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Debates

Os revolucionários e a "Assembléia Constituinte"

25 Aug 2005   |   comentários

Os revolucionários marxistas, quando levantamos a demanda por uma Assembléia Constituinte Livre e Soberana, não deixamos em nenhum momento de dizer abertamente que lutamos pela expropriação de burguesia e a socialização dos meios de produção por um governo dos trabalhadores, dos camponeses e do povo pobre, baseado em conselhos de deputados revogá-veis eleitos por unidade de trabalho. Porém, as massas não elevam seu nível de consciência apenas pela propaganda abstrata dos socialistas. É necessário proporcionar-lhes experiências concretas com as quais possam perder suas ilusões na democracia burguesa e tirar conclusões revolucionárias.

Hoje, a matéria prima mais concreta através da qual podemos dialogar com o atual nível de consciência das massas é sua indignação com a corrupção que toma conta das instituições do regime e a relação entre essas instituições e as miseráveis condições de vida na cidade e no campo.

Nesse sentido, para dialogar com a maioria da população que hoje não compartilha de nossa perspectiva revolucionária, chamamos as massas a lutarmos juntos para impor pela força uma Assembléia Constituinte Livre e Soberana, como forma de mobilizá-las e colocá-las no centro da cena política nacional. Nesse marco, utilizamos a Assembléia Constituinte para propagandear e agitar reivindicações de transição que se apóiam nas demandas mais sentidas pela população e que por se enfrentarem com o sistema capitalista proporcionam experiências de luta das quais possam ser extraídas conclusões revolucionárias.

Desta forma, a consigna de Assembléia Constituinte Livre e Soberana politiza e eleva o nível de consciência das massas e cria uma grande “escola de pedagogia revolucionária” , onde as massas aceleram sua experiência com a democracia burguesa e avançam na compreensão da necessidade e dos meios da luta revolucionária.

As Constituintes restringidas e controladas

A burguesia realiza Constituintes restringidas e controladas para impor saídas reacionárias diante das crises em seus regimes. É uma política de “reação democrática” , na qual as classes dominantes buscam dar uma aparência de “mudanças profundas” , renovando a legitimidade de suas instituições e, quando necessário, inclusive o pessoal político, para na verdade não mudar nada.

A Assembléia Constituinte de 1988 no Brasil foi um típico exemplo de “reação democrática” utilizada pelas classes dominantes para impedir que o ascenso grevís-tico da década de 80 derrubasse a ditadura de forma revolucionária e para garantir a conclusão da transição “lenta, gradual e pacífica” para a podre democracia em que vivemos hoje. Basta comparar as leis sobre emprego, salário e repartição da terra que foram aprovadas em 1988 com o que na prática aconteceu com o povo na cidade e no campo durante a ofensiva neoli-beral para comprovar que esse tipo de constituição não passa de um engano reacionário.

É esse tipo de política que em meio à atual crise política alguns setores da burguesia brasileira já começam a levantar, como por exemplo o PPS de Roberto Freire. A luta para impor através da mobilização a Assembléia Constituinte Livre e Soberana é também uma forma de preparar as massas para o combate contra esse tipo de saída burguesa e reacionária para a crise.

Uma digressão sobre a Assembléia Constituinte em situações revolucionárias

As organizações de tipo soviético, ao contrário de qualquer tipo de Assembléia Constituinte, têm deputados eleitos por unidade de trabalho (produção, serviço, o campo, as minas, e na base da sub-oficialidade do exército burguês); nelas os exploradores não têm nenhum direito e a garantia da implementação das decisões em última instância são as milícias operárias. Essa é a estratégia de poder revolucionário pela qual lutamos.

Quando há um ascenso revolucionário, em determinadas circunstâncias chamamos uma “Assembléia Constituinte Revolucionária sob as ruínas do regime” , e não meramente uma Assembléia Constituinte Livre e Soberana, ao mesmo tempo em que simultaneamente chamamos à constituição de um poder sobre bases soviéticas e um partido que lute por um programa revolucionário. Foi isso que defendemos nos últimos dois levantamentos revolucionários na Bolívia, onde lutamos por uma Assembléia Popular (que é a forma boliviana dos Soviets, ou Conselhos) ao mesmo tempo em que dialogamos com as aspirações e ilusões das grandes massas que confiam que uma Assembléia Constituinte, nacionalizando os hibrocarbonetos, começará a liquidar sua miséria e a entrega do país ao imperialismo.

