecimentos para setores industriais e agroexportadores, para compensar os aumentos de preço dos empréstimos provocados pela elevação dos juros e de custos, devido à inflação.

Longe de defender o salário dos trabalhadores, o que o governo Lula faz diante da inflação é garantir os altos lucros acumulados pela patronal nos últimos anos.

Por uma campanha salarial unificada

Nesse início de 2008 já ocorreram importantes greves, demonstrando uma importante disposição de luta dos trabalhadores. Greves por salário em setores mais precarizados como a construção civil de Fortaleza, empresas de ónibus em várias cidades do Nordeste, ou os terceirizados da Revap no estado de São Paulo. E greves e mobilizações contra ataques da patronal e dos governos, como a mobilização dos operários da GM em São José dos Campos ou a greve dos professores estaduais em São Paulo.

Nessas lutas vimos o papel da CUT e da Força Sindical. Essas centrais foram rechaçadas pelos operários da Revap, como já tinham sido pelos trabalhadores dos Correios no ano passado. Na luta da GM elas descaradamente se aliaram à patronal contra os operários. E apesar de que ainda dirigem a maioria dos sindicatos mais importantes do país, sabemos que vão colocar sua influência política para pedir paciência aos trabalhadores e gerar expectativas nas medidas de Lula.

Nessa situação a luta contra a inflação recai sobre a Conlutas, que precisa responder à altura convocando para o segundo semestre uma campanha salarial unificada em todo o país. E exigindo dos sindicatos da CUT e da Força Sindical que rompam sua colaboração com a patronal e organizem junto com a Conlutas a luta dos trabalhadores.

Um programa operário e popular de luta contra a inflação

Em cada categoria a Conlutas deve opor às medidas do governo Lula, de aumento dos juros e subsídios à patronal, um programa operário de luta contra a inflação, denunciando como a demanda de redução de juros (compartilhada pela CUT, pela Força Sindical e inclusive pelo PSOL) só vai favorecer a própria burguesia.

O primeiro ponto de um programa operário contra a inflação é o reajuste mensal automático de salários de acordo com o aumento do custo de vida (e não da inflação oficial, sempre menor) e pela recuperação das perdas salariais acumuladas desde os tempos de FHC, que deve ser calculada em cada categoria.

Essas medidas vão diminuir a inflação? Não, mas vão evitar que sejam os trabalhadores os principais prejudicados por ela. Por isso devemos também lançar demandas dirigidas às classes médias, de formação de comitês de consumidores para controlar os preços. Que a patronal arque com a inflação! Ao invés de repassar o aumento de custos ao preço final, que esse aumento seja absorvido com a diminuição do lucro, que como demonstramos só vem crescendo nos últimos cinco anos.

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