Porém, em última instância, qualquer Assembléia Constituinte, mesmo nas circunstâncias mais revolucionárias, tem enormes limites no aspecto fundamental de sua relação com o poder económico e militar da burguesia e seu caráter policlassista. Por isso, a Assembléia Constituinte, mesmo numa situação revolucionária, para nós não é mais do que uma tribuna para fazer propaganda de nosso programa e alentar o desenvolvimento de organizações de tipo soviético e de um partido que lute por este programa e esta estratégia.

O sectarismo oportunista do PSTU e de setores do PSOL

Muitos setores que se reivindicam revolucionários, como por exemplo o PSTU, dizem que lutar por uma Assembléia Constituinte Livre e Soberana é uma capitulação à democracia burguesa, que fomenta ilusões na burguesia e por isso vai contra a luta revolucionária.

Frente à atual crise política, o PSTU propõe exigir do Congresso e do Ministério Público que chamem Lula para depor, fazendo coro com os setores da burguesia que defendem um impeachment, assim como na crise do “Fora Collor” em 1992, quando defendia “eleições gerais” . Ainda que o PSTU tente se cobrir com um discurso de esquerda dizendo que só a mobilização nas ruas pode dar uma saída progressiva para a crise, basta perguntar-lhe por que objetivo as massas devem se mobilizar para desmascarar sua política: no máximo vai obter como resposta políticas abstratas como o atual “Fora todos!” , que por trás da aparente radicalidade se reduz de fato ao “Fora Lula” que o PSTU já vinha ensaiando, combinado com uma demanda abstrata sem conteúdo de classe (basta lembrar que este “Fora todos” foi o lema das mobilizações da classe média argentina em 2001, que logo passaram a apoiar o governo burguês de Kirchner). É evidente que se as massas levantassem tanto o “Fora Lula” quanto o “Fora todos” , nós estaríamos lado a lado com elas, explicando a necessidade de que os trabalhadores têm que impor sua própria saída independente, sem o que não adianta falar em “Fora todos” de maneira abstrata, pois quem aproveitaria esse “vazio de poder” hoje seria a oposição burguesa; porém, levantar estas consignas hoje, quando elas não partem espontaneamente das massas, não é a tarefa da vanguarda marxista. Por mais que essa política pareça “radical” para alguns setores, esse partido com isso não faz mais do que jogar fora mais uma oportunidade de fazer os trabalhadores avançarem para superar suas ilusões democráticas, pois não levanta nenhuma consigna real que acelere essa experiência, que só pode se dar na prática e não tem como ser substituída pela simples propaganda abstrata da revolução. O PSTU, apesar das aparências, se nega a disputar com a burguesia a influência política sobre as dezenas de milhões de trabalhadores e camponeses pobres do país que se desiludem com o governo Lula e o PT, deixando esse “trabalho” para o PSDB.

Aqui o PSTU pouco se diferencia do PSOL, que chama um plebicito revogatório para tirar Lula e ganhar alguns votos a mais para Heloísa Helena nas próximas eleições enquanto o neoliberalismo tucano é que realmente ganha com o desgaste do neoliberalismo petista.

Assim, sem travar uma luta conseqüente contra o partidos burgueses e nem tampouco contra o oportunismo do PSOL, o PSTU pode continuar tranqüilo com sua tradição sindicalista (que se nega à política revolucionária de massas) com pitadas de propagandismo revolucionário abstrato (que não serve para educar as massas, e sim apenas se auto-proclamar revolucionário).

E o PSOL, por sua vez, avança mais alguns passos em sua adaptação ao regime.

Todo revolucionário consequente hoje deve lutar, tanto na Conlutas como na Assembléia Popular, pela construção de um pólo antigovernista e antiburocrático que exija dos sindicatos, da CUT e do MST sua ruptura com o governo e um plano de lutas capaz de impor a convocação de uma Assembléia Constituinte Livre e Soberana, com milhares de deputados eleitos, que garanta a investigação e a punição dos corruptos, que revogue as reformas e leis antipopulares votadas no “Congresso do Mensalão” e que discuta como resolver os problemas do desemprego, dos salários miseráves, da reforma agrária e da entrega do país ao imperialismo.

